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WhatsApp Image 2024 06 14 at 20.11.09Dona de vozeirão com carregado sotaque português e dotada de uma impressionante capacidade de articular e comunicar ideias. Mas, acima de tudo, uma professora de extenso currículo, exigente e zelosa com seus alunos. Maria da Conceição Tavares, que faleceu aos 94 anos no último dia 8, deixou uma legião de admiradores.
“Ela não tinha nenhuma tolerância com pensamento tecnocrático, burocrático, com o jeito amesquinhado de usar a razão como uma forma de escapar aos desafios centrais do país”, disse o professor emérito Carlos Medeiros, um desses muitos admiradores, na homenagem à mestra realizada na segunda-feira (10), no Instituto de Economia. O ato, organizado pelo centro acadêmico Stuart Angel, lotou o Salão Pedro Calmon, no campus da Praia Vermelha, com colegas e estudantes de várias gerações.
“Afinal, o que tornava a Conceição, em suas aulas, tão especial? Era exatamente a capacidade dela de comunicar, de falar ao âmago, ao coração, ao sentimento das pessoas que estão ali”, prosseguiu Medeiros. “Mas, ao mesmo tempo, não pensem que queria apenas adeptos que concordassem com ela. Era a primeira a puxar o tapete, se dissessem uma bobagem. Não podia falar qualquer coisa. Tinha que seguir uma tradição lógica conceitual rigorosa”.WhatsApp Image 2024 06 14 at 20.11.10 1
O professor falou com a experiência de ter sido orientado pela homenageada no doutorado. “E eu digo que não é fácil ser orientando da Conceição Tavares. Conceição lia uma frase e dizia: ‘Tá errado! Tá errado!’. E aí você tinha que refazer, mexer”. Apesar do jeito explosivo, a mestra era generosa e paciente, sempre instigando os alunos a crescer. “A Conceição odiava mediocridade, o mais ou menos, a coisa estável, meio plana. Isso não era com ela. Nunca foi”, afirmou.
Tanto não foi que alcançou um status sem igual entre os pares. “Estes aspectos centrais fizeram da Conceição, talvez, a intelectual mais criativa ou produtiva nessa área, entre economistas, com um pensamento próprio, orgulhoso de si, que não está pagando homenagem e buscando publicação para pontinhos na Capes. Essa era a Conceição, uma grande e apaixonada intelectual”, concluiu Medeiros.
Uma intelectual de esquerda. Conceição nunca escondeu seu posicionamento forjado inicialmente no marxismo e depois refinado com a influência de autores desenvolvimentistas e do trabalho junto à Comissão Econômica para a América Latina (Cepal). Esta formação, porém, nunca contaminou a análise rigorosa dos acontecimentos.
O exemplo mais claro aconteceu em 1970, quando Conceição lançou, ao lado de José Serra — ambos trabalhavam na Cepal, em Santiago —, o ensaio “Além da Estagnação”. “Para mim, o melhor trabalho sobre economia brasileira se você pensar nos recursos disponíveis em cada momento do tempo”, disse o diretor do Instituto de Economia, professor Carlos Frederico Leão Rocha.
“Ela faz uma previsão bastante ousada para a época, ainda mais para quem vinha da esquerda. Dizia que o milagre econômico iria dar certo. O que tem de problemático é que é excludente”, lembrou Fred. “O que Conceição estava anunciando era que os planos daquele governo iriam dar certo. Ia contra as ideias que estavam na esquerda, mostrando a importância da isenção científica”, completou.
Tomando o “Além da Estagnação” como uma das referências, o diretor do Instituto recordou ter chamado a mestra para dar uma aula sobre economia brasileira, em 2004. Talvez uma das últimas ministradas na graduação. “A minha turma era grande. Devia ter uns 60 alunos. E nós dávamos aulas na parte dos fundos do Palácio, onde há salas para 80 pessoas. E aquela sala ficou cheia, com gente sentada nas janelas. Foi um espetáculo. E ela falava sem parar”.
WhatsApp Image 2024 06 14 at 20.11.11 1A maneira de lecionar impressionava. “Não segue uma linha reta. Vai e volta muitas vezes. A segunda coisa é que você pensa no contra-argumento que vai apresentar. E ela já ia falando: ‘Você não vai pensar besteira, porque eu já tenho aqui a resposta para a besteira que você está pensando’”, lembrou Fred, divertido. “Devemos dar continuidade ao trabalho da Conceição. Essa é a nossa missão. É a maneira de homenageá-la”, concluiu o diretor.
Diretor executivo do Centro Acadêmico Stuart Angel, Danilo Ponciano concorda. “Conceição Tavares nos ensinou a importância de entender a economia não como um conjunto de números frios, mas como um instrumento de transformação social”, disse. “Ela nos mostrou que por trás de cada dado econômico existe uma pessoa, uma família, uma comunidade. Nos ensinou a olhar para além dos gráficos e estatísticas, ela nos ensinou a enxergar o rosto do povo brasileiro, mas especialmente o rosto dos mais pobres”.

“TIKTOKER”
Em depoimento gravado para o canal do Instituto de Economia no Youtube, o professor Carlos Pinkusfeld se juntou às homenagens e, entre outros aspectos, destacou o perfil da mestra como comunicadora. “A Conceição não mandava um e-mail. Mas, apesar de a Conceição ser completamente afastada do mundo digital, ela virou tiktoker antes de existir o Tiktok. Pela sua formação de empatia com as pessoas. Tinha esse lado de divulgadora, de formadora de um sentimento político ligado à economia”. Era algo tão intenso que a economista segue viralizando nas redes desde 2020, com a divulgação de trechos de aulas ou entrevistas.
Intensidade que se revelava também nos momentos difíceis da vida do país ou do mundo. “A Conceição gostava de dizer que era pessimista na razão e otimista na vontade. Tinha duas frases padrão: ‘Perdemos’ e ‘estamos mal’. Eram dois clássicos. Acabei de ver o resultado da eleição do parlamento europeu e me veio a Maria da Conceição Tavares à cabeça”, disse Pinkusfeld, em referência ao avanço da extrema-direita.
“Mas esse ‘Perdemos’ ou ‘estamos mal’ durava apenas o tempo de tomar um café e acender o primeiro cigarro. Porque, daí a dez minutos, ela já estava pensando que nem uma locomotiva e tentando explicar porque perdemos”, observou. “Deve haver um reconhecimento das dificuldades que o mundo nos coloca e uma motivação para continuar pensando. Mais do que pensando, no caso dela, criando instituições, formando alunos e criando ideias para tentar reverter isso”.
Conceição ajudou a criar as pós-graduações do Instituto de Economia da Unicamp e do Instituto de Economia da UFRJ e formou gerações de economistas, que hoje agradecem o legado deixado. “Mas a gratidão não se restringe ao mundo acadêmico. Conceição não só sempre mexeu com a cabeça dos alunos e dos colegas economistas; o fez com a intelectualidade brasileira em geral, com os tecnocratas, os políticos e os governantes, os sindicalistas e empresários. Sempre obrigou todo mundo a ‘pensar grande’. Obrigou o Brasil a se pensar grande”, avaliou o professor titular Ricardo Bielschowsky.
“E somos gratos pela energia que empregou e que transmitiu, como guerreira que foi no front intelectual da luta política por uma sociedade mais democrática, melhor e mais justa”, completou.

DA PRAÇA MAUÁ AO
CONGRESSO NACIONAL

WhatsApp Image 2024 06 14 at 20.11.11 2Na homenagem organizada no Pedro Calmon, uma das mais emocionadas era a professora Hildete Pereira, uma das amigas mais próximas de Conceição. As duas foram vizinhas, no Cosme Velho, durante 28 anos.
Hildete contou que a velha amiga se apaixonou pelo Brasil assim que desembarcou do navio, na Praça Mauá, fugindo da ditadura salazarista. “Conceição chegou ao Rio de Janeiro numa segunda-feira de carnaval, em 1954. Grávida, recém-casada e correndo da polícia de Portugal”. Naquela época, o desfile das escolas de samba acontecia ali pertinho, na avenida Rio Branco. “Ela disse que ficou enlouquecida com a alegria do povo brasileiro”.
Conceição ainda não era professora. Carregava o diploma de matemática da Universidade de Lisboa e só arranjou emprego prestando concurso para o então Instituto Nacional de Imigração e Colonização, que tratava da questão das terras no país. A alegria que sentia se transformou em indignação ao constatar a enorme concentração fundiária do Brasil. “Foi a virada de chave na vida dela”, afirmou Hildete.
A indignação e a coragem no debate público levaram Conceição ao PMDB de Ulysses Guimarães e, posteriormente, ao PT. Hildete coordenou a campanha que elegeu a colega como deputada federal, em 1994, com 40 mil votos. Mas a vida no parlamento não agradou. “A negociação política vai e vem, vai e vem, até que se chega a um mínimo de acordo. A Conceição dizia que não dava para isso”. O resultado é que acabou se tornando professora da bancada petista. “Ela disse que ia ensinar economia para quem quisesse”, completou Hildete.

LINHA DO TEMPO

1930. 24 de abril, Maria da Conceição de Almeida Tavares nasce em Anadia, Portugal.

1953. Cola grau em Licenciatura de Ciências Matemáticas e Estatísticas na Universidade de Lisboa.

1954. Emigra para o Brasil, radicando-se no Rio de Janeiro.

1956. Aprovada no vestibular, ingressa na Faculdade de Ciências Econômicas e Administração (FEA) da Universidade do Brasil, atual UFRJ.

1960. Cola grau como bacharel em Ciências Econômicas.WhatsApp Image 2024 06 14 at 20.11.11

1961. Inicia sua carreira docente como professora auxiliar de ensino na Universidade do Brasil.

1970. Publica em coautoria com José Serra o ensaio “Além da estagnação: uma discussão sobre o estilo de desenvolvimento recente do Brasil”.

1972. Convidada pela recém-fundada Universidade de Campinas (Unicamp), assume a coordenação da Pós-Graduação de Economia.

1972 – Publica o livro “Da substituição de importações ao capitalismo financeiro: ensaios sobre economia brasileira”.
1973. Reassume sua função como professora da FEA/UFRJ, exercida simultaneamente com a docência na Unicamp.

1975. Coordena a Graduação da FEA/UFRJ até o ano de 1977. Defende a tese “Acumulação de capital e industrialização no Brasil” e obtém o título de doutora e livre-docente.

1978. Aprovada no concurso público para a vaga de professora titular na UFRJ, com a tese “Ciclo e Crise: o movimento recente da economia brasileira”.

1979 . Nomeada coordenadora do Instituto de Economia Industrial da UFRJ.

1986. Dirige o Instituto de Economia da UFRJ no quadriênio 1986/1989.

1990. Aposenta-se como professora titular da UFRJ.

1993. Recebe do Conselho Universitário da UFRJ o título de professora emérita.

1994. 15 de novembro, Maria da Conceição Tavares é eleita deputada federal pelo PT/RJ, com 40.409 votos.

1998. Recebe o “Prêmio Jabuti – Economia, Administração, Negócios e Direito”, pelo livro Poder e Dinheiro – uma economia política da globalização, organizado por ela em parceria com José Luís Fiori.

2017. Escreve o artigo “Restaurar o Estado é preciso”, sobre o papel-chave do Estado na retomada do crescimento do Brasil.

2018. Lançamento do filme Livre Pensar – Cinebiografia de Maria da Conceição Tavares. O filme foi lançado no Salão Pedro Calmon do Instituto de Economia da UFRJ.

2024 . Falecimento, no dia 8 de junho, aos 94 anos, em Nova Friburgo (RJ).

Em reunião na manhã desta segunda-feira (10) com reitores de universidades e institutos federais, o governo anunciou investimentos da ordem de R$ 5,5 bilhões do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) nessas instituições. Serão R$ 3,17 bilhões para consolidação e R$ 600 milhões para expansão de universidades, e mais R$ 1,75 bilhão destinados a hospitais universitários. Os recursos de consolidação serão aplicados em 338 obras — 223 novas, 20 em andamento e 95 retomadas. Já os R$ 600 milhões para expansão contemplam a criação de 10 novos campi.

O governo também anunciou a complementação orçamentária de R$ 400 milhões para custeio das IFES. Serão R$ 279,2 milhões para as universidades e R$ 120,7 milhões para os institutos. De acordo com o ministro da Educação, Camilo Santana, esses recursos se somam aos R$ 347 milhões já recompostos pelo MEC de janeiro a maio deste ano. O ministro divulgou ainda um novo aporte de R$ 35 milhões para ampliação do Programa Bolsa Permanência, voltados para estudantes indígenas e quilombolas de universidades e institutos federais.

Embora não tenha sido o principal foco do encontro, a greve dos docentes federais e TAEs foi o pano de fundo do encontro. Após o anúncio dos investimentos, feito pelo ministro Camilo Santana, tanto a presidenta da Andifes e reitora da UnB, professora Márcia Abraão, quanto o presidente do Conif e reitor do IF Goiano, Elias Monteiro, defenderam a legitimidade da greve e apelaram ao governo que busque uma solução negociada com os sindicatos. Depois dessas falas, o governo deu duas claras sinalizações de que não vai mais avançar na proposta salarial já apresentada aos docentes.

A primeira veio do ministro Camilo Santana. Ele retomou a palavra para defender a proposta feita pelo governo, sentado ao lado da ministra Esther Dweck, do MGI. "Amanhã haverá uma nova reunião com os TAEs, já houve a reunião com os professores. Com a última proposta negociada com os docentes, inclusive um dos sindicatos assinou a negociação, a variação de reajuste até 2026 varia de 23% a 43%. Em um ano e meio nós não podemos recompor todo um processo histórico de anos. A proposta feita aos docentes, junto com a que será apresentada aos TAEs, representa um impacto de mais de R$ 10 bilhões. Há um enorme esforço do governo para a gente sair desse impasse e garantir a retomada das aulas para os nossos alunos".

No encerramento do encontro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu a segunda sinalização. Em tom enfático, e relembrando suas origens de líder sindical, Lula disse que é preciso ter coragem para decretar uma greve, mas que também é preciso ter coragem para sair dela.

"A greve tem um tempo para começar e tem um tempo para terminar. A única coisa que não se pode permitir é que ela termine por inanição. O dirigente sindical tem que ter coragem de tomar decisões que muitas vezes não é o tudo ou nada que ele apregoou. Muitas vezes eu fiquei com nada. Nesse caso da educação, se vocês analisarem o conjunto da obra, vão perceber que não há razão para essa greve estar durando o que está durando, porque quem está perdendo não é o Lula, não é o reitor, quem tá perdendo é o Brasil e os estudantes. Não é por causa de 3%, 4% que a gente fica a vida inteira em greve. O montante de recursos que a companheira Esther colocou à disposição é um montante não recusável, só quero que levem isso em conta", disse o presidente.

Além das duas falas, o governo deu um terceiro sinal. Ontem, em despacho da Secretaria de Relações do Trabalho do MGI, o governo deferiu o registro sindical definitivo do Proifes. Assim, a entidade que assinou com o governo o acordo do dia 27 de maio, passa a ter plenos poderes para representar sindicatos de docentes do magistério superior e do EBTT. De acordo com o diretor de Assuntos Jurídicos da federação, Osvaldo Negrão, a liminar de um juiz federal de Sergipe que suspendia o acordo perde a sustentação.

Veja aqui a íntegra da apresentação do governo federal para as universidades e institutos federais.

WhatsApp Image 2024 06 07 at 19.16.07Há um consenso na Escola de Belas Artes: assim não dá para estudar. Mas as estratégias encontradas para a greve estudantil dividem a comunidade acadêmica da EBA. Não há dúvidas sobre a justeza das reivindicações, que passam por melhoria da infraestrutura, climatização das salas, papel higiênico, água. Seria o básico, não fossem as condições tão precárias do prédio e o orçamento insuficiente. Sem aguentar mais, os estudantes da EBA decidiram antecipar a greve estudantil, marcada para o dia 11 de junho, e montaram barricadas para impedir as aulas.
“A gente considera que o diálogo não estava existindo, por isso a gente partiu para a greve”, contou a estudante Laura Luz, do Centro Acadêmico da EBA. Ela estava tomando conta de uma barricada no quinto andar do edifício Jorge Machado Moreira, na quinta-feira (6). Mesas e cadeiras empilhadas impediam a passagem para o corredor de salas de aula e laboratórios. Enquanto esteve no prédio, a reportagem só viu movimentação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. O prédio estava esvaziado de estudantes e professores da EBA.
Laura justifica que a greve também foi decidida para colocar a UFRJ no movimento grevista nacional. “São mais de 50 universidades em greve. Para a gente não faz sentido que a UFRJ, que é a maior universidade do Brasil em número de estudantes, não aja de tal maneira. A universidade vive uma situação absurda, tem a metade do orçamento que já teve anos atrás. A gente precisa se posicionar”.
Em duas assembleias convocadas pela AdUFRJ em 5 de abril e 10 de maio, os professores da UFRJ, por larga maioria, decidiram não entrar em greve.
O acesso fechado aos laboratórios, salas e corredores da EBA desrespeitam o direito de ir e vir de uma categoria que decidiu não aderir à greve nacional: os professores. “Eu me sinto indignado e muito desrespeitado”, critica o professor Gilberto Oliveira, do Departamento de Artes Ambientais. “Nós estamos no mesmo barco. Não existe professor contra aluno, mas nós, como categoria profissional, não estamos em greve. Nosso dever constitucional é estar em sala de aula. Nosso calendário não está suspenso”, justifica o docente.WhatsApp Image 2024 06 07 at 19.25.17 1Fotos: Renan Fernandes
A indignação é o ponto de partida de uma carta escrita em consenso pelos professores do departamento e enviada na manhã de sexta-feira (7) à direção da Escola. No texto, os docentes relatam situações vexatórias, falam da animosidade a que estão submetidos e pedem uma reunião com a direção da EBA com expectativa de chegarem “a uma solução com condições para a conclusão do período acadêmico”.
Sem conseguir acesso aos seus materiais de trabalho, o professor Gilberto tem sido questionado por seus estudantes, que são formandos, sobre como será a continuidade do semestre. Falta apenas um mês para as aulas acabarem. “Estou tentando ver com outras unidades se é possível me emprestarem uma sala para que eu termine de dar o conteúdo que esses estudantes precisam. Meus alunos estão se formando e eu não estou conseguindo dar a carga horária que eles precisam para terminar o curso. Estou sem norte”.
O docente expressa ainda a preocupação de outros professores. “Estou vendo muitos colegas sendo xingados, hostilizados. Não se pode impedir o direito de ir e vir. O prédio está esvaziado e os professores, amedrontados”. O docente vai além: “É uma ação criminosa, porque infringe o Artigo 331 do Código Penal. Não se pode impedir um servidor de exercer sua atividade profissional”, alega o docente. “Também fere o Artigo 5º da Constituição, do direito de ir e vir”.
O clima de hostilidade e medo é real e sentido por muitos docentes que preferiram não se identificar para a matéria ou optaram por não dar seus depoimentos à reportagem para evitar algum tipo de represália. “Fiquei impedido de acessar minha sala de trabalho. Eles não têm esse direito. É uma situação bem tensa, bem conflituosa. Os estudantes passaram dos limites e me parece que eles sabem que passaram, pois não estão publicando em suas redes os bloqueios realizados”, aponta um docente que preferiu não se identificar.
WhatsApp Image 2024 06 07 at 19.25.17“O calendário não está suspenso. A gente tem que dar aulas”, aponta outro professor que também pediu para não ser identificado. “Nossa carga horária precisa ser cumprida, porque nossa categoria não está em greve”. O docente também questiona a pauta de reivindicações. “Não há dúvidas de que são justas, mas parecem difusas. Não há um objeto claro de negociação. É muito mais para apoiar a greve nacional”, avalia.
Outros docentes apoiam o movimento estudantil. “A greve é legítima. A universidade pública vem sendo dilapidada há décadas e a situação se acentuou nos últimos oito anos. Há 50 anos fomos jogados num prédio que não foi feito para nós. Fomos nos adaptando, mas isso tem um preço. Chegamos a um ponto insustentável”, argumenta o professor Marcelo Silveira, do Departamento de História e Teoria da Arte.
Apesar de apoiar os estudantes, o docente aponta uma contradição da greve estudantil. “Ao mesmo tempo que há disposição para se mobilizar, há um enorme esvaziamento do prédio, talvez pela própria localização do campus”, argumenta. “Então fica uma greve meio torta. Sem tanta adesão, o que sobra é o bloqueio das salas”, ele acredita. “Existem dois mundos: um do profissional que está sendo pago para realizar o seu trabalho e outro dos que recebem esse serviço”, expressa. “Como se dará essa relação?”, questiona.
Em defesa dos estudantes, a professora Graça Lima, do Departamento de Representação da Forma, acredita que a greve é um processo pedagógico e que o diálogo é o melhor caminho. “Esse é um processo democrático e educacional. A gente devia dar graças a Deus porque eles acordaram dessa situação insustentável. A universidade é deles”, afirma. “Eles fizeram barricadas, xingaram professores. Está certo? Não. Mas foi a forma que eles encontraram de serem ouvidos”.
Diretora da EBA, a professora Madalena Grimaldi tenta o diálogo. “A direção não apoia barricada de maneira nenhuma, mas também não apoia a violência para a retirada. Chamar segurança para acabar com as barricadas é um ato de violência e nós também não coadunamos com isso”, diz a diretora. “A gente está apostando no diálogo e no processo pedagógico. Por isso decidimos esperar a terça-feira, dia 11”, explica a professora Madalena. “Todos nós queremos o bem da UFRJ. A questão é o limite dessa manifestação. Em alguns momentos há, sim, alguns excessos por parte dos discentes”, reconhece a diretora.
Após a assembleia do DCE do dia 11, a diretora irá se reunir com o CAEBA e depois agendará uma reunião aberta a todo o corpo social da escola. “É uma situação delicada, constrangedora para os docentes e difícil de mediar, mas estamos tentando”.

ESTUDANTES CONTRA GREVE
Na semana passada, uma assembleia do DCE decidiu pela greve geral estudantil a partir do dia 11 de junho. Mas muitos estudantes questionaram o esvaziamento do espaço de deliberação e passaram a realizar consultas nos cursos para ampliar o debate estudantil. No curso de Contabilidade, 72% disseram não à greve. “Foi uma consulta eletrônica de uma semana. Conseguimos 269 respostas majoritárias contra a greve”, conta a estutante Lúcia Vieira, diretora do CACont. “A maior parte dos alunos do nosso curso já começa estágio no terceiro período e precisa da bolsa para ajudar suas famílias. Para a maioria, terminar o semestre é uma questão de sobrevivência e isso não foi considerado pelo DCE”, completa o estudante Reinaldo Silva, também diretor do CA.
Na Faculdade de Direito, o plebiscito teve a participação de 880 estudantes. Desses, 700 não acreditam que seja o melhor momento para a greve. “Nossa preocupação foi ouvir o máximo de estudantes porque a gente não quer se afastar dessa representação efetiva”, observa Renan Charnoski, do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (CACO).
Danilo Ponciano, do CA de Economia, conta que será feita neste fim de semana uma consulta via formulários aos estudantes e acredita que a maior parte também será contra a greve. “Ir para assembleia levantar a mão não é suficiente, porque 250 alunos não podem definir o futuro de 60 mil. Além disso, não tem sentido uma greve estudantil a um mês do encerramento do período”.
A movimentação autônoma de centros acadêmicos levou o DCE a realizar uma votação em urna nos restaurantes universitários na sexta (7) e na segunda (10). O resultado da consulta embasará a discussão na assembleia do dia 11. Perguntada se o resultado pode mudar a deliberação sobre a greve, tomada na última assembleia, a estudante Giovanna Almeida, coordenadora do DCE, afirma que sim, mas que a decisão será tomada durante a assembleia do dia 11. “A consulta vai ser um elemento para a decisão da assembleia, que será simultânea na Praia Vermelha, Macaé e Fundão”, conta. “A greve foi uma unanimidade entre quem estava presente na última assembleia e também foi pensada para mostrar solidariedade aos cursos que já estão em greve, como os da EBA, Dança, Educação Física, IFCS”.

GREVE NACIONAL
No quadro nacional, a greve das universidades federais ganha contornos curiosos: conseguiu apoio da ala bolsonarista no Congresso Nacional e repercussão nas redes de ninguém menos que Jair Bolsonaro.
Presidente da Comissão de Educação da Câmara, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) convocou um a audiência para discutir a greve nacional e um grupo de trabalho que irá se debruçar sobre as demandas dos grevistas. A mesma comissão convocará a ministra da Gestão Esther Dweck, professora do Instituto de Economia da UFRJ, a comparecer no dia 26 para explicar o andamento das negociações com o funcionalismo.
Em paralelo, o presidente Lula se reunirá com os reitores das universidades federais. Na pauta, o anúncio de novas verbas para as instituições de ensino superior (veja mais informações na matéria da página 3). Será que o Andes, que afirma que o movimento e as negociações são por orçamento, vai encaminhar o fim da greve? A ver.

WhatsApp Image 2024 06 07 at 18.18.02 4Foto: AndesTrês reuniões previstas para a semana de 10 a 14 de junho podem definir o futuro da greve dos docentes federais, iniciada em 15 de abril. São 62 IFES paralisadas em todo o país (veja quadro abaixo). A primeira delas, logo na segunda-feira (10), foi convocada pelo presidente Lula e pode contemplar uma reivindicação não apenas das entidades representativas da categoria, mas também dos reitores das universidades federais: a recomposição orçamentária. A expectativa é que Lula anuncie a liberação de verbas e, com isso, ponha água na fervura da greve nacional da educação.
A segunda reunião, na terça-feira (11), não tem a ver diretamente com a pauta de reivindicações dos docentes. Trata-se da 6ª mesa específica temporária dos trabalhadores técnico-administrativos em educação (TAEs). O encontro foi convocado pelo MGI. Três entidades representativas dos trabalhadores federais em educação — Andes, Sinasefe e Fasubra — têm um pacto político de manter docentes e técnicos mobilizados de forma conjunta, e com isso pressionar o governo a negociar. O lema desse pacto é “Sem TAEs não tem acordo”.
O encontro mais cercado de expectativa é o de sexta-feira (14) no MEC. Agendado a contragosto pelo governo, que já pontuou ter chegado ao limite na proposta salarial aos docentes, é uma “rodada extra” de negociação, na qual Andes e Sinasefe tentarão pressionar para ter algum reajuste em 2024 — o MGI sinalizou com zero por cento para este ano. Há também a previsão de que o MEC avance em questões não econômicas, como a revogação da portaria 983/2020 — que ataca o tripé ensino, pesquisa e extensão e estabelece o ponto eletrônico para a carreira EBTT.
Na quarta-feira (5), os professores da UFMG decidiram encerrar a greve depois de 51 dias de paralisação. As aulas serão retomadas na próximaWhatsApp Image 2024 06 07 at 19.23.35 segunda-feira (10). Foram 201 votos pelo fim da greve, 179 pela continuidade e 16 abstenções. Para o diretor de Assuntos Educacionais do Magistério Superior do Proifes, Geci Silva, o recuo da UFMG pode simbolizar um esgotamento dos docentes com a greve. “O pessoal mais sensato vai cansando e acaba criando força para ir na assembleia e aguardar todas as oratórias sem fim para votar”, acredita Geci.

BATALHA JURÍDICA
Em um circuito paralelo aos encontros em Brasília, a disputa judicial em torno do acordo assinado entre o governo e o Proifes no dia 27 de maio promete agitar a semana. Anulado em 29 de maio por decisão do juiz Edmilson da Silva Pimenta, da 3ª Vara Federal de Sergipe, o acordo pode voltar a valer caso a decisão seja revertida. É o que espera o Proifes, que ajuizou um agravo de instrumento contra a decisão.
Para o Andes, o Proifes é uma “entidade cartorial burocrática sem registro sindical”. Depois da assinatura do acordo, o presidente do sindicato nacional, Gustavo Seferian, atacou o Proifes: “O anúncio de assinatura de acordo com a Proifes, entidade sem nenhuma legitimidade e que tem em sua base nem 10% da categoria docente, em uma reunião secreta, expressa uma atitude antidemocrática e antissindical do governo”.
No agravo, a federação sustenta que tem legitimidade para participar das negociações e assinar acordos: “Impedir a participação do Proifes nas negociações e, por conseguinte, na assinatura de Termo de Acordo, significa deixar à margem do processo de negociação, que é coletivo e democrático, milhares de servidores que não se sentem representados pela Andes”.
O Proifes alega que vem participando das mesas de negociação desde 2006, e que assinou todos os acordos desde então, sendo três deles como única entidade sindical, em 2007, 2012 e 2015. Segundo o diretor de Assuntos Jurídicos do Proifes, Osvaldo Negrão, o Andes promoveu uma ação judicial coordenada de suas seções sindicais para contestar o acordo. Foram 16 ações ajuizadas — só a de Sergipe obteve liminar. Negrão lembrou ainda que, mesmo sem acordo assinado, o governo pode levar a proposta, no formato de PL, para apreciação no Congresso Nacional.

DEBATE NO SBT NEWS EXPÕE DUAS VISÕES SOBRE A GREVE

A campanha salarial e o movimento grevista dos docentes federais foram os temas do programa Poder Expresso, do canal SBT News, na terça-feira (4), que reuniu os professores Gustavo Seferian, presidente do Andes-SN, e Mayra Goulart, presidenta da AdUFRJ. Seferian defendeu a manutenção da greve que já dura quase dois meses. Já Mayra ponderou que as universidades foram duramente atacadas durante o governo Bolsonaro e que, neste momento, é preciso resgatar o papel das instituições públicas de educação junto à sociedade.
Ao ser perguntado pelo apresentador Leo Cavalcanti sobre a ausência de greves docentes nos quatro anos do governo anterior, o presidente do Andes lembrou que, no 39º congresso da entidade, no início de 2020, a greve estava no horizonte da categoria. “Naquele momento, nós apontamos a necessidade de construção de uma grave nacional por melhores salários e pelo ‘fora, Bolsonaro’. Mas logo depois veio a pandemia da covid-19 e tudo parou”, recordou.
Seferian disse que a greve atual não prejudica os estudantes. “O que atrapalha os estudantes é o congelamento dos investimentos nas IFES. Há prédios ruindo, com ventiladores caindo na cabeça dos estudantes, como no IFCS da UFRJ, onde trabalha a professora Mayra. Reitores colocam que, sem investimentos, as universidades não chegam a setembro. Precisamos de recomposição orçamentária para pagar contas de luz e água, contratos de terceirizados e até as bolsas estudantis”.
A professora Mayra Goulart concordou com a necessidade de complementação orçamentária para as IFES, mas discordou quanto à eficácia da greve. “Não estamos em um contexto confortável o suficiente para fragilizarmos o governo e nem para tensionar nossa relação com a sociedade civil. A gente tem que abrir as portas das universidades e mostrar à sociedade os motivos pelos quais precisamos de mais recursos”, disse ela. E completou: “O prédio do IFCS, onde eu leciono, está caindo aos pedaços e estamos fazendo o possível para formar alunos excelentes ali, para que eles devolvam o que estão aprendendo à sociedade. Precisamos de recursos, mas vamos batalhar por eles de portas abertas, convencendo a sociedade de que ela precisa acreditar na universidade pública”.

Os sindicatos e coletivos que representam professores, técnicos e estudantes de graduação e pós-graduação da UFRJ se reuniram nesta terça-feira, 4, para debater a realização de uma audiência pública com parlamentares e integrantes da sociedade civil organizada. O objetivo é apresentar as demandas da universidade por orçamento e a infraestrutura fragilizada da instituição. A AdUFRJ foi representada pelos diretores Antonio Solé e Rodrigo Fonseca. Sintufrj, AdUFRJ, APG UFRJ e DCE UFRJ Mário Prata irão formalizar um documento para o reitor Roberto Medronho solicitando o agendamento da audiência. A construção da atividade deverá ser conjunta entre as entidades representativas dos segmentos universitários e a reitoria. Ainda não há data prevista.

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