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João Torres
Professor do Instituto de Física e
pró-reitor de Pós-graduação
e Pesquisa da UFRJ
Nos últimos meses, a cobertura internacional sobre Gaza tem se concentrado, com razão, na destruição de hospitais e escolas. No entanto, um aspecto igualmente vital da infraestrutura civil tem recebido menos atenção: as universidades. Desde o início das operações militares de Israel em 2023, ao menos doze instituições de ensino superior foram completamente destruídas. Estima-se que cerca de 94 professores universitários tenham sido mortos, além de centenas de estudantes e dezenas de administradores acadêmicos.
Um dos casos mais simbólicos dessa destruição é o da Universidade Al-Aqsa — a mais antiga instituição pública de ensino superior da Faixa de Gaza — que, até 2024, atendia cerca de 26 mil estudantes. Suas instalações foram completamente arrasadas por bombardeios israelenses e suas bibliotecas foram queimadas de propósito, com imagens registradas pelos próprios perpetradores.
No meio das ruínas das cidades bombardeadas, entre a dor de familiares assassinados e a perda de lares, jovens palestinos encontram um raro refúgio: a Ciência. Em meio ao genocídio em curso, eles continuam estudando Física de buracos negros, teoria dos números primos, Óptica Quântica e outros temas complexos da Ciência moderna. E não estão sozinhos.
Uma constelação de cientistas mundialmente reconhecidos tem se mobilizado para oferecer a esses estudantes um elo com o conhecimento e com a dignidade humana. Dentre os envolvidos estão nomes de peso como os Prêmios Nobel Anne L’Huillier, Michel Mayor,e Alain Aspect, além dos medalhistas Fields (o “Nobel da Matemática”) Terence Tao, Cédric Villani e Edward Witten. A esses se somam pesquisadores como Neil Turok, ex-diretor do Instituto Perimeter de Física Teórica, e Carlo Rovelli, autor de best-sellers em Física. Como isso é possível?
Duas grandes iniciativas têm garantido essa ponte entre Gaza e o mundo acadêmico internacional. A primeira é a Solidariedade Acadêmica com a Palestina (Academic Solidarity with Palestine), uma rede formada por cerca de quatro mil voluntários, dedicada a manter o acesso à educação superior para jovens palestinos. Em parceria com a Universidade de Lille, na França, e a Universidade An-Najah, na Cisjordânia, a iniciativa organiza cursos online voltados às necessidades dos estudantes de Gaza.
As dificuldades, porém, são imensas. A organização distribui chips de celular para que os alunos consigam se conectar à internet. Muitos deles caminham longas distâncias até encontrar sinal suficiente para assistir às aulas. Uma realidade que lembra, numa versão muito pior, os desafios enfrentados por estudantes brasileiros durante os períodos mais críticos da pandemia da covid-19.
A segunda iniciativa é a organização Cientistas pela Palestina (Scientists for Palestine – S4P). Criada em 2015 por físicos dos EUA e do Reino Unido, a S4P busca apoiar a Ciência na Palestina e mitigar os efeitos devastadores da ocupação militar sobre o ensino e a pesquisa. Através de ações diretas em território palestino e da articulação de uma rede internacional de cientistas, a organização realiza webinários, escolas de verão, captação de recursos e programas de intercâmbio para estudantes e pesquisadores palestinos.
Mesmo diante da guerra, das limitações técnicas e da dor, as aulas continuam acontecendo. E acontecem em nome dos direitos humanos universais, conforme expressos na Declaração Universal de 1948 — o mesmo ano da criação do Estado de Israel. Esses direitos não são ideias abstratas: são fundamentos da dignidade humana, como o direito à vida, à liberdade, à saúde, ao trabalho — e à educação.
O mais impressionante é que, antes da guerra contra Gaza, a Palestina tinha uma das maiores taxas de alfabetização da região — um testemunho do valor que seu povo atribui à educação, mesmo após décadas de ocupação.
A solidariedade internacional de grandes cientistas com Gaza não é de hoje. Um dos episódios mais emblemáticos ocorreu em 2013, quando o renomado físico Stephen Hawking (foto) decidiu boicotar a Conferência Presidencial de Israel, organizada pelo então presidente Shimon Peres. Hawking havia inicialmente aceitado o convite, mas voltou atrás após apelos de acadêmicos palestinos e de colegas ao redor do mundo, em apoio ao movimento BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções). Sua decisão gerou ampla repercussão internacional e foi interpretada como um gesto político forte, vindo de um cientista de prestígio global, em defesa dos direitos dos palestinos. Vale lembrar que Hawking já havia visitado a Palestina em 2006 , quando participou de uma videoconferência com estudantes em Gaza, expressando apoio à educação e ao direito dos palestinos ao acesso ao conhecimento — mesmo sob condições de bloqueio e ocupação. Seu gesto permanece como referência simbólica da aliança entre ciência e justiça.
Participar de um colóquio com cientistas de alto nível ou fazer um curso de Física ou de línguas, mesmo que online, dá aos estudantes palestinos uma certeza fundamental: eles não foram esquecidos. Ainda são vistos como seres humanos, apesar da intensa campanha de desumanização que enfrentam. A ciência, a educação e a busca por uma compreensão mais ampla do universo são valores universais — e os jovens palestinos ainda vivos merecem usufruí-los como qualquer um dos nossos estudantes aqui na UFRJ.
Foto: Silvana SáColetivo de professoras e professores aposentados do CAp
A FALA DOS PROFESSORES DO COLÉGIO DE APLICAÇÃO QUE TÊM DIREITO AO RECONHECIMENTO DE SABERES E COMPETÊNCIAS
Somos professoras e professores aposentados do Colégio de Aplicação da UFRJ. Dedicamos os melhores anos de nossas vidas à formação de milhares de crianças e adolescentes. Foi o trabalho diuturno numa época em que o magistério era mais desvalorizado do que hoje e que as tarefas familiares ainda eram mais fortemente concentradas nas mulheres. Uma lida árdua que impediu muitos de nós de concluir a titulação..
Nossa história e nosso contexto foi reconhecido pela lei nº 12.772/2012, o chamado Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), legislação que abriu as portas para um justo retorno financeiro para nós. No entanto, há mais de dois anos vivemos uma situação kafkaniana em que temos que cumprir uma maratona burocrática para receber algo que é nosso por direito.
O Jornal da AdUFRJ abriu espaço para nossa luta em reportagem de capa há duas semanas e nos convidou para escrever um artigo detalhando nosso calvário. É o que fazemos aqui.
Primeiro queremos explicitar que o RSC permite aos docentes do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (EBTT) receberem valores de Retribuição por Titulação (RT), mas para isso é necessário comprovar documentalmente a prática pedagógica, conhecimentos e competências adquiridas que façam equivalência com a especialização, mestrado e doutorado.
No âmbito da UFRJ, a Resolução n° 02/15 do CONSUNI dispôs sobre a regulamentação da avaliação e fluxo de procedimentos para a concessão do RSC.
Em fins de 2022, a ADUFRJ venceu ação coletiva que determinou a extensão do direito ao RSC a 74 docentes do Colégio de Aplicação que se aposentaram na vigência da lei da paridade remuneratória. Nesse mesmo período, foi firmado com a UFRJ um compromisso para que esses docentes, após cumprimento de todo o protocolo de avaliação, tivessem a imediata revisão de seus proventos de aposentadoria.
O não cumprimento desse acordo por parte da UFRJ nos causa indignação. Dos 23 docentes que entraram com o pleito junto à CPPD/EBTT/RSC, 9 foram avaliados e seus respectivos processos encaminhados à PR4, que, até o momento, não efetivou o pagamento, tendo, inclusive, negado procedência a um deles.
E por que toda essa indignação diante da desconsideração aos nossos direitos?
A grande maioria dos pleiteantes ao RSC iniciou a sua atuação no CAp na década de 80, atravessando os anos 90, até mais ou menos a primeira década dos anos 2000. Trata-se de uma geração de docentes que, resgatando o contexto histórico mais amplo, viveu o momento do fim da ditadura e início do processo de reconstrução democrática, resistindo à ameaça de retrocesso nas políticas educacionais com a persistente tentativa de imposição das reformas neoliberais na educação.
MOVIMENTO SINDICAL
Lembramos que nós professores vivíamos uma conjuntura de luzes e sombras, mas, sem dúvida, com um horizonte mais aberto para a discussão de novos caminhos para a educação brasileira, em seus diferentes níveis. Vale lembrar também que o CAp, conosco na linha de frente, sempre participou ativamente do movimento sindical, mobilizando-se em todas as greves e manifestações, e assumindo, anos seguidos, o profundo desgaste que é a reposição de aulas no ensino básico.
No nível interno, nossa geração de docentes vivenciou um clima de efervescência e intensos debates provenientes das mudanças no pensamento pedagógico crítico e das novas concepções de educação escolar.
Resgatando a trajetória histórica do CAp, é importante lembrar que, embora criado em 1948 e concebido como um espaço privilegiado para a formação docente na UFRJ, até meados dos anos 80, o colégio não era uma unidade autônoma, encontrando-se subordinado, primeiramente, ao Departamento de Didática da Faculdade Nacional de Filosofia e, posteriormente, à Faculdade de Educação e ao CFCH.
Internamente, forjou-se um movimento de resistência ao papel subordinado do CAp e se estruturou um movimento de renovação da prática pedagógica, que levou à elaboração de novas propostas programáticas por todos os diferentes setores curriculares do colégio. Contudo, só em 1985, o corpo docente do CAp elegeu sua primeira diretoria. A partir daí, ocorreram grandes mudanças na estruturação interna do colégio.
CONDIÇÕES DE TRABALHO
E antes de abordarmos algumas dessas mudanças, é importante destacar que muitos desses professores da lista dos 74 docentes habilitados ao pleito do RSC assumiram cargos de direção e de coordenação e tiveram uma participação de extrema dedicação e compromisso na luta pela construção de autonomia administrativa e pedagógica de nosso colégio.
Assim, após a conquista do direito de eleger sua diretoria, verifica-se uma intensa mobilização do corpo docente em torno de questões institucionais, como a conquista de representação no Consuni, no CEG e no Conselho do CFCH. Do mesmo modo, surge uma nova estrutura de funcionamento da escola, através da criação das Direções Adjuntas, do Conselho Pedagógico e das coordenações dos setores curriculares. Ainda que a implantação dessa nova estrutura tenha representado um avanço indiscutível, perduraram, ao longo das décadas de 80 e 90, condições de trabalho precárias, evidenciadas por contratos temporários extorsivos, atraso de pagamento, demora na contratação de professores concursados e substitutos. Certamente, todos nós sofremos as repercussões dessa precariedade em nossas condições de trabalho.
Lembramos também que, ainda que já tivesse sido instituído o concurso público como condição de ingresso dos professores, o regime de trabalho predominante era, na década de 80 e em parte dos anos 90, de 20 horas semanais. Com uma carga muitas vezes exaustiva de aulas/turmas e de licenciandos, mergulhávamos, sobrecarregados, no estudo e preparação das aulas, acreditando na proposta de enriquecer nossa prática pedagógica e propiciar uma educação crítica e de qualidade para os nossos alunos e licenciandos.
Nós, professores aposentados, temos a memória viva de nossa atuação naquele período. Fomos, junto com as nossas respectivas equipes de setor curricular, elaboradores e integrantes dos primeiros projetos de pesquisa e extensão aprovados junto ao CEG/CEPG. Acreditamos, portanto, que em muito contribuímos para o reconhecimento do caráter universitário do trabalho do CAp-UFRJ ao implantar e desenvolver sua premissa central, que é o elo entre ensino, pesquisa e extensão.
Na década de 90 e até meados da primeira década de 2000, a maioria de nós participou da construção do primeiro projeto político- pedagógico do colégio, que foi resultado de inúmeras discussões e debates sobre o papel dos colégios de aplicação na formação dos professores, na pesquisa sobre a educação básica, sobretudo, na democratização da educação pública. Foi nesse contexto que foram implementadas as novas formas mais democráticas de acesso ao CAp.
DIREITO DE PARIDADE
É importante afirmar que, ao longo desse período final, cresceu em muito o número de professores que passaram para o regime 40 h/DE. Contudo, o breve relato da ampliação das responsabilidades e tarefas presentes no processo de conquista de autonomia administrativa e pedagógica, bem como as dificuldades na concessão de licença para capacitação dos docentes, nos ajuda a esclarecer os motivos pelos quais muitos professores da educação básica não encontraram fôlego para completar a sua titulação em nível formal.
Não à toa foi instituído o RSC que, em última análise, representa um entendimento consensual das dificuldades presentes no Ensino Básico, Técnico e Tecnológico no que se refere à capacitação docente, buscando contemplar o direito de paridade remuneratória entre os docentes das IFEs
Queremos ainda expressar, mesmo não estando presentes na reformulação da carreira EBTT, o orgulho que sentimos ao constatar que a implantação de mecanismos de estímulos à capacitação docente mudou significativamente o perfil acadêmico dos professores do CAp - UFRJ. Segundo Carvalho (2025), o corpo docente atual do CAp, composto por 98 professores, chegou, em 2024, ao número de 65 doutores, 17 doutorandos e 15 mestres. Acreditamos firmemente que nosso esforço pedagógico e nossas lutas reivindicatórias contribuíram para a configuração desse novo perfil e, certamente, pavimentaram o caminho que os novos professores estão percorrendo.
Pleitear o RSC representa um ato de extrema coragem e resiliência para nós, professores aposentados, – alguns há mais de 20 anos - na medida em que foi necessário se submeter a um complexo fluxo de procedimentos, que envolveu a elaboração de um memorial descritivo/analítico completo, englobando toda a atuação profissional desenvolvida até o momento da aposentadoria.
O memorial deve percorrer parâmetros pré- estabelecidos e normatizados, tais como, a título de exemplo, o inventário de todas as turmas trabalhadas e licenciandos orientados ao longo dos anos letivos na ativa; projetos de pesquisa e/ou extensão desenvolvidos; cursos de capacitação certificados; atuação em gestão, comissões e representações institucionais; atuação em bancas de seleção; produção de material didático e aplicação de métodos e tecnologias educacionais; artigos e livros publicados e muitos outros itens que justifiquem a solicitação do pleito.
Cada uma das atividades apresentadas no memorial deve ser referendada por documento comprobatório. Tratou-se de tarefa indescritivelmente exaustiva coletar documentos de um período anterior à era digital.
Em seguida, toda a documentação do professor pleiteante segue para a CPPD/EBTT/RSC, instituída no CAp, com vistas a coordenação do processo avaliativo de cada docente, cabendo-lhe o trabalho de formação da banca, composta por 4 avaliadores, sendo dois internos e dois externos.
Esses avaliadores são sorteados pelo SIMEC a partir de uma lista nacional de avaliadores inscritos no sistema. Na prática, a questão da formação das bancas é, segundo esclarecimentos da CPPD/EBTT, altamente problemática porque, na real, os professores que se dispuseram a participar solidariamente da avaliação dos colegas, ao serem sorteados, argumentam sentirem-se sobrecarregados e não se disponibilizam a mais esse trabalho não remunerado.
Segundo a CPPD, este é o principal fator que explica porque, apesar de terem entregues o memorial há cerca de 2 anos, a maior parte dos docentes pleiteantes ainda não teve sua avaliação concluída e encaminhada para homologação pelo Conselho Diretor do CAp, etapa que precede o envio do processo para a PR4.
FORÇA E ENERGIA
A partir deste sucinto relato, é possível entender porque nos sentimos profundamente indignados quando nove companheiros, com o processo avaliativo concluído e enviado para a PR4, não conseguem ter a retribuição por titulação incorporada imediatamente nos seus respectivos proventos.
Carregando dentro de nós a força e a energia oriundas de muita dedicação, estudo e vivência de luta cotidiana na construção de novos e mais democráticos caminhos para o ensino básico, queremos deixar claro que NÃO abdicaremos do direito ao Reconhecimento de nossos Saberes e Competências.
Na cidade que recebeu a maior quantidade de africanos escravizados durante a diáspora negra, o sangue de corpos pretos continua escorrendo diariamente. O jovem Herus Guimarães, morto em ação do Bope durante uma festa junina no Morro Santo Amaro, está entre as vítimas mais recentes da violência de Estado que atinge a população negra no Rio de Janeiro.
Olhar para o passado e revisitar a história da escravidão no Brasil é uma oportunidade de repensar um futuro diferente. Pensando no poder da educação e da cultura como mecanismo de transformação, a AdUFRJ promoveu no sábado (7), um passeio ao Museu Memorial dos Pretos Novos, na Gamboa.
“Esse roteiro não é sobre o passado”, destacou o historiador Gabriel Siqueira, guia do passeio. “A escravidão pode parecer parte do passado, mas corpos pretos continuam sendo vítimas de violências do Estado”, completou.
O roteiro começou no Sítio Arqueológico do Cais do Valongo, onde entre 1811 e 1843 historiadores estimam que até dois milhões de africanos escravizados desembarcaram. Do cais ao museu, Gabriel — que também é capoeirista — cantou e tocou ao berimbau canções que relembram o sofrimento e a resistência do povo negro.
“Navio negreiro, tumba flutuante, terra mãe distante, dor e desespero”, dizem os versos da canção de Mestre Toni Vargas entoada pelo guia.
Os pretos novos eram os africanos escravizados recém-chegados ao Brasil. Aqueles que não resistiam aos maus-tratos na longa travessia do Atlântico eram lançados ao mar ou jogados em uma vala comum, junto com o lixo depositado pela população. Até o fechamento em 1830, entre 20 e 30 mil pessoas foram enterradas no antigo Caminho da Gamboa, hoje Rua Pedro Ernesto, no que é considerado o maior cemitério de pessoas escravizadas das Américas.
A professora Nedir do Espirito Santo, vice-presidenta da AdUFRJ, reforçou a importância do roteiro para divulgar uma história ainda pouco conhecida. “Só aqui podemos ter noção de toda dor e sofrimento que essas pessoas passaram”.
O cemitério foi descoberto em 1996, quando moradores do local iniciaram obras de reformas na casa que hoje abriga o museu. Na fundação da casa foram encontrados milhares de fragmentos de ossos que as pesquisas arqueológicas apontaram pertencerem majoritariamente a crianças e adolescentes.
A visita ao museu comoveu o professor Hugo Nóbrega, do Instituto de Computação. “Fiquei arrepiado do começo ao fim. É muito impactante ver esses pedaços de ossos de pessoas que foram brutalizadas”, comentou. O docente refletiu sobre a condição em que os restos mortais foram encontrados. “É simbólico que tenham sido descobertos sob a fundação de uma casa, diz muito sobre a fundação na nossa sociedade. Precisamos sempre olhar as coisas com essa lente para entender o presente”.
A professora Rozane Tardin, da Escola de Educação Física e Desportos, participou pela primeira vez de um passeio cultural promovido pela AdUFRJ e aprovou a experiência. “Achei um espetáculo. É uma história muito profunda da escravidão e dos movimentos de resistência do povo negro”, exclamou. A atividade foi a oportunidade que a docente precisava para conhecer o museu. “Sempre tive vontade de conhecer esse local. Com certeza, estarei presente nos próximos passeios”.
O impacto do passeio nos docentes fomentou o desejo por novos programas com essa temática. Nedir garantiu novas atividades para divulgação da história da escravidão e da herança africana no Rio de Janeiro. “Os professores pediram e nós faremos novamente um passeio pela região da Pequena África para dar continuidade a esse processo de aprendizagem”, afirmou, ao final da visitação.
Quem chega diariamente à Cidade Universitária de carro ou de ônibus não conhece outro ângulo pouco usual da Ilha do Fundão. A vista do campus a partir da Baía de Guanabara é um privilégio dos pescadores que tiram das águas do entorno o ganha-pão de cada dia.
Na sexta-feira (6), o projeto Orla Sem Lixo organizou um evento na Prainha, aos fundos da Faculdade de Letras, que apresentou a Enseada do Fundão para a comunidade acadêmica. Além de passeios de barco, uma feira de Ciências ao ar livre mostrou todas as frentes de ação do programa. O evento fez parte das celebrações da Semana Mundial do Meio Ambiente.
O projeto, que nasceu em 2020, instalou barreiras na Prainha e no mangue da Enseada de Bom Jesus, próximo ao Parque Tecnológico. O objetivo dos projetos-piloto é a recuperação dos ecossistemas nessas duas regiões. “Aqui chega muito lixo. Nossa estimativa é de que aqui chegue uma tonelada de lixo por dia”, disse a professora Susana Vinzon, coordenadora do projeto Orla Sem Lixo.
SABERES TRADICIONAIS
A multidisciplinaridade é uma marca do trabalho desenvolvido pelos pesquisadores. “A ideia é agregar professores e grupos que tenham interesse em desenvolver pesquisas dentro dessa temática que abrange muitas áreas”, explicou Vinzon. “É um projeto orgânico que cresce em função do financiamento e do interesse de pessoas que querem investigar dentro do universo do impacto do lixo na costa”, completou.
A comunidade de pescadores também é parte fundamental do desenvolvimento do projeto. Mensalmente, os pesquisadores organizam o “Café com Orla” para ouvir as contribuições de quem tem o conhecimento prático.“Os pescadores constroem e participam de todo o processo. Eles têm a vivência e isso é essencial”, pontuou a docente.
A integração entre pessoas e saberes diferentes é o grande desafio do psicólogo Jairton da Silva, estudante de mestrado do Núcleo Interdisciplinar para o Desenvolvimento Social, envolvido no projeto desde 2021. “São grupos que, muitas vezes, não conversam”, revelou sobre o trabalho de sentar com pesquisadores de diferentes áreas e com os pescadores. “Juntar todas essas pessoas representa um avanço no pertencimento e na valorização de saberes tradicionais”.
O trabalho desempenhado pelos pesquisadores do projeto é um fio de esperança para as águas da Guanabara. “As barreiras são efetivas e as melhorias já são evidentes”, afirmou a professora Vinzon. A pescadora Ana Paula Amorim confirmou o avanço na qualidade da água na Prainha. A paraibana trabalha no entorno da Ilha do Fundão desde 2005. “Tem espécies de peixes voltando a entrar aqui”, celebrou. “Antes tínhamos que ir longe para conseguir pescar, agora a gente joga a rede por aqui mesmo e pega tainha, robalo, siri, camarão”.ORLA SEM LIXO Para Susana Vinzon, a vivência dos pescadores é essencial no projeto
A Prainha é mais que apenas lugar de trabalho para a pescadora. Moradora da Maré, Ana Paula leva os filhos ao local nos momentos de lazer. “Não precisamos ir para longe tendo uma praia maravilhosa ao lado de casa. O que precisamos é que esse trabalho tenha continuidade para manter essas boas condições”, disse, esperançosa.
A preocupação com a saúde mental e as condições de trabalho dos pescadores está entre os temas discutidos pelos pesquisadores. “A Cidade Universitária foi construída a partir do aterro de sete ilhas onde viviam comunidades de pescadores”, apontou a professora Vinzon. “Esse é também um trabalho de resgate”, definiu.
Com o apoio da Petrobras, está em estudo a construção de uma base de apoio para os pescadores na Prainha. Será a primeira estrutura do Parque da Orla que consta no Plano Diretor 2030 da UFRJ. “O conceito é trazer a biodiversidade, o ambiente natural e soluções modernas que ajudem na conscientização das pessoas sobre a importância do meio ambiente”, explicou Susana Vinzon.
Roberto Guedes é um dos pescadores que serão beneficiados com a construção da estrutura de apoio. Morador de Belford Roxo, Roberto pesca na Prainha há 28 anos. Todo domingo, o pescador e a esposa Livânia pegam a cadelinha Pimenta e embarcam na Kombi do casal em direção ao Fundão, onde montam acampamento para trabalhar até quarta-feira. “Temos que trazer água potável, bateria para ter luz, um fogareiro para cozinhar e gelo para armazenar os peixes”, contou sobre a rotina.
Os passeios de barco fizeram sucesso com o público. Caroline Dantas, estudante de Engenharia Civil, participou do roteiro que levou os visitantes até a Ilha do Catalão, na outra extremidade da enseada. A jovem conheceu o projeto em uma ação realizada na Ilha do Governador, perto de onde mora. “É importante conhecer o entorno de onde a gente vive e estuda”. A estudante ficou impressionada com a quantidade de lixo retida pelas barreiras instaladas pelo projeto. “Sabia que a baía é poluída, mas só vendo a quantidade de lixo boiando é que se tem noção real do problema e da importância de ações como essa”, refletiu.
A professora Denise Pires de Carvalho, presidente da Capes e ex-reitora da UFRJ, assumiu no último dia 27 a presidência do Conselho Científico do Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento (IRD), da França. O IRD é uma instituição pública que realiza parcerias com países do Sul Global, como o Brasil, pelo cumprimento dos Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Organização das Nações Unidas (ONU).
A docente já havia sido nomeada conselheira científica do IRD neste mês. O Conselho Científico do instituto é formado por 30 integrantes, sendo 15 eleitos pelos pesquisadores do próprio IRD. Os outros 15, como a presidente da Capes, são nomeados para representar a diversidade da pesquisa internacional. Denise foi escolhida para presidir o órgão por unanimidade, em reunião presencial na sede da instituição, em Marselha (França).