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Não foi uma semana fácil. Iniciamos a travessia no domingo com o gosto amargo de mais uma barbárie policial contra moradores de comunidades. Dessa vez, os relatos de desespero vieram do Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, onde nove rapazes foram mortos por militares do Batalhão de Operações Especiais, o Bope. Como de hábito, a tragédia começou de véspera, sob o ritmo da pior das conselheiras, a vingança.
Na manhã de sábado, 20 de novembro, o sargento Leandro Rumbelsperger da Silva, de 38 anos, foi assassinado por traficantes enquanto patrulhava a favela. Em represália, as tropas do Bope passaram 33 horas tocando o horror dentro de um mangue da região. Ao saírem, deixaram um rastro de sangue que, segundo relatos de moradores, inclui tiros nas costas, cortes de órgãos genitais, balas na cabeça. Covardes, os agentes do Estado não voltaram sequer para recolher os corpos – alegaram risco de vida. Coube aos familiares o de sempre: denunciar, chorar e identificar seus mortos.
“Isso vai continuar acontecendo enquanto as principais autoridades da área continuarem negando suas responsabilidades. As autoridades deveriam investigar o que aconteceu, pedir as armas dos policiais envolvidos e afastá-los”, resume o professor Michel Misse, um dos maiores estudiosos da violência policial no Brasil, e professor da UFRJ. “É com pesar que comento a mesma coisa há 50 anos”.
Ainda na terça-feira, a revolta e a tristeza com a chacina do fim de semana se somaram a uma espécie de torpor com o retorno de velhas questões da UFRJ. Saíamos das agruras da violência urbana para as disputas do mundo acadêmico, essa espécie de ilha que insiste em se fragmentar em debates fratricidas enquanto nossos reais inimigos travam embates reais para destruir a Ciência e a universidade. Na manhã do dia 23, em sessão extraordinária do Conselho Universitário da UFRJ, voltamos oito anos no tempo e, como em 2013, travamos um diálogo de surdos.
O Consuni foi convocado para decidir se a universidade reabre as discussões sobre a adesão à Ebserh, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. O relator, professor Walter Suemitsu, defendeu a abertura de negociações com a estatal. Um dos argumentos centrais do seu parecer é a posição de diretores do CCS, favoráveis à contratação da empresa para aliviar a profunda crise dos hospitais da UFRJ. “Escutei ambos os lados. Eu me reuni com os diretores dos hospitais, com o coordenador do Complexo Hospitalar, e também com o movimento Fora Ebserh”, ponderou Suemitsu.
Ponderações, no entanto, não foram o forte do último Consuni. De um lado, estudantes, técnicos e alguns docentes do Movimento Barrar a Ebserh e da atual diretoria do Andes gritavam contra a adesão à estatal. Xingavam a reitora, acusavam os oponentes de privatistas e outros istas impublicáveis. Poucos mostravam dados, números ou soluções concretas para salvar os hospitais universitários da UFRJ – só o HU, por exemplo, tem cerca de 600 funcionários que trabalham sem qualquer direito garantido. Nem férias remuneradas, nem licença de saúde, nem 13º salário, nem indenização por demissão. E aqui, car@ colega, nunca é demais lembrar que somos um sindicato e que essa precarização nos incomoda e nos vergonha.
Do outro lado, no entanto, ainda há poucas certezas a favor da contratação, vista por seus defensores como a última esperança para solucionar o xadrez funcional, acadêmico e sanitário das unidades de saúde da UFRJ. O melhor exemplo do cenário dramático dos hospitais está  nos dados do Clementino Fraga, um gigante no tamanho, mas com menos de 400 leitos disponíveis, sendo 150 só para a covid-19.
No Clementino, pasmem, há no total 4.000 funcionários – 2.600 RJU, 600 extraquadros e outros 800 profissionais contratados em regime provisório para o combate à covid-19, segundo dados da Administração Central. Na prática, a média leito por profissional do Clementino obedece à matemática do absurdo. Oitocentas pessoas contratadas para cuidar de 150 leitos e outras 3.200 para tratar de 220, o que significa cerca de 15 profissionais por paciente.
Evidentemente, há algo errado e precisamos tratar disso com delicadeza, mas também com algum desconforto crítico. Do contrário, ficaremos sem hospitais, sem recursos e sem argumentos. Sabemos que o debate de terça-feira passada era apenas um pedido de abertura da discussão, mas para seguir nessa seara com alguma racionalidade nos parece necessário que os dois lados apresentem mais dados e menos retórica.
Nós, na AdUFRJ, estamos apostando nesse modelo em que fazemos o que melhor sabemos – afinal, somos professores antes de sermos sindicalistas, e acreditamos que a informação qualificada enriquece o debate. Foi com esse espírito, aliás, que organizamos há duas semanas o debate sobre Ebserh com dois professores que defendiam posições antagônicas. Você pode recuperar a discussão em nosso canal no Youtube.
No Jornal da AdUFRJ, seguiremos cobrindo jornalisticamente o assunto, e abrindo nossas páginas para todos que quiserem encarar a discussão de forma fraterna e respeitosa. Um pouco desse espírito está nas páginas 4 e 5, nos artigos dos professores Felipe Rosa e Marinalva Oliveira, dois docentes que, em campos opostos, travam o bom embate. Vale ler.
Boa leitura. Até a semana que vem.

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Este não é um editorial como os outros em que focamos na apresentação do jornal. Hoje, queremos mandar uma mensagem para cada professor e professora que esta semana tentou retomar as aulas sob a imposição monocrática de um juiz que violou a autonomia universitária e determinou o imediato retorno presencial generalizado na UFRJ.
Nossa mensagem é de acolhimento, de solidariedade. Queremos dizer que a AdUFRJ está atenta e de braços abertos para mitigar os problemas dos docentes neste momento tão difícil. Não hesite em nos contatar. Precisamos informar também que, na última quinta-feira, abrimos uma frente judicial para pedir o cancelamento do retorno acadêmico imediato.
O segundo semestre de 2021 começou diante de uma série de incertezas. Não sabemos quantos espaços da universidade são seguros para o retorno. O GT pós-pandemia estava mapeando área por área, até ser atropelado pela decisão judicial. Tampouco temos um balanço geral de quantas disciplinas e alunos estão aptos a começar presencialmente. As unidades acadêmicas estão correndo para tabular essas informações.
Nosso cronograma, aprovado democraticamente na universidade, previa um retorno gradual, primeiro com as disciplinas práticas agora em novembro, e, mais tarde, em abril, com as teóricas. Esse era o planejado e acordado. A UFRJ é um mundo complexo, com infraestrutura desigual entre as unidades. Há departamentos com aulas em subsolo sem janelas. Há professores sem gabinetes próprios que repartem com colegas instalações precárias. E, principalmente, há uma multidão de alunos sem condições de voltar às aulas do dia para a noite, morando fora do Rio, e que foram obrigados pela pandemia a abandonar suas moradias na capital fluminense.
Temos que entender – e acolher – essa diversidade. O que significa abrir olhos e ouvidos para as demandas de passes de transporte, de aumento das linhas de ônibus e de reorganizações dos bandejões.
É justo nesse contexto de indignação com a falta de sensibilidade de um magistrado, que sequer visitou os campi e ouviu a universidade, que a nova diretoria da AdUFRJ resolveu entrar na Justiça contra a imposição do retorno imediato. A AdUFRJ cobra a suspensão, em caráter de urgência, da decisão do desembargador Marcelo Pereira da Silva. Não há prazo definido para apreciação do pedido.
Nossa visão sobre esse processo é diferente do olhar da reitoria. Somos professores e somos representantes sindicais dos docentes. Queremos mostrar nossas especificidades. Nossa questão é trabalhista. Desejamos retornar ao trabalho presencial, mas de forma segura, planejada e responsável.
Ainda não há informações concretas de que serão assegurados produtos de higiene e limpeza (sabão, álcool em gel, máscaras), equipamentos de Proteção Individual (EPIs), de Proteção Coletiva (EPCs), além de condições para assepsia nas unidades, considerando abastecimento regular de água, limpeza e rede de esgoto em pleno funcionamento. “Ou seja, estão ausentes condições de segurança de trabalho, em razão da falta de condições sanitárias, salubres de trabalho, em meio à pandemia”, resume o texto de nossa ação judicial, protocolada essa semana.
Temos uma reunião do Conselho de Representantes da AdUFRJ marcada para a próxima segunda-feira, 22, quando iremos recolher também as observações e ponderações dos conselheiros. Todo esse material pode ser incorporado ao nosso processo. E, aqui, como diretoria, queremos reforçar nosso comprometimento com a defesa da qualidade do trabalho docente. Estamos na AdUFRJ para isso e, se você tem algum aspecto para nos contar, alertar, debater, por favor, nos procure. Estamos juntos!

Boa leitura.

OBS: Durante o fechamento desta edição, fomos surpreendidos com a convocação de um Conselho Universitário extraordinário para discutir a Ebserh. Reforçamos aqui nosso compromisso com o debate, amplo e diverso, sobre o tema. Compromisso que já expressamos concretamente na semana passada, quando realizamos um importante debate público com docentes que defendem posições opostas sobre o tema.

WhatsApp Image 2021 11 19 at 17.54.36A última sessão do CineAdUFRJ do ano – parceria do sindicato com o Grupo de Educação Multimídia, projeto de extensão da Faculdade de Letras – debateu a perspectiva freiriana da educação como elemento de transformação da realidade. A sessão foi a primeira da nova diretoria do sindicato. Cinco filmes foram discutidos. Um deles, um documentário de 33 minutos produzido pela Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa). O projeto ouviu ex-alunos de Paulo Freire — que completaria 100 anos em 2021.
A professora Ana Lúcia Fernandes, diretora da AdUFRJ e docente da Faculdade de Educação, foi uma das debatedoras. Para ela, os filmes analisados apresentam uma perspectiva histórica de como a educação é vista na nossa sociedade. “Ao mesmo tempo em que a educação é essa força motriz de utopia, também aparece como sinônimo de progresso individual e coletivo”, avaliou.
Ana Lúcia defendeu que a escola também é ou deve ser espaço de experimentação e que a educação não deve ser encarada como única responsável por fracassos ou sucessos sociais. “Numa perspectiva histórica, há a crença de que a educação é a resolução de todos os problemas”, disse. “A educação transforma, sim, mas ela, por si só, não é capaz de transformar a realidade. Ela ajuda, mas há outros elementos estruturantes”, concluiu.
Márcia Lisboa, docente do Departamento de Letras da Uerj, também convidada da noite, apresentou a ideia de utopia, de Paulo Freire, como “o que ainda não é, mas vai ser”. “A imaginação utópica funciona para dizer aos nossos alunos que querem ser professores, às crianças que estão na escola, aos jovens que vão fazer o Enem nesse ano terrível que eles vão poder, ainda vai ter (espaço) para eles”, disse. “É preciso acreditar no futuro e é preciso que esse futuro seja verbo também. Acreditar que a educação ainda não é, mas vai ser”.
Professor recém-aprovado no Núcleo Interdisciplinar para o Desenvolvimento Social (Nides), do Centro de Tecnologia, Paulo Maia destacou as narrativas exibidas, todas, a seu ver, idealistas. “Os filmes geram uma identificação empática em relação ao tema. São narrativas que têm uma chave idealista”, defendeu.
Ele também pontuou a dualidade apresentada nas obras, entre o que chamou de cultura letrada e a dimensão prática da vida. São duas dimensões colocadas em contradição, que não é da escola, mas social. “Essa ideia não brota da relação professor aluno, nem brota na escola. É uma dimensão estrutural da sociedade”, afirmou. Para o professor, a narrativa apaga a lógica hegemônica social dos filmes e enfatiza a adesão emocional ao tema educação
Os filmes analisados na sessão do dia 18 de novembro foram: “Vida Maria” (2006), de Márcio Ramos; “Nunca me sonharam” (2017), de Cacau Rhoden; “40 horas na memória” (2013), do grupo Ufersa; “Madadayo” (1993), de Akira Kurosawa; e “Vocacional” (2011), de Toni Venturi. Para assistir às obras ou ao compilado de trechos, montado pela curadoria do cine, basta acessar o site do GEM. Todos os debates também ficam gravados no canal do grupo, no Youtube.

WhatsApp Image 2021 11 19 at 17.54.35 3Alexandre Medeiros e Kelvin Melo

O avanço da vacinação favorece a retomada gradual das aulas presenciais na UFRJ, mas não só. Um dos processos mais importantes para a vida universitária, a realização dos concursos docentes também deslanchou nos últimos meses.
Até fevereiro deste ano, não havia ocorrido sequer uma nomeação para as 128 vagas ofertadas pela UFRJ em editais do fim de 2019 e de 2020. E apenas as provas referentes a 16 delas tinham sido aplicadas. Passados nove meses, com a melhoria dos índices epidemiológicos, o quadro é bem diferente: mais da metade das vagas já foi preenchida e “cerca de 88% dos concursos já foram realizados”, informa a assessoria de imprensa da universidade.
A chegada de novos docentes à UFRJ representa um alento em tempos tão difíceis para a educação, segundo o vice-reitor Carlos Frederico Leão Rocha: “Os concursos são essenciais, pois permitem a reposição de nosso quadro de professores”, diz. “No cenário atual, isso significa a garantia de continuidade de nossas atividades e, principalmente, uma perspectiva para os pesquisadores que formamos em nossos programas de pós-graduação”, completa.
Para não perder nenhuma vaga, o Consuni prorrogou o prazo de realização dos concursos até 30 de junho de 2022. A medida foi elogiada pelo professor Joaquim Welley Martins, integrante da Comissão Executiva de Concurso Docente. “Houve a relevante preocupação com a reposição do corpo docente nesse contexto de descaso e não priorização da educação como um todo, mas da universitária em particular, explicitamente demonstrada por esse governo que aí está”, observa o professor da Escola de Comunicação.
Welley destaca o esforço das unidades para a realização das provas não presenciais, durante a pandemia em curso: “Praticamente todas as etapas dos concursos estão sendo realizadas de forma remota. Isso implica um trabalho hercúleo dos departamentos e das comissões dos concursos, que têm de ajustar várias situações e aspectos da Internet para todo o processo”.
“A UFRJ tem de realizar todos esses concursos, cujas vagas já estão liberadas pelo MEC, não esquecendo de brigar por outras tantas vagas, tendo em vista a flagrante diminuição do número de docentes de carreira, implicando uma situação de risco para vários cursos”, completa o docente da ECO.

PROCESSO CUIDADOSO
A Faculdade de Letras, uma das unidades com maior número de substitutos (40, de um total de 628) da UFRJ, sabe bem disso. A unidade realizou concursos para duas vagas e fará mais dois, nas próximas semanas. “Prorrogamos o máximo que podíamos em função da segurança das pessoas. É uma questão sanitária séria, que ainda não acabou. Realizamos agora, pois estávamos preocupados em perder essas vagas”, esclarece a diretora Sonia Reis.
A prova escrita, etapa obrigatoriamente presencial dos concursos, está sendo cercada de todos os cuidados. “Precisamos que todos os candidatos estejam juntos para o sorteio dos pontos e tivemos a ideia de acomodá-los sentados em cadeiras no corredor principal da unidade, que é um lugar amplo, aberto e ventilado”, explica Ubirajara Carvalheira Costa, secretário-geral da faculdade. “Após o sorteio, cada fiscal levou o seu grupo de até nove candidatos para as salas que já estavam com os seus kits para a realização da prova”, completa.
O desafio da organização continua nas demais etapas, remotas, do concurso. “Uma equipe atua constantemente para que a conexão da internet de quem está gravando a etapa não se perca. Se a internet de um deles cair, outro servidor está de plantão para assumir esta gravação”, diz Ubirajara.

E DEPOIS?
A diretora manifesta preocupação com perdas por aposentadoria compulsória, aos 75 anos, em um futuro muito próximo. “Tenho uma série de professores com 70 anos. Daqui a cinco anos, um dos setores do Departamento de Neolatinas vai perder ao mesmo tempo cinco professores pela compulsória. Vamos conseguir repor isso?”, questiona.
A UFRJ informou que está prevista ainda para este mês a publicação de um novo edital docente, “com vagas para setorizações diferentes das que constam nos editais em andamento”. Questionada, a assessoria não respondeu até o fechamento desta edição quantas vagas seriam ofertadas nem quais unidades seriam contempladas.

WhatsApp Image 2021 11 19 at 17.54.36 2HELEINE FERNANDES, escritora e doutora pela Faculdade de Letras da UFRJ"É importante reconhecer mulheres negras como pensadoras, lideranças fundamentais para que os saberes ancestrais sejam manifestados no Brasil”, afirma Heleine Fernandes, escritora e doutora pelo departamento de Ciência da Literatura da Faculdade de Letras da UFRJ. Na semana em que se comemora o Dia da Consciência Negra, o Jornal da AdUFRJ ouviu a autora sobre seu livro “A poesia negra-feminina de Conceição Evaristo, Lívia Natália e Tatiana Nascimento”, finalista neste ano do maior prêmio literário do país, o Jabuti.

“É uma pesquisa sobre poesia negra feminina contemporânea. Na primeira parte do trabalho, investigo a aparente inexistência dessas poetas”, conta Heleine. “Na segunda parte, investigo a obra poética delas, que pertencem a três gerações diferentes, de lugares fora do eixo Rio-São Paulo”, completa. Para a autora, muitas negras poetas poderiam compor o trabalho. “Escolhi três, mas existem muitas que fazem reverberar saberes não-ocidentais”, defende. “Também depois deste trabalho, foi quando pude me reconhecer como uma poeta negra contemporânea e publiquei um livro que se chama ‘Nascente’, pela Editora Garupa/ksa1”, afirma Heleine.
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A obra, selecionada entre as 10 melhores na categoria Ciências Humanas, uma das 21 temáticas do Jabuti, é fruto da pesquisa realizada por Heleine ainda na Faculdade de Letras. A escritora cursou graduação (desde 2005), mestrado e doutorado (até 2019) no Fundão. Para ela, a UFRJ foi fundamental para sua jornada. “Sempre tive bolsas, o que foi fundamental para que eu pudesse continuar a estudar”, conta. Por outro lado, o livro também funciona como uma crítica. “Essa tese também fala de um buraco. Durante minha formação inteira, nunca estudei uma autora negra. E minha tese vem para questionar essa universidade, que é uma das melhores do Brasil”, aponta a escritora.

E não foi nada fácil permanecer no curso. “Quando fiz vestibular, só a UERJ tinha a política de cotas. Quando entrei na universidade, não foi por cotas e há pouco tempo fiquei sabendo que existem cotas para pessoas negras dentro da pós, mas não aproveitei isso”, explica. “Sofri racismo durante minha formação e, diferente de hoje, não havia o coletivo de pessoas negras dentro da Letras”, conta.

Heleine agradece a permanência ao professor que a orientou, Alberto Pucheu. A família também sempre incentivou seus estudos. “Sou a primeira pessoa a fazer universidade pública, mestrado e doutorado. Meus avós são analfabetos e sempre investiram muito na minha educação, valorizaram isso”, diz.

Heleine não passou para a segunda fase do Jabuti, em que apenas cinco livros foram escolhidos para a grande final, na próxima semana. Mas a autora fica feliz por ter contribuído para o reconhecimento da poesia enquanto produção de conhecimento: “A minha pesquisa se soma muito a uma tentativa de criar ações, para estudantes negros e indígenas, que validem outras formas de formular o conhecimento e os saberes”, conclui.

Trabalho de incentivo à leitura está na final do Jabuti

WhatsApp Image 2021 11 19 at 17.54.36 3Já Miriane Peregrino, que também fez o doutorado na Letras (até 2019), aguarda com ansiedade a final do Jabuti, no dia 25. O trabalho coordenado por ela, enquanto editora do jornal “Literatura Comunica!”, os “Diários de Emergência covid-19”, foi selecionado entre os cinco finalistas na categoria inovação e incentivo à leitura.
“Tive a ideia dos diários quando estava em confinamento e o projeto foi crescendo. Esse ano fizemos a inscrição no Prêmio Jabuti e a Cynthia Rachel Pereira Lima ficou como a proponente responsável. Cynthia é uma das autoras dos diários e participa do (Jornal) Literatura também. Nos conhecemos quando atuamos em bibliotecas comunitárias: ela, na Baixada Fluminense, e eu, no Cerro Corá e na Maré. Ela também é de Letras, fez a especialização em literaturas africanas aqui na UFRJ”, conta.
Os diários foram publicados em cinco números ao longo do primeiro ano da pandemia. Todos estão disponíveis em formato online na página do jornal. “O Jabuti reconhece o que foi feito no ano anterior, neste caso, 2020. Nossa ação de fomento a leitura tem tudo a ver com a pandemia, o que fizemos foi estimular a leitura durante o confinamento da Covid-19”, reflete.
Ao todo, 63 autores, que residem ou não no Brasil, foram contactados por Miriane para se somarem à sua iniciativa, de março de 2020 a março de 2021. “Penso o Jornal Literatura Comunica como uma atividade de extensão, mas não necessariamente vinculada à universidade. Na pandemia, acabei lembrando dos diários de Anne Frank e de Lima Barreto, que são diários de confinamento escritos cada qual com sua especificidade”, explica.
Eleonora Ziller, ex-presidente da AdUFRJ, orientou Miriane durante o doutorado. “A Miriane é sensacional, daquelas meninas incríveis que a gente recebe de presente para orientar”, elogia. “No doutorado ela já fez uma mudança grande, quando propôs um doutorado-sanduíche em Angola. Abriu caminhos inusitados, conseguiu um trabalho como pesquisadora na Alemanha, quando aconteceu a pandemia, e ela sofreu isso tudo lá no estrangeiro”, conta.
Para Eleonora, o diferencial do trabalho de Miriane é a literatura atrelada à prática. “É a construção do fazer, com relações práticas e sociais transformadoras. Ela vive a literatura como um exercício de liberdade, compartilhamento. O trabalho dela é muito consistente”, acredita.
Eleonora enxerga a chegada de trabalhos como o de Miriane como a grande novidade do Jabuti deste ano. “É uma decisão de olhar diferenciado para coisas que não estavam na esfera. Ela estar entre as finalistas é muito importante”, acredita.

I Jornada Científica Favelades Universitáries

WhatsApp Image 2021 11 19 at 17.54.36 4Promover projetos e iniciativas produtoras de conhecimento, conduzidas por estudantes universitários e lideranças sociais moradores das favelas e periferias do estado do Rio. Esta é a proposta da primeira edição da Jornada Científica Favelades Universitáries, iniciada no dia 16 e com programação até amanhã (20). O evento tem organização da Pró-reitoria de Extensão da UFRJ, o Fórum Favela Universidade, o Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré/ Museu da Maré, a Casa Viva e a Fundação Oswaldo Cruz.
Na mesa de abertura, o convidado de honra foi o ex-deputado e escritor Jean Wyllys, que contou sobre sua passagem acadêmica na Universidade de Harvard. Com o tema “Quais caminhos levam os favelades à universidade e a universidade à favela?”, Wyllys discutiu os principais desafios enfrentados numa jornada científica ao exterior. “Não se sintam inferiores por não falar bem uma língua que não é sua, principalmente se estiverem nos Estados Unidos, porque as pessoas nativas de lá só falam a língua deles. E nós temos que correr atrás para falar outras línguas, numa realidade alijada de direitos, que torna tudo muito mais difícil”, disse.

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