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temporaoEx-ministro da Saúde (2007-2011) do segundo mandato do governo Lula, o médico José Gomes Temporão propôs uma articulação ampla com foco no combate à pandemia para atuar de forma alternativa às diretrizes federais. O shadow cabinet (termo em inglês que pode ser traduzido como gabinete sombra ou gabinete paralelo), segundo Temporão, funcionaria como uma autoridade sanitária de peso que “sinalizasse para a sociedade: o rei está nu, não é por ali, é por aqui”. O ex-ministro foi um dos convidados do debate virtual “Estratégias realistas para o enfrentamento da covid-19”, promovido pelo Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, na noite da segunda-feira (22). O encontro reuniu pesquisadores e movimentos sociais.

O gabinete informal sugerido por Temporão reuniria governadores, prefeitos, entidades da Saúde Pública, da Ciência e da Medicina, partidos políticos, parlamentares, Congresso Nacional e mídia para criar uma governança com foco no combate à pandemia. “Na prática, nós construímos uma governança paralela informal e ampliada do Sistema Único de Saúde, sem governo federal”, justificou o ex-ministro. Em sua visão, o consórcio Nordeste para vacinas é um exemplo positivo, “mas teríamos espaço para avançar um pouco mais”.

O ex-ministro da Saúde analisou a desarticulação progressiva do SUS no último ano, até a militarização final da pasta. E descartou a hipótese de “erros” ou “incompetência” de gestão: “Existe um método onde se faz um diagnóstico e a partir desse diagnóstico são tomadas medidas nas áreas sanitária, econômica, social e médica. O resultado: trezentos mil mortos”, afirmou.

Pesquisas de diferentes instituições apontaram para erros graves em  importantes frentes. Um mapeamento da Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) mostrou um discurso coeso, entre pronunciamentos e normas jurídicas, em resposta à covid-19. “Existe um momento, entre final de março e início de abril de 2020, em que prevalece dentro do governo federal a ideia de que a resposta deve ser a imunidade de rebanho por contágio”, disse Deisy Ventura (USP).

A convergência de indicadores alarmantes, como a alta de transmissões, superlotação em hospitais e de mortalidade em diversos estados, hoje, foi explorada pelo pesquisador da plataforma Monitora covid-19 da Fiocruz, Christovam Barcellos. “Em fevereiro e março, o Brasil todo ficou vermelho”, alertou.

Já a fragmentação das ações junto à população para evitar aglomeração, como isolamento social, fechamento de escolas, lockdown no comércio e afins foi abordada por Guilherme Werneck, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e pela liderança comunitária do Dona Marta, Itamar Silva. “Isoladamente, essas medidas têm efeito pequeno. Na forma combinada é que você consegue superar o patamar de transmissão para ter um respiro na mortalidade e também no serviço de saúde”, criticou Guilherme. Já Itamar deu ênfase aos gargalos do transporte urbano e da realidade habitacional de “seis a oito pessoas em moradias de dois cômodos”.

A reitora da UFRJ, Denise Pires de Carvalho, participou da discussão sobre o cenário. “Daria para o Brasil não estar passando por essa situação. Isso tem que ficar claro para a população: que essas quase trezentas mil mortes poderiam sim ter sido evitadas. Elas foram evitadas em outros países, inclusive em alguns com uma população maior que a do Brasil”, lamentou.

José Gomes Temporão

“Estamos diante de uma situação de naturalização da pandemia onde, paradoxalmente, ela atinge a situação mais crítica. O governo federal aposta na apatia, na insensibilidade, na indiferença”.

Deisy Ventura

“A tese da imunidade de rebanho por contágio ofereceu a diversos atores do governo federal uma solução eleitoral, como forma de angariar apoio de setores econômicos importantes”.

Christovam Barcellos

“Ao mesmo tempo em que se percebe essa ocupação grande dos hospitais, há uma alta na mortalidade e na incidência de casos”.

Guilherme Werneck

“Não existe no Brasil uma ação que tenha sido colocada em prática, nacionalmente ou regionalmente, para contenção da transmissão de forma efetiva”.


Itamar Silva

“A comunicação efetiva está se dando de novas formas. Como a gente faz para se contrapor e disputar essa comunicação da maneira como ela está acontecendo hoje?”.

WhatsApp Image 2021 03 19 at 17.25.574Alessandra Nascimento
Colégio de Aplicação (CAp)

 

Eu atuo com uma turma de primeira série do Ensino Fundamental, estamos em pleno período letivo, que vai até o dia 9 de abril. São 16 alunos de seis e sete anos que estão aprendendo a ler e a escrever. Gosto muito de trabalhar com essa série, me sinto confortável, tenho experiência de alguns anos com esse segmento de alfabetização. Começamos presencialmente, lá em março do ano passado, construindo nossos laços, conhecendo as crianças, fazendo o diagnóstico de cada aluno para construir nosso projeto. Mas, em três semanas de aula, tudo parou.

Ou melhor, pararam as aulas presenciais, porque nosso trabalho continuou, e de forma intensa. Fizemos várias reuniões e mantivemos um princípio básico do CAp, que é o de não deixar nenhum aluno para trás. Decidimos que não começaríamos nenhuma atividade sem que tivéssemos a certeza de que todos os nossos alunos tivessem acesso ao ensino remoto. Fizemos um mapeamento para saber a situaçao de cada um: se tinha computador, celular, acesso à internet. E nisso o edital de inclusão digital da UFRJ foi fundamental, pois garantiu esse acesso.

Em paralelo, mesmo sem contar como carga horária, fizemos o que chamamos de encontros de acolhimento. Com tantas mortes diárias por covid-19, queríamos saber como estavam os alunos e suas famílias. Foram encontros semanais e virtuais, a partir de julho. Especificamente na minha série, a gente propôs um projeto, em vigor até hoje, de protagonismo infantil. Para que cada aluno pudesse expressar suas emoções diante da pandemia, as perdas na família, as necessidades em casa. A partir de setembro, retomamos o ano letivo de 2020, com encontros síncronos diários de uma hora e vinte minutos, e atividades assíncronas para cumprir em casa. Nesse momento de isolamento, esse tempo em que ficamos com eles ajuda muito para que não se sintam distantes, sozinhos e tristes.  

Muitas são as angústias, muitas são as fragilidades. Mas eu acredito que a gente fez o que deveria ter feito e estamos fazendo o melhor que podemos fazer. Tem dias que eu fico muito triste, choro, me sinto incapaz, impotente. Quando um aluno meu não consegue ler e chora, se eu estou ao lado, consigo lidar com isso, contornar a situação. Mas na distância, não. Mesmo assim, temos feito coisas muito bacanas nas aulas remotas. Construímos com eles uma rotina. Em termos pedagógicos, o maior ganho talvez tenha sido a possibilidade de trabalhar interdisciplinarmente. Eu atuo com as disciplinas de Portugûes, História e Geografia. E passei a dar aulas em conjunto com a professora de Educação Física. Planejamos juntas as abordagens, criando diálogos e contemplando os conteúdos que precisamos cumprir. Isso tem sido muito legal. Mas estou muito ansiosa pelo retorno. A esperança é que seja em breve e com segurança.

WhatsApp Image 2021 03 19 at 17.25.572Giuliana Franco Leal
Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade (Campus Macaé)

 

Cinco horas da manhã de uma segunda-feira normal de outubro de 2020. Minha jornada de trabalho profissional começa cedo e termina tarde. No meio dela, tem um longo turno de trabalho não remunerado, em que faço comida, limpo a casa e cuido dos meus filhos. Hoje preciso terminar o parecer de um artigo antes que as crianças acordem, o prazo está no fim. Sem creche, sem rede de apoio, o jeito é torcer para que elas durmam até o parecer estar pronto. Não foi desta vez. Bom dia, meninos, vamos tomar café da manhã?

Enquanto assistem ao desenho, termino de escrever.  Entre limpar um bumbum e separar uma briga de irmãos, preparo slides para a aula da tarde e também o almoço. Pelo whtasapp, vejo as últimas atualizações de um grupo de muitas mães e alguns pais professores da UFRJ. Discute-se como conciliar trabalho docente e cuidados com filhos ou com familiares doentes, idosos ou com deficiências. A universidade precisa estar atenta para que essas diferenças entre seus servidores não se transformem em desigualdades; o sindicato também.  

Depois de almoçar, lavar a louça e escovar várias fileiras de dentes, sento com as crianças no chão para montar quebra-cabeças. Enquanto inventamos histórias de piratas, esqueço por um tempo os milhares de mortos da pandemia. Depois do banho nas crianças, as deixo com o pai. Começa meu turno dedicado exclusivamente ao trabalho profissional. Preparo o material de apoio da aula e paro para ler notícias. Desanimadoras. Não vou nem comentá-las na aula. Com os alunos, discuto problemas sociais e seus reflexos na área profissional deles e os incito a pensar alternativas. Muitas câmeras fechadas, mensagens no chat, alguns se arriscam no microfone. Conversamos sobre como ser profissionais melhores. Ao fim da aula, uma aluna diz que a quarentena está difícil, mas que nossa aula de segunda-feira tem sido um dos alívios. Sorrio. O dia ainda vai longe, mas já trouxe algumas alegrias no meio do caos. Estamos sobrevivendo, estamos na luta.

WhatsApp Image 2021 03 19 at 17.25.573Bruno Clarkson Mattos
Instituto de Biologia

 

No dia 9 de março de 2020, assinei o contrato para o que seria a minha primeira experiência como docente e, na semana seguinte, as atividades foram paralisadas. Com o avanço da pandemia e a sensação de impotência diante do crescente número de vítimas, assim que a UFRJ anunciou um programa de voluntários para o combate à covid-19, eu aproveitei o vínculo recentemente estabelecido e me cadastrei. Entre abril e julho, trabalhei na força-tarefa de combate à doença, parte no Centro de Triagem e Diagnóstico montado no CCS, parte no Laboratório de Virologia Molecular, fazendo extrações de RNA viral das amostras de swab para os rt-PCRs diagnósticos de Sars-CoV-2.

As atividades foram intensas e me deixaram psicologicamente estafado para estudar e preparar as aulas para o Período Letivo Excepcional, que foi anunciado para começar em agosto. Com o início das aulas remotas se aproximando, seria impossível conciliar as duas atividades e eu me despedi do voluntariado.

Retomei então os estudos para a construção das aulas e o aperfeiçoamento do uso das ferramentas que viabilizaram o ensino e a comunicação com os alunos. Mesmo contando com a ajuda dos colegas que dividem disciplinas comigo, essa retomada foi um período intenso, com a elaboração e a gravação das aulas e com o desenvolvimento das atividades e avaliações que seriam passadas aos alunos nos meses seguintes. Em novembro, a minha participação no PLE se encerrou com a aplicação das avaliações.

Esse primeiro período de ensino a distância foi difícil para todos, mas sinto que foi especialmente desafiador para os alunos. A impressão que  tenho é que muitos ainda não haviam se adequado a essa nova realidade. A maioria não conseguiu acompanhar o cronograma de aulas assíncronas e, de maneira geral, a frequência deles nas aulas síncronas foi muito baixa. Menos de 10% dos inscritos compareciam. Algumas vezes, nenhum aluno apareceu para a aula.

Não vou esconder que fiquei frustrado de ter a minha primeira experiência como professor na UFRJ em um cenário que exige distanciamento dos alunos e ensino remoto. Mesmo assim, para mim é gratificante, em um momento como esse, ter participado de alguma forma do combate à pandemia e da manutenção do ensino em uma das melhores universidades do país.

WhatsApp Image 2021 03 19 at 17.25.571Elaine Sobral da Costa
Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG)

 

Desde março de 2020 eu vinha trabalhando como voluntária no Centro de Triagem Diagnóstica de covid-19 da UFRJ, o CTD ou Bloco N. Foi uma experiência dura, alguns dias coletando swabs de 8h às 16h sem beber água, sem ir ao banheiro, sem comer. Ao mesmo tempo, foi incrível porque trabalhei lado a lado com os nossos alunos e outros docentes, sob o comando da professora Terezinha Marta, assistindo a profissionais de saúde e segurança de todo o Rio de Janeiro.

Até o final de julho, fiquei separada de meu filho e de meu marido. Só via meu filho no quintal. Em agosto, deixei o CTD, tive minha família reunida e começava a nova etapa de aulas online. Eu coordeno a disciplina Clínica Pediátrica II, junto com a professora Fernanda Mariz, no 8º período de graduação em Medicina. Tivemos que nos virar para aprender a manejar as ferramentas, e a dar suporte para outros professores que atuam na disciplina. Anteriormente à pandemia, eu vinha colocando material bibliográfico, questões e casos clínicos no AVA (Ambiente Virtual de Aprendizagem). Mas daí a ter o curso inteiro virtual, foi um grande salto.

Os alunos voltaram com muita garra para aprender. Houve uma clara perda, porque as atividades práticas só voltaram para os internos. A nossa disciplina perdeu as práticas ao vivo. Houve também ganhos que eu não imaginava. Nós deixamos as aulas teóricas gravadas, para serem assistidas em casa em qualquer momento, e utilizamos o horário dessas aulas para discussão de casos clínicos. Essas discussões foram riquíssimas. Fizemos também algumas atividades integradas com mais de um professor de diferentes áreas. Em todo esse tempo eu segui trabalhando presencialmente no Instituto de Pediatria, o IPPMG, ou Ipepê como a gente gosta de chamar. Tinha uma certa correria, às vezes entrava online ainda de máscara, tensa se a internet estaria funcionando, às vezes corria para casa para poder entrar com uma rede mais estável. Tudo isso sem o olho no olho, ou até sem a voz dos alunos, que usam muito o chat para se comunicar. E por ora seguimos assim...

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