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ALEXANDER W. A. KELLNER
Diretor do Museu Nacional

A maior homenagem que um paleontólogo — pesquisador que estuda os registros da vida do passado geológico do planeta — pode fazer é dedicar o nome de uma espécie a uma pessoa ou instituição. Esse foi justamente o caso de Berthasaura leopoldinae — o mais novo dinossauro do Brasil. Foi um trabalho de equipe, liderado por um aluno do Programa de Pós-graduação em Zoologia do Museu Nacional/UFRJ e que incluiu pesquisadores do Centro de Paleontologia da Universidade do Contestado, da COPPE/UFRJ e do Museu.
Todo organismo no nosso planeta recebe o nome composto por gênero e espécie. O nome do gênero da nova descoberta é uma junção de Bertha, homenagem a Bertha Lutz, + saurus, que vem do grego e significa WhatsApp Image 2021 12 03 at 18.40.071BERTHASAURA LEOPOLDINAE, no oásis que era Cruzeiro do Oeste há 115 milhões de anos - ARTE: MAURILIO OLIVEIRA“lagarto” ou “réptil” e é comumente utilizado na denominação de répteis fósseis. Foi utilizada a conjugação feminina, já que se refere a uma mulher. E que mulher!
Bertha Maria Júlia Lutz (1894 – 1976) foi uma pessoa notável que estava bem à frente do seu tempo. Era bióloga e realizou inúmeras pesquisas com anfíbios no Museu Nacional antes mesmo dessa instituição ter sido incorporada à UFRJ (o que ocorreu em 1946). Ingressou na instituição em 1919 como secretária, a única função disponível na época para uma mulher no serviço público (!), sendo a segunda funcionária pública do nosso país — uma conquista e tanto para a época. Mas nunca atuou em secretaria e sempre realizou pesquisa. Ela se aposentou em 1964, tendo sido eleita Professora Emérita da UFRJ.
Formada em Sorbonne (França), Bertha Lutz viajou bastante ao longo de sua carreira, incluindo a participação em diversos congressos realizados nos Estados Unidos, fato não comum para aquele tempo. Nos anos 50, passou uma temporada no British Museum (hoje Natural History Museum) em Londres. Realizou diversas atividades de campo, sobretudo no Sudeste e no Mato Grosso.
Não apenas na pesquisa essa personagem importante da ciência brasileira se destacou. Bertha Lutz foi a primeira mulher a se tornar deputada no Brasil, tendo sido candidata em 1934 quando ficou com a primeira suplência (que na época era dada ao candidato com maior número de votos entre os não eleitos). Tomou posse em 1936 (com a morte de um deputado) ficando nessa atividade até 1937, quando Getúlio Vargas fechou o Congresso Nacional. Feminista, foi uma das principais lideranças na luta pelos direitos políticos das mulheres brasileiras, reconhecida nacionalmente e internacionalmente. O nome dessa grande brasileira deveria ser mais destacado e difundido na nossa sociedade pelo seu exemplo.
O nome da espécie do novo dinossauro, B. leopoldinae, faz uma dupla homenagem. A primeira é para a Imperatriz brasileira Maria Leopoldina (1797–1826). A arquiduquesa austríaca pertencente a uma das mais poderosas dinastias europeias da época (Harbsburgo–Lorena), veio ao Brasil como esposa de D. Pedro, que viria a ser primeiro imperador do país. Grande entusiasta das ciências naturais, a futura imperatriz trouxe em sua comitiva vários naturalistas e artistas europeus, que percorreram e documentaram a história natural do Brasil Colônia. Ela mesma se interessava pelo estudo de minerais e fez coletas importantes de plantas que ainda estão guardadas no Museu Nacional. Foi graças à sua atividade, e posteriormente a do seu filho, D. Pedro II, e de sua esposa, a Imperatriz Tereza Cristina, que o palácio de São Cristóvão sempre foi um templo das ciências naturais e antropológicas no nosso país!
Porém, não apenas a ciência destaca D. Maria Leopoldina! Fato que muitos desconhecem é que foi pelas mãos da futura imperatriz que passaram os documentos enviados ao jovem D. Pedro no dia 02 de setembro de 1822, culminando com a declaração da independência do Brasil alguns dias mais tarde. Na proximidade do bicentenário dessa data tão importante, temos a oportunidade de promover um resgate histórico dessa mulher maravilhosa que era austríaca de berço, mas em cujo peito batia um generoso coração brasileiro! Na sua morte, o Brasil chorou a perda de sua primeira imperatriz, conhecida como a “mãe dos brasileiros”, que sofreu muito durante a vida, mas nunca se esquivou em ajudar com a sua bondade o povo brasileiro, tendo especial atenção para com os mais desafortunados, incluindo os escravizados. Um exemplo de abnegação que muitos poderiam seguir!
Por último, mas não menos importante, leopoldinae é uma justa homenagem à escola de samba Imperatriz Leopoldinense, que honrou o Museu Nacional/UFRJ com o tema do seu desfile na Marquês de Sapucaí em 2018 — Uma Noite Real, no Museu Nacional! A sensibilidade do carnavalesco Cahê Rodrigues na forma de retratar o Museu na avenida ainda emociona todos que se lembram daquele 13 de fevereiro de 2018. Era o ano do bicentenário da instituição, que é o primeiro museu do país e também a primeira instituição científica do país.
Naturalmente, a importância da descoberta desse novo dinossauro transcende as homenagens. Berthasaura leopoldinae representa um terópode (Theropoda) – grupo de dinossauros carnívoros ao qual pertence o T. rex. Mais especificamente, a nova espécie é um abelissauróide (do clado Noasauridae), que eram formas de animais no topo da cadeia alimentar encontradas no supercontinente Gondwana (que reunia as massas continentais da América do Sul, África, Austrália, Índia e Antártica). Sendo o dino mais completo do cretáceo brasileiro, com crânio, mandíbula, coluna vertebral, cintura peitoral e pélvica, braços e pernas (faltando os pés), era uma espécie com perto de um metro de comprimento. O mais interessante: desprovido de dentes! Porém, para se ter a certeza de que se tratava do primeiro dinossauro edêntulo da América do Sul, tivemos que lançar mão de uma tecnologia que cada vez mais tem sido utilizada na pesquisa dos fósseis: a tomografia computadorizada. Pesquisadores do Laboratório de Instrumentação Nuclear (LIN) da Coppe/UFRJ usaram o microtomógrafo para realizar as imagens que confirmaram a descoberta. Tecnologia de ponta utilizada na pesquisa de fósseis.WhatsApp Image 2021 12 03 at 18.40.42COLETA em Cruzeiro do Oeste (2013)
Outro aspecto importante da descoberta, que, como vimos, reúne ciência, tecnologia, história e cultura, é o fato de que o fóssil e uma escultura em vida de Berthasaura leopoldinae serão brevemente expostos em um centro de visitação que o Museu irá abrir ainda no primeiro semestre do ano próximo. Uma belíssima área de 44 mil m2 ao lado do parque da Quinta da Boa Vista. Obrigado, Instituto Cultural Vale, por prometer a doação de R$ 500 mil necessários para tornar esse sonho da instituição possível: voltar a receber as crianças das escolas que se encontram órfãs de Museu Nacional!
A descoberta e todo o desenrolar da pesquisa associada ao novo dinossauro mostrou mais uma vez que a nossa UFRJ continua gerando pesquisa de alta qualidade! Também cabe destaque como a colaboração entre diferentes setores da universidade pode funcionar superbem, produzindo resultados importantes. Sem contar com a gratidão que o Museu tem com os seus parceiros externos, como o CENPALEO, que com a sua generosidade tem acolhido pesquisadores e alunos, muitos dos quais estão desenvolvendo suas dissertações de mestrado e teses de doutorado com exemplares daquela instituição.
Infelizmente, nem tudo são flores... Como mencionado, Berthasaura leopoldinae terá a sua “casa” no centro de visitação, juntamente com os novos exemplares que temos recebido no esforço de recomposição das coleções (mais informações no site recompoe.mn.ufrj.br). O mesmo não ocorre com os profissionais do Museu. Passados mais de três anos da tragédia de 2 de setembro de 2018, uma grande parte dos servidores sofre por não ter local adequado para realizar seu trabalho. Dois anos após a verba assegurada pela ação determinante da Direção do Museu para a construção de seis módulos emergenciais ter sido liberada, ainda estamos longe de alcançar essa meta. Desculpas e mais desculpas pelos que deveriam ajudar os seus colegas de instituição — nem mesmo o processo licitatório foi feito! Sem contar com o fato de agora sermos “brindados” pelos que estão coordenando esse projeto com a redução para três módulos apenas... Infelizmente, alguns colegas da nossa universidade não estão fazendo a sua parte na reconstrução da área acadêmica da instituição, tão importante para a sua sobrevivência. Mas isso será objeto de um novo artigo em futuro próximo e é algo que irá mudar na próxima gestão do Museu Nacional/UFRJ.
Por hoje, vamos ficar contentes com essa belíssima e justa homenagem que mistura de forma singular ciência, tecnologia, história e cultura! A pesquisa foi desenvolvida por Geovane A. de Souza, Marina B. Soares, Luiz C. Weinschütz, Everton Wilner, Ricardo T. Lopes, Olga M. O. de Araújo e por mim. O artigo pode ser obtido no site da Scientific Reports (www.nature.com/articles/s41598-021-01312-4). Informações sobre várias descobertas de fósseis no Brasil e no mundo podem ser obtidas na coluna Caçadores de Fósseis (https://cienciahoje.org.br/artigo_category/cacadores-de-fosseis/), um projeto do Instituto Ciência Hoje que em breve completará duas décadas. Feliz 2022 para todos e que melhores dias venham brindar a ciência, a cultura e as universidades brasileiras!

WhatsApp Image 2021 12 03 at 18.44.55Josué Medeiros
Cientista político e ex-diretor da AdUFRJ

Primeiro, a boa notícia. A extrema direita vai perder as eleições presidenciais em 19 de dezembro de 2021. O deputado federal de centro-esquerda Gabriel Boric, de apenas 35 anos, será eleito e derrotará o radical de direita José Antonio Kast.
A má notícia é que a extrema direita chilena veio para ficar. Kast conquistou quase dois milhões de votos no 1o turno, ocorrido em 21 de novembro, o que o projeta como uma liderança incontestável. Além disso, seu patamar de 27% indica que há base social para um movimento político enraizado com base na defesa do autoritarismo, da violência e de um nacionalismo xenofóbico.
Não é fácil entender esse cenário tão bifurcado e ainda em aberto, mas é possível organizar as coordenadas para acompanhar o que se passa no Chile.

O estallido social de 2019
Em outubro de 2019, o Chile foi sacudido por um terremoto diferente dos abalos sísmicos que aquele país está acostumado a enfrentar. Milhões de pessoas foram às ruas em todo o país até março de 2020 e só saíram por causa da pandemia da covid-19. O estopim foi o aumento da passagem do trem em Santiago. A violência policial na repressão aos manifestantes foi a gasolina que incendiou ainda mais a fogueira da revolta social. Foram centenas de mortos e milhares de ativistas feridos e detidos.  
Os “carabineiros” cometeram inúmeras violações de direitos humanos contra a população e escancararam os limites da democracia chilena, até hoje organizada sob a égide da Constituição de 1980, elaborada pelo ditador Augusto Pinochet. Suas marcas principais são a ausência de direitos sociais — o regime autoritário pinochetista foi o primeiro laboratório neoliberal no mundo — e a existência de amarras institucionais que impedem mudanças constitucionais.
O estallido social foi o momento em que a sociedade chilena disse basta para essa Constituição. A questão é o que fazer depois disso.
WhatsApp Image 2021 12 03 at 18.42.31O estallido social se caracterizou pela ausência de lideranças constituídas. Uma nova geração política que já ocupava as ruas desde 2006 com a Revolta dos Pinguins e que, desde então, tentava renovar o sistema político, buscou representar o movimento.
O contexto era de profunda crítica ao sistema político existente, no qual a esquerda se organizou em uma coalizão chamada Concertación e governou o país de 1990 a 2010, quando o atual presidente, Sebastián Piñera, venceu as eleições e a direita democrática chilena conquistou seu primeiro mandato. De 2010 a 2019, houve uma alternância de poder entre Piñera e Michelle Bachelet, que primeiro governou de 2006 a 2010, ainda pela Concertación e depois voltou ao poder, de 2014 a 2018, já pela coalizão Nueva Mayoria. Em 2018, Piñera triunfa novamente. Todo o arranjo democrático chileno surgido em 1990 já estava em crise desde 2014 e ruiu em definitivo com o estallido social.  
A renovação se deu por duas vias e a primeira foi a Constituinte.

A Constituinte chilena
A força da renovação não se voltava apenas para o sistema político, mas alcançava todo o aparato legal e institucional chileno. O acordo pactuado entre as lideranças das mobilizações e o sistema político foi a realização de um referendo em abril de 2020, que foi adiado pela pandemia e ocorreu em 25 de outubro.
 Setenta e oito por cento dos votantes aprovaram a Constituinte. A segunda etapa foi a eleição dos parlamentares, marcada para abril de 2021 e realizada em 15 e 16 de maio. O resultado foi amplamente favorável à renovação, com 100 constituintes somando esquerda e independentes e 17 representantes dos povos indígenas contra 38 legisladores da direita.
Finalmente, em 4 de julho, a Assembleia Constituinte foi instalada com a eleição de Elisa Loncón, uma parlamentar mapuche (povo indígena da região centro-sul chilena, bastante perseguido pela Ditadura de Pinochet e que, por diversas vezes, entrou em conflitos com as instituições democráticas do Chile, acusando-as de violar seu território e ameaçar sua sobrevivência).
Já a segunda via da renovação democrática chilena se manifestou nas eleições presidenciais de 2021.

As eleições presidenciais e o futuro
Em paralelo ao processo constituinte, o sistema político tradicional seguiu governando, com Piñera presidente e um Congresso Nacional já em processo de renovação pelo surgimento de novas forças, tais como a Frente Amplio de Boric, à esquerda, e o próprio Kast, à direita. Piñera, na verdade, virou um presidente zumbi, apenas administrando o quadro pandêmico e buscando se manter no poder diante de um processo de impeachment.
Outra questão decisiva é o comparecimento eleitoral no Chile. Todo o processo constituinte foi marcado pela baixa participação, sempre menor que 50% do eleitorado. Isso limita a energia Constituinte e permite que o sistema político siga organizando os pilares institucionais chilenos, ainda que sua legitimidade seja baixa.
 Tal ambiguidade se manifestou nas eleições presidenciais. Se, por um lado, o rechaço ao sistema político presente na Constituinte se manifestou no resultado, com duas novas lideranças alcançando o segundo turno, por outro é inquestionável que Kast significa uma recusa das energias que a Assembleia Constituinte representa. Ou seja, um terço do eleitorado chileno que foi às urnas disse não ao sistema político e não à Constituinte.
Em resumo: uma vitória de Kast nas eleições seria a morte da Constituinte e um prenúncio de novas explosões sociais. Com Boric presidente, o mais provável é que exista uma convergência do novo mandatário com o parlamento constituinte, o que pode permitir um desfecho positivo para a democracia chilena. O desafio, nesse caso, será derrotar o movimento de extrema direita que seguirá vivo no país, mesmo com a derrota eleitoral.

TEXTO E TÍTULO DE RESPONSABILIDADE DA AUTORA

WhatsApp Image 2021 11 26 at 18.11.12MARINALVA OLIVEIRA
Professora da Faculdade de Educação da UFRJ e integrante do Movimento Barrar a Ebserh na UFRJ


A Ebserh foi criada para “resolver” os problemas dos hospitais universitários federais (HUs), que sofrem com estruturas físicas precárias, falta de pessoal e subfinanciamento. A empresa hoje administra 40 HUs, mas a realidade tem mostrado que sua atuação não solucionou os problemas, não trouxe mais recursos para os hospitais, nem melhorou as condições da população usuária e do/as trabalhadores/as. Pelo contrário, são várias as denúncias de descumprimento dos contratos e nas metas de ampliação de infraestrutura, tendo reduzido os espaços de ensino, pesquisa e extensão, de trabalho e de assistência à população, consolidando a terceirização e o assédio moral aos trabalhadores.
Na UFRJ, a adesão à empresa foi retirada de pauta em 2013, após amplo debate na comunidade acadêmica. Contudo, a atual reitora, contrariando promessa de campanha, ressurge com a pauta, no fim do ano, quando a universidade ainda funciona majoritariamente de maneira remota, em meio à crise sanitária, política e social no país, conduzindo o processo sem debate com a comunidade universitária.
A reitora apresenta um relatório que não avalia o conjunto das experiências dos hospitais sob a gestão Ebserh, mas analisa apenas hospitais favoráveis/parceiros da empresa. No relatório apresentado, estão ausentes os três segmentos da universidade, havendo problemas de metodologia, na amostra, no mérito e na representatividade.
A eventual transferência dos hospitais à empresa afastará a participação da comunidade acadêmica e implicará na cessão de patrimônio da UFRJ em meio a tantos ataques à educação pública em nosso país. Não podemos lutar contra a reforma administrativa e ao mesmo tempo concordar que a contratação de pessoal deixe de ser via concurso público (RJU) e passe para a lógica privada (CLT). O fato é que, além de não trazer melhorias, a Ebserh tem interferido na autonomia universitária, especialmente nas práticas de extensão, e precarizado as condições de trabalho, entre outras queixas.
Além do mais, no atual contexto político e econômico, com Bolsonaro privatista no poder, além das graves ameaças à democracia, precisamos estar atentos a tudo que possa ameaçar o patrimônio público e a autonomia universitária. Eventual adesão à Ebserh seria abrir mão dos hospitais universitários e colocá-los sob o comando de um general, Oswaldo de Jesus, presidente da empresa.
Alega-se ainda que haveria espaço para negociar contratos mais favoráveis aos interesses da UFRJ, mas todos os contratos são iguais e atendem apenas aos interesses da empresa, com poucas diferenças, e significa uma adesão para garantir os interesses da empresa, não da universidade.
Não se ignoram as dificuldades dos HUs da UFRJ, mas sabemos que essas são fruto do brutal contingenciamento orçamentário em todo o serviço público, em especial pelos cortes de recursos e limitação de concursos públicos, o que se agravou no Governo Bolsonaro. Os cortes de gastos públicos também afetam a Ebserh e não serão resolvidos mediante adesão à empresa.
É necessário ainda dizer que a UFRJ já tem decisão favorável da Justiça Federal  transitada em julgado, em fase de execução, determinando a realização de concursos para substituição dos “extraquadro”. Antes mesmo de pensar em negociação com a Ebserh, a UFRJ deveria garantir a realização desses concursos para não perder vagas.
Por fim, entendemos que qualquer proposta de adesão deve ser precedida de amplo (e presencial) debate na comunidade universitária, de forma democrática, jamais como chantagem.

TEXTO E TÍTULO DE RESPONSABILIDADE DO AUTOR

WhatsApp Image 2021 11 26 at 18.11.121FELIPE ROSA
Professor do Instituto de Física e integrante do Conselho de Representantes da AdUFRJ

Nessa última terça-feira, dia 23/11, tivemos o que alguns apelidaram como o “Consuni do fim do mundo”: depois de 8 anos congelada na gaveta reservada aos itens radioativos, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – Ebserh – foi reconduzida à pauta da UFRJ. Mais especificamente, foi iniciada uma discussão para se abrir negociações com a Ebserh, deixando-se uma possível celebração de contrato para um momento posterior. Dada a experiência pregressa (e, em alguns momentos, lamentável) do conselho máximo acerca do tema, já se esperava uma reunião bastante tensa, mas infelizmente o que se viu foi uma subida furiosa pelas escarpas da tensão até a beira do precipício da irresponsabilidade.
Antes de mergulharmos na polêmica, faz-se necessário prover um breve contexto. O Complexo Hospitalar da UFRJ passa por uma situação difícil há muitos anos, graças a um coquetel indigesto de subfinanciamento, carência de gestão e corporativismo excessivo. Assim sendo, nos idos de 2012, o conselho do CCS propôs, numa votação por ampla maioria, que se passasse a gestão dos hospitais da UFRJ para a então recém-criada Ebserh, uma empresa pública engendrada para este fim. A perda da autonomia, ainda que parcial, sobre o complexo hospitalar de uma Universidade não é algo periférico ou acessório, e um vigoroso debate tomou conta da UFRJ até uma infame reunião do Consuni em meados de 2013, quando a discussão foi interrompida com violência e tumulto. O tema então ficou submerso até o final de 2020, quando, movido por encerramentos de contratos que fechariam muitos leitos, o Complexo Hospitalar solicitou às instâncias superiores o retorno às negociações com a Ebserh.   
E um ano depois, cá estamos. Com o amadurecimento das conversas, foi convocado um Consuni extraordinário para tratar do tema. A polêmica se instalou assim que se anunciou que tal reunião seria remota, pois isso “inviabilizaria o debate verdadeiramente democrático”.
Os mais experientes sabem que, nesse caso, “debate democrático” significa pressão ostensiva de grupos organizados sobre os conselheiros/as, com invasões das salas de reunião, palavras de ordem etc. Nada disso é necessariamente mau – manifestações, mesmo que enfáticas, fazem parte da democracia – mas junte-se os ânimos acirrados com o contexto pandêmico que ainda vivemos, e a decisão de fazer um conselho remoto mostra-se bastante responsável. Não obstante, foram anunciados atos presenciais antiEbserh na reitoria no próprio dia 23, com a participação de diversas entidades. Imaginava-se que o ato poderia se dar nos pilotis da entrada do prédio, ou talvez até no hall de acesso ao gabinete da reitoria, mas qual não foi a surpresa de muitos ao perceberem que, ao abrir-se a transmissão ao vivo do Conselho, as câmeras de alguns conselheiros mostravam o Salão Nobre da reitoria apinhado de gente.
Pasmem, caras e caros leitores: as mesmas lideranças que exigem padrões sanitários nórdicos para o retorno das atividades didáticas presenciais estavam promovendo, sem a menor necessidade objetiva, uma baita aglomeração num salão pequeno e mal ventilado. Vários conselheiros presentes no salão, inclusive, retiravam suas máscaras para fazer suas intervenções. Poderia se argumentar que, devido às altas taxas de vacinação, o risco de contágio seria baixo, mas o fato é que todas as orientações técnicas são inequívocas em recomendar cautela em lugares fechados, e o que vimos foi uma grande cena de desobediência cívico-científica.
Enfim, após aproximadamente três horas e meia, com os humores recrudescendo e a aglomeração inflando, o representante dos professores titulares do CCMN pediu vistas do processo, o qual foi seguido por vários outros conselheiros. A próxima reunião do Conselho Universitário já está marcada para a próxima quinta-feira, dia 02/12. Espero não ter que bater novamente na tecla da insensatez, seria realmente o fim da picada.

FSOU6357Foto: Fernando Souza/Arquivo AdUFRJO primeiro Conselho de Representantes convocado pela nova diretoria da AdUFRJ mostrou uma organização bastante diversa do retorno presencial em toda a universidade. Há unidades que retomaram grande parte de suas atividades presencialmente. Já outras, com graves problemas estruturais, estão sem condições de receber estudantes em suas instalações. O CR virtual, dia 22, reuniu 38 conselheiros, além da diretoria.
“Foi uma boa reunião. Havia muitas unidades presentes. Foi bastante representativa”, avaliou o presidente da AdUFRJ, professor João Torres. “Tivemos um retrato de como está a volta presencial, com situações muito distintas. Sem dúvida, a segurança, sobretudo para os cursos noturnos do Fundão, é uma das principais preocupações neste momento”, ressaltou.
O alerta veio das representações do Instituto de Biologia e da Escola de Educação Física e Desportos. “O quadro mais grave é do pessoal do nosso noturno. No diurno, cerca de 50% dos nossos estudantes querem retornar presencialmente. Mas, no noturno, mais ou menos 5% dos alunos querem retornar agora, numa situação ainda de muita insegurança no campus”, afirmou a ex-diretora da AdUFRJ, professora Christine Ruta, da Biologia.
O conselheiro Marcelo Melo, da EEFD, falou no mesmo sentido. “A nossa solução foi voltar ao presencial com eletivas para minorar os impactos na nossa comunidade acadêmica. Oferecemos o mínimo de eletivas no período tarde-noite para não expor os alunos num Fundão ainda vazio”.
Na Praia Vermelha, o maior problema é o aulário (conforme adiantado pela edição nº 1.204 do Jornal da AdUFRJ). A estrutura não permite o retorno presencial das aulas nos contêineres habitáveis. “Na Faculdade de Educação, nós voltamos o mínimo possível. A maior parte de nossas atividades acontece no aulário, que não tem nenhuma condição de receber alunos”, informou a professora Marinalva Oliveira. “Os estudantes estão também em situações precárias, muitos fora do estado”.
Outros conselheiros descreveram um retorno presencial amplo de suas unidades. Sobretudo as que funcionam nas instalações do Centro de Tecnologia. “Obviamente nunca paramos. Produzimos álcool desde o início da pandemia, fizemos palestras virtuais, colamos grau, organizamos a escola”, descreveu Ricardo Medronho, diretor da AdUFRJ e professor emérito da Escola de Química. “A gente já começou a oferecer muitas disciplinas práticas presenciais e algumas teóricas. As salas foram todas sinalizadas para garantir o distanciamento de 1,5 metro. Nós procuramos nos adequar da melhor forma possível a essa exigência da volta”, disse.
Outro relato veio da Escola Politécnica. “A universidade é muito diferente em tudo, sobretudo na sua estrutura física. No caso do CT, a infraestrutura é boa, há salas de aulas amplas, com janelas que podem ser abertas, há portas largas”, ressaltou o conselheiro Eduardo de Miranda Batista. “A informação que tenho é que o semestre seria adequado para disciplinas laboratoriais e atividades práticas. Continuamos majoritariamente em aulas remotas. O retorno presencial massivo acontecerá conforme o plano da UFRJ, a partir de 2022”, finalizou.

AÇÕES DA DIRETORIA NO PRIMEIRO MÊS DE MANDATO

WhatsApp Image 2021 11 26 at 18.11.122O momento serviu também para que a diretoria apresentasse suas ações neste primeiro mês de mandato. O presidente João Torres fez um breve relato das movimentações jurídicas da AdUFRJ. Uma delas é o recurso contra a instalação de ponto eletrônico para os docentes do Colégio de Aplicação. “A primeira instância negou recurso e recorremos em segunda instância. Aguardamos o resultado”, contou. Outra ação foi o recurso da AdUFRJ movido no Tribunal Regional Federal da 2ª região contra a volta açodada das aulas presenciais.
Do ponto de vista político, o professor destacou a atuação com o Andes e outros sindicatos. “Temos trabalhado bastante com o Andes, inclusive na campanha contra a PEC 32, que é algo que atinge o serviço público e, principalmente, os jovens professores que ingressam na carreira”. A AdUFRJ foi uma das entidades que financiaram a campanha no Rio de Janeiro, com outdoors (foto) que convocavam a população para os atos de outubro, contra a reforma administrativa.
Outro aspecto ressaltado pelo dirigente foi a atuação do setor jurídico do sindicato. “Entre 2020 e 2021, foram feitos 866 atendimentos de filiados. A assessoria tem atualmente 226 processos ativos, sendo 22 ações coletivas e 204 individuais. Foram, ainda, ajuizados 66 processos judiciais nesse período”, informou João.

No TRF-2, procurador concorda com instituições de ensino

Forçada por decisão judicial ao retorno presencial possível das aulas, a UFRJ segue atenta às movimentações do recurso que tramita no Tribunal Federal da 2ª Região. E uma recente manifestação da Procuradoria Regional Federal pode ajudar a universidade a organizar a volta aos campi de forma mais cuidadosa e planejada.
Em documento divulgado no dia 19, o procurador Paulo Fernando Corrêa concordou, em boa parte, com os argumentos da defesa das instituições de ensino — além da UFRJ, são citadas no processo a UniRio, a UFRRJ, o IFRJ, o Cefet, o Pedro II e o Instituto Nacional de Educação de Surdos.
O procurador é favorável à determinação de retorno às aulas presenciais, mas observa que a medida deve ser adaptada ao planejamento pedagógico de cada instituição, assegurando a continuidade do ensino remoto para estudantes “cujas condições pessoais, econômicas e de saúde, não permitam o retorno presencial no corrente ano letivo”. Além disso, Paulo Fernando Corrêa destaca as dificuldades financeiras das universidades, institutos e Pedro II: “Permitindo-se àquelas entidades de ensino que comprovem não possuir condições de cumprir tais exigências de imediato, notadamente por questões orçamentárias, a manterem, até o fim do corrente ano letivo, a modalidade de ensino remoto, com a apresentação, desde logo, do plano de retorno às atividades presenciais para o primeiro semestre do ano letivo de 2022”.
Advogada da AdUFRJ, Ana Luísa Palmisciano considerou positiva a manifestação, mais sensível às dificuldades das instituições de ensino. E, portanto, com um ponto de vista diferente dos procuradores de primeira instância que moveram a ação junto ao TRF-2. “Ela concorda com os argumentos de que o retorno só pode ocorrer de forma segura. Foi uma manifestação feita pelo mesmo procurador da segunda instância que recebeu as entidades na reunião do MPF”, lembrou a assessora jurídica, em referência à reunião ocorrida dia 10 que contou com a presença da AdUFRJ.
Não há prazo definido para o desembargador Marcelo Pereira da Silva, que determinou o retorno das aulas, deliberar sobre o recurso das instituições de ensino. Também não há decisão do desembargador em relação ao recurso apresentado pela AdUFRJ. (Kelvin Melo)

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