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Por Silvana Sá e Beatriz Coutinho

 

WhatsApp Image 2022 02 25 at 22.36.501O ensino remoto foi necessário para a universidade, ao longo da pandemia, mas está na hora de acabar. Este é um consenso entre professores das mais diferentes unidades e centros e é o debate central da universidade nos últimos dias. Apesar da certeza sobre a importância de voltar aos campi, a comunidade acadêmica tem muitas dúvidas sobre como garantir a plena segurança de docentes, estudantes, técnico-administrativos e terceirizados após dois anos de uma pandemia que ainda mata quase mil pessoas por dia no Brasil.

Essa segurança passa pela vacinação, mas a UFRJ ainda não tem uma política clara sobre como vai cobrar a comprovação da vacina para aqueles que acessarem suas dependências. A medida já foi adotada para professores e técnico-administrativos. O controle é feito via chefias imediatas. O maior desafio é exigir a imunização dos estudantes. O segmento compreende mais de 69 mil alunos de graduação e pós-graduação.

A proposta da reitoria é a aplicação de um questionário para o controle vacinal no momento da inscrição em disciplinas. “Esse questionário tem objetivo epidemiológico, para conseguir entender quais seriam as nossas fragilidades nessa situação”, explica o vice-reitor Carlos Frederico Rocha.

A medida, no entanto, é considerada insuficiente para a comprovação da imunidade.  “Não queremos um passaporte ‘para inglês ver’. Queremos que o atestado vacinal possa ser registrado no SIGA”, considera o professor João Torres, presidente da AdUFRJ. “Passaporte vacinal é importante para a proteção de toda a comunidade. Um indivíduo não vacinado vai transmitir o vírus com muito mais eficiência”, reforça o professor Roberto Medronho, coordenador do GT Coronavírus da UFRJ.

A preocupação do docente, especialista em epidemiologia, se justifica pelos números. Apesar dos bons índices atingidos até agora no país, muita gente ainda não se imunizou. A taxa de pessoas com o esquema completo no Brasil, entre a população vacinável, é de 78%. Entre os maiores de 18 anos, menos de 40% tomaram a dose de reforço, até o momento. No Rio de Janeiro, o índice dos imunizados é de 71% entre aqueles acima de 5 anos de idade, e de 80% entre maiores de 12 anos.

Com boas taxas, mas ainda aquém do ideal, o professor Medronho recomenda que a universidade realize a cobrança aos estudantes via Sistema Integrado de Gestão Acadêmica (SIGA). “Os alunos podem fazer o upload do comprovante no momento da matrícula no SIGA. E no diário do professor pode estar indicado os alunos que não se vacinaram. O docente teria o poder de cobrar um teste negativo dos não vacinados”, sugere. “Considero perfeitamente factível que a nossa universidade, que tem grande tradição na área de tecnologia e computação, cobre esse comprovante nesta forma digital”.

Outra proposta aventada – e que começou a ser colocada em prática em algumas unidades – foi a cobrança do comprovante nas portarias dos edifícios. Neste caso, o profissional terceirizado de segurança é o responsável por exigir o documento de vacina. A medida, no entanto, apresenta limitações, e fica inviável num contexto de alta circulação de pessoas. “Formalmente, não temos uma designação de recursos humanos para uma cobrança nas nossas entradas”, pontuou a professora Terezinha Marta Castiñeiras, chefe do Departamento de Doenças Infecciosas da Faculdade de Medicina, durante a Plenária de Decanos e Diretores da última terça-feira (22).

Coordenadora do Centro de Triagem Diagnóstica (CTD) da UFRJ, ela também é a favor do questionário para mapear pessoas não imunizadas. “Os não vacinados constituem uma população pequena, não vejo isso como um grande desafio, e a expectativa é que essas pessoas tenham se infectado com a Ômicron. Isso significa um período de pós-infecção que coincide com o nosso retorno”, explica. A infectologista aponta a boa cobertura vacinal do estado do Rio como critério para que as preocupações em torno dos não vacinados seja reduzida. Além disso, ratifica o apoio do CTD na vigilância epidemiológica e no monitoramento de casos.

Para o professor Pedro Lagerblad, do Instituto de Bioquímica Médica, qualquer decisão que se tome sobre o passaporte vacinal precisa ser de caráter educativo. “É uma questão de marcar posição, mas com impacto epidemiológico pequeno, por conta da taxa de vacinação na cidade do Rio de Janeiro, que é de 90%”, declara. “É relevante pedir, do ponto de vista educativo, mas eu não acho que se deva impedir a matrícula de alunos não vacinados, por exemplo”.

As mudanças no cenário epidemiológico, segundo o docente, apontam para uma tendência de baixa taxa de transmissão e número de casos em abril. “Ainda estamos num momento de transmissão importante, o que sustenta o argumento de exigir o comprovante. Minha impressão, no entanto, é que até o final de abril esta questão será letra morta, a menos que apareça uma nova variante”, considera o ex-diretor da AdUFRJ. “A realidade é que a gente precisa estar preparado para dois ou três cenários, mas as projeções, neste momento, indicam um cenário mais favorável em abril”.

Em plenária virtual realizada na terça-feira (22), o Setor das Instituições Federais de Ensino (Ifes) do Andes aprovou calendário de mobilização que indica para o dia 23 de março a deflagração de uma greve nacional dos servidores públicos federais por tempo indeterminado, caso o governo não aceite negociar reajustes salariais. A data foi definida na mesma terça-feira por entidades reunidas pelo Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasefe) e pelo Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate). Os servidores reivindicam reposição salarial de 19,99% — referente a perdas nos três anos do governo Bolsonaro. O calendário também prevê o Dia Nacional de Mobilização, em 16 de março, com manifestações em vários estados e no Distrito Federal.

Na plenária do Andes, o indicativo de greve a partir de 23 de março recebeu 33 votos favoráveis, nenhum contra e três abstenções — uma delas da AdUFRJ. “Vamos nos WhatsApp Image 2022 02 25 at 22.36.49mobilizar para fazer ações no dia 16, junto com outras categorias, mas a questão da greve por tempo indeterminado vai ser discutida na assembleia do dia 18 de março. Nossa assembleia apontou na direção da construção de um movimento de recomposição salarial, e estamos firmemente engajados nisso. Mas tivemos na assembleia muitas vozes críticas a uma greve por tempo indeterminado. Daí a nossa abstenção. Eu mesmo fui e sou uma dessas vozes. Sou contra a greve por tempo indeterminado, a nossa diretoria como um todo é contra, principalmente agora, quando quase toda a categoria trabalha de forma remota e estamos nos preparando para o retorno presencial”, pontuou o professor João Torres, presidente da AdUFRJ, que participou da plenária do Andes.

Apesar da larga margem favorável, a plenária do Andes mostrou que muitas seções sindicais enfrentam dificuldades de mobilização de suas bases para uma greve por tempo indeterminado, em um momento em que grande parte das universidades está em período de férias ou em processo de retomada de aulas presenciais, após dois anos de ensino remoto na pandemia de covid-19.

DIFICULDADES NA BASE
Alguns relatos na plenária do Andes dão a dimensão das dificuldades de mobilização enfrentadas em muitas instituições federais de ensino para a deflagração de uma greve por tempo indeterminado. Em algumas, além da desmobilização da base de docentes, há resistências por parte dos estudantes e da própria sociedade local. “Estávamos muito envolvidos com a mobilização para o retorno presencial e, junto com outras categorias, conseguimos pressionar o Conselho Universitário a aprovar a exigência do passaporte vacinal. Estamos agora engatinhando na mobilização pela construção da greve, temos muito a construir”, relatou o professor Leonardo Botega, diretor da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal de Santa Maria (RS).

O calendário acadêmico é um entrave em algumas universidades. “Estamos começando agora 2021.2, e isso fez com que nós ainda não tenhamos feito sequer uma assembleia para debater o tema”, contou o professor Thiago Arruda, vice-presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal Rural do Semi-Árido. O presidente da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Tecnológica do Paraná, Lino Trevisan, também relatou que a entidade não conseguiu ainda fazer uma assembleia para discutir o indicativo de greve. Secretária-geral da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Alagoas (Adufal), a professora Irailde Correia descreveu uma dificuldade adicional em sua base: “Nosso semestre começa em 21 de março de forma presencial. É o mesmo período de mobilização para a greve”.

Os problemas de mobilização ocorrem mesmo em algumas seções sindicais onde já foram feitas reuniões prévias de avaliação do movimento. “Vamos fazer uma assembleia em 9 de março, convocando também os estudantes e os técnico-administrativos, mas temos enfrentado dificuldades para mobilizar a nossa base”, contou a professora Edivania Alves, diretora-geral da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Pará.

A professora Celeste Pereira, secretária-geral da Associação de Docentes da Universidade Federal de Pelotas, relatou problemas de articulação com outras categorias, no âmbito do Fonasefe, como um obstáculo a ser superado na construção de um movimento nacional dos servidores públicos. O mesmo obstáculo foi levantado pelo professor Fernando Nogueira, presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Lavras (MG): “Temos que construir a unidade com outros setores do Serviço Público Federal e dialogar mais amplamente com a população”, defendeu Nogueira, que também apontou a resistência da reitoria ao movimento. “Temos uma reitoria bolsonarista, interventora e estamos sob constante ataque. A reitoria conseguiu até mesmo barrar a exigência do passaporte vacinal para o retorno às aulas presenciais”.

FALTA DE DIÁLOGO
Inicialmente, o indicativo para o início de uma greve por tempo indeterminado dos servidores públicos federais estava previsto para 9 de março. Mas, também por dificuldades de mobilização para uma data tão próxima, o indicativo foi alterado para 30 de março. Esta semana, a data foi novamente alterada para 23 de março, levando em conta que o dia 30 é bem próximo de 4 de abril — esta a data-limite para a concessão de reajustes ao funcionalismo público, de acordo com a Lei 9.504/77 (Lei Eleitoral), que veda medidas nesse sentido de 180 dias antes da eleição até a posse dos eleitos.

Até o momento, o governo Bolsonaro não tem demonstrado motivação para o diálogo com os fóruns nacionais de servidores federais. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já afirmou em várias entrevistas ser contrário à concessão de reajustes a servidores federais este ano.    

As entidades representativas de servidores insistem na abertura de negociações, mas sustentam que a greve é um instrumento legítimo de pressão. “O índice que reivindicamos não recupera nossas perdas, só repõe parte delas. O calendário que estamos apresentando busca construir uma unidade dos setores que estão mais avançados e organizados em relação à construção da greve com aqueles que têm outro ritmo. O Dia Nacional de Mobilização, em 16 de março, vai ser decisivo para a gente. Temos que dar um ultimato ao governo Bolsonaro nesse dia, com manifestações em todo o país, e dar o prazo de uma semana para que ele nos responda, ou então vamos para a greve. Isso não é um blefe”, assegurou David Lobão, coordenador-geral do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe) e uma das principais lideranças do Fonasefe.

WhatsApp Image 2022 02 18 at 18.19.50Este é um editorial muito difícil de escrever e profundamente impactado pela tragédia de Petrópolis. Muitos professores, estudantes e técnicos da universidade vivem na região serrana e passaram os últimos dias atônitos com a multiplicação das mortes, das perdas, do desespero. Há colegas com alunos de mestrado que velaram quatro familiares. Há alunos sem casa e sem esperança. E há professores que, mesmo com a vida sitiada pelos escombros, se desdobram para montar redes de solidariedade. Essa, aliás, é uma das forças mais potentes de nossa comunidade acadêmica: a empatia entranhada em nosso cotidiano.  

Menos de 20 horas depois de as encostas desmoronarem, na última terça-feira, professores, técnicos e alunos montaram redes solidárias para arrecadar doações. Só no Fundão, há hoje quatro pontos de coleta. De nosso lado, na AdUFRJ, tentamos fortalecer esse amálgama de solidariedade e cuidado. Ligamos para professores que moram na região, integramos com o Sintufrj e o DCE a campanha por donativos e montamos uma modesta ação emergencial de amparo. Na quarta-feira, mandamos um caminhão com 10.782 garrafas de água mineral, o que corresponde a 16.128 litros. O material foi entregue ao sindicato municipal de professores. Mas queremos, podemos e devemos ajudar mais. Com doações, com reflexões e informações.

273771187 3626706357453826 2318157644341626519 nEstamos de portas, braços e páginas abertos para ideias de campanhas de solidariedade, de artigos e de movimentos que colaborem para reconstruir Petrópolis e interromper o ciclo macabro dessa tragédia que une fatalidades naturais, agravadas pelas mudanças climáticas, com o repetido descaso das autoridades públicas. O efeito concreto desse desmazelo fica evidente quando lemos os depoimentos das páginas 8 e 9 desta edição, em que professores e estudantes da UFRJ, todos moradores de Petrópolis, detalham as consequências concretas da irresponsabilidade política que já dura décadas na região serrana. Um único aluno, Deivid Ribeiro de Souza, estudante do mestrado em Caxias e professor do Ensino Fundamental, perdeu essa semana quatro familiares. Ele próprio é um sobrevivente da enchente de 1988, quando sua mãe viu a casa desmoronar. “Mesmo assim, jamais recebemos um auxílio do governo para sairmos das áreas de risco. Ninguém mora em área de risco porque quer. Mora porque não tem alternativa”, desabafa o Deivid na reportagem.

Seguiremos acompanhando os professores, técnicos e estudantes petropolitanos, e reiteramos que podem contar conosco. Temos certeza que a força da UFRJ não se resume às nossas aulas ou a nossas pesquisas. Tampouco está limitada aos muros invisíveis dos campi. Somos fortes porque somos uma comunidade enraizada e comprometida com o coletivo.
Boa leitura.

PS: O jornal dessa semana tem nove páginas, uma a mais do que o normal, para cobrir a tragédia de Petrópolis. Mas a edição está também repleta de outros a assuntos relevantes, como uma reflexão difícil, porém necessária, sobre a construção da greve dos servidores públicos federais, na página 3. Além de uma matéria forte sobre o exponencial crescimento de agrotóxicos no Brasil. Aliás, mais um recorde do governo Bolsonaro: em três anos, foram mais de 1.500 agrotóxicos liberados. A situação pode piorar se for aprovado no Senado — já passou pela Câmara — um projeto de lei que afrouxa ainda mais a liberação desses produtos no país. Leia na página 7.

Na semana passada, a assembleia geral da AdUFRJ aprovou, com críticas, a construção de uma campanha salarial unificada dos servidores públicos federais, com possibilidade de greve. Mas constituir um movimento que pretende representar os mais de 584 mil servidores ativos do Executivo Federal não é tarefa fácil. Até agora, o consenso gira em torno da ideia de que é preciso agir para tentar reverter as perdas salariais. E já. O índice de reajuste defendido pelo Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasefe) é de 19,9%, mas os docentes acumulam perdas bem maiores nos últimos três anos. “Há um contexto favorável para reivindicar reajuste. Estamos em ano eleitoral, o governo Bolsonaro atribuiu boa parte do orçamento ao Centrão, que não têm muitas preocupações com amarras fiscais”, aponta a cientista política e vice-presidente da AdUFRJ, professora Mayra Goulart.

Mas uma greve por tempo indeterminado não unifica o movimento docente. “É um cenário pontualmente favorável, em meio a um contexto muito desfavorável para nós. Uma greve durante uma pandemia e trabalho remoto pode confundir a sociedade”, acredita Mayra. “É preciso buscar outras formas de mobilização, com a universidade aberta, com aula, com envolvimento presencial da comunidade acadêmica”, defende a professora.

O presidente da AdUFRJ, professor João Torres, tem o mesmo entendimento. “Não queremos ficar imóveis num cenário em que os docentes já perderam em torno de 30% da renda desde nosso último reajuste”, pontua. “No entanto, é um momento em que a universidade é vista pela sociedade como um lugar de privilégio, porque conseguiu trabalhar até agora remotamente, na pandemia. Para a maioria das pessoas, há uma percepção de que os professores universitários não perderam salário, enquanto outros grupos ficaram meses sem renda”, pondera o dirigente.

Outro argumento levantado pela diretoria da AdUFRJ diz respeito ao governo Bolsonaro. “A gente faz greve por vários motivos. Um dos motivos é desgastar o governo, mas me parece que este não é um bom mecanismo para desgastar o governo Bolsonaro. Ao contrário, uma greve pode reforçar a narrativa dele”, diz João Torres. “Precisamos construir um movimento de negociação salarial que não coloque a sociedade contra a gente e que não fortaleça o discurso do governo. Greve por tempo indeterminado vai colocar a sociedade contra nós”, afirma.

Construção delicada
O funcionalismo federal congrega profissionais de Saúde, de Pesquisa, de Educação e das chamadas carreiras típicas de Estado, como auditores, procuradores e defensores públicos. Não é novidade que os primeiros grupos sofrem com desvalorização salarial, perdas de direitos e desprestígio, enquanto as carreiras consideradas da elite do funcionalismo vivem um cenário praticamente oposto. Os salários iniciais desses segmentos — aprovados em concursos que exigem apenas a graduação — são maiores do que os vencimentos de professores titulares. Essas contradições também fragilizam a mobilização das categorias profissionais. Além de representarem um risco, quando o assunto é o apoio da população às pautas de reivindicação.

“Uma considerável parte da nossa sociedade ou teve redução salarial ao longo da pandemia, ou ficou sem qualquer fonte de renda. A gente espera que esse segmento tão fragilizado apoie uma greve de pessoas — especialmente os auditores — que ganham 20 salários mínimos no início da carreira?”, questiona o professor Felipe Rosa, do Instituto de Física. Ex-diretor da AdUFRJ, ele pede cautela aos docentes. “Se construirmos um movimento unificado, precisaremos ter nossas pautas muito claras para a sociedade. Nós temos uma relação com o Serviço Público que o entende efetivamente como prestação de serviço. Essas carreiras típicas de Estado têm outra relação, uma relação de empregado e empregador, puramente. Essa alta casta votou maciçamente em Bolsonaro, em 2018. E acredito que, se ganharem um reajuste expressivo, votarão nele novamente neste ano”.

Para o professor Luis Eduardo Acosta, da Escola de Serviço Social, a greve é um instrumento importante para mobilizar os servidores. Embora reconheça as dificuldades do período remoto, ele defende a suspensão das atividades por tempo indeterminado. “Uma unidade ampla nos possibilita realizar uma pressão intensa. Tivemos grandes perdas salariais neste período. Seria um erro deixar passar este momento”, acredita. Ele sugere a realização de atividades na rua, com mostras sobre o conhecimento desenvolvido na universidade, além de assembleias comunitárias da UFRJ. “É preciso buscar unir forças, inclusive com outras universidades federais do Rio de Janeiro. Nossa capacidade de pressionar o governo está em construir uma opinião pública favorável ao movimento”.

O Andes defende a campanha unificada e a greve. “Os ataques que temos enfrentado na Educação com o corte orçamentário, as tentativas de privatização, são tão fortes que, se a gente não mostrar força agora, vai ser muito difícil reverter o quadro que se apresenta de destruição da Educação e dos serviços públicos”, afirma a professora Regina Ávila, secretária-geral do Andes. “A mobilização unitária dos servidores já foi vitoriosa no ano passado, quando conseguiu impedir que a PEC 32 (da reforma administrativa) fosse a voto em plenário. Precisamos manter esse movimento”, justifica. No dia 22 de fevereiro, as seções sindicais das universidades federais, filiadas ao Andes, vão se reunir remotamente para debater o formato da greve, de acordo com as discussões ocorridas nas assembleias locais.

Mudanças no calendário
O Fonasefe se reuniu nesta quinta-feira (17) e modificou o calendário de mobilizações. Antes, a greve nacional dos SPF seria deflagrada em 9 de março. Agora, o entendimento mudou. “Avaliamos que nenhuma das categorias estava preparada para entrar em greve. Então, reforçaremos o dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, com atividades. E apontamos o dia 16 de março como Dia Nacional de Greve dos Servidores Públicos”, revela David Lobão, representante do Fonasefe. A paralisação por 24 horas terá atos em todas as capitais e será um “ultimato ao governo”, nas palavras do dirigente. “O governo terá mais 15 dias para nos receber e iniciarmos uma negociação. Caso contrário, começaremos a greve por tempo indeterminado a partir do dia 30 de março”.

O professor Pedro Lagenblad, do Instituto de Bioquímica Médica e ex-diretor da AdUFRJ, no entanto, questiona os prazos para uma ampla mobilização nacional. “Um movimento deste porte tem fôlego curto para pressionar, porque em abril entramos no período pré-eleitoral, no qual não será mais possível conceder reajustes ao funcionalismo, por força da legislação”, adverte. “Além disso, este é um período delicado, de recesso e preparação para o retorno presencial. Parar por tempo indeterminado é um cenário desastroso, porque prejudica os estudantes e vai nos custar muito caro. Temos outros caminhos possíveis, como paralisações pontuais e a realização de grandes atos de rua, desde que o cenário epidemiológico permita”, defende.

ATO PÚBLICO NO RIO
Servidores públicos federais na luta por recomposição salarial e pela valorização do Serviço Público Federal fizeram ato no Centro do Rio na terça-feira (15). Com faixas e cartazes, os manifestantes se concentraram em frente aos prédios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e nas escadarias da antiga sede do Ministério da Fazenda. Representes de sindicatos de servidores de autarquias como o IBGE e o INPI e de instituições de ensino participaram da atividade. O ato fez parte da mobilização nacional dos servidores públicos, teve o apoio do Andes e da AdUFRJ, mas não conseguiu levar às ruas um grande contingente de pessoas.

Adufrj em Macaé: professores debatem retorno presencial
A diretoria da AdUFRJ se reuniu com docentes de Macaé, nesta sexta-feira (18), para debater condições para o retorno presencial. Também participaram representantes do GT Pós-Pandemia e da Coordenação de Apoio ao Ensino. O primeiro período letivo de 2022 começa em abril e preocupa a comunidade universitária. Foi definida uma série de encaminhamentos: cobrança de passaporte vacinal nos prédios de Macaé; garantias do fornecimento de equipamentos de proteção individual; avaliação das condições de infra-estrutura predial e de redes para o retorno; além da cobrança de resolução do CEG sobre o atendimento aos estudantes com comorbidades e não vacinados.
O retorno presencial também será assunto do Conselho de Representantes da AdUFRJ, na próxima terça-feira (22). O encontro acontece virtualmente, às 10h.

“Foi um horror. Eu estava com minha aluna no computador, preparando a apresentação para a Semana de Integração Acadêmica, quando começou a chover forte. Abri a janela e mostrei a força da chuva para ela. Logo depois, interrompi a reunião. Eram 16h30. Meia hora depois, meu filho veio correndo e disse que havia um barulho estranho e que parecia a queda de algo grande. Corremos para a varanda. Os vizinhos estavam apavorados. O morro que fica atrás da minha rua desabou. O morro despencou. Um lamaçal imenso desceu e tirou um fino do meu muro. Ficamos sem luz. O transformador pifou, o 4G também. Ficamos ilhados, isolados, sem dar nem receber informação. No meu bairro não tem sirene. Sou professora da UFRJ há 30 anos, moro em Petrópolis há 22. Nunca vi nada igual. Estou bem, mas senti muito medo e uma necessidade enorme de saber notícias dos outros colegas da UFRJ que moram em Petrópolis”.

O desabafo de Ana Luísa Palhares de Miranda, professora da Faculdade de Farmácia, revela a aflição de quem sobreviveu à tragédia de terça-feira (15), em Petrópolis, WhatsApp Image 2022 02 18 at 18.30.23mas retrata também uma característica entranhada na comunidade acadêmica da UFRJ: a solidariedade. Em menos de 12 horas, professores, estudantes e técnicos organizaram redes de apoio e coletaram doações para aliviar a dor dos petropolitanos. Só no Fundão, há quatro pontos de coleta — veja os endereços na página 2.  “Temos que nos ajudar. São situações muito dolorosas. Tenho aluno que perdeu quatro parentes. É de partir o coração”, lamentou a professora Mônica Lacerda, coordenadora de pós-graduação do campus da UFRJ em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, onde trabalham e estudam mais de dez docentes e 30 alunos moradores de Petrópolis. “Graças a Deus, não aconteceu nada com a minha casa nem com a minha família, mas na cidade foram muitas mortes e muitas perdas”.

Aluno do mestrado de Caxias, o professor Deivid Ribeiro de Souza, de 35 anos, perdeu a esperança, uma tia, um tio e dois primos. Os quatro eram moradores do Morro da Oficina, área desfigurada pela chuva e que integra um desolador mapa criado em 2017 pela Prefeitura de Petrópolis. Segundo o estudo, há 27 mil residências em locais de risco alto ou muito alto de deslizamentos na cidade. “Só encontramos os corpos do meu tio e de um dos meus primos. Não tenho mais esperança de que os outros dois estejam vivos. Minha família materna acabou. Só sobrou a minha avó”, lamenta. Dona Olinda foi salva pela escola. Tem 85 anos e está cursando a 5ª série do Ensino Fundamental. Estava no colégio na hora da tragédia. “Ela é danada, sempre quis aprender. Agora está inconsolável”, conta Deivid. Sua história é marcada por tempestades e descaso das autoridades. “Sou sobrevivente da enchente de 1988. Naquela época, minha outra avó faleceu e minha mãe perdeu a casa. Eu e minha mãe viemos morar em Itaipava, mas o resto da família ficou em Petrópolis. Em 2011, de novo, fomos atingidos pelas chuvas, ninguém morreu, mas nossa casa ficou a um palmo de ser alagada. O mais impressionante é que nenhum de nós jamais recebeu ajuda do governo para sair das áreas de risco. É uma história muito triste, um drama que se repete”.

A tristeza familiar de Deivid não ofusca sua capacidade de analisar a conjuntura política que molda as tragédias naturais e políticas na região serrana fluminense. “Ninguém mora em comunidade ou em área de risco porque quer. Mora por necessidade, por falta de alternativa. Petrópolis é vitima da especulação imobiliária. Qualquer pedaço de terra aqui vira condomínio de luxo”, lamenta o professor, que se desdobra entre o serviço de inspetor escolar na rede estadual, a docência em escolas particulares e o mestrado na UFRJ. “Com toda essa dor, é muito bonito ver a força da solidariedade. Quando fui pegar minha avó, vi um monte de gente se ajudando, gente que não tem nada dividindo o nada. Só tenho a agradecer”.

Gratidão é a palavra que se repete na voz acelerada da professora Sabrina Silva, de 31 anos, moradora da Rua Teresa, uma das mais atingidas pelas chuvas. A enchente arrastou o apartamento de sua irmã, as paredes de sua própria casa e inundou a morada de seus pais, um pedreiro e uma dona de casa. “Perdemos tudo. Casas, móveis, eletrodomésticos, roupas, documentos, histórias. Minha mãe estava sozinha com meus sobrinhos, um bebê de seis meses e um menino de três anos. Ela ligou para o meu cunhado, ele veio correndo, mas dois minutos depois de pegar as crianças, o apartamento desabou. Perdemos as coisas, mas estamos vivos”, pondera a mestranda do campus de Caxias, que se divide entre o curso e o magistério em escolas privadas da região serrana.  

“Meus colegas me ajudaram de uma forma impressionante. Recebi tudo: roupas, dinheiro, comida, carinho. Fui abraçada, fui agarrada por uma onda de solidariedade. Só tenho a dizer muito obrigada. Sou só agradecimento. Não tenho palavras”, diz a moça, dez horas depois de retornar aos escombros de sua casa para tentar resgatar seus dois cachorros, Thor e Sheide. “A Defesa Civil não me deixa levá-los. Hoje eu fui lá e quase consegui. Mas me disseram que uma pedra estava tremendo e que era arriscado. Eles têm comida e água, mas não sei até quando aguentam”.

A professora Mônica Lacerda não aguentou ver a dor dos alunos vitimados pelas chuvas. Docente da UFRJ há dez anos, moradora de Petrópolis, ela lidera uma campanha para arrecadar doações no campus de Caxias. Em 48 horas, com a parceria incansável da assistente social do campus, Michele Rocha, a campanha rastreou todos os alunos e docentes que vivem no município e coletou recursos financeiros, mantimentos, roupas. “Temos que nos ajudar. É uma tragédia muito grande. Hoje fui para a escola estadual aqui perto de casa. Virou abrigo. Estão precisando de tudo, mas principalmente de brinquedos. As crianças estão traumatizadas e não há nada para passar o tempo. Eu não tenho medo. Tenho que ajudar. O Estado é omisso. Eu não sou. Faço o que eu posso. Sou uma cidadã de Petrópolis, voto aqui, meus filhos foram criados aqui”.

O professor Eduardo Mach, 64 anos, mora em Petrópolis há mais de quatro décadas, já testemunhou várias enchentes, mas nunca viu uma chuva como a de terça-feira — choveu 259,8 milímetros em 24 horas, maior volume desde 1932, quando o Instituto Nacional de Meteorologia começou a medir o índice pluviométrico da região. “Choveu mais do que nunca. Não aconteceu nada com a minha casa, moro numa região que ficou intacta, mas estou muito preocupado, passo os dias ligando para os amigos. Temos muita gente da UFRJ que mora aqui. Só na Escola de Química somos cinco professores. Assim que eu percebi o tamanho da tragédia, entrei em contato com cada um. Estão todos bem, graças a Deus, mas a cidade está destruída”, lamenta Mach, titular da UFRJ e ex-diretor da Escola de Química. “Que eu saiba, a situação mais grave entre os professores foi a da professora Ana Luísa, da Farmácia”.

A professora Ana Luísa Palhares de Miranda, a mesma que aparece no começo dessa reportagem, ainda não se recuperou. Moradora de Castelânea, um dos bairros mais sacrificados pelas quedas de barrancos, não consegue dormir direito, fica pensando nos vizinhos, remói a lembrança de uma senhora idosa que não queria abandonar a casa destruída pela chuva, pragueja contra as autoridades que insistem no descaso, e lista cada um dos conhecidos da universidade que moram em Petrópolis. “Temos que nos ajudar. De terça para quarta, eu não preguei o olho. Quando a chuva passou, colocamos os celulares para carregar no carro e comecei a catar notícias da família e dos colegas da universidade”, conta a docente, filha de Mariana Miranda, uma professora aposentada da UFRJ, de 87 anos, nascida em Petrópolis, em 31 de janeiro de 1934, durante uma enchente. “As chuvas fazem parte da história de Petrópolis, mas o descaso, a repetição das tragédias, isso é culpa dos homens”.

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