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Uma das atividades do primeiro dia de congresso foi a instalação da Comissão de Enfrentamento ao Assédio. A comissão é composta por cinco docentes da diretoria nacional do Andes e da diretoria da seção sindical anfitriã do encontro, a ADUFC. A aposta é que a criação de um grupo específico para receber demandas de assédio possa contribuir para coibir as agressões, além de punir eventuais agressores. “A comissão tem papel de acolhimento da vítima, de enfrentamento ao assédio, mas também é um espaço pedagógico”, ressalta a professora Maria Inês Escobar, diretora da ADUFC. “É importante que essa comissão exista para dizer que o assédio acontece muitas vezes entre nós. É um processo brutal, cujas vítimas são, majoritariamente, mulheres”.

Para a professora Sônia Pereira, também diretora da ADUFC, instalar a comissão é um importante passo institucional, mas ela precisa avançar. “Nosso papel é inibir e coibir ações discriminatórias. É um trabalho que precisa de continuidade, que deve ser fortalecido”.

HISTÓRICO

Criada pela primeira vez em 2018, no 37º Congresso do Andes, a Comissão de Enfrentamento ao Assédio foi uma resposta a um forte protesto de mulheres que denunciaram situações de assédio moral e sexual durante o congresso anterior, realizado em 2017, em Cuiabá. Na ocasião, elas leram um manifesto em que citavam diversos casos, e indicaram a constituição de uma comissão extraoficial de mulheres para apurar as denúncias. Não foram indicadas, no entanto, sanções aos acusados, que também não foram identificados.

"Do Café, guardo as melhores memórias possíveis. Nós nos conhecemos há quase 47 anos. Trabalhávamos juntos no antigo WhatsApp Image 2024 02 23 at 14.45.38Serviço Nacional de Teatro. Demorou em torno de 11 anos, desde que nos conhecemos, para que ficássemos juntos, mas sempre fomos parceiros no trabalho. Café era muito culto e aprendi demais com ele, mesmo nunca tendo sido sua aluna. Nosso setor era de pesquisa sobre dramaturgia brasileira, principalmente do século XIX. Muitos textos eram dados como perdidos, outros sofreram transformações. Era um trabalho bem intenso de pesquisa. Comparávamos diversas edições, alterações de textos. Foi um período extraordinário. Trabalhava conosco Fátima Saadi, grande parceira e amiga também.

Um dia, Café me perguntou se eu conhecia a Ilíada. Eu disse que não, porque não me sentia madura para um texto tão complexo. Eu era muito nova. Ele me perguntou, então, quem tinha colocado aquilo na minha cabeça e no dia seguinte me trouxe um exemplar e o leu todo comigo. Seguimos assim em outros grandes clássicos, heranças fundamentais da Literatura, do teatro, da poesia. Nós íamos ao cinema e ao teatro, jantávamos em seguida e discutíamos sobre o que tínhamos visto. Foram tantas as vezes que fomos expulsos de restaurantes, porque nos estendíamos bebendo vinho, lendo, conversando, trocando impressões, textos, poesias. Pensar nesses momentos me traz uma grande coleção de belíssimas lembranças.

Vivemos juntos desde 1988. O convívio, de quase 36 anos, foi muito especial. Café era um homem singular e apaixonado. E eu também muito apaixonada. Eu fui mimada demais. Todas as terças-feiras ele me trazia flores, durante muitos anos. Nossa diferença de idade era de 27 anos, mas o Café foi jovem bem prolongadamente. Ele tinha um humor extraordinário!

Outra marca forte era a sua simpatia. O riso sedutor, carismático, atencioso; sobretudo, muito cortês. E um homem preocupado com a família. Tivemos um filho juntos. Eu tinha já uma filha e ele duas, dos nossos casamentos anteriores. Minha filha o considera um segundo pai. Ela escreveu uma coisa muito linda: há espaço para ter dois pais no coração.

O Café era uma pessoa rara sob qualquer aspecto. Absolutamente singular. Ele me provocava muito a pensar por mim mesma. Fez parte da minha formação. Não havia uma relação hierárquica. Ele operava numa postura provocadora, mas muito horizontal. Foi uma pessoa decisiva para mim. Abriu espaço para o pensamento e para o meu inconformismo intelectual. Ele tinha muita paciência e eu tinha muita escuta. Nós tínhamos, aliás, muita escuta um para com o outro na vida. E eu não falo de casamento perfeito, mas de casamento feliz. Tínhamos um exercício de encontro, de inquietação e de paixão.

Com a universidade, era uma relação de amor. Ele gostava de mim, dos filhos, dos amigos e da UFRJ. Foi um permanente militante pela melhoria das condições de trabalho dos professores e um dos fundadores da AdUFRJ. Era muito respeitado e dedicado à contribuição acadêmica. Quando diretor da Faculdade de Letras, fundou uma especialização em teatro e depois o curso de Direção Teatral, alocado na Escola de Comunicação. Era um homem de iniciativas, de se entusiasmar e de levar ideias adiante. Realizou um congresso internacional na Letras que reuniu três mil pessoas do mundo todo. Foi uma gestão bastante bem-sucedida, considerando, inclusive, as contradições e entusiasmos do período de Redemocratização. Havia uma capacidade extraordinária de ouvir as contribuições, uma escuta de encorajamento. A sala dele sempre estava aberta.

Mas na universidade ele também teve muitos dissabores. Ele tinha enorme capacidade de aglutinação, mas também facilidade de encontrar oponentes. Mas não havia hostilidades. Era política sem picuinha. Havia respeito. Café ocupava um elevado lugar civilizatório. Nós vimos, recentemente, o que aconteceu na política do país. O ódio perdeu o pudor. Ele deixa também essa lição contra a política do ódio e ataques mesquinhos. Viveu a política com elegância.

Também na vida política enfrentou situações com muita coragem. Quando era diretor do Conservatório Nacional de Teatro do SNT, atual Escola de Teatro da Unirio, durante a passeata do Edson Luís, algum estudante jogou algum tipo de líquido da janela. Ele imediatamente mandou fechar todos os registros de água. Quando a polícia chegou, ele disse que era impossível aquilo ter acontecido, porque a escola estava sem uma gota. Ele era assim, de raciocínio muito rápido.

WhatsApp Image 2024 02 23 at 14.45.38 1Um momento terrível aconteceu no fim da década de 1950. Ele estava em São Paulo imprimindo folhetos do Partido Comunista Brasileiro. A polícia chegou. Ele conseguiu se esconder dentro da caixa d’água, onde permaneceu por longo tempo. Colocava algumas vezes o nariz para fora, para respirar, e voltava para debaixo d’água. Havia outros companheiros na casa. Ele ouviu tiros. Os companheiros foram assassinados ou levados. Horas depois, ele saiu caminhando pela linha do trem, completamente molhado, trajando só uma bermuda. Era só o que ele tinha naquele momento.

Outro fato, este do qual ele se orgulhava muito, foi ter ido a Cuba no primeiro ano da Revolução participar da campanha deWhatsApp Image 2024 02 23 at 18.19.29 alfabetização. Havia muitas crianças e adultos analfabetos, muita gente. De lá trouxe uma bandeira onde se lia “Territorio libre de analfabetismo”. Muitos anos depois, já diretor da Letras, ele recebeu uma autoridade do Ministério da Educação de Cuba que tinha sido uma das crianças (os “hijos de Fidel”) acolhidas em quarteis esvaziados dessa função e destinados a abrigos. Ele viu a bandeira num evento realizado lá na Letras para uma conversa ampla e ficou muito emocionado. Li poemas de Nicolás Guillen.

WhatsApp Image 2024 02 23 at 14.45.37Carmem exibe seu 'cafezeiro', presente oferecido pelos alunos de Direção Teatral, por ocasião do aniversário de dez anos do cursoDe vez em quando eu choro, mas procuro me manter em paz. Há lembranças tão vívidas de uma vida tão plena e rica, que me consolam. Ele estava sofrendo demais. Não merecia viver uma vida limitada. Ele já não conseguia mais ler, porque o tremor essencial atingiu a visão. Mas eu tinha como hábito ler para ele em voz alta desde os tempos de pesquisa. Foi realmente um hábito que nos acompanhou ao longo dos anos. Há poucos meses, nós relemos Os sertões, Grande Sertão Veredas, quase todos os romances de Machado de Assis, João Cabral de Melo Neto, Mário de Andrade e vários outros. Ele ficou muito feliz! Pausava a leitura, pontuava questões, discutia. Uma mente completamente produtiva. O tempo inteiro atuante. Ele tinha muita vitalidade, desejo de vida, amor pela vida no sentido mais pleno. Foi uma vida linda. Eu acho que sou uma privilegiada."

Carmem Gadelha
Professora Titular da Escola de Comunicação da UFRJ e companheira de vida (Em entrevista ao Jornal da AdUFRJ)

 

 

“A firmeza nos propósitos políticos do Café — como a defesa intransigente do ensino público, gratuito e de qualidade — convivia com um extremo humanismo e generosidade que desconcertavam os defensores de outro modelito de sociedade. Certa vez, um grupo que pensava radicalmente diferente das opiniões do Café veio tomar satisfações do então diretor da Faculdade de Letras. Entraram no gabinete sem pedir licença, pareciam ter uma faca entre os dentes, com cara de poucos amigos. Eu era assessor do Café e estava na sala. Café pediu que sentassem à mesa e, acendendo um dos seus clássicos charutos, tomou a palavra com um sorriso maroto: sejam bem-vindos, meus queridos amigos reacionários e privatistas! Em que posso lhes ajudar? A resposta veio de um dos invasores: Pois, professor Cafeteira, estamos aqui...Cafezeiro, corrigiu um dos seus amigos. Nessa hora Café deu uma gargalhada e consolou o autor do equívoco. Tudo bem, companheiro. Um outro derramou o cafezinho pelando nas pernas e deu um gritinho. Café deu de novo uma gargalhada, como sempre. O grupo também riu alto e parecia então desorientado e embaraçado. Acho que esqueceram o que tinham vindo fazer ali. Café deu alguns esclarecimentos sobre a esperança de ver uma sociedade brasileira mais justa e democrática, todos faziam que sim com a cabeça. Mudavam de opinião assim facilmente? As baforadas do charuto encobriam caras desfiguradas, me lembrei da cara do personagem no quadro Grito, do Munch. Logo perguntavam sobre as pesquisas do professor Cafezeiro, examinaram a lista enorme dos versos de Camões tronando sobre a mesa, um das pesquisas do Café da época, um disse que sabia ser ele um dos grandes especialistas brasileiros em teatro, outro, o mais tímido, fez a pergunta clássica sobre como saber o que é certo e o que é errado em Língua Portuguesa, Café gargalhou, sonoro, o ambiente era de confraternização. A sala evocava uma reunião de velhos amigos. Os abraços e tapinhas nas costas se seguiram acarinhados por risos e adjetivos elogiosos. Assim era Edwaldo Cafezeiro. Conquistava todo mundo sem jamais perder a atitude ética, a fraternidade e a alegria. Deixa muitas saudades.”

Godofredo de Oliveira Neto
Professor Titular da Faculdade de Letras da UFRJ

BENJAMIN GILBERT
1929-2024

foto perfil benjamin gilbert foto acervo farmanguinhosA AdUFRJ lamenta o falecimento, aos 94 anos, do professor Benjamin Gilbert, no dia 9 de fevereiro. Nascido em Felixtowe, Inglaterra, em 1929, Gilbert formou-se em Química pela Universidade de Bristol em 1950, onde também concluiu doutorado em 1954. Foi um dos fundadores do Instituto de Pesquisas de Produtos Naturais (IPPN) da UFRJ, onde atuou como professor visitante até 1972. Químico de formação, ele sempre se destacou pela pujança de sua produção acadêmica. O docente é autor de 120 publicações científicas, entre elas capítulos de livros sobre alcaloides indólicos e produtos naturais industrializáveis na Amazônia. Gilbert trabalhava na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) desde 1986, na área de Química de produtos naturais e colaborava na implantação da fitoterapia no Sistema Único de Saúde (SUS). Era pioneiro no campo de estudo de plantas medicinais.

Com extenso currículo, Gilbert foi pesquisador de diversas instituições no Reino Unido e nos Estados Unidos. No Brasil, atuou na formação de profissionais na Marinha, na Fiocruz, na Companhia de Desenvolvimento Tecnológico (Codetec), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e foi membro de comitês de doenças endêmicas e de Química do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Foi, ainda, sócio da Royal Society of Chemistry, American Chemical Society, Associação Brasileira de Química e Sociedade Brasileira de Química.
Instituições de ensino e pesquisa de todo o país lamentaram a perda do professor, que era pesquisador emérito da Fiocruz. A AdUFRJ lastima mais esta perda para a academia e presta sentimentos aos amigos e familiares neste triste momento.

 

MAURO BOIANOVSKY
1959-2024

20150526081341692936uProfessor de Economia da Universidade de Brasília, Mauro Boianovsky faleceu no último dia 21, aos 64 anos, em decorrência de câncer. Referência no campo da História do Pensamento Econômico, foi considerado um dos pesquisadores mais influentes do mundo, segundo a Universidade de Stanford.

Formado em Economia pela Universidade de Brasília, em 1979, Mauro fez mestrado na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro e doutorado em Cambridge, na Inglaterra. Era professor titular na Universidade de Brasília, onde lecionava Teoria do Desenvolvimento Econômico, na graduação, e História do Pensamento Econômico, na pós-graduação. A AdUFRJ lamenta a perda.

 

 

 

AFONSO CELSO PASTORE
1939-2024

PastoriNa quarta-feira (21), morreu o economista e ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore, aos 84 anos. Doutor em Economia pela USP, Pastore foi professor titular do Departamento de Economia, diretor da instituição e um dos economistas mais respeitados do país.

Em nota, o Centro de Debate de Políticas Públicas, criado por Pastore, afirma que ele teve enorme impacto na formação de várias gerações de economistas. “Se tornou um intelectual público na melhor acepção do termo: engajado em debates nos mais variados fóruns, capaz de traduzir a teoria econômica para o grande público, aberto a novas ideias, mas sem jamais abrir mão da coerência e do rigor acadêmico.” Condolências aos amigos e familiares.

luiz werneck vianna 1“Aluno de Ciências Sociais no IFCS, entre 1964 e 1967, Luiz Werneck Vianna nos ensinou a grandeza e o sentido deste curso do qual tenho a honra de ser professora. Seu pensamento, de natureza holística na consideração dos fenômenos sociais, indissociáveis nas suas dimensões antropológica, sociológica e política, mas, sobretudo histórica, nos alerta para o risco de interpretações compartimentadas, especializadas e alienantes, posto que resultam em reflexões anódinas e inodoras sobre uma pequena parte, enquanto o todo, confuso e doloroso, segue rejeitado. Este todo é o Brasil e Werneck nos ensinou a pensá-lo.

Nos idos de 2008, ensinou uma menina de 20 poucos anos a ler em uma semana 1.000 páginas de Oliveira Vianna, Tavares Bastos, Alberto Torres, Francisco Campos entre outros. Me ensinou a esperar suas pausas, seus silêncios. Me ensinou que os grandes autores são grandes por alguma razão e que precisamos ter a humildade de lê-los e mergulhar em seus textos.

Como intelectual público e professor, Werneck nos ensinou que toda reflexão é engajada. Fez isso de maneira arriscada. Diante da hegemonia de leituras acerca de nossa sociabilidade insociável e deletéria, Werneck dobra a aposta sobre a sociedade civil. E, em um contexto marcado pelo autoritarismo, defende na USP, na década de 1970, uma tese de doutorado intitulada Liberalismo e Sindicato no Brasil, apontando um caminho que muitos anos depois faria todo sentido para mim: o sindicalismo.

A despeito dessa incursão na academia paulista, ao meu ver, o pensamento de Werneck estabelece nossa marca, enquanto intelectuais cariocas. Aqui, nesse balneário de burocratas e funcionários públicos, onde o mercado e o liberalismo são ficções nebulosas, americanismo e iberismo, via prussiana e revolução passiva tornam-se ainda mais prementes como chaves de leitura.

Atuando no antigo Iuperj e na Escola de Magistratura do Rio de Janeiro, Werneck organizou nessas chaves o pensamento de gerações de sociólogos, antropólogos, cientistas políticos e operadores do Direito.”

Mayra Goulart
Cientista política e presidenta da AdUFRJ, foi aluna de Werneck

 

“Amigos e amigas, perdemos, hoje, um gigante: Luiz Jorge Werneck Vianna, aos 84 anos. Uma vida inteira dedicada a pensar o Brasil e a mudar esse22588SK1527444562G país tão desigual e violento. Foi ele que me recebeu no Partido Comunista Brasileiro nos anos 1970, na clandestinidade. Foi ele quem me ensinou a analisar a conjuntura, distinguir tática e estratégia, reler Marx e Gramsci com os olhos postos no presente, sem dogmatismos. Sua coragem, sua independência, seu espírito crítico, sua devoção à causa coletiva — sonhando um socialismo renovado, aberto e brasileiro — foram e são exemplos para minha geração e as seguintes. Em tudo que fazia punha toda a sua paixão. Era lucidez, inteligência, compromisso e paixão. Um erudito discreto, mas transgressor, uma usina exuberante de afeto e generosidade, às vezes disfarçada pela aspereza dos rompantes. Não conheço ninguém mais ético no desempenho de sua função acadêmica, ninguém mais avesso a cálculos carreiristas e a acomodações pusilânimes, ninguém mais íntegro.

Tive o privilégio extraordinário de ser seu aluno, amigo e companheiro, e de aprender com ele, mesmo quando divergíamos. Nos últimos tempos, quando problemas de saúde o limitavam, ele se mantinha otimista, absolutamente confiante num futuro radicalmente democrático e socialista, apesar de tudo. Werneck parte, nos deixa desolados e muito mais pobres, mas, como talvez dissesse: parte cheio de esperança no trabalho da história.
Todas as homenagens que prestemos à sua memória serão insuficientes para retribuir o que lhe devemos. Ele nos deixa como herança, à qual temos o dever de não renunciar, sua comovente fé laica nas classes populares e no potencial criador da política, aliada ao pensamento crítico. Querido Werneck, o enorme contingente de seus alunos, colegas, camaradas e amigos, enquanto tivermos força, estaremos na luta e, de pé, ouvindo seu nome, diremos, juntos: presente!”

Luiz Eduardo Soares
Antropólogo e cientista político

Para discutir o necessário avanço feminino na Ciência, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) recebeu o evento “Meninas e Mulheres na Ciência:WhatsApp Image 2024 02 23 at 20.49.04 Avanços e Perspectivas”, no dia 19. O encontro foi organizado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Na ocasião, foram entregues as outorgas do edital inédito lançado pela agência em 2023, o Programa de Apoio à Jovem Cientista Mulher com vínculo em instituições de Ciência e Tecnologia do estado. Para este edital, a Faperj destinou um total de R$ 13 milhões distribuídos para 70 pesquisadoras. Uma das vencedoras foi a professora Mayra Goulart, cientista política do IFCS e presidenta da AdUFRJ.

O termo de outorga foi assinado publicamente por Michele Gonçalves Monthé, que representou todas as contempladas. Michele é professora da Escola de Química da UFRJ e atua no Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Processos Químicos e Bioquímicos. “É fundamental que atuem diretamente na inclusão de mulheres nas áreas de ensino, ciência e tecnologia, engenharia e matemática, uma vez que representamos um terço de todos os pesquisadores”.

Ela também falou sobre a necessidade de ampliar o acesso de jovens mulheres negras à carreira docente. “Somos apenas 0,9% de todos os professores”. A docente aproveitou o momento para fazer uma homenagem à sua mãe, a professora Cheila Gonçalves Monthé. “Mulher negra, de origem humilde, superou todas os obstáculos e se tornou a primeira docente titular negra da UFRJ”.

Mayra Goulart considera que a ação da Faperj ajuda a mudar a realidade da pesquisa brasileira. “Há uma disposição hegemônica dos recursos da pesquisa no Brasil, que são concentrados em pessoas do sexo masculino e que já têm carreiras amplamente consolidadas”, aponta a docente. “Com isso, essa iniciativa contorna um viés que desfavorece professores jovens e mulheres, sempre marginalizados por critérios supostamente meritocráticos estabelecidos pelos grupos hegemônicos que são por eles favorecidos”.

A mesa de abertura teve a participação de importantes nomes do meio científico. Um deles, a professora Tatiana Roque, secretária municipal de Ciência e Tecnologia. “Precisamos de fomentos específicos, sim, para mulheres, para mães, para a gente combater o assédio, o teto de vidro, a desigualdade nas carreiras, as injustiças do ponto de vista dos direitos”, afirmou. “A ciência que a gente pratica, sem a participação igualitária das mulheres, se torna enviesada”, disse.

Apesar dos desafios, a presidente da ABC, professora Helena Nader, trouxe dados que mostram avanços. “A gente já tem paridade na pós-graduação. Isso é um marco. Também temos paridade em publicações. Não temos paridade nas diferentes áreas. Esse incentivo precisa começar na pré-escola”, afirmou. Ela também alertou para o refluxo feminino nas chamadas ciências duras. “Nós vivíamos um aumento de meninas nas áreas exatas e agora temos visto uma diminuição. É preciso saber o motivo”.

O machismo estrutural, para o professor Jerson Lima, presidente da Faperj, está na origem da questão. Docente da UFRJ, o professor deu exemplo de dois editais da Faperj: um lançado para pesquisadores com vínculo institucional e outro para pesquisadores sem vínculo. O edital com vínculo teve maior participação de homens e só 35% de mulheres, enquanto o que não necessitava de vínculo institucional teve 62% de participação feminina. “Isso nos mostra um quadro preocupante. Mulheres estão tendo menos espaço nas universidades”, lamentou.

Para atuar na linha de apoio às mães, a Faperj lançará em maio deste ano um edital específico para esse público. A iniciativa terá a parceria do Instituto Serrapilheira e do movimento Parent in Science. Os apoios devem totalizar R$ 120 mil para cada projeto selecionado.

OUTROS EDITAIS
Há outras boas, mas ainda recentes e parcas, iniciativas espalhadas pelo país com o objetivo de ampliar o acesso de mulheres na Ciência. A Faperj é uma das pioneiras em editais voltados à equidade de gênero. Hoje, a fundação tem dois específicos: o de Meninas e Mulheres nas Ciências Exatas e da Terra, Engenharias e Computação, em segunda edição, e o edital de apoio à Jovem Cientista Mulher. Além disso, a Faperj busca garantir a equidade de gênero entre vencedores dos editais, amplia prazos para contagem de produtividade para pesquisadoras mães e aplica, desde 2018, a licença-maternidade para pesquisadoras e bolsistas.

A Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo tem iniciativa semelhante: o edital Mulheres na Ciência, que seleciona projetos de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação coordenados por pesquisadoras.

Este ano, a Secretaria Municipal de Ciência e Tecnologia do Rio lançará o segundo edital do Prêmio Elisa Frota Pessoa, destinado aos melhores artigos escritos por mulheres sobre Ciência e Tecnologia na igualdade de gênero. A cerimônia acontece no dia 8 de Março. As universidades federais de Santa Catarina e de Alagoas também têm prêmios destinados a mulheres na Ciência. As premiações são voltadas ao público interno das duas instituições.

O CNPq e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação lançaram no ano passado a terceira chamada pública Meninas e Mulheres nas Ciências Exatas, Engenharias e Computação, destinada a estudantes do ensino médio e de graduação. O edital distribui R$ 100 milhões às vencedoras. Outras duas chamadas aconteceram em 2013 e em 2018. O projeto prevê que pelo menos 30% das bolsas sejam destinadas a negras e indígenas.

A Universidade Federal do Mato Grosso do Sul tem um programa institucional de Mulheres na Ciência. O edital busca apoiar com auxílio financeiro docentes e técnicas da universidade que coordenem projetos de pesquisa e inovação. O exemplo é seguido pelo Instituto Federal de Sergipe.

A Universidade de Brasília tem o edital Mulheres e Meninas na Ciência: o Futuro é Agora, destinado a projetos de extensão que atuem incentivando a participação de meninas das escolas públicas do Distrito Federal nas áreas de Ciência e Tecnologia.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) tem dois editais para estimular a igualdade de gênero na ciência. Um deles é o Programa Amazônidas – Meninas e Mulheres na Ciência. O outro é o Programa Fapeam: Mulheres na Ciência, específico para o interior do estado.

Já o Instituto Federal do Rio Grande do Norte lançou a segunda edição do edital “Projetos de Pesquisa e Inovação com Mulheres Jovens Cientistas”, voltado a projetos de pesquisa e inovação que envolvam alunas do ensino médio ou da graduação.

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