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Lucas Abreu
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Apandemia colocou a Ciência no centro das discussões da sociedade. O desenvolvimento científico é a maior arma para enfrentar a covid-19, e a rotina dos pesquisadores foi alterada em todos os campos do conhecimento. Quem lida diretamente com pesquisas ligadas ao combate à doença se viu diante de desafios urgentes, mas outras áreas de pesquisa também foram afetadas, seja por demandas da sociedade e até pelo isolamento social, que mudou o fluxo de trabalho. Todos têm em comum o cansaço nesse um ano de trabalho incessante e confinamento.

“Por uma razão boa, que é o fato de as pesquisas estarem dando certo e encontrando aplicações práticas, a carga de trabalho é imensa”, desabafou a professora Leda Castilho, do Laboratório de Engenharia de Cultivos Celulares da Coppe. As pesquisas em questão são a produção em escala piloto da proteína que recobre a superfície do vírus e seu uso no desenvolvimento de testes sorológicos e de uma vacina contra o coronavírus. Além disso, a proteína também tem sido usada pelo Instituto Vital Brazil para desenvolver um soro equino para combater a covid-19. “A gente sente uma responsabilidade de fazer tudo o melhor e o mais rápido possível para contribuir no enfrentamento da pandemia, com a consciência de que não podemos parar”, contou a professora, que disse tirar daí a força para uma densa rotina de trabalho: “Nos últimos 12 meses, o único dia em que não trabalhei foi em 1º de janeiro”.

Leda Castilho explicou que mudar o foco do seu trabalho para o coronavírus não foi tão complicado. “O que estamos fazendo é muito semelhante ao que já fazíamos para proteínas de outros vírus  e para outras proteínas que são usadas como medicamentos”, contou a professora. “O meu laboratório trabalha para desenvolver essas tecnologias”. A sequência com que as pesquisas aconteceram foi uma resposta às demandas mais urgentes. “No começo da pandemia, a primeira emergência era ter testes, então passamos a produzir a proteína e a trabalhar junto com o professor André Vale, da Biofísica, para desenvolver o teste S-UFRJ”, contou a professora.

A pandemia exigiu o melhor da Ciência em todas as suas áreas. Guilherme Horta Travassos é professor do Programa de Engenharia de Sistemas e Computação da Coppe, e faz parte do GT Coronavírus da UFRJ desde o primeiro momento. Sua principal colaboração foi a criação do covidímetro, ferramenta utilizada para monitorar a pandemia no Rio de Janeiro. “Eu sempre estive envolvido com a solução de problemas, mas nunca de um problema tão insano quanto essa pandemia”, contou o professor. “Caí na vertente tecnológica do grupo, e busquei contribuir trazendo a pegada tecnológica. É um grupo formado por mentes brilhantes, que buscou se antecipar às questões da pandemia”, elogiou o professor.

A experiência de trabalho multidisciplinar é um dos trunfos apontados pelo docente para o sucesso do GT. “É um problema extremamente grave, que afeta a todos, o que nos permitiu ter uma agenda de trabalho comum”, exaltou Travassos, que vê no aprendizado coletivo um ganho para o futuro. “Foi um ano desafiador e de transformações. Problemas extremamente complexos ficaram menos complexos graças à soma das cabeças brilhantes que temos nos diferentes centros da UFRJ. Se tirarmos proveito disso, teremos uma revolução científica na UFRJ, porque quebramos o conceito das ilhas, e estabelecemos um continente científico dentro da nossa universidade”.

O combate à doença exigiu pesquisas, mas não foram as únicas demandas geradas pela pandemia. “Nós, economistas, fomos chamados a responder a questões bastante imediatas”, contou a professora Marta Castilho, do Instituto de Economia. “A covid-19 entrou na vida do meu grupo de pesquisa, não só nas vidas pessoais, mas como tema de estudos. Estudamos os impactos da pandemia na economia brasileira, analisando aspectos macroeconômicos e setoriais”, explicou ela, que ainda lembrou da centralidade das discussões econômicas e do falso dilema criado entre a vida e a economia. “Em economia somos chamados o tempo todo para o debate público. Tínhamos o desafio de mostrar que não existe essa contradição, e que devemos buscar formas de minimizar os custos econômicos da pandemia”.

Na avaliação da professora Marta, foram dois os principais problemas enfrentados pelos pesquisadores durante o isolamento social. “Perdemos uma parte do convívio que era frutífero para as reflexões e para o desenvolvimento dos trabalhos. A falta de convívio social atrapalha um pouco por tirar essa possibilidade de troca”, observou. O segundo problema é o que ela chamou de “perda das fronteiras do que é tempo e lugar de trabalho”, o que faz com que as jornadas de trabalho sejam mais intensas e mais longas. “Estamos trabalhando mais e necessariamente estamos sendo mais produtivos”, resumiu.

Para o diretor do Instituto de História, Antônio Carlos Jucá Sampaio, os arquivos públicos fechados estão atrapalhando as pesquisas de sua área. “Há muitos pesquisadores que estão com as suas pesquisas paradas por não poder acessar documentos históricos”, contou. Outro problema relatado pelo diretor é a falta dos eventos tradicionais da área. Mas, ao mesmo tempo, o isolamento social e a adoção de tecnologias de comunicação trouxeram uma nova possibilidade. “Estamos fazendo outros tipos de eventos, virtuais, com a presença de convidados internacionais, inclusive. E esse tipo de evento tem possibilitado mais ações de extensão ligadas à história pública. Nesse diálogo com a sociedade, o historiador constitui e reconstitui seus objetos de estudo”.

Na avaliação do professor Ildeu de Castro Moreira, presidente da Sociedade Brasileira para Progresso da Ciência, o saldo é de um ano ruim para a ciência brasileira. “Um ano extremamente complicado. Ruim do ponto de vista da postura do governo e dos cortes no investimento em Ciência, apesar da pandemia”, criticou o professor. “As universidades, institutos de pesquisa e pesquisadores estão tentando se desdobrar para enfrentar a pandemia em condições muito difíceis, porque é um governo federal negacionista”. Ildeu defendeu que os investimentos em Ciência e Tecnologia são um caminho não só para a saída da pandemia, mas para o avanço do país. “A Ciência e Tecnologia são importantes para a sociedade, para a economia do país, para o uso sustentável das suas riquezas e potencialidades. Espera-se que, em um momento como esse, a maior parte da sociedade brasileira se dê conta disso”.

Ana Beatriz Magno, Alexandre Medeiros e André Hippertt
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Enfrentar a pandemia é viver no desterro de um Brasil sem rumo. É uma espécie de exílio que nos aparta da vida real, da lida de carne e osso, e nos joga num continente de medo e horror. Professores e alunos da UFRJ estão desterrados desde 16 de março do ano passado, quando a universidade suspendeu as aulas presenciais e a terra do conhecimento se transformou num exaustivo mosaico virtual e luminoso que se acende a cada aula, a cada reunião, a cada telejornal com os números e notícias da tragédia brasileira.

Incansáveis, professores e alunos da maior universidade do Brasil se desdobram para transformar a angústia em compromisso e Ciência. Nos últimos 12 meses, centenas de docentes, estudantes e técnicos aceleraram pesquisas para ajudar no combate ao coronavírus, produziram milhares de litros de álcool em gel, criaram um sistema ágil de testagem e teceram uma potente rede de solidariedade interna e externa.

“A gente sente uma responsabilidade de fazer tudo o melhor e o mais rápido possível para contribuir no enfrentamento da pandemia, com a consciência de que não podemos parar”, conta a professora Leda Castilho, do Laboratório de Engenharia de Cultivos Celulares da Coppe, uma das responsáveis pela pesquisa do soro anti-covid, feito com base em plasma equino, notícia alvissareira  no tratamento da doença.  “Nos últimos 12 meses, o único dia em que não trabalhei foi em 1º de janeiro”.
Em respeito ao compromisso dos 4.198 professores, 9.200 técnicos e 65 mil alunos da UFRJ com a Ciência, a Educação e a Cultura, o Jornal da AdUFRJ preparou uma edição especial sobre os desafios impostos à comunidade acadêmica desde março de 2020. São 18 páginas, intercaladas com vigorosos depoimentos de professores e ilustradas com desenhos de alunos do 5º ano do Colégio de Aplicação. Também recuperamos os principais fatos ocorridos no país e na UFRJ no último ano, homenageamos os mortos, celebramos a esperança estampada no rosto de cada um dos vacinados e reverenciamos o trabalho dos profissionais que estão salvando vidas nos hospitais da universidade.

“Sabemos da pressão no sistema de saúde. Entramos na guerra porque sabíamos que a guerra chegaria até nós, mas também por entender o nosso papel social”, conta Rosana Lopes Cardoso, diretora médica adjunta do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho. “O papel do hospital público é atender a população”.
Com quase 3 mil mortes diárias e com uma cobertura vacinal ainda pífia, o Brasil entra no 13º mês de pandemia com o quarto ministro da saúde, e cada vez mais exige uma agenda firme de resistência ao genocida de plantão. “A pandemia nos tirou da rua e nos jogou em um arremedo de vida, uma vida virtual. A pandemia exigiu fortalecer as novas formas de luta e sindicalismo que defendemos desde 2015 na AdUFRJ”, resume a presidente do sindicato, professora Eleonora Ziller. “Não vamos desistir”.

Como ensinam as crianças em seus desenhos — espécie de oásis de delicadeza em tempos de brutalidade —, a vitória da esperança sobre a dor também depende de cada um de nós, de nossa empatia, resiliência, do uso de máscara, do distanciamento social e da valorização da Ciência, temas tão caros para a comunidade da UFRJ.
“A UFRJ suspendeu as atividades presenciais não essenciais para proteger o corpo social e ajudar a diminuir a transmissão da covid-19”, explica a reitora, professora Denise Pires de Carvalho, primeira mulher a ocupar a reitoria, e que jamais imaginou passar mais da metade de seu mandato numa universidade desterrada de si mesma. “Os números estão muito graves. Não há como voltar agora. Temos de ter responsabilidade e reafirmar a importância da Ciência. Essa é a forma de construir a verdadeira sociedade do conhecimento, formada por pessoas com mais empatia e respeito ao outro e ao meio ambiente”.

Respeito e empatia traduzem a história do professor emérito da Letras, Edwaldo Cafezeiro, que, aos 90 anos de idade, comemora com a alegria de menino suas duas doses de imunização. “Me vacinei. Me senti muito bem, aliviado. Eu recomendo que todas as pessoas tomem a vacina para que tenhamos segurança e para que essa doença acabe logo”. Com o mesmo espírito de Cafezeiro, desejamos saúde, vacina já e boa leitura.

Lucas Abreu
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Nas ruas, mas sem aglomerações. Assim foram as celebrações do 8 de março da AdUFRJ, que preparou projeções com homenagens às mulheres da Ciência e exibiu em pontos do Rio e de outras cidades do Brasil ao longo da semana passada. As projeções exaltavam o papel da mulher na academia e reivindicavam mais inclusão no meio científico. A ação foi fruto de uma parceria entre a AdUFRJ e o Observatório do Conhecimento e contou com o apoio de outras associações docentes e sindicatos de todo o país.

“As projeções, quando filmadas, produzem imagens de alto impacto”, observou a professora Christine Ruta, do Instituto de Biologia, diretora da AdUFRJ e idealizadoraWhatsApp Image 2021 03 12 at 19.31.021 da manifestação. “É como se a AdUFRJ estivesse ocupando momentaneamente aquele espaço. Em ocasiões usuais ocuparíamos a rua. Mas, por enquanto, estamos ocupando alguns prédios”, justificou a professora, lembrando o momento que vive o mundo. “Em tempos sem pandemia, muitas ações podem ser pensadas, mas atualmente temos que ter criatividade para explorar ações sem aglomerações”, pontuou.

Christine Ruta ressaltou a importância de homenagear as mulheres cientistas. “Historicamente, a Ciência tem sido um lugar masculino, com raras exceções. Hoje estamos em um processo de reverter esse cenário, e é importante mostrar que a mulher tem ocupado cada vez mais espaços em todos os ramos da Ciência”, defendeu. “Estamos trabalhando para que Marie Curie, Hipácia, Bertha Lutz e outras não sejam mais exceções”.

As projeções ocuparam os paredões externos do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, na Ilha do Fundão, a Escola de Música, na Lapa, e o Campus Macaé da UFRJ. Ganharam também as ruas de São Paulo, Campinas, Salvador e Recife, graças ao trabalho dos sindicatos locais (respectivamente ADUFABC, ADUNICAMP, APUB e ADUFEPE). As projeções foram filmadas, e o resultado do trabalho é um vídeo de quatro minutos com as imagens embaladas pela música “Dentro de cada um”, interpretada por Elza Soares. Você pode assistir ao vídeo em youtube.com/adufrj.

WhatsApp Image 2021 03 12 at 19.31.032A estimativa dos organizadores da iniciativa é de que o vídeo com as projeções tenha sido visto por mais de 40 mil pessoas nas redes sociais, com mais de 2.800 comentários, um resultado considerado excelente pelo grupo. Mas Christine Ruta ainda chama atenção para outro impacto importante da ação. “Em termos de política sindical, esta campanha também foi extremamente positiva, uma vez que articulou diversas ADs do Brasil, que representam uma grande diversidade de posições no movimento dos professores”, defendeu a professora.

Lucas Abreu
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O governo Bolsonaro deu mais uma volta no parafuso do autoritarismo. O alvo agora é a professora Erika Suruagy, vice-presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal Rural de Pernambuco (Aduferpe). Erika foi intimada a depor na Polícia Federal graças a um inquérito criminal que investiga outdoors colocados em várias cidades de Pernambuco. As peças criticavam os ataques do governo à Educação e ao SUS, mencionavam o número de mortos pela covid-19 (120 mil vítimas à época) e caracterizavam Bolsonaro como “o senhor da morte chefiando o país”.

As placas foram instaladas em setembro, e eram parte de uma campanha da Aduferpe junto com outros sindicatos locais, como a Seção Sindical dos Docentes da WhatsApp Image 2021 03 12 at 19.31.04Professora Erika Suruagy foi intimada pela Polícia FederalUniversidade de Pernambuco (ADUPE) e o Sindicato dos Servidores dos Institutos Federais de Pernambuco (SINDSIFPE). “O ministro da Justiça, com base em um requerimento do presidente Jair Bolsonaro, solicitou a abertura de um inquérito para apuração, alegando atentado à honra do presidente”, contou a professora Erika, que soube do inquérito depois de ter sido intimada pela Polícia Federal para prestar esclarecimentos.

Segundo a professora, a delegada da Polícia Federal tomou seu depoimento e entendeu se tratar de uma campanha sindical. Mesmo assim, não encaminhou o inquérito para arquivamento, deixando a decisão para o Ministério Público. “Nesse momento achamos que era importante denunciar, tornar público o que estava acontecendo”, diz Erika, que foi intimada porque era a presidente da Aduferpe na época da publicação dos outdoors.

A docente está tranquila com o aspecto legal do caso. “Nós entendemos que não é crime, e mais ainda porque estou em um mandato coletivo, eu represento 1.200 professores”, explicou ela, que chama a atenção para o lado político da decisão do governo. “O objetivo é intimidar, dizer que quem abrir a boca para criticar vai para a cadeia”, avaliou a professora, que tem sido atacada nas redes sociais por apoiadores de Bolsonaro. “Essas intimidações estão acontecendo com cientistas e outros professores. Nós temos que nos posicionar”.

O Andes divulgou uma nota de apoio à professora e criticando o governo. “De modo absurdo e afrontoso às liberdades políticas inscritas na Constituição de 1988, a Polícia Federal dá continuidade à infundada queixa”, diz a nota do sindicato, que lembrou que a medida é parte de “outras marcas de perseguição docente”, como o caso dos professores da UFPEL que tiveram que assinar um Termo de Ajustamento de Conduta. A UFRPE também publicou uma nota de solidariedade, reafirmando “o direito legítimo a manifestações públicas, sejam de origem do movimento sindical ou de qualquer outra, ressaltando-se o caráter inconstitucional e inadmissível da censura”.

A UFRJ divulgou nesta sexta-feira (12) uma nota de apoio à professora. “Prestamos solidariedade à Érika Suruagy neste momento de tensão. Lembramos, ainda, que a universidade federal é instituição de Estado e, por isso, não é subserviente deste ou daquele governo, sendo portadora de autonomia didático-científica, conforme a Carta Magna afirma”, diz a nota. Leia a íntegra em (https://ufrj.br/2021/03/12/nota-de-apoio-a-professora-erika-suruagy-da-ufrpe/).

Na avaliação da professora Eleonora Ziller, presidente da AdUFRJ, a instauração do inquérito a pedido de Bolsonaro é mais uma manifestação de um presidente que se comporta como uma criança mimada. “O raciocínio político dele é infantil e precisa de limites”, explicou Eleonora, que considera que o perigo maior é as pessoas acharem normal que o presidente se comporte assim.

“Nós temos que repudiar isso nacionalmente e com muita força. Ele ultrapassou todos os limites do ridículo”, defende Eleonora, que acha que o presidente tem que ser responsabilizado pela péssima política de condução da pandemia. “Vamos buscar modos contundentes de demonstrar isso a cada dia. Não recuaremos um milímetro”, disse Eleonora, que também se solidarizou com a professora Erika Suruagy.

Para o presidente do PROIFES, Nilton Brandão, a situação é preocupante, e cita o caso dos professores da UFPEL. “Temos um governo policialesco que não admite nenhuma crítica e que, portanto, vai tentar penalizar qualquer cidadão que possa demonstrar contrariedade em relação às ações do governo”, disse o professor, que acredita que o Brasil caminha para um regime autoritário.

WhatsApp Image 2020 10 24 at 00.57.18Josué Medeiros
Professor de Ciência Política do IFCS e diretor da AdUFRJ

O título desse artigo poderia ser usado em 1978, quando, do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, Lula – então presidente da entidade – recebeu um telefonema informando a eclosão de uma greve na Scania e correu para apoiar e dar suporte. Iniciava-se o movimento grevista que se tornou nacional e ajudou a pôr fim à ditadura militar instalada em 1964. Mudou tudo na política brasileira.  

Poderia também ser usado em 1980, quando o mesmo Lula resolveu sair dos limites sindicais e fundar um partido político dos trabalhadores. O PT se tornou o primeiro e único partido de massas nacional do nosso sistema político. Organizou as energias de uma diversidade de movimentos sociais diferentes. Conquistou prefeituras, governos estaduais, presidência. Criou e implementou políticas públicas inovadoras. Mudou tudo na política brasileira.

O título serviria ainda para o fatídico dia 7 de abril de 2018, quando o criminoso juiz Sérgio Moro expediu o mandado para prender Lula no bojo da farsa jurídica da Lava Jato. O ex-presidente foi para a sede do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo não para se esconder, mas para fazer um grande ato político de defesa da democracia. Apesar dos pedidos de correligionários para resistir, Lula se entregou e, desde então, lutou para provar sua inocência. Bolsonaro só foi eleito pela ausência de Lula. Mais uma vez, mudou tudo na política brasileira.

Apesar das muitas possibilidades históricas de uso desse título, nossa escolha foi usá-lo para a nova conjuntura de Lula Livre e com os direitos políticos plenamente restituídos. O motivo é simples: é um erro achar que isso ocorreu de dentro dos gabinetes do STF, graças a uma “decisão” do ministro Edson Fachin no dia 8 de março de 2021.

Isso foi resultado de uma luta molecular que foi travada sem parar desde 2016, pelo menos. A começar pelo próprio Lula, que se recusou a desistir. Com o tempo, essa luta conseguiu ir além da esquerda, o que é fundamental para qualquer pauta ser vitoriosa. Setores das classes médias, da mídia, das elites políticas, jurídicas e intelectuais perceberam que a operação Lava Jato mostrou a antessala do autoritarismo no Brasil. Não por acaso, um dos seus principais resultados foi a eleição de Jair Bolsonaro.

Assim, o ato decisivo da nova conjuntura não foi a decisão de Fachin, mas sim o modo como Lula deu consequência a ela. De novo, da sede do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, no dia 10 de março. Em um discurso histórico, o maior líder político do país mostrou o tamanho da sua força. E ao fazer isso, refletiu o tamanho da pequenez do atual presidente. Uma vez mais, tudo mudou na política brasileira.

Uma nova chance para a democracia
O quadro político até fevereiro era extremamente favorável a Bolsonaro. Sua vitória nas eleições para a mesa diretora da Câmara garantiu estabilidade e proteção institucional, complementando um escudo que ele já tinha no Judiciário (vide decisão do STJ que anulou as investigações contra seu filho, o senador Flávio Bolsonaro). Tudo isso foi operado com a ajuda dos militares, o que reforça sua posição institucional.

Na sociedade, apesar da tragédia econômica e da pandemia, o quadro se mostrava previsível. Sem ruas para questioná-lo, Bolsonaro controlava a agenda. A vacinação mais cedo ou mais tarde deslancharia e sobre esse tema ele repetia o padrão de outras polêmicas: ora diz que é contra, ora diz que é favor, e com isso mantém o controle da situação. Na economia, apesar da inflação dos alimentos, aluguel e combustíveis, um novo auxílio emergencial garantia um alívio para os mais pobres e, de tabela, na sua popularidade. Por fim, na pauta dos direitos, Bolsonaro preparava um novo avanço do armamento e da defesa de uma concepção de família que ataca a diversidade.

Ele não enfrentava resistência das ruas. Não enfrentava resistência do sistema político. À direita, DEM e PSDB em crise. À esquerda, as disputas entre Ciro e PT falavam mais alto do que a unidade para lutar contra o governo. Novas lideranças com disposição de mudar isso (Boulos, Manuela, Dino) não têm forças para fazer isso sem os dois principais atores.

E as águas de março trouxeram dois grandes eventos que alteraram a luta política e acabaram com a posição confortável de Bolsonaro. O primeiro foi o tsunami da pandemia. Conforme alertaram cientistas do Brasil inteiro, de todas as universidades e institutos de pesquisa, nossa tragédia sanitária se consolidou. Estamos há 50 dias com média móvel acima de mil óbitos. Somos hoje o país em que mais se morre por covid-19. Os sistemas de saúde estaduais colapsaram de norte a sul. Por dois dias seguidos tivemos mais de dois mil mortos pelo coronavírus.

O segundo foi Lula Livre para disputar as eleições. Seu tamanho e sua capacidade política projetam uma esquerda unificada desde já em torno dele. E, conforme ele mesmo indicou, rodando o Brasil saindo da paralisia. Seu histórico pronunciamento no Sindicato dos Metalúrgicos indica ainda uma disposição para ampliar as conversas com setores da direita democrática. Sem isso, será impossível tirar Bolsonaro e refazer nossos pactos democráticos.

Se vai dar certo, não sabemos. As elites ainda se mostram tolerantes demais com a tragédia Bolsonaro. Sua demofobia estrutural insiste em manter Lula e os setores populares fora da mesa. Mas, até fevereiro de 2021, o jogo estava encerrado. Março reabriu a luta política. É um caminho árduo, mas agora temos a oportunidade de caminhar.

E nós nisso tudo?
De nossa parte, como um sindicato de base e como cidadãs e cidadãos, o que podemos fazer para ajudar é aprofundar nossa capacidade de dialogar e mobilizar. Precisamos fazer mais conversas com os amplos setores da sociedade que não aguentam mais Bolsonaro. Tal como fizemos na AdUFRJ e no Observatório do Conhecimento – especialmente a APUB, da UFBA, que protagonizou o ciclo de debates Pensando a Universidade. Especialmente a mesa “Economistas Pensam a Universidade”, com a presença da economista e nossa colega da UFRJ Esther Dweck, em companhia de Laura Carvalho, Monica de Bolle, André Lara Resende e Armínio Fraga. Com esse debate, conseguimos furar a bolha e consolidar ainda mais a ideia de que a universidade e a pesquisa precisam de mais verbas. Dinheiro para Educação e Ciência não é gasto, é investimento!

Além do diálogo, a mobilização. Participamos ativamente das carreatas contra Bolsonaro organizadas pela Frente Povo Sem Medo e Frente Brasil Popular. Apesar dos limites desse tipo de ato, a receptividade das pessoas tem sido animadora e indica um ambiente propício para mobilizações de rua assim que a pandemia permitir. E temos também a campanha Educação tem Valor, do Observatório do Conhecimento, pela qual podemos pressionar virtualmente os parlamentares pela recomposição do nosso orçamento. Não deixe de acessar a plataforma http://pressione.observatoriodoconhecimento.org.br/ . A mobilização virtual tem dado resultados em várias frentes e com mobilização vamos reverter os cortes no orçamento das universidades!

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