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WhatsApp Image 2021 12 10 at 20.20.24Um dos pilares condenados pela Defesa Civil, no bloco C do prédio da reitoria. Trecho está interditado - Fotos: Alessandro Costa

A universidade vem se desdobrando para atender à determinação judicial de retorno das aulas presenciais. Mas não é fácil voltar. Quem percorre os corredores dos edifícios do Fundão percebe que faltou ao desembargador Marcelo Pereira da Silva, do Tribunal Federal da 2ª Região, conhecer a realidade. A precária infraestrutura e o subfinanciamento da instituição não foram considerados na sentença e ajudam a explicar os ainda tímidos números de disciplinas presenciais oferecidas neste semestre.
A pró-reitoria de Graduação informa que 42,7 mil alunos se inscreveram para 2021.2, mas 41,5% das disciplinas continuam sendo remotas. Apenas 2,6% são integralmente presenciais e a maioria, 55,9%, é composta por disciplinas híbridas, que conjugam aulas remotas e aulas presenciais.
Passados 24 dias do início do semestre letivo, ainda há espaços da universidade sem condições mínimas para receber um grande volume de pessoas. É o caso, por exemplo, do edifício Jorge Machado Moreira (JMM), que abriga o gabinete da reitoria. O prédio era a casa da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Escola de Belas Artes e do Instituto de Pesquisas em Planejamento Urbano e Regional. Era. Desde 2016, quando o oitavo andar foi destruído por um incêndio, a situação do prédio – tombado pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, da prefeitura carioca – só se deteriorou. As unidades precisaram buscar abrigo em outros locais para suprir a falta de salas de aula.
De transitória, a situação se tornou permanente. Há cinco anos, esses cursos necessitam de instalações cedidas para exercerem suas atividades. “Nós alocamos mais de 600 horários para aulas por semestre sem termos uma sala de aula para chamar de nossa”, reclama a diretora da Escola de Belas Artes, professora Madalena Grimaldi. Antes do incêndio, a EBA ocupava as salas do sexto e sétimo andares do JMM, além dos ateliês e oficinas do térreo e segundo andar. “Desde 2016 dependemos da acolhida da Faculdade de Letras, do CT, do CCMN e da Educação Física para conseguirmos atender aos nossos alunos”, conta a docente.WhatsApp Image 2021 12 10 at 20.31.57Sala no sexto andar do JMM não pode ser utilizada
A EBA voltou presencialmente com disciplinas práticas, nos ateliês localizados no Bloco D do edifício. “É uma volta parcial e as turmas estão divididas em pequenos grupos. As disciplinas teóricas, por enquanto, seguem remotas”, diz. Mesmo com os empréstimos de salas em outras unidades, a diretora afirma que não há condições de retomar as aulas integralmente presenciais, caso o distanciamento social permaneça necessário no ano que vem. “Sem o JMM, não tenho como alocar 15 cursos nas atuais condições de biossegurança. Não há espaço para isso”. Além das salas, a diretora reforça a necessidade de impermeabilização do bloco D, por conta das graves infiltrações que atingem os ateliês. “Quando chove, molha tudo”.

IMPOTÊNCIA E ABANDONO
“O Jorge Machado Moreira é o edifício que concentra o maior número de problemas estruturais, resultado do abandono de décadas”, reconhece o vice-reitor da UFRJ, professor Carlos Frederico Leão Rocha. “Vamos gastar R$ 11 milhões com as obras prioritárias, mas eu precisaria de R$ 50 milhões para deixar o prédio adequado para o uso. Eu não vejo de onde tirar esse volume de recursos. A sensação que tenho é de impotência”, lamenta o dirigente.
As obras avançam na lentidão em que os recursos chegam até a universidade. Em abril deste ano, um novo incêndio, desta vez no segundo andar, tornou ainda mais dramática a crise de infraestrutura do local. O custo para a reforma do Núcleo de Pesquisa e Documentação da FAU, atingido no incidente, foi de R$ 562 mil. A obra deve ser encerrada até o final deste mês. Nos andares mais altos, há salas de aula prontas para receber alunos, mas falta energia elétrica.
Ainda há obras em andamento no sexto, sétimo e oitavo andares, que começaram em 2020 e serão concluídas em abril de 2022. Em paralelo, acontece a reforma das instalações elétricas desses andares e da subestação de energia. O prazo para a recuperação da rede, que era outubro deste ano, está ultrapassado e em revisão. Só essas frentes já custaram cerca de R$ 3 milhões, segundo informações fornecidas pela assessoria de imprensa da reitoria. Outros R$ 3 milhões foram utilizados no reforço estrutural do oitavo andar, reforma da rede hidráulica e impermeabilização da biblioteca. Essas obras foram concluídas entre 2018 e 2021.
Mas os problemas não param por aí. Alguns pilares de sustentação do prédio, no bloco C, foram condenados pela Defesa Civil e precisam de recuperação urgente para permitir a ocupação ampla do edifício. O projeto está pronto, mas ainda aguarda dinheiro para a licitação. A reitoria estima um custo inicial de R$ 309 mil. Outro projeto também urgente busca recuperar as instalações elétricas do terceiro, quarto e quinto andares. O custo estimado é de R$ 1,2 milhão.
A administração central pretende entregar as salas de aula do sexto e sétimo andares em abril. Os demais andares ainda precisam de licitações, que ela pretende escalonar para liberar gradativamente cada pavimento, na medida em que as obras ficarem prontas. “Precisamos mexer na fachada, precisamos resolver o problema grave dos pilares, precisamos de brigada de incêndio, mas sem energia, não tem como as aulas voltarem. Então, eu diria que a prioridade é religar toda a energia do prédio para devolver as aulas para os blocos A e D, enquanto as outras obras acontecem em paralelo”.

CCS TAMBÉM SOFRE
O edifício principal do Centro de Ciências da Saúde também enfrenta problemas. As instalações do subsolo, sobretudo as salas de aula, não são adequadas para serem utilizadas durante a pandemia. “As aulas presenciais da pós-graduação e as aulas práticas da graduação retornaram. Mas as aulas teóricas, ainda não”, relata a professora Julia Clarke, da Faculdade de Farmácia. “Precisaríamos utilizar as salas de aula do subsolo, que não têm ventilação alguma. Temos 160 novos alunos a cada semestre, não temos espaço”.WhatsApp Image 2021 12 10 at 20.31.57 1Sala do subsolo do CCS não pode ser utilizada
Vice-decana do CCS, a professora Lina Zingali reconhece as dificuldades. “As salas não estão sendo usadas no subsolo e o nosso aulário, o bloco N, está ocupado pelo Centro de Triagem e Diagnóstico para covid-19. Por isso, estamos com uma grande limitação de salas de aula”, explica. O planejamento do CCS é devolver o bloco N para aulas teóricas no início do ano que vem. “O CTD será transferido para outro espaço e as salas serão reformadas para receber os alunos até o meados de janeiro”, afirma.

IFCS SEM AULAS PRESENCIAIS
WhatsApp Image 2021 12 10 at 20.31.57 2ARTE para recepcionar a comunidade acadêmica, no IFCSOs problemas também atingem unidades isoladas da universidade. No Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, não haverá aulas presenciais no período atual. “Temos um calendário acadêmico da graduação e pós-graduação com aulas e turmas previstas ainda no modo remoto. Os professores e estudantes se prepararam para isso. Você não pode alterar no meio do caminho uma disciplina que foi prevista no modo remoto”, explicou o diretor, professor Fernando Santoro.
A unidade ainda estuda a adaptação dos espaços. “Não podemos retornar a um espaço sem tomar cuidados com os protocolos de biossegurança. É preciso ter muito cuidado nessa transição”, afirmou Santoro. “É preciso saber qual é a ocupação segura das salas, garantir que todos os espaços tenham dispositivos de higiene e ventilação adequada”, completou.
As dificuldades orçamentárias são o principal entrave para finalizar a adaptação. “Nós não temos orçamento. Quando assumimos a direção, em outubro, já não tínhamos mais orçamento”, alertou. O professor destaca que o IFCS tem a peculiaridade de ser um prédio antigo e tombado, o que dificulta reformas. “O prédio é muito antigo, e precisa de uma conservação que independe da própria pandemia”.
No último dia 3, Santoro dirigiu a performance “Desembarque das Bacantes”, que misturou música, dança e filosofia, e contou com a participação do Teatro das Ideias Vivas. Os participantes realizaram uma lavagem das escadarias do prédio histórico para fazer uma abertura simbólica do IFCS. “A universidade está aberta de novo, não apenas para que os seus estudantes, professores e técnicos retornem, mas para que a cidade também entre na universidade”, explicou o professor. Mas, por enquanto, apenas para atividades acadêmicas como reuniões de orientação e de grupos de pesquisa, eventos e atividades de extensão. (colaborou Lucas Abreu)

DESEMBARGADOR
AINDA NÃO
AVALIOU RECURSOS

Enquanto organiza o retorno presencial possível nas atuais condições de pandemia e infraestrutura, a comunidade da UFRJ monitora o processo em tramitação no Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Em 25 de outubro, o desembargador Marcelo Pereira da Silva determinou a volta das aulas aos campi da universidade — e de outras seis instituições de ensino no estado — UniRio, Pedro II, UFRRJ, Instituto Nacional de Educação de Surdos, Cefet e IFRJ. Mas, até o fechamento desta edição, o magistrado não se manifestou sobre os recursos apresentados pela defesa das instituições ou pela AdUFRJ.

 

 

WhatsApp Image 2021 12 03 at 18.39.49Beatriz Coutinho e Kelvin Melo

Reviravolta na Avaliação Quadrienal da Capes. O juiz Antonio Henrique Correa, da 32ª Vara Federal, autorizou a retomada dos procedimentos de análise de todos os programas de pós-graduação do país, no último dia 2. A decisão ocorre após a renúncia coletiva dos 80 avaliadores de três grandes áreas do conhecimento, nas últimas duas semanas, em sinal de protesto contra a presidência da agência de fomento.  
A avaliação estava suspensa por uma liminar de setembro, para apuração de supostas irregularidades nos critérios de ranqueamento entre os programas, atendendo a uma ação do Ministério Público Federal. “A suspensão pura e simples do processo de avaliação (...), como foi determinada pela liminar (...), não atende aos objetivos da pretensão deduzida e cria um risco de irreversibilidade da medida caso persista por um tempo além do razoável”, reconheceu o juiz, na nova decisão. O magistrado, no entanto, ainda proíbe a divulgação do resultado final da avaliação.
“Essa decisão é, claramente, resultado da pressão acadêmica. Saiu na mídia toda”, afirma a professora Cláudia Rezende, do Instituto de Química da UFRJ, que renunciou à função de consultora da área na véspera da sentença judicial. A docente, porém, recebeu a notícia com cautela. “Não foi só a pauta da quadrienal que pedimos. E, além disso, não foi revertida totalmente a situação. Pode avaliar, mas não pode mostrar os resultados. O que isso significa?”, questiona. “A pressão tem que continuar. E cada vez mais forte”, completa.
Sobre a possibilidade de retomar a função, neste novo cenário, Cláudia diz que prefere não responder individualmente. “Foi uma decisão coletiva”. A docente informa que os integrantes da comissão da área conversam por grupo de mensagens, mas ainda não há nenhuma reunião formal marcada para avaliar a sentença judicial.
O professor Leandro de Paula, do Instituto de Física da UFRJ e um dos consultores signatários da carta de renúncia da área, acredita que a decisão do juiz “foi, no mínimo, influenciada fortemente” pelo protesto dos pesquisadores. Mas também não garantiu uma volta do grupo ao processo de avaliação. “É claro que conversamos entre nós, mas não tem nenhuma decisão, pois há vários pontos em aberto. Nem sei se a Capes quer que nós voltemos”, diz.
As cartas de renúncia coletiva das áreas de Química, Física/Astronomia e de Matemática, Probabilidades e Estatística foram divulgadas em momentos diferentes. Mas, em linhas gerais, assinalam vários pontos comuns de discordância com a atual presidência da Capes. Todos ainda não atendidos. A demora da Capes para reverter a liminar de setembro — o que não ocorreu totalmente — era apenas um deles.
Lenta para agir pela revogação da liminar, a presidente da Capes, Cláudia Toledo, por outro lado, tem demonstrado pressa com o processo de abertura de novos cursos, incluindo a regulamentação do ensino a distância. A postura representa outro ponto de atrito com os pesquisadores.
“O EAD foi uma das razões da nossa demissão. Existia uma pressão para que a gente fizesse um documento, abrindo a possibilidade de ensino a distância para mestrado acadêmico profissional e doutorado acadêmico na área da Física”, explica o coordenador da área, o professor Fernando Lázaro, da PUC-Rio. A prioridade é formar físicos experimentais, pela necessidade de inovação no país. “Ter um curso a distância, sem laboratório, não tem o menor cabimento”.
Fernando vai além da avaliação para falar do clima de instabilidade da agência de fomento. “Existe o Plano Nacional de pós-graduação, que é decenal, para ser um programa de Estado, e não de governo. Valeu de 2011 a 2020. Em 2020, ele acabou e até hoje não houve nenhuma discussão a respeito”, diz. As mudanças no comando, segundo o docente, também não contribuem para o debate: em quatro anos, houve três presidentes da Capes.
César Niche, professor do Instituto de Matemática da UFRJ, fazia parte do grupo de consultores que renunciou na área. Ele também questiona a sentença: “Avaliação sem poder divulgar os resultados? Para quê? Decisão estranha”, diz. “E isso não impede que a instância superior reveja a decisão, se o MP recorrer”, completa. Ainda não havia reunião formal dos consultores e coordenadores para discutir o assunto.
“Pelo lado político, nada mudou: ensino a distância e novos cursos — sem completar a avaliação atual, que estabelece patamares de qualidade para o futuro — seguem sendo prioridade para a diretoria da Capes. E os mandatos dos atuais coordenadores seguem sem serem prorrogados”, critica, em referência à redução do tempo para realizar o trabalho de avaliação, devido à judicialização do processo.
César enfatiza que a educação a distância precisa ser bem discutida. E a Matemática tem experiência no tema, construída após anos de estudo. “É algo muito importante, mas não para ser decidida a toque de caixa. Na área da Matemática, temos o PROFMAT, um programa nacional de formação de professores do ensino médio, envolvendo várias universidades, parte presencial, parte a distância, que funciona bem”.

CAPES PUBLICA DIRETRIZES PARA CURSOS NOVOS
Na quarta-feira (1º), ignorando boa parte da comunidade acadêmica, a Capes publicou as diretrizes e calendário para a apresentação de propostas de cursos novos. Documentos orientadores, nas modalidades presencial e a distância, serão divulgados até 20 de dezembro. Em nota divulgada dois dias antes, a agência informou que esta seria uma “atribuição estatutária” da presidência.
Até o fechamento desta edição, a assessoria do órgão não respondeu aos questionamentos da reportagem sobre a pressa da inclusão do ensino a distância nas propostas de cursos novos e sobre como pretende recompor as comissões das áreas em que houve renúncia coletiva.

“O DESCONTENTAMENTO CRESCEU MUITO”, DIZ JANINE

WhatsApp Image 2021 12 03 at 18.40.06O protesto dos pesquisadores das três áreas repercutiu na comunidade acadêmica. “Essa renúncia coletiva atesta a exaustão de muitos participantes com a demora da avaliação”, afirma o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, professor Renato Janine Ribeiro. O ex-ministro da Educação observa que o atual processo já deveria ter ocorrido entre junho e julho. “Quando o Judiciário decretou a suspensão, ela já estava atrasada. O descontentamento cresceu muito”. Janine, que já foi diretor de avaliação da Capes entre 2004 e 2008, não se recorda de outra renúncia coletiva na história da agência. “Creio que a situação é inédita”.
Para Flávia Calé, presidenta da Associação Nacional de Pós-Graduandos, a demissão reflete um cenário de desmonte da política educacional brasileira. “O tripé (financiamento, avaliação e PNPG) que sustenta a Capes está sob ataque, e isso tem gerado desânimo na comunidade científica”, afirma. Na última segunda (29), a ANPG se manifestou nas redes em defesa da pós-graduação, alegando que a renúncia é fruto de um “desgoverno”.
Calé, no entanto, ainda espera que todos os atuais coordenadores e consultores permaneçam até o fim da avaliação. E diz que o ideal seria a recondução aos postos daqueles que renunciaram. A estudante entende que esse corpo docente tem papel importante dentro da agência. “São polos de resistência. Eles ajudam a reverter ou minimizar impactos de medidas negativas que possam ser tomadas”, argumenta.
Natália Trindade, diretora da Associação dos Pós-Graduandos da UFRJ, também vê na renúncia em massa um protesto contra a desregulamentação da Capes e do sistema de avaliação quadrienal. Trindade observa que o impacto da crise atual não é imediato, mas alerta: “Ele virá lá na frente, quando acontecer a distribuição das bolsas”.

NA UFRJ, PRAZOS PARA DEFESA VOLTAM EM MARÇO

Enquanto o sistema de avaliação da Capes enfrenta graves turbulências, a pós-graduação da UFRJ se movimenta em direção à normalidade possível durante a pandemia. No dia 29 de outubro, o Conselho de Ensino para Graduados (CEPG) aprovou uma resolução para retomada dos prazos de defesa de dissertação ou tese — suspensos desde 14 de março do ano passado. O tempo volta a ser contado exatamente um ano depois, a partir de 14 de março de 2022. A resolução nº 06/2021, disponível na página da pró-reitoria de Pós-graduação e Pesquisa, está acompanhada de uma instrução normativa para aplicação da recontagem dos prazos.

bandeira adufrjDiretoria da AdUFRJ

Precisamos conversar. As cenas do último Conselho Universitário colocaram uma cunha entre nós. Até aqui reconhecíamos nossas diferenças com a oposição, mas achávamos que a disputa ocorria nos limites da lealdade política. Na manhã de quinta-feira, 2, esses limites foram rompidos. A sessão virtual do Consuni foi hackeada e os nomes dos conselheiros foram duplicados. A ideia do golpe era lotar a sala e implodir a sessão agendada para debater a abertura de negociação da Ebserh. Os golpistas foram bem-sucedidos por alguns minutos e muito mal vistos nas horas seguintes.
Somos professores, defendemos a escuta e acreditamos que métodos caminham entranhados aos conteúdos. Nosso método é outro. No debate da Ebserh — e em todos os outros — somos defensores incansáveis da pluralidade, da multiplicidade de visões e do diálogo respeitoso. Diálogo respeitoso não é um oba-oba, uma Torre de Babel em que todos falam e ninguém se entende. Acreditamos, de fato, na força transformadora da prática dialógica. A prática de nossos antagonistas, no entanto, é muito barulhenta, muito agressiva, mas pouco eficaz e terrivelmente nociva porque implode pontes entre os diferentes.
Car@ colega, aqui queremos deixar claro sem meias-palavras. Não seremos reféns do sectarismo de nossa oposição. Não seremos reféns do medo, das palavras de baixo calão nem de fake news. Não seremos reféns sequer do ódio. Aliás, o ódio é a tática useira e vezeira da direita e, infelizmente, também, com raras e louvosas exceções, de nossos antagonistas na universidade.
Seguiremos nossa jornada na diretoria da AdUFRJ prezando valores antigos, mas alvissareiros de tempos melhores: a educação, o respeito, a pluralidade. Vale para tudo, desde Ebserh à polifonia de nossas reportagens, dos debates sobre calendário acadêmico às produtivas articulações realizadas pelo Observatório do Conhecimento. Aliás, a boa notícia da semana vem dele, do Observatório. Passamos parte da semana em Brasília, preparando o calendário de atividades para 2022 dessa fértil e potente rede nacional de associações docentes e sindicatos. Na capital, visitamos parlamentares. Não escolhemos os gabinetes por nossas preferências partidárias, mas sim pelo potencial de cada um em acolher e amplificar a defesa da Ciência e da universidade pública, gratuita e de qualidade. Essa sim, a nossa luta, a nossa utopia, aquela que deveria nos unir.
Boa leitura!

hospitalHospital Universitário - Foto: Fernando Souza/Arquivo AdUFRJO colegiado máximo da UFRJ aprovou por ampla maioria – 40 votos favoráveis, 13 contrários e 2 abstenções – a abertura de negociações com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) para gestão de seu Complexo Hospitalar. Na prática, a reitoria fica autorizada a discutir os termos de uma eventual adesão à estatal, que hoje gerencia 40 hospitais universitários de 32 instituições de ensino superior. A reunião aconteceu de forma remota nesta quinta-feira, dia 2 de dezembro.
O Movimento Barrar a Ebserh na UFRJ realizou nova manifestação no salão nobre do Conselho Universitário e voltou a exigir uma reunião presencial do colegiado, a exemplo do ocorrido no dia 23 de novembro, quando o tema foi pautado pela primeira vez no Consuni. Apesar do uso de máscaras, o distanciamento social necessário à prevenção da covid-19 não foi observado. WhatsApp Image 2021 12 03 at 18.49.452
Outro desrespeito notado no início da sessão foi o acesso de pessoas não autorizadas na sala de teleconferência utilizando nomes de conselheiros que ainda não haviam acessado o espaço. A sala comportava até 75 pessoas. Os logins duplicados derrubariam a reunião virtual, que precisou ter seu início oficial atrasado enquanto a reitora Denise Pires de Carvalho solicitava que os participantes ligassem suas câmeras para identificar e derrubar os invasores.
Durante a sessão, Denise foi acusada pelas representações estudantis de ter mentido em sua campanha para as eleições da reitoria, em 2019. Na época, a professora afirmou que se empenharia para reerguer os hospitais da UFRJ e que as soluções, naquele momento, não passavam pela empresa. “Eu não menti. A Ebserh não estava em pauta em 2019 porque sequer tínhamos um hospital com infraestrutura que permitisse inciar qualquer discussão naquela época. O passivo de abandono de gestões anteriores foi enorme”, defendeu-se a dirigente. Na ocasião, o Clementino Fraga Filho tinha apenas 176 leitos ativos. “Herdamos um hospital que não tinha perspectiva de se manter aberto não por conta de pessoal, mas de infraestrutura. Hoje temos um hospital com infraestrutura e sem pessoal”, justificou.
Ainda durante o expediente, a professora Mônica Pereira dos Santos, representante dos associados do CFCH, leu carta assinada por 230 professores contrários à abertura de negociações com a empresa. Os docentes argumentaram que a contratação da Ebserh foi abandonada pela universidade ainda em 2013 e que a empresa é “passível de desestatização”. “Os pareceres favoráveis não levam em conta a atualidade sobre o funcionamento da empresa e os riscos de sua contratualização”, diz trecho do documento.
OS PARECERES
A discussão foi subsidiada por cinco pareceres: quatro de pedidos de vista e um do relator da Comissão de Desenvolvimento, professor Walter Suemitsu, favorável ao relatório do GT Ebserh (veja ao lado). Representante dos Titulares do CCMN, o professor Nelson Braga apresentou análise favorável à do relator. “O medo de perder a autonomia, tão alardeado, não se confirmou na experiência vivenciada nas outras universidades. Este medo nos deixou tão somente a liberdade de lamentarmos nossas perdas. Faz-se necessário agora reconhecer os erros do passado e buscar um melhor futuro para a UFRJ”.
Os outros três pareceres negavam a possibilidade de abertura de negociações com a empresa. Um deles foi do técnico-administrativo Francisco de Paula Araújo. No texto, ele acusou a reitoria de não realizar debates democráticos e destacou que não há garantias de aporte de recursos e concursos para pessoal com a contratação da empresa.
A estudante Júlia Vilhena foi autora do segundo parecer contrário. Embora tenha apresentado dados que explicitavam melhoria nos números dos hospitais geridos pela Ebserh, a estudante justificou que não se tratava de médias significativas. “Apesar dos resultados favoráveis em quadro de pessoal, leitos de unidade de terapia intensiva, taxa de ocupação e média de permanência, o teste de Mann-Whitney (método estatístico) mostrou que a variação de internações, consultas e exames, antes e depois da Ebserh, não foi estatisticamente significante”.
O último parecer contrário foi do também estudante João Pedro Pimentel, que sugeria a execução judicial da decisão que indica a substituição de todos os extraquadros por servidores concursados. Ele enfatizou que o problema dos hospitais não é de gestão, mas orçamentário. “É preciso reconhecer o esforço que os responsáveis pela gestão dos hospitais têm empreendido para assegurar condições de funcionamento diante do dramático ajuste fiscal de que são vítimas os HUs”, afirmou.

A DISCUSSÃO
Pró-reitor de Planejamento e Finanças, o professor Eduardo Raupp contou ter sido o relator do processo de adesão da Universidade de Brasília à Ebserh, uma das primeiras instituições a firmarem contrato com a empresa. “Temos mais em comum do que divergências. Estamos todos preocupados com nossos hospitais, estamos todos lutando para que nossos hospitais se reergam”, disse. “Não podemos ter ficado oito anos sem apresentar uma solução para os nossos hospitais. Quando assumimos a gestão na UFRJ, havia trabalhadores extraquadros que recebiam menos de um salário mínimo”, criticou.
Quem também se posicionou em defesa da abertura das negociações foi o diretor do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho. O professor Marcos Freire chamou atenção para a necessária defesa da população que precisa dos serviços públicos de saúde. “Eu não ouvi preocupação com os pacientes. Saindo os 850 contratados temporários, a gente volta à estaca zero”, afirmou. “O que precisa agora não é da assinatura de contrato, é da abertura de negociações. Precisamos discutir um contrato que seja bom para nós”, argumentou.
Igor Alves Pinto, representante da APG, criticou falas de ambos os lados que não apresentavam novos dados ou argumentos que pudessem convencer sobre a necessidade ou não da empresa. “Esse debate, como está, nada resolve. Se nós autorizarmos, a universidade vai perder. Se negarmos, a universidade também vai perder”. O conselheiro leu documento, formulado em conjunto com o técnico Roberto Gambine, com sugestões para a etapa de negociações. Dentre os encaminhamentos, estão: a realização de sessão extraordinária do Consuni com a presença de representação da Ebserh para apresentação de sua proposta de contratualização; que a empresa apresente metas de disponibilidade de créditos orçamentários de custeio, investimento e concursos por ano; que a universidade nomeie uma comissão paritária para definição dos limites da proposta de contratualização; e que, após o contrato, a Ouvidoria-Geral da UFRJ seja nomeada como instância de acolhimento das reclamações da comunidade universitária e de usuários dos hospitais.

Relatório defende contratação da Ebserh

WhatsApp Image 2021 12 03 at 18.49.45O Conselho Universitário desta quinta-feira continuou a discussão com base no relatório produzido pelo grupo de trabalho nomeado pela reitoria para levantar a situação do Complexo Hospitalar da UFRJ e dos hospitais que aderiram à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). O documento, finalizado em agosto deste ano, conclui que falta orçamento e pessoal para as unidades de saúde da universidade e que a Ebserh foi capaz de melhorar as contas e sanar os problemas de recursos humanos nos hospitais de sua rede, ainda que com “algum atraso na reposição dos funcionários RJU”. A recomendação final do texto é de abertura imediata das negociações com a estatal.
De acordo com os dados reunidos pelo GT, o Complexo Hospitalar sofreu perda de 20% de sua mão de obra concursada entre os anos de 2009 e 2020. No mesmo período houve redução de 40% dos extraquadros. O estudo indica a necessidade de redimensionamento de pessoal em todo o Complexo Hospitalar, com a contratação de mais 811 pessoas para o HU e 1.899 para toda a rede de hospitais. Em 2020, o complexo reunia 924 profissionais extraquadros e 3.520 servidores efetivos. A maior parte deles lotada no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho: 623 extraquadros e 2.027 efetivos.
Outro dado do relatório se refere a orçamento. Os recursos provenientes do SUS para o HU reduziram de R$ 111,64 milhões, em 2011, para R$ 49,61 milhões, em 2020. O encolhimento de mais de 40% é fruto do fechamento de leitos ao longo dos anos. Para se ter uma ideia, de 550 leitos ativos na década de 1990, o hospital passou a contar com apenas 200 até o ano passado. O número passou para 344 este ano com a abertura de leitos exclusivos para covid-19 e contratação de pessoal temporário para suprir a demanda da pandemia (veja AQUI).
Os números também mostram um encolhimento no número de residências na última década e queda no conceito do curso de Medicina do Fundão no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), de 5, até 2010, para 3, em 2019. (Silvana Sá)

WhatsApp Image 2021 11 26 at 18.11.123O Enem 2021 teve como tema da redação “Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil”, o que surpreendeu alunos e professores da educação básica. Mas a surpresa foi maior para Fernanda da Escóssia, jornalista — que trabalhou na Comunicação da AdUFRJ, entre 2018 e 2019 — e professora substituta da Escola de Comunicação da UFRJ. Um trecho de seu livro, “Invisíveis: uma etnografia sobre brasileiros sem documento”, foi citado na prova. A obra, resultado da tese de doutorado de Fernanda, denuncia a situação de pessoas que não têm acesso ou têm acesso limitado ao mínimo de direitos, como Saúde e Educação, por falta de documentos. O Jornal da AdUFRJ conversou com a professora sobre a sua pesquisa, a importância da repercussão do tema e o reconhecimento da ciência brasileira.

Jornal da AdUFRJ – Como você chegou a este tema de pesquisa?
Fernanda da Escóssia – Descobri esse tema como repórter. A primeira matéria que eu fiz sobre pessoas sem documentos foi em 2003, na Folha de S.Paulo. Naquela ocasião, percebi que era um problema que passava de uma geração para outra e que tinha raízes profundas, históricas e estruturais na sociedade brasileira. Desde então, persigo o tema. No doutorado, precisei, como diria o (Pierre) Bourdieu (sociólogo francês), fazer um salto epistemológico, olhar o meu objeto agora com as ferramentas de outras ciências, as ciências sociais, transformando um problema social em um problema sociológico.WhatsApp Image 2021 11 26 at 18.11.131

Quais direitos são impedidos para uma pessoa sem documentos?
Uma pessoa que não tem certidão de nascimento não tem nenhum outro documento. Então, pela ordem, ela não tem CPF, não tem identidade, se for homem não tem certificado de reservista, não tem título de eleitor, não tem carteira de trabalho, não tem passaporte e, quando morre, é registrada em uma cova sem identificação. Uma pessoa sem documentos é excluída desse mundo dos direitos. Ela não vota, não tem emprego formal, não pode ser beneficiária dos programas sociais, não pode se aposentar e tem acesso limitado às políticas de saúde e educação. Uma senhora, no livro, tinha um câncer, mas não podia ser operada porque não tinha documentos. Durante muitos anos, ela só teve acesso ao atendimento emergencial. É um acesso limitado ao sistema de saúde. No caso da educação, a escola não vai permitir que um estudante sem documentos estude. Por tudo isso, pessoas sem documentos têm acesso limitado às políticas de saúde e educação, e são basicamente excluídas desse outro conjunto de direitos.

Segundo a sua pesquisa, houve uma queda no número do sub-registro de crianças entre 2003 e 2019, e um dos motivos foi o Bolsa Família. O fim do programa pode representar um retrocesso nesse cenário?
O Bolsa Família algum dia será visto também como um programa de acesso à documentação, porque, ao exigir que os beneficiários tivessem documentos, acabou motivando o próprio Estado a se mexer para oferecer e facilitar o acesso à documentação para essas pessoas. O fim do Bolsa Família é preocupante sob vários aspectos e, também, sob o aspecto da questão da documentação. O que se espera é que esse programa que veio para substituí-lo pelo menos mantenha essa preocupação.  

O governo Bolsonaro nunca priorizou programas sociais. Esta falta de atenção pode prejudicar um sistema que estava sendo criado para incluir essas pessoas?
O governo Bolsonaro é refratário à observação dos direitos. É preocupante, claro. Em 2007, o governo Lula implementou o Compromisso Nacional pela Erradicação do Sub-registro. O programa não foi extinto, mas as pessoas que estão mais atuantes nestes comitês dizem que elas têm tido mais dificuldades. A erradicação do problema exigiria uma ação federal mais forte e radical sobre registro. Tem uma coisa muito simples que o governo podia fazer, um bom censo. O censo de 2010 perguntou sobre crianças de até dez anos sem documento. O próximo censo, que já foi adiado, perguntará apenas sobre crianças de até cinco anos sem documentos. Por que o governo não repete a pergunta da PNAD de 2015, que perguntava sobre pessoas de qualquer idade sem documento? Mas o governo esvaziou o censo e não mostra nenhum interesse em fazer esse diagnóstico completo.  

Como se sentiu, como pesquisadora, vendo um tema tão importante quanto o da inclusão ser o tema da redação do Enem?  
Isso é muito importante para mim. Algumas pessoas consideraram o tema difícil para alunos do ensino médio, mas um tema é difícil quando ele não é tratado, não é pensado e discutido. Ele não estava no nosso radar de preocupações. Assim como, há algum tempo, a desinformação também não estava no radar das nossas preocupações e hoje qualquer aluno de ensino médio sabe fazer uma redação sobre desinformação. Essa é a minha realização como jornalista, pesquisadora e professora. É muito gratificante ver que o tema da sua pesquisa serviu para a sociedade discutir um assunto que fala da exclusão brasileira. Agora temos reportagens, pessoas discutindo o tema da redação, professores de ensino médio atentos ao tema e três milhões de candidatos pensando sobre isso no domingo. Porque, na redação do Enem, o aluno tem que propor alguma iniciativa capaz de resolver o problema apontado na prova. Imagina que há três milhões de jovens pensando em algo que possa ser feito para diminuir a exclusão documental brasileira! Fiquei felicíssima.

O governo ataca a Ciência. O que significa, neste contexto, ter a sua pesquisa como tema de redação do Enem?
A Ciência assume a sua centralidade nesse momento, mostra o que é capaz de oferecer para o país. É uma pesquisa em ciências sociais pautando a discussão na sociedade. Eu sou professora substituta de uma universidade pública, vemos as dificuldades que o ensino público superior tem enfrentado. Vemos as dificuldades que os pesquisadores têm enfrentado. Ver a pesquisa acadêmica no dia a dia das pessoas, mostrando a sua relevância, é muito recompensador.

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