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savings 2789153 960 720O Observatório do Conhecimento convidou a reitoria da UFRJ para uma reunião com o coordenador da bancada federal fluminense, deputado Áureo Ribeiro (Solidariedade), em Brasília, no próximo dia 28. O objetivo da rede de 12 associações docentes hoje coordenada pela AdUFRJ é sensibilizar os políticos para uma recomposição das receitas das universidades. A Proposta de Lei Orçamentária de 2024 tramita no Congresso com números desanimadores para a educação superior.
‘Temos atuado em Brasília com os membros da Comissão Mista de Orçamento (CMO), mas a gente acredita que precisa de mais ajuda”, afirmou a professora Mayra Goulart, presidente da AdUFRJ e coordenadora do Observatório, em reunião com o reitor Roberto Medronho e a vice-reitora Cássia Turci, na segunda (13). “Seria muito importante que a reitoria estivesse lá conosco”.
A docente explicou que a ação não busca recursos de emendas parlamentares, de pequeno porte e utilização limitada pelas reitorias. A ideia é ampliar as verbas de custeio e investimento. “É importante criar um relacionamento com estes deputados para que eles se sintam parlamentares da UFRJ”.
O reitor Roberto Medronho disse que faria todos os esforços para participar do encontro do dia 28. “A situação financeira é dramática. A gente precisaria de R$ 550 milhões, para funcionar razoavelmente bem. Mas vamos receber R$ 388 milhões, já devendo 120 milhões deste ano”.

MINHA CASA MINHA VIDA
Na reunião com o reitor, Mayra também apresentou a proposta de incluir moradias para estudantes das universidades públicas no Programa Minha Casa Minha Vida do governo federal. O Rio de Janeiro, com vários imóveis federais, estaduais e municipais sem uso, poderia se transformar em um palco importante da iniciativa.
“Achamos que o fórum de reitores do Rio pode ser um bom espaço para apresentar essa proposta”, disse Mayra. “Outro espaço seria a reunião das pró-reitorias de assistência estudantil, que deve ocorrer em Brasília nos próximos dias”.
A reitoria concordou em levar a ideia aos demais reitores. (Kelvin Melo)

gavel gf55211776 640A AdUFRJ venceu ação coletiva que determina o pagamento do Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC) aos docentes que se aposentaram até março de 2013. A UFRJ informou que 71 docentes aposentados e 13 pensionistas podem ter direito a requerer a revisão do benefício. Para isto, é necessário apresentar um memorial descritivo com toda a documentação que comprove as atividades mencionadas. Muitos desses documentos podem ser obtidos pelo Siape. Certificados, diplomas, declarações de setor de pessoal também são considerados documentos válidos.

Halley Lino de Souza, assessor jurídico da AdUFRJ, observa que desde 2022 foi firmado um compromisso para que esses docentes recebessem administrativamente a RSC, mas a universidade não tem cumprido a determinação. “A direção da AdUFRJ já comunicou por escrito à reitoria, ao CAp e também à PR-4 esse descumprimento. Nós estamos solicitando que esses professores façam contato conosco porque vamos demonstrar na justiça que não houve esse cumprimento”, explica. “Já para os docentes que ainda não fizeram essa solicitação, pedimos que entrem em contato também com a assessoria jurídica da AdUFRJ para fazermos valer esse direito”, afirma o advogado.
A AdUFRJ encaminhou por e-mail aos sindicalizados a listagem nominal dos docentes possivelmente aptos à revisão dos benefícios. Os professores podem entrar em contato com o sindicato para esclarecer dúvidas e para a representação jurídica. É necessário preencher uma procuração. Estamos disponíveis no número: (21) 99808-0672 ou pelo e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..

O que é o RSC
Criado em 2012, o Reconhecimento de Saberes e Competências é um direito que permite aos docentes do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico receberem valores de Retribuição por Titulação caso comprovem competências adquiridas que equivalham à especialização, mestrado e doutorado. Assim, docente graduado pode receber a RT de Especialista (RSC-I), o docente com título de Especialista pode ter direito à RT de Mestre (RSC-II) e o docente com título de Mestre pode adquirir a RT de Doutor (RSC-III).

WhatsApp Image 2023 11 09 at 22.42.44 9Foto: Fernando SouzaA celebração das lutas antirracistas tem atividades especiais promovidas pelo Coletivo Enegrecer em parceria com a AdUFRJ. No próximo dia 11, está prevista a instalação de um estande na tradicional Feira das Yabás, em Madureira, Zona Norte do Rio. A atividade conta com o apoio do Observatório do Conhecimento.
Já no dia 25, uma visita guiada tratará sobre territórios negros e desigualdades raciais no Rio de Janeiro. A visita compreenderá o circuito das Pequenas Áfricas no bairro de Madureira. O ponto de encontro é na Casa Aban, a primeira residência estudantil voltada a jovens negros, localizada na Rua Carolina Machado, 726. A atividade começa às 8h.
De lá, os participantes visitam o Quilombo do Agbara Dudu, a Praça Paulo da Portela, o Parque Madureira, as escolas de samba da região, o Viaduto de Madureira, o Mercadão e favelas do bairro. A ideia é discutir democracia, acesso a direitos e moradia.
Além do circuito, haverá feijoada na Casa Aban e atividades culturais. A programação termina às 18h. Vice-presidenta da AdUFRJ, a professora Nedir do Espirito Santo celebrou a parceria. “É muito importante e simbólico que este circuito aconteça em Madureira, que tem forte presença do movimento negro”, afirmou.
MINISTRA
Na UFRJ, a abertura do Novembro Negro aconteceu no dia 27 de outubro e teve a presença ilustre da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. Na ocasião, a universidade lançou a campanha “UFRJ antirracista — nenhum passo atrás: a universidade está mudando”. O projeto pretende demarcar o compromisso da UFRJ com o combate ao racismo e a construção de uma política antirracista. 
“Quando eu era adolescente, eu passava pela UFRJ saindo ou voltando para a Maré e essa era uma realidade muito distante para mim. E sempre que eu sonhava em ser professora, a perspectiva de ser professora universitária era muito mais distante”, disse a ministra, que hoje é doutoranda do Programa Interdisciplinar de Pós-Graduação em Linguística Aplicada da UFRJ. 
“Eu cresci numa família que me ensinou que o conhecimento da gente ninguém tira”, ela continuou. “Mas, para conseguir isso, a gente precisa de condições, precisa de bolsa, de ações de permanência”, pontuou a ministra. “Falo para cada estudante que está aqui: a gente precisa reafirmar, com nome e sobrenome, por que estamos aonde estamos. Estar nesta universidade é mérito de vocês. Essa universidade também é vocês e ninguém pode tirar isso de vocês”.
Vice-presidenta da AdUFRJ, a professora Nedir do Espirito Santo fez uma saudação no início do evento e destacou a importância do combate à evasão estudantil e a necessidade de fortalecer ações de permanência. “Queremos que esses jovens negros concluam a graduação, disputem vagas na pós-graduação e se tornem docentes pesquisadores, uma vez que a presença de pretos, pardos e indígenas é tão parca na carreira docente”, afirmou. Nedir também pediu mais investimentos para a universidade pública e a recomposição salarial de professores, para que a carreira volte a ser um sonho dos jovens brasileiros.
A deputada federal Benedita da Silva, de 80 anos e em recuperação de uma cirurgia na coluna, fez questão de comparecer ao evento para prestigiar a ministra. “Não poderia deixar de estar ao seu lado, principalmente hoje, em que é preciso ter uma vigília constante contra a intolerância que toma conta do nosso país”, disse. “É a democracia que garante a pluralidade, a luta antirracista”, afirmou. Arrancando lágrimas da plateia, Benedita bradou: “É um orgulho ver a cara do Brasil dentro das universidades. Sou mulher negra. Tentaram me fazer de homem, tentaram me fazer branca. Mas eu não aceitei. Usei e uso minha voz para reafirmar que sou uma mulher negra”.
Superintendente geral de Ações Afirmativas, Diversidade e Acessibilidade da UFRJ, Denise Góes, reconhecida militante do movimento negro na universidade, fez um discurso contundente e emocionado para uma plateia majoritariamente formada pela juventude negra da universidade. “Após mais de um século de existência, a universidade avançou para a institucionalização de pautas outrora silenciadas e negligenciadas. Ao movimento negro brasileiro se deve a mudança de perspectiva sobre as pautas raciais”, afirmou.
A atividade foi organizada em parceria com o Fórum de Ciência e Cultura, a Superintendência de Ações Afirmativas, Diversidade e Acessibilidade e a a reitoria. O reitor Roberto Medronho e a coordenadora do FCC, professora Christine Ruta, fizeram parte da mesa.

 

Desde 2012, quando foi denunciado pelo Ministério Público Federal por supostas irregularidades na gestão de recursos, o professor Carlos Levi da Conceição, de 73 anos, pode contar nos dedos as noites tranquilas de sono que conseguiu ter. “Não é um sono profundo, é algo agitado, confuso. Parece tão absurdo isso durar todo esse tempo. Por mais forte que você tente ser, é uma espada na sua cabeça”, conta o ex-reitor da UFRJ (2011-2015). Em entrevista ao Jornal da AdUFRJ, o professor fala sobre o longo processo, que resultou em uma condenação em primeira instância em 2019 e que até hoje não teve o recurso da defesa julgado.

ENTREVISTA / CARLOS LEVI DA CONCEIÇÃO, PROFESSOR E EX-REITOR DA UFRJ

WhatsApp Image 2023 11 09 at 22.42.44 5Jornal da AdUFRJ — Esse processo tem início formal com uma denúncia do MP em 2012. São mais de dez anos de idas e vindas na Justiça. Como o senhor tem suportado esse longo calvário?
Carlos Levi
— Isso traz repercussões para a sua vida, a sua família, e vai consumindo seu cotidiano com incertezas e dúvidas que ficam sempre pairando no horizonte. E com alguns momentos de pico, como aqueles em que se aproximam audiências importantes, quando a tensão cresce.

De que a forma a certeza da inocência lhe ajuda nesses momentos?
A convicção da inocência me dá a certeza de que as ações que fiz, as intenções que me moveram, não têm nada de errado. Isso me leva a acreditar que, em algum momento, vai prevalecer a lei, a boa Justiça, e me dá confiança para enfrentar todo esse processo. Até porque a fragilidade das provas que foram elencadas para me condenar é muito forte e evidente.

Se as provas são frágeis, e podem ser derrubadas com fortes elementos, por que tanto tempo de processo?
Até por conta desse distanciamento no tempo e no espaço, hoje eu posso ter mais clareza para entender esse processo. Tudo começou em 2003, na gestão do reitor Aloisio Teixeira, com um convênio com o Banco do Brasil, eu nem fazia parte da administração da UFRJ naquele momento. Esse convênio se transformou em um contrato com o banco em 2007, com a participação da FUJB, quando eu já era pró-reitor de Planejamento. Hoje fica claro que já havia então em gestação um movimento lavajatista no Judiciário e no MP. E uma das características desse movimento era a perseguição às universidades públicas. O mais remoto exemplo que eu me lembro dessa perseguição aconteceu em 2008 com o então reitor da UnB, Timothy Mulholland, acusado pelo MP de improbidade administrativa. Foi um caso muito explorado na época pela imprensa como um exemplo de mau uso de recursos públicos (Timothy acabou aboslvido na ação de improbidade administrativa).

O senhor acredita que a gestão do professor Aloísio Teixeira tenha sofrido algo semelhante?
Sim. E no caso dele havia ainda uma resistência interna às mudanças que a gestão vinha promovendo, notadamente na Faculdade Nacional de Direito. A primeira denúncia na imprensa contra a gestão do Aloísio partiu justamente de um integrante da FND, falando do contrato com o BB. Mais tarde veio a denúncia do MP, em 2012. Nesse mesmo ano, o professor Aloísio Teixeira faleceu. Éramos amigos íntimos. Ele estava muito desgostoso por ter sua vida depreciada, enxovalhada. Esse processo de alguma forma participou para acelerar a sua morte. Só quem experimentou o sabor amargo dessas injustiças, o ambiente que se forma, sabe o que é essa amargura.

Mais uma vez chama a atenção a demora no processo.
Veja, esse processo só vem a ser julgado em primeira instância em 2019. Sete anos após a denúncia. É muito tempo de agonia. O processo entra pela 7ª Vara, que é a vara da Lava Jato no Rio. Quem estava lá era o juiz Marcello Granado, que se declarou impedido em fevereiro deste ano, já como desembargador do TRF, quando o julgamento de nosso recurso contra a condenação chegou a ser iniciado, mas foi anulado com esse impedimento.

Esse é o julgamento na esfera criminal, mas há também um processo na esfera cível, não?
Sim, esse outro está correndo sem qualquer ligação com esse da esfera criminal. Vamos nos concentrar nesse da esfera cível depois de esgotar a luta na esfera criminal. O processo criminal é o que mais nos preocupa pela sua natureza persecutória, com esse ambiente lavajatista que vem desde o episódio com o reitor da UnB. Mas que também se manifestou na UFMG, na FURG e, o caso mais trágico e dramático, o da prisão e do suicídio do reitor Luiz Carlos Cancellier, da UFSC, em 2017.

Estava previsto para esta terça-feira (7) um novo julgamento do recurso, mas ele foi mais uma vez adiado. Como está o seu dia a dia e qual a sua expectativa para o desfecho desse caso?
Mais um adiamento... Um dos três desembargadores se declarou impedido e precisará ser substituído para recompor o quorum mínimo requerido. Além disso, houve um pedido de suspeição contra o relator, encaminhado por uma das partes envolvidas. Hoje estou aposentado na UFRJ, mas sigo com atividades de orientação de teses e participo de um grupo de energia eólica na Coppe. Minha expectativa é que essa condenação seja derrubada, só depois vou pensar melhor do que fazer da vida. Parece tão absurdo isso durar todo esse tempo. Por mais forte que você tente ser, é uma espada na sua cabeça. Você pensa em relaxar, se divertir, mas vem aquela sombra. É muito pesado, não recomendo nem desejo a ninguém. Mas ao menos estou vivo e tenho esperança. A luta continua.

WhatsApp Image 2023 11 09 at 22.42.44 7No dia 27 de outubro, deixou-nos a professora Marinalva Oliveira, titular da Faculdade de Educação. Sua partida repentina, aos 59 anos, gerou comoção na academia, na política, nos sindicatos docentes de todo o país e nos movimentos sociais por direitos das pessoas com deficiência. O velório, ocorrido na sede da Aduff, em Niterói, reuniu algumas centenas de pessoas e demonstrou a importância da docente nos mais diversos espaços de organização. Abaixo, trecho de seu memorial para a classe de titular, em que a professora apresenta sua trajetória pessoal. Em seguida, uma sequência de depoimentos falam de dor, saudade e de como Marinalva era imprescindível.

 

Nasci na zona rural do município de Caravelas, histórica cidadezinha baiana. (...) Meu nascimento ocorreu no dia 28 de agosto de 1964, em pleno golpe civil-militar de 1º de abril de 1964, regime sob o qual vivi até a juventude. Vivi minha infância entre os estados da Bahia, Minas Gerais e Espírito Santo. Meu pai trabalhava como empregado de fazendas. Era vaqueiro e sua principal função era cuidar do gado, mas também fazia plantações de arroz, feijão, milho para vender e para nosso sustento. Tudo que consumíamos era produzido naquelas terras pelo meu pai. Havia a época da plantação e da colheita. Vim ao mundo pelas mãos de uma parteira, em casa, após três dias de trabalho de parto da minha mãe, mas minha chegada trouxe uma grande decepção para a família: após o nascimento de duas irmãs, a expectativa era que viesse um menino. Essa expectativa foi transformada “parcialmente” em realidade, pois minha mãe sempre cortava meu cabelo bem curto e me vestia como menino. Meu apelido era Joãozinho. Como meu pai era trabalhador rural, aos meus seis meses, nós nos mudamos de Caravelas para Minas Gerais, onde foi trabalhar como vaqueiro do meu tio. Era uma fazenda banhada pelo Rio Doce e cercada por outros rios, mas que não foram suficientes para me fazer aprender a nadar.WhatsApp Image 2023 11 09 at 22.42.45 1
Nessa fazenda do meu tio, meu pai era o faz-tudo e minha mãe era a professora das crianças que moravam nas redondezas, onde não havia escola. (...) À minha mãe foi permitido tão somente estudar até a quarta série e meu pai apenas sabia assinar o nome e “fazer contas”. (...) Fiz todo o ensino primário na escola rural onde minha mãe era professora, apesar de sua baixa escolaridade.
(...)
Meu pai foi atraído pela promessa do meu tio fazendeiro – é cada tentação que o diabo coloca na vida de Parrom! –, que havia comprado fazendas no Pará e prometeu que o irmão teria sua própria terra. No anseio de nos libertar, de ter nosso pedaço de terra e melhores condições de vida, viajamos semanas de Minas Gerais até o Pará. Era o mito de que no Pará distribuíam terras. A chegada ao lugar foi impactante. Fomos morar no meio da mata, nas terras compradas pelo meu tio. Para eu estudar, tive que ir morar na cidade com treze anos e trabalhar como trabalhadora doméstica infantil, sem remuneração, pois trocava a comida e a dormida pelo trabalho. Era uma situação de exploração de trabalho infantil, mas eu achava que era eu a que estava recebendo favores. Também sofri abuso sexual, algo que só fui entender anos, muitos anos depois.
Minha mãe e meu pai, quando entenderam a falsa promessa do meu tio, largaram a mata e vieram morar na cidade. Naquele momento, eu e meu irmão, que fora adotado após o meu nascimento, fomos trabalhar para o sustento da casa, pois os demais estavam desempregados e sem renda. (...) Meu pai, diante da condição de não ser mais a fonte de sustento da casa, desapareceu, sem dar notícias. Após seis meses, quando já não tínhamos esperança de que estaria com vida, reapareceu. Ele estava empregado numa fazenda e veio buscar a família. Eu havia terminado o ginasial e, no local para onde nos mudaríamos, não havia ensino médio. Por isso, pedi para ir morar com minha tia Ubaldina, em Vitória da Conquista, na Bahia, pois minha tia morava sozinha e podia possibilitar meus estudos e eu queria muito chegar à universidade.
Eu tinha um primo caminhoneiro (...). Então foi acertada a minha ida para a Bahia com meu primo, na boleia do caminhão. A viagem até Vitória da Conquista durou semanas e, mais uma vez, foi marcada por atos de abuso sexual. Desde cedo, conheci a fome, a exploração, o machismo e a pedofilia, mas também a importância da solidariedade e da partilha. Até então, nesse Brasil profundo da minha infância, nunca tinha ouvido falar em golpe ou ditadura militar, e minhas únicas lembranças são desses momentos que pareciam inesgotáveis.
Em Vitória da Conquista, fiz o curso de magistério como ensino médio. Morando com minha tia, conheci a dignidade de ter escola, roupas, cama, comida e ir a festinhas, como toda adolescente. Era o começo do fim da ditadura e havia embates muito grandes dentro das escolas, devido ao fato de os diretores serem indicados pelo regime. ...começou assim, formal e organizadamente, a minha trajetória de lutas por justiça. (...)
Terminado o curso de magistério, sonhava em fazer uma faculdade, mas naquela época ainda não existia curso superior em Vitória da Conquista. Em 1984 retornei ao Pará e, como os meus familiares moravam no interior, fui morar na capital, em um pensionato com quartos coletivos. (...) Tive uma bolsa estudantil do município, mas, como ocorre ainda hoje, seu valor era muito insuficiente e não pagava sequer as contas mais essenciais. Assim, o dia em que eu almoçava, não jantava e havia dias em que sequer fazia essas duas refeições. Como minha família não tinha condições financeiras para me manter, eu passei um ano fazendo cursinho à noite e, durante o dia, trabalhava como vendedora de rua. Eu passava de porta em porta para vender água sanitária e plano de saúde. Mesmo assim, escolhia entre almoçar e jantar (...)
Era o ano das “Diretas já!”, da luta pela redemocratização do país (...) Os comícios ocorreram em várias cidades do Brasil. Em Belém, foi no dia 16 de fevereiro de 1984, na Praça da República, e reuniu 60 mil pessoas. Eu estava na rua vendendo água sanitária e, ao me deparar com aquela multidão lutando pela redemocratização do país ao som de Fafá de Belém cantando “Menestrel das Alagoas”, me juntei para não permitir que mais uma geração vivesse sem liberdade política e de expressão e emprego.
Naquele momento, eu não tinha a compreensão sobre os limites do movimento. (...) A campanha das Diretas terminou como começou, de forma ordeira. A oposição burguesa tomou todos os cuidados para que a campanha não perdesse o rumo e não passasse a questionar as estruturas da sociedade brasileira, algo que eu só fui entender anos mais tarde.
Em 1985 fiz o vestibular para a UFPA e para uma faculdade privada. Como muitas e muitos jovens da minha geração, prestei vestibular para mais de uma opção de carreira e o ensino privado ofertado por uma empresa proprietária de uma faculdade foi o que me restou por não ter conseguido obter pontuação para uma universidade pública na primeira lista de aprovados. Desse modo, iniciei minha trajetória no ensino superior.

DEPOIMENTOS

WhatsApp Image 2023 11 09 at 22.42.45 2A primeira lembrança que tenho da minha mãe é na sua república, onde morava quando ainda estudante da UFPA. Eu tinha apenas 4 anos. Ali foi o início de nossa grande história de amor, que durou exatas três décadas. Me despeço dela aos 34 anos e com muito de seus valores cultivados no homem que me tornei.
Nessa primeira vez que a vi, lembro de chegar tímido com meu pai e de ser, aos poucos, conquistado com batatas fritas, sorrisos largos e gestos sempre de muito carinho. Lembro que o quarto dela tinha apenas um colchão no chão, uma mesinha de estudos e algumas caixas de papelão que serviam de guarda-roupa. Tudo muito simples, mas extremamente aconchegante.
Professora, logo de cara me ensinou que a relação mãe e filho nada tem a ver com genética, mas com amor. Diplomática, recusou que eu a chamasse de “mãe” quando pequeno. Mas eu nunca tive dúvidas de qual era seu inquestionável lugar em minha vida. Se algo apertasse e eu precisasse de ajuda, eu não tinha dúvidas de quem procurar.
Entreguei meus documentos para tomar posse como professor da Unifap exatamente na semana em que ela se foi. Posso dizer, com certeza absoluta, que esse foi um dos momentos em que mais a vi feliz em toda minha vida. Eu iria iniciar minha trajetória docente na mesma universidade que ela. Mandei foto no dia em que cheguei à pró-reitoria com meus documentos. E já arquitetava a foto que a enviaria no dia da minha primeira aula, algo que não vai mais ser possível. Hoje só posso prometer que vou honrar sua memória como um professor dedicado, afetuoso, empático com os estudantes que mais precisam e radicalmente compromissado com a defesa da educação pública.

Andrew Costa

Você nunca me prometeu que seria eterna. Você nunca me prometeu que estaria aqui sempre. Você nunca me disse que seria fácil. Mas também você nunca me preparou pra sentir esse vazio.
Você nunca me preparou pra uma partida tão precoce e tão do nada. Você realmente nunca me prometeu ser eterna. Mas eu ainda achava que te teria vários anos por aqui... Te veria vários anos aqui, me chamando atenção... Reclamando da minha bagunça.
Ou me pedindo pra fazer massagem porque as suas pernas e braços estavam doendo. Sairia de manhã e veria você na esteira. Ouviria você me pedindo um café durante as suas várias lives e reuniões intermináveis.
Ô, mãe, eu ainda não acredito.
Do mesmo jeito avassalador que entrou na minha vida, você se foi das minhas vistas. Não digo que foi da minha vida, porque não tem como, você se faz presente em cada detalhe desse apartamento, em cada ato meu, e dentro do meu coração tu faz tua morada eterna.
Eu te amo muito, muito.
Você me ensinou o que significa ser mãe de fato. Mas, além disso, me ensinou a ser um ser humano íntegro, humilde, que se importa com os outros, e que não abre mão dos seus princípios.
Prometo te encher de orgulho, e prometo seguir meus sonhos e construir minha vida do jeitinho que você queria que eu fizesse...
Porque sei o quanto você se preocupava em me deixar desamparada.
Te amo para além de quando eu respirar.

Andressa Costa

Minha mãe foi apaixonada pela vida, pelas pessoas, pelas pessoas com deficiência. A sua luta incansável pela educação pública e pela inclusão de pessoas com Síndrome de Down nunca será esquecida. Eu nasci em 2006 e sempre estivemos juntos. Marinalva presente! Hoje e sempre!WhatsApp Image 2023 11 09 at 22.42.45 3

Gabriel Oliveira Costa

Marinalva, a conversão
dos sofrimentos em luta

“Desde cedo, conheci a fome, a exploração, o machismo e a pedofilia,
mas também a importância da solidariedade e da partilha.”
(Memorial Público Titular da Profª Drª Marinalva Silva Oliveira)
Não sei escrever um obituário e é o único aprendizado que não me interessa consolidar: ele sempre será o lamento por alguém que já não está.
Há muitos modos de medir a estatura de uma humana, de um ser social, para além dos pesos e medidas comumente utilizadas.
No caso da lutadora Marinalva, desde sua morte, foram tantas as pessoas de dentro e de fora da universidade a dizer do que ela tinha oferecido, organizado, ensinado e partilhado nas lutas e saberes, que a amiga querida nos parece uma desconhecida. Discreta e disciplinada, seu interesse era multiplicar consciências e lutas, todas! Das mais urgentes às de longo prazo; das mais singulares às mais universais. Foi uma alegria saber que no seu mundo de lutas e solidariedades também ali foi original e irrepetível. Assim, em primeiro lugar, foi frondosa a sua árvore da solidariedade de classe.
A segunda e mais difícil medida a considerar é aquela vinda da homenagem de adversários e mesmo de inimigos: a(o)s que pelo elogio na morte precisam apagar o não reconhecimento em vida.
Marinalva, em sua generosidade, rir-se-ia com todas as homenagens.
Outro traço desta amiga combinava a firmeza com a alegria e a disponibilidade ao diálogo. A premissa residia naquilo que entendia como a capacidade de mudar pelo aprendizado, pela tomada de consciência. Foi assim que ela, docente, tornou-se antirracista, anticapacitista, feminista e avessa aos cretinismos parlamentar, sindical e de movimentos sociais. Toda vez que uma organização da qual ela participava demonstrava limites por burocratização ou outras degenerações, lá ia ela – com suas dores – construir outros espaços de luta. Criança pobre, acumulou significativos sofrimentos e transmutou-se em jardineira. Marinalva não se demorava onde não existia amor e partilha. Interessava-lhe a semeadura.
Marinalva, presente!

Sara Granemann,
ex-presidenta da AdUFRJ

Foi uma perda muito abrupta de uma pessoa com uma capacidade amorosa extraordinária. Essa era uma característica muito poderosa da Marinalva. Ela era alguém capaz de travar um debate cerradíssimo na disputa política, com muitas divergências, sem jamais isso ter qualquer traço de ataque ou de destruição de pessoas. Ela fazia o embate muito corajoso e muito honesto do ponto de vista das ideias. Isso é uma característica rara que, combinada com esse modo de amar o outro e o mundo, que ela possuía, fazia dela um quadro extraordinário. A perda de uma pessoa com a idade dela, que, aliás, é a mesma que a minha, de uma forma repentina é sempre dolorosa para todos nós. Mas alguém que combinava uma quantidade de qualidades tão raras é sempre uma dor porque nos empobrece de forma irremediável. Pessoas como a Marinalva não estão por aí o tempo todo. Era incrível sua capacidade de, no meio de todos os debates e brigas, ter uma pausa para uma conversa humana, um bate-papo fortuito sobre as coisas da vida. Ela vai fazer falta. Eu vou sentir muita saudade dela. Os congressos do Andes já são tristes e, com a ausência dela, vão ser mais tristes ainda.

Eleonora Ziller,
ex-presidenta da AdUFRJ

Estive no velório da professora Marinalva. Historicamente fui um adversário político dela. Nossa relação sempre foi muito honesta. Ela sempre foi, como creio que eu sou, muito dura na argumentação política, mas nunca agiu com ataques pessoais. Ao contrário, nossa relação foi sempre muito afetuosa. No dia 18 de outubro conversamos muito sobre estratégias para emendas parlamentares. Ela vai fazer falta. É muito importante ter adversários que a gente admira, em quem a gente confia. Estive lá representando a reitoria da UFRJ. Mesmo diante de posições tão distintas, a gente, de fato, dialogava e essa é uma característica bastante rara na UFRJ.

João Torres,
ex-presidente da AdUFRJ

 

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