Ano novo, dívidas antigas e poucos recursos. A UFRJ entra em 2024 com um roteiro semelhante ao de exercícios anteriores. A diferença é que as verbas devem acabar ainda mais cedo, se não houver nenhuma suplementação orçamentária. “Até o início de julho”, prevê o pró-reitor de Finanças (PR-3), professor Helios Malebranche. Em 2023, mesmo com um aporte extra do governo Lula, os cofres ficaram vazios em meados de setembro.
O déficit do ano passado ainda não é conhecido com precisão, mas ultrapassa a casa dos R$ 100 milhões e pressiona as contas de 2024. A administração central ainda aguarda a chegada de faturas do mês de dezembro — e algumas de novembro — para fechar o número.
As maiores pendências são as contas das concessionárias. A universidade não paga a Light desde julho. A Águas do Rio não recebe desde setembro. Os valores mensais variam conforme o consumo, mas, em média, a UFRJ gasta R$ 4,5 milhões de energia e R$ 3 milhões com água.
Além das concessionárias, há atrasos com o pagamento de serviços como manutenção predial, de áreas verdes ou de elevadores. “Algumas empresas ameaçam não querer renovar contrato em decorrência dos atrasos nos pagamentos e isso tem afetado o nosso trabalho”, explica a pró-reitora de Gestão e Governança, Claudia Cruz. “Temos conversado com as empresas e tentando negociar a continuidade dos serviços enquanto nos esforçamos para regularizar os pagamentos”.
As reduzidas receitas da UFRJ neste ano, de R$ 388,3 milhões, ainda dependem da sanção presidencial ao orçamento da União, que pode ser realizada até o dia 22. Até lá, a reitoria faz o que pode com o que já recebeu: um duodécimo do valor (R$ 32,3 milhões) — conforme prevê a legislação federal para o funcionamento mínimo da máquina pública.
“As prioridades, como sempre, são todas as bolsas e os contratos de mão de obra e de alimentação dos restaurantes universitários. São despesas para as quais a gente já estava dando um tratamento diferenciado no final do ano passado”, explica o pró-reitor de Finanças em exercício, George Pereira — o professor Helios está de férias. “E estamos tentando avançar com algumas poucas despesas do ano passado”.
Em 2023, apesar de todas as dificuldades, a reitoria não cortou nenhum contrato. A única medida, em vigor desde setembro, foi restringir o pagamento de viagens. Só foram autorizados os trabalhos de campo em disciplinas obrigatórias. Mas o cenário pode mudar em 2024. “Estamos fazendo estudos para ver a possibilidade de adequar o orçamento às despesas”, diz George.
“Estamos com uma situação dramática. É muito importante que o nosso orçamento seja recomposto agora”, afirma a reitora em exercício, professora Cássia Turci — o professor Roberto Medronho está de férias.
A dirigente informa que as entidades nacionais de reitores das universidades e institutos federais (Andifes e Conif) solicitaram uma audiência à presidência para tentar reverter o cenário atual. “A nossa situação é crítica, mas várias universidades e institutos encerraram o ano passado com dívidas. E não terão condições de desenvolver suas atividades com o orçamento previsto”, completa Cássia.
REITORES REIVINDICAM MAIS R$ 2,8 BILHÕES
O resultado surpreendeu os reitores que, ao longo de meses de negociação junto ao governo e aos parlamentares, solicitavam um aumento de R$ 2,5 bilhões em relação à proposta orçamentária original, de apenas R$ 6 bilhões. Ainda em dezembro, a Andifes divulgou uma nota em que expressou a indignação com os números aprovados (confira AQUI o documento).
“Nós temos consciência das dificuldades econômicas do país. Por isso, não pedimos nada além do mínimo”, afirma a presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), professora Márcia Abraão (foto).
Os R$ 8,5 bilhões totais inicialmente pleiteados são próximos do valor de 2016, último ano do governo Dilma, sem contar a inflação do período, e equivalem ao do último ano do segundo governo Lula, em 2010, corrigido pela inflação. “E nós crescemos muito nos últimos 15 anos. Aumentamos em 30% o número dos estudantes de graduação. Foram criadas dez novas universidades. Tudo isso com o orçamento sendo diminuído”, explica Márcia, que é reitora da Universidade de Brasília (UnB).
Após a redução de R$ 310 milhões em relação à proposta do MEC, a demanda dos dirigentes passou de R$ 2,5 bilhões para R$ 2,8 bilhões. “Terminamos 2023 aos trancos e barrancos. As instituições mais novas, com até dez anos de criação, ainda não conseguiram sequer se consolidar. Tivemos universidade que deixou de pagar luz e muitas não puderam dar o justo aumento no valor das bolsas de graduação concedido pelo MEC. E quase todas terminaram no vermelho”, critica a reitora da UnB. “As universidades, que são fundamentais para o desenvolvimento do país e redução da pobreza, não têm como sobreviver com este orçamento. Isso significa que nós precisamos continuar atuando fortemente para reverter esta situação”, completa a presidente da Andifes.
Jornal da AdUFRJ publica retrospectiva de um ano marcado pela retomada da democracia, pelas dificuldades orçamentárias e pela luta dos docentes por melhores condições de trabalho
Janeiro
Democracia resiste
O ano começou com a esperança de dias melhores, depois da posse do presidente Lula. Diversos professores da UFRJ, inclusive da diretoria da AdUFRJ participaram da festa, em Brasília, mas o combate ao golpismo e à barbárie não esmoreceu. As tentativas extremistas de golpe de Estado foram debeladas pela atuação conjunta dos Poderes da República. Foi também um mês de dor com as denúncias de abandono e genocídio do povo ianomâmi. As imagens expuseram as dramáticas consequências da ações do garimpo ilegal na Amazônia. Na UFRJ, o professor Carlos Frederico Rocha Leão assumiu como novo reitor após a professora Denise Pires de Carvalho assumir a Secretaria de Educação Superior do MEC.
Fevereiro
Baixa renovação no Congresso
Em Brasília, Lula apoiou as reeleições de Arthur Lira na Câmara e Rodrigo Pacheco no Senado para garantir a estabilidade do sistema político. A nova legislatura tomou posse com um baixo índice de renovação entre os deputados. No Senado, figuras proeminentes do bolsonarismo ampliaram as fileiras da extrema direita. O 41º Congresso do Andes, realizado no Acre, decidiu pela desfiliação da central sindical Conlutas e definiu o número inédito de quatro chapas na disputa pela direção do sindicato nacional.
Março
Reajuste insuficiente
As mulheres foram às ruas em defesa da democracia e na luta por direitos iguais. Os docentes da UFRJ aprovaram em assembleia a recomposição de 9% nos salários, com severas críticas à defasagem em relação aos 26,94% de inflação acumulados durante o governo Bolsonaro. Alunos do CAp sofreram com a interdição da sede do Fundão por problemas estruturais. A AdUFRJ organizou um encontro entre professores da universidade e parlamentares fluminenses para aumentar a sinergia entre a academia e os políticos. A explosão de casos de ataques a escolas de ensino básico jogou luz nos impactos do discurso de ódio da extrema direita e sobre a necessidade de valorizar o professor.
Abril
AdUFRJ amplia apoio aos sindicalizados
A AdUFRJ promoveu um café da manhã para ouvir as demandas dos professores aposentados. O último reitor dos tempos da ditadura militar, o professor Adolpho Polilo, de 95 anos, encantou a plateia com a força de sua história. A AdUFRJ também deu início ao programa de visitas guiadas para filiados com todas as vagas para o passeio pela Pequena África preenchidas pelos docentes e acompanhantes. No final do mês, o professor Roberto Medronho foi eleito novo reitor para o período 2023-2027. A chapa formada por Medronho e a professora Cássia Turci recebeu ampla votação dos docentes.
Maio
Novas formas de mobilização da categoria
Na eleição do Andes, a UFRJ registrou aumento da participação dos docentes e deu larga vantagem à chapa do Renova Andes. A situação manteve o controle do sindicato com decisões polêmicas da Comissão Eleitoral Central. Após três edições virtuais, o evento “Conhecendo a UFRJ” abriu as portas da universidade para quase seis mil alunos de escolas públicas e privadas. Em Brasília, a coordenação do Observatório do Conhecimento cumpriu agenda política e realizou uma série de reuniões com deputados e com o ministro da Educação, Camilo Santana.
Junho
Avanços tecnológicos e sindicais
O Hospital Universitário Clementino Fraga Filho fez o primeiro transplante de fígado em oito anos, por meio do Centro Nacional de Transplantes Complexos, instalado no HU com recursos do Ministério da Saúde. O Canecão voltará à cena cultural carioca depois de 13 anos fechado. O consórcio Bônus-Klefer ganhou a concessão da área no Campus da Praia Vermelha e a abertura da nova casa de shows está prevista para os próximos três anos. A AdUFRJ deu sequência às atividades histórico-culturais com visitas guiadas à região da Pequena África e ao Real Gabinete Português de Leitura. O sindicato também apresentou o novo corpo jurídico após a contratação da Lindenmeyer Advocacia, que há 36 anos defende celetistas e servidores públicos. E lançou a campanha “Professores com Zé Gotinha”, para combater os danos causados pela desinformação sobre as vacinas.
Julho
Mudanças na reitoria e na AdUFRJ
A posse do novo reitor Roberto Medronho lotou o auditório do CT, em cerimônia que exaltou o ensino público de qualidade e a democracia. A professora Nedir do Espirito Santo substituiu o professor João Torres, nomeado pró-reitor de Pós-graduação e Pesquisa, na presidência da AdUFRJ. Foi um mês de muito trabalho e conquistas na AdUFRJ. O sindicato venceu a ação judicial dos 3,17% de reajuste ignorado pelo governo FHC e beneficiou dois mil professores que trabalharam na UFRJ entre 1995 e 2001. A seção sindical também iniciou diálogo com a reitoria para mudar as regras de progressões que prejudicam os docentes. Um novo curso de inglês para filiados, totalmente gratuito e online, foi mais uma iniciativa do sindicato. Em comemoração ao Dia Nacional da Ciência, um público estimado de 15 mil pessoas foi até a Quinta da Boa Vista em um domingo de sol. A AdUFRJ esteve presente para dar apoio ao evento.
Agosto
Eleição expõe visões distintas de sindicalismo
As campanhas das chapas que disputaram a diretoria da AdUFRJ expuseram ideias diferentes sobre sindicalismo, movimento docente e formas de aumentar a participação dos professores universitários no sindicato. A Advocacia-Geral da União emitiu novos pareceres a favor da progressão docente, após seguidas derrotas judiciais e pressão da comunidade acadêmica. A AdUFRJ cobrou da reitoria a aplicação do novo entendimento. O sindicato também reagiu à proposta de reajuste salarial de um por cento para servidores do Executivo e participou de manifestação pela valorização dos professores. O Observatório do Conhecimento organizou a Jornada de Mobilização em Defesa das Universidades Públicas, que transformou Brasília no centro de debates sobre o futuro das universidades. Dois passeios promovidos pela seção sindical encantaram os docentes: as visitas culturais aos palácios da Alerj e da Câmara Municipal e a exposição de Frida Kahlo no Forte de Copacabana.
Setembro
Mobilização em defesa dos docentes
Definição nas eleições da AdUFRJ. Em votação remota, a chapa “Valorização e Inclusão”, liderada pela professora Mayra Goulart, venceu com 61% dos votos. Sem tempo a perder, a diretoria do sindicato integrou um movimento nacional para pressionar parlamentares e governo por melhores salários e condições de trabalho. A agenda intensa contou com reuniões para a mobilização da categoria e a definição da estratégia de mobilização. No campus do Fundão, a deterioração das instalações da Escola de Educação Física e Desportos culminou no desabamento de parte do teto. A unidade foi interditada para obras emergenciais. Sem dinheiro para obras estruturais, a UFRJ pediu socorro. O Consuni aprovou moção para cobrar do governo federal uma suplementação orçamentária ainda em 2023.
Outubro
Más condições de estrutura da UFRJ vêm à tona
As gambiarras e a insalubridade de unidades da UFRJ foram expostas em outubro. No Centro de Ciências da Saúde, a excelência acadêmica convive com a estrutura degradada do prédio. Docentes, técnicos e estudantes do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional protestaram contra as dificuldades de infraestrutura, consequência do incêndio que atingiu parte do prédio da reitoria em 2016. No Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, alagamentos e riscos de incêndios são obstáculos no cotidiano da comunidade acadêmica. A nova diretoria da AdUFRJ tomou posse com atenção especial às condições de trabalho na universidade. A solenidade de posse reuniu professores de diferentes unidades. A diretoria do sindicato manifestou repúdio aos ataques de ódio sofridos pelos professores Michel Gherman (IFCS), Mônica Herz e Márcio Scalércio (PUC-Rio), em debate sobre a guerra entre Israel e o grupo palestino Hamas.
Novembro
Debate sobre a Ebserh domina o calendário da UFRJ
O Jornal da AdUFRJ produziu um especial em celebração ao Dia da Consciência Negra. O professor de Direito Processual Penal, Nilo César Martins Pompílio da Hora, primeiro docente negro a alcançar o topo da carreira na Faculdade Nacional de Direito estampou a campa da edição. A UFRJ chorou a perda repentina da professora Marinalva Oliveira, titular da Faculdade de Educação, militante pelos direitos de pessoas com deficiência. Os diretores de quatro hospitais da universidade apresentaram a situação crítica das unidades. A crise reduziu o número de leitos no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho para apenas 180. Para embasar a discussão sobre a adesão à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), a professora Ligia Bahia apresentou no Consuni um relatório de 71 páginas que detalhou dados sobre os 41 hospitais administrados pela empresa. A festa de fim de ano da AdUFRJ reuniu professores de diferentes unidades no Fórum de Ciência e Cultura.
Dezembro
Progressões múltiplas têm avanços
Os professores terminaram o ano com uma excelente notícia. Com atuação decisiva da AdUFRJ, a proposta de resolução que volta a permitir as progressões múltiplas na carreira está em análise na Procuradoria da UFRJ. O sindicato também trabalhou exaustivamente em Brasília. Em conjunto com o Observatório do Conhecimento, a Reitoria e a Coordenação de Relações Externas, fez parte da conquista de 27 emendas parlamentares para a UFRJ, totalizando R$ 125,86 milhões. O valor corresponde a um terço do orçamento da instituição para 2024. Após dez anos de polêmica, o Consuni aprovou a adesão à Ebserh com 73% dos votos. O Hospital Universitário, o Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira e a Maternidade Escola serão administrados pela empresa. A nona edição da Bienal da Escola de Belas Artes da UFRJ, com o tema “Kaleidoscópio”, reúne, até o dia 24 de março, 76 obras de 54 artistas no Paço Imperial.
Feliz 2024
Que o novo ano fortaleça nossa esperança e nossa coragem para defender salários justos, condições dignas de trabalho e uma universidade pública, gratuita, de qualidade e inclusiva.
Diretoria da AdUFRJ