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Mais do que a eleição das redes, esta é a eleição do Whatsapp. A campanha de Haddad terá de intensificar a estratégia diante da máquina bolsonarista – cerca de 15 mil grupos de zap que começaram a agir há pelo menos três anos. Uma das tarefas decisivas do segundo turno, destaca a diretora da Escola de Comunicação da UFRJ, professora Ivana Bentes, é responder com máxima velocidade às fake news no zap. A docente, que participou de uma reunião de coletivos de mídia em São Paulo, destaca iniciativas que começam a ser montadas nas redes sociais. “Serão criados grupos de Whatsapp com links públicos para oferecer uma contranarrativa”, disse. “Começou uma campanha de cada um virar dois votos por dia. As pessoas têm que reaprender a conversar”. Ivana criticou a decisão da candidatura do PSL de não ir aos debates do segundo turno, mas vê coerência: “Quanto mais ele fala, mais explicita o vazio da argumentação. É lamentável”. Sem ir a debates, Bolsonaro reagenda o confronto público e o desloca para seu palco favorito, as redes, onde tem seguidores fiéis e não é contestado. Outro ponto importante, para a diretora da ECO, é simplificar a linguagem para dialogar com outros grupos sociais. “A esquerda se acostumou a trabalhar com análise de conjuntura, com um discurso que não fura a ‘bolha’. É preciso investir em memes, em humor”, afirma. O cientista político Antônio Lavareda acompanha grupos de whatsapp de um lado e outro. “O volume que recebo de material de Bolsonaro, em relação ao de Haddad, é de 10 para um”, afirma. Mesmo numa eleição tão polarizada, Lavareda entende que é possível “converter” votos e furar a bolha. Na verdade, afirma Lavareda, as bolhas vão se ampliando e há chance de argumentação. Para o professor de Publicidade e Propaganda da UFRJ Marcelo Serpa, é preciso ouvir: “É preciso se desarmar e entender o eleitor. Sem isso, não tem como tocá-lo”. O docente lista grupos a serem conquistados, e o maior deles é o que não foi votar: são quase 30 milhões de eleitores, o que gerou uma abstenção de 20,33%. “O público que não quer saber de política é mais fácil de conquistar”, afirma Serpa. Votos nulos somaram 7,2 milhões (6,14%), e os em branco, 3,1 milhões (2,65%) — e também são votos a serem conquistados. Outro grupo é o de eleitores de outros candidatos, como Ciro e Marina. Por fim, se houver tempo, é possível buscar eleitores de Bolsonaro. “Em uma ponta, temos o bolsonarista que faz campanha. Na outra, o confuso, que não sabe bem se posicionar, e opta pelo Bolsonaro. Eu faria pesquisa com bolsonaristas, tentaria entender seu grau de convencimento. E encontrar um discurso que seduza o bolsonarista que não é fechado”, afirma Serpa.

Na noite de domingo, dia 7, logo após saber que disputaria o segundo turno, Jair Bolsonaro (PSL) afirmou que vai “botar um ponto final em todos os ativismos no Brasil”. A frase acendeu o sinal vermelho dos movimentos sociais país afora e fez crescer a mobilização para buscar votos contra a sua candidatura. Gizele Martins, jornalista e militante dos direitos humanos, explica que a estratégia para chegar aos moradores das periferias é o corpo a corpo. “Já vivemos o fascismo nas favelas. Um governo de extrema-direita pode piorar nossa vida”, disse. “Vamos lembrar as ações do PT que mudaram o dia a dia das pessoas, como o bolsa família, as cotas”, explica. O movimento de mulheres fará novo ato em 20 de outubro, com o mote “Mulheres pela democracia”, contra a candidatura de Bolsonaro. Militantes LGBTI formaram uma frente em favor de Haddad. “É um projeto que defende a democracia, com proposta clara sobre direito e igualdade. O outro propõe ódio e negação de direitos”, afirma Cláudio Nascimento, integrante da Aliança Nacional LGBTI. O desafio é conseguir falar para quem não defende a mesma causa, alerta o professor Ivo Coser. Ele lembra que o horário eleitoral gratuito perdeu influência diante das redes sociais, e a mobilização também terá de se dar nesse nível, onde Bolsonaro nadou de braçada no primeiro turno. “Não só se parte atrás em termos de números, mas também nas táticas de jogo”, afirma. AÇÕES NA UFRJ Preocupada com o futuro da universidade, a comunidade acadêmica reage. As entidades representativas de alunos, professores e técnicos lançaram nota conjunta em defesa da democracia (veja na página 4). A diretoria da Adufrj convocou assembleia para quarta-feira, dia 17, às 14h, na sala 426, 4º andar do Bloco A do CT. A discussão da conjuntura eleitoral e uma proposta de construção da Frente pela Democracia fazem parte da pauta. “Não é mobilização partidária. É posicionamento político. A briga é em defesa da universidade pública”, diz a presidente da Adufrj, Maria Lúcia Werneck. A movimentação na UFRJ não é isolada. O Andes indicou a realização de assembleias de docentes em todo o país para debater a criação de frentes antifascistas, além de propor a discussão de estratégias para a defesa de direitos e das universidades públicas. No Rio, sindicatos e movimentos sociais já iniciaram a mobilização. Diretor da Adufrj, o professor Eduardo Raupp tem participado dos encontros: “O clima é de apreensão, mas não de recolhimento. Estão todos mobilizados”. Raupp informa que estes fóruns terão caráter permanente: “A mobilização contra o fascismo não se encerra no segundo turno, qualquer que seja o resultado, diante da eleição de um Congresso Nacional de perfil bastante conservador”, disse.

A crise institucional brasileira ocorre, em especial, pelo esgotamento do modelo de tripartição de Poderes. Não é um fenômeno exclusivamente nacional, mas mundial. Os Estados contemporâneos encontram-se com distorções nas funções de seus Poderes. No caso brasileiro, ocorre hipertrofia do Judiciário na tentativa de assegurar direitos e hipotrofia do Executivo, refém do Legislativo, pelas contínuas e históricas perdas de apoio para o desenvolvimento de políticas de governo. A sociedade brasileira sofre as consequências de uma ordem política insegura e de previsões incertas sobre direitos fundamentais. Desde a redemocratização, a partir da Constituição de 1988, presencia-se um processo longo e imperioso sobre a necessidade de assegurar direitos individuais e sociais. Por motivos diversos, o Executivo deixa de cumprir em grande parte seu papel e seu compromisso constitucional. Problemas de falta de logística, de recursos, de ausência de planos de governo estáveis e de políticas públicas de pouca eficiência demonstram a difícil tarefa de consecução e da consolidação dos direitos fundamentais. O plano de realização destes direitos inalienáveis na ordem democrática está ameaçado e, por conseguinte, percebe-se o quão contraditória pode se revelar uma sociedade democrática sem que se tenha a garantia e a efetivação de tais direitos. O resultado é um Executivo, no Brasil, desgastado. Como explicar esta “crise institucional”? Um dos pontos sensíveis parece ser o distanciamento entre a sociedade civil e o Estado brasileiro. Existem dois entes em conflito permanente. Essa polarização traz uma demanda de ordem institucional muito grande que poderia ser traduzida na tentativa dos Poderes de serem alçados à condição de “o mais representativo” ante a sociedade civil. A disputa é pelo reconhecimento como instituição com maior grau de legitimidade — o que, na verdade, se resume a fatores midiáticos. Ao que tudo indica, não existe confluência de interesses políticos e jurídicos para a promoção efetiva dos direitos fundamentais como base da democracia. Este móbile da atividade institucional, competitivo e destrutivo em razão da concorrência por uma maior legitimidade, promove, ao contrário, a tensão política entre os Poderes marcada por acertos e barganhas quase sempre com baixo grau de legitimidade. A crise se mostra clara quando do desequilíbrio entre as funções e competências constitucionais dos Poderes em vista de uma atividade eminentemente política. Esquece-se a função de promoção dos direitos fundamentais como fio condutor da aproximação entre Estado e Sociedade Civil para a concretização do Estado Democrático de Direito. A Constituição Federal é ameaçada por todo este jogo político polarizado de Poderes. Atacam-se princípios fundamentais. Algo inaceitável e que não pode ser naturalizado: qualquer ameaça a direitos fundamentais põe em risco a própria democracia brasileira. Para as eleições em curso, deve-se acreditar em um projeto de governo que possa se comprometer com a defesa incondicional dos direitos fundamentais que representam a essência do Estado Democrático de Direito. Nestas eleições, ante a crise institucional, discute-se a questão político-estatal sem que seja recuperada a simbologia do ato constituinte de 1988: “a democratização do País”. É um processo contínuo e irrevogável. Esquece-se de toda uma trajetória de conquistas de direitos, ao longo de 30 anos, indispensáveis ao projeto político social democrático. O ato constituinte foi pautado nos direitos fundamentais para a segurança da democracia. Não existe outra equação. Estas eleições não podem ser outra coisa senão a reafirmação de um projeto político-constitucional originário e definitivo para nós brasileiros com as garantias dos direitos fundamentais. O desequilíbrio e a polarização dos Poderes não são de solução imediata. Há que se pensar nestas eleições na importância de um Executivo com legitimidade e um propósito muito claro sobre a defesa dos direitos fundamentais. É uma pauta indissociável da vida democrática brasileira. Somente assim seria possível assegurar um nível adequado de legitimidade para a nova Presidência e uma reaproximação entre os Poderes e a sociedade civil. Do contrário, aprofundar-se-á a já histórica crise institucional brasileira. CARLOS BOLONHA Diretor da Faculdade Nacional de Direito e Professor de Teoria do Estado e de Direito Constitucional

Eleições 2018: uma história de mulheres e camadas

Faz mais ou menos um mês que recebi o convite para escrever este texto. Na época, as coisas já estavam difíceis. Imaginava que ficariam mais. A que ponto exatamente chegaríamos? Impossível precisar. Hoje tenho em mãos a missão de entregar meu artigo. Pergunto-me: sobre o que escrever? A princípio, poderia produzir um balanço sobre o que o último domingo significou para história do Brasil. Um grande retrocesso na luta por democracia. Ao mesmo tempo precisamos reconhecer: o processo eleitoral de 2018 não cabe por completo nessa sentença. Assim, poderia apresentar um quadro estatístico, enaltecendo as conquistas heroicas de mulheres negras, como Erica Malunguinho (PSOL). Autora do projeto revolucionário Aparelha Luzia Quilombo Urbano, a arte-educadora torna-se a primeira deputada federal transexual do estado de São Paulo. Como ela diz: “Reintegração de posse”. Eu, que ando por aí, destemida e rebelde, afirmando que mulheres negras são intelectuais em seus múltiplos fazeres, celebro a conquista de Erica e de todas as mulheres — cis e transgêneras — de meu grupo racial, evocando a imagem de D. Sonia. Na infância, adorava quando minha mãe fazia torta salgada. Ela explicava que o segredo para a receita dar certo era a quantidade de camadas que fazíamos. E, ao bom estilo da pobreza brasileira, identificada pela sociologia branca como “ralé”, a professora e cozinheira caprichava nas misturas. Geleia, frango, carne, sardinha, maionese, iogurte, purê de batata. Milimetricamente distribuídos em fatias de pão de forma sem casca, encomendadas com antecedência na padaria da esquina, a organização dos ingredientes garantia o sucesso do resultado. A tal torta, que em minha memória ficou associada à “semana do pagamento” de uma tradicional família brasileira, composta por mulheres da classe trabalhadora, é metáfora do agora. Nosso tempo presente é uma história de mulheres e camadas. O retrocesso é indiscutível. A gravidade chega ao ponto de termos no segundo turno um candidato acusado de sonegar impostos, receber propinas, ser beneficiado por caixa dois de campanhas eleitorais. Um político que defende o fim dos Ministérios do Trabalho, da Ciência e da Tecnologia. O porte de armas, a redução da licença-maternidade, a castração química como punição para crimes de estupro. Sob a narrativa de moralizar e proteger a sociedade, Jair Bolsonaro tornou-se a principal opção da população no Brasil, exceto no Nordeste. Região que, de novo, “deu um vira” no estereótipo de atraso e burrice. Água, comida, educação integram a gramática de uma democracia de marcas profundas. Voltando à torta salgada, prefiro acreditar que o crescimento da extrema direita, exemplificado pela eleição expressiva de políticos conservadores, homens, brancos, heterossexuais, em estados e na federação, pode ser lida como o meio. Por estranho que pareça, esse meio é dependente. De quem? Da primeira e da última camadas da torta. Elas são compostas pela passagem de Fernando Haddad para o 2º turno da eleição presidencial. Um político que, como prefeito de São Paulo, aumentou o piso salarial dos professores, construiu três hospitais gerais e mais de quatrocentas creches. Que, à frente do Ministério da Educação, notabilizou-se por programas revolucionários como o ProUni, pela abertura de 18 universidades federais e pelo Plano de Desenvolvimento da Educação. A base da torta traz a indicação de Fátima Bezerra, do PT, para disputar o 2º turno no Rio Grande do Norte. E, não menos importante: a eleição de mulheres negras para deputadas estaduais e federais em Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador. No Brasil irreversível, Áurea Carolina (PSOL-MG), Dani Monteiro (PSOL-RJ), Mônica Francisco (PSOL-RJ), Olívia Santana (PcdoB-BA), Renata Souza (PSOL-RJ), Talíria Petrone (PSOL-RJ), entre outras, apresentam propostas que articulam equidade racial, de gênero e direitos humanos. Urbanização das favelas, desmilitarização do estado, desencarceramento, combate ao racismo institucional. Atenção à educação pública, às pessoas em situação de rua, legalização do aborto, estado laico, creches noturnas. Autonomeadas sementes da vereadora Marielle Franco, brutalmente assassinada no Rio de Janeiro em março de 2018 por seu compromisso com o combate à violência e à corrupção, seus mandatos já começaram nas ruas. Nos milhões de votos recebidos. Hoje só dá para pensar que essas mulheres ocuparão a Câmara e as Assembleias Legislativas com a categoria das camadas que transformam a história. Elas chegam para ficar na política partidária. Merecem o nosso apoio. Nosso cuidado. Parabéns, meninas! GIOVANA XAVIER Historiadora, professora Faculdade de Educação UFRJ, coordenadora do Grupo Intelectuais Negras e do Grupo PET Diversidade UFRJ, colunista do Nexo Jornal

"O cenário sombrio desenhado no final do primeiro turno desencadeou uma onda de perplexidade. Porém, o momento exige mais do que a reflexão indignada e desencanto", diz um trecho O contexto de incertezas sobre o futuro das universidades públicas delineado pelo resultado das eleições exige o posicionamento inarredável das entidades da sociedade civil em torno dos direitos democráticos e sociais. Ameaças de autogolpe e de destruir toda forma de ativismo político, além de ataques e ameaças à integridade física de pessoas e grupos identitários, desestabilizam regras básicas de convívio social e exigem uma atuação responsável no segundo turno. Estamos atentos. O CENÁRIO SOMBRIO desenhado no final do primeiro turno desencadeou uma onda de perplexidade. Porém, o momento exige mais do que a reflexão indignada e desencanto. Precisamos de lucidez para mover-nos na árdua jornada contra a intolerância. Exigimos que as instituições responsáveis pela garantia de um debate eleitoral público coíbam o incitamento de violências. O futuro do país, de suas universidades públicas e sistema de ciência e tecnologia requerem que os programas dos candidatos sejam apresentados com clareza e discutidos democraticamente. A DISSEMINAÇÃO DE TRUCULÊNCIA e intolerância é inaceitável. A AdUFRJ, ao lado de sindicatos, movimentos sociais e associações científicas e profissionais, integrantes da construção democrática no país, não aceita restrição de liberdades e direitos políticos e sociais. Valores e princípios de igualdade e respeito às diversidades são a razão de ser da nossa entidade. Não transigiremos. Nenhum direito a menos. Diretoria da Adufrj

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