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Diretoria da AdUFRJEmbora separados por mais de cinco séculos, os integrantes da atual diretoria do Andes e os monges hesicastas do Império Bizantino guardam similaridades impressionantes. Duas delas são notáveis: a capacidade de abstração da realidade e a convicção de que o próprio umbigo é o centro do universo.
A postura dos monges hesicastas foi determinante para a queda do Império Bizantino, que viveu seu auge no século XI e mergulhou em declínio a partir do final do século XIV. Sob a iminência de um ataque dos turcos otomanos — que viria a se concretizar, levando à queda de Constantinopla em 1453 —, o império tinha como única tentativa de resistência uma aliança política e militar com o Ocidente, sendo vital para isso uma reunificação da Igreja Bizantina com a Igreja Católica. Indiferentes à realidade, os monges hesicastas foram contrários à aliança. Isolados em seus mosteiros, eles preferiram seguir com a prática da onfaloscopia — a observação do próprio umbigo, enquanto repetiam uma mesma oração. No mundo real, o império ruía.
É também com uma admirável capacidade de abstração da realidade que a diretoria do Andes tem conduzido o sindicato neste crucial momento do país. Com uma genérica posição de “Fora, Bolsonaro”, o sindicato nacional se exime de apoiar a única candidatura com potencial para varrer do Planalto o governo fascista de Jair Bolsonaro: a de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O Andes sequer encaminhou o debate sobre a eleição presidencial para discussão em suas instâncias de decisão. Com requintes de abstração, convocou para 28 de setembro — quatro dias antes do 1º turno — uma reunião de seu GT de Política Agrária, Urbana e Ambiental para debater, entre outros temas, o Plano Nacional de Mineração 2030 e 2050.
Mas, na última reunião do Setor de Instituições Federais de Ensino, nos dias 6 e 7 de agosto, a diretoria do Andes foi voto vencido: ficou decidido que as federais farão assembleias até o final deste mês para debater as eleições. Alvíssaras: foi a primeira vez que o setor aprovou uma decisão contrária à direção nacional. Anote aí na agenda: a assembleia da AdUFRJ será no dia 31. Confira tudo em nossa matéria da página 4.
Enquanto o Andes prefere olhar para o próprio umbigo e repetir velhas orações, 124 ex-dirigentes e reitores não empossados de 54 universidades federais tomaram posição. Eles assinaram um manifesto em defesa da Democracia e em apoio à candidatura do ex-presidente Lula, como detalha nossa matéria da página 3. O documento foi entregue ao próprio candidato no dia 15, em aula aberta na USP. Assinam o manifesto quatro ex-reitores da UFRJ: Alexandre Pinto Cardoso, Nelson Maculan, Carlos Levi da Conceição e Roberto Leher.
A urgência de o movimento docente se engajar na campanha presidencial também foi o mote do debate do programa Contramola, no último dia 10, como mostra a matéria da página 5. As professoras Mayra Goulart, vice-presidente da AdUFRJ, e Elisa Guaraná, presidente da Adur-RJ, falaram sobre a crise nas universidades federais, asfixiadas pelos cortes orçamentários, e a necessidade de um posicionamento firme do Andes para a derrota nas urnas do governo Bolsonaro, com o apoio à candidatura Lula, tirando o sindicato nacional de sua letargia monástica.
Completam esta edição os estudos para a ampliação dos serviços jurídicos da AdUFRJ, na página 6; as atividades da 26ª BioSemana da UFRJ, na página 7; e, na página 8, a bela homenagem a Alex Schomaker Bastos, estudante de Biologia da UFRJ assassinado em 2015: ele agora batiza uma nova espécie de vaga-lume.
Faltam menos de 50 dias para as eleições de outubro. Ainda há tempo para os que praticam a onfaloscopia atentarem para a gravidade do momento. Afinal, não existe só um umbigo no mundo.
Boa leitura!
Foto: Fernando SouzaIsadora CamargoUma fila extensa percorria os corredores da Escola de Comunicação, no fim da tarde de 1º de agosto, quando uma aluna anunciou ao megafone: “Já vai começar”. Pouco depois, com a plateia instalada, a luz apagou. O rosto do ator reluziu o vermelho do holofote. Uma distorção de guitarra tocou ao fundo. Após dois anos de UFRJ fechada, outra noite de espetáculos da Mostra Mais de Teatro começava a encantar o público.
“Estávamos ansiosos. Em janeiro de 2020, estava tudo pronto e tivemos que cancelar, trocar o formato. É maravilhoso estar de volta.” comemorou Erika Neves, produtora da Mostra. O evento é a exposição das peças dirigidas pelos alunos de Direção Teatral, ao longo da disciplina de Direção VI. Ocorre todo ano, ao fim do primeiro semestre letivo. Durante a fase mais aguda da pandemia, em 2020 e 2021, ocorreu de forma remota. “Foi um desafio, e um momento de muito aprendizado, como é o papel da arte, continuar criando possibilidades para um mundo tão devastado”, comentou a professora Eleonora Fabião, que coordena o curso de Direção Teatral.
No retorno aos palcos deste ano, a Mostra lotou os 60 lugares da Sala Vianninha da Escola de Comunicação, na Praia Vermelha, em quase todas as oito peças apresentadas entre 25 de julho e 5 de agosto. Também houve performances do curso de Dança da UFRJ, convidado especial do dia 3.
A iniciativa também contribui para formar um novo público para o teatro. Um dos espectadores, o estudante de Jornalismo Aerton Menezes viu na UFRJ a primeira oportunidade de conhecer esta arte tão de perto. “Tive um primeiro contato na ECO, em uma oficina de Teatro do Oprimido da galera de Direção Teatral. Foi uma experiência muito boa”, disse. “Comecei a me interessar e soube que, no final dos períodos, o pessoal organiza a Mostra. Fiquei ansioso para que chegasse. Achei muito massa. É algo gratuito, produzido pelos próprios alunos, e de qualidade”.
SABERES EM DIÁLOGO
A ECO e o Programa de Apoio às Artes da UFRJ (PROART) providenciam a estrutura da Mostra. Já a equipe contou com a participação das escolas de Belas Artes, Música e Comunicação da UFRJ, Escola de Teatro da UniRio, Escola Técnica Martins Penna e grupos independentes. “A gente abre as portas para receber a comunidade. Juntamos atores e atrizes, amadores e profissionais do Rio de Janeiro inteiro. É um movimento de teatro universitário na cidade, radicalmente interdisciplinar, conectivo e dialógico”, avalia Eleonora. “Essa é a inteligência teatral: colocar saberes em diálogo”.
A Mostra também significa a chance para estudantes de diferentes áreas se envolverem na produção cultural. Sarah Soares, aluna de Rádio e TV na UFRJ, é um exemplo. “Eu vi que a gente poderia participar, sendo de outros cursos. Me interessei pela peça “A Partilha”. Foi muito gratificante, não só pela experiência profissional, mas também por ter conhecido as meninas da equipe”, afirmou. “Gostei muito desse intercâmbio entre os cursos. Todo mundo ganha.”
“A Partilha”, escrita por Miguel Falabella, foi dirigida pela aluna Louise Guima. A comédia conta a história de quatro irmãs que se reencontram para dividir os bens da falecida mãe. “Tenho muita familiaridade com o gênero. Já fiz muito teatro de comédia, mas atuando, nunca tinha dirigido. Senti que seria bom para começar, para uma primeira peça, uma coisa mais leve para mim”. A estudante relacionou sua estreia como diretora com o próprio enredo de “A Partilha”: “Minha equipe foi só de mulheres, então a gente acabou se unindo muito. E é o que a peça fala sobre, partilhamos muita coisa juntas, descobrimos que todas, no fim, têm a mesma família, e viramos uma”.
Estela MagalhãesOs professores sindicalizados já podem se beneficiar de um novo convênio da AdUFRJ, firmado com a rede de drogarias Raia. Há descontos a partir de 15%, válidos online e nas lojas físicas, em medicamentos genéricos e tarjados e artigos de perfumaria. “É um serviço que todo mundo usa, então esperamos atender grande parte dos associados da AdUFRJ”, diz a diretora Karine Verdoorn.
Para ativar o desconto, basta acessar o site www.drogaraia.com.br, fazer o cadastro com o CPF e acessar a aba “meus benefícios”. Dependendo do laboratório do medicamento, a redução pode chegar a até 30% do valor. “Temos buscado cobrir diferentes áreas através dos convênios. E saúde e bem-estar representam uma área muito importante para os nossos associados”, completa Karine.
Caso o professor já tenha um plano de saúde que ofereça desconto na Raia, o menor valor da compra prevalece. “Vários professores não têm plano de saúde, então este convênio oferece um ótimo benefício”, diz Meriane dos Santos Paula, funcionária responsável pelo setor dos convênios. “Para vários professores que utilizem o convênio uma, duas ou três vezes, o desconto chega muito próximo ou até se equipara ao valor da contribuição mensal ao sindicato”, explica.
Professora Terezinha Castiñeiras - Foto: Twitter UFRJO Brasil registrou 2.458 casos confirmados de varíola dos macacos até esta sexta-feira (12). No mundo, já são mais de 27 mil. Para avaliar como o país está combatendo a doença e a contribuição da UFRJ, o Jornal da AdUFRJ entrevistou a professora Terezinha Marta Castiñeiras, diretora do Núcleo de Enfrentamento e Estudos de Doenças Infecciosas Emergentes e Reemergentes (Needier) da universidade.
Estamos atrasados em relação ao combate ao monkeypox?
Entendemos que seja necessário um esforço concentrado dos gestores, das equipes de saúde, dos pesquisadores e da população. O primeiro passo é reconhecer a magnitude do problema e o seguinte é investir em sua solução. Para o enfrentamento do monkeypox é fundamental que a população esteja adequadamente informada sobre a forma de transmissão do vírus e como minimizar estes riscos. A despeito de toda complexidade, não estamos partindo do zero, já existem recursos estratégicos potenciais, cabe torná-los disponíveis e utilizá-los em bases científicas.
O Ministério da Saúde anunciou a compra do medicamento tecovirimat para combater o monkeypox. Qual sua avaliação sobre esta medida?
Estudos in vitro e em animais de experimentação apontam para o benefício do uso do tecovirimat nas infecções pelos orthopoxvírus em geral. Contudo, não temos conclusões definitivas sobre eficácia e segurança da droga no tratamento específico da infecção humana pelo vírus monkeypox. No contexto de escassez do medicamento para suprir a demanda internacional, é primordial assegurar o atendimento aos indivíduos mais gravemente acometidos. O esforço do Ministério da Saúde é de conseguir um quantitativo mínimo que possa atender aos casos mais críticos. Paralelamente, é também de interesse global e nacional tentar estabelecer, através de estudos multicêntricos bem controlados, as indicações mais precisas do tecovirimat e otimizar o seu uso. A Organização Mundial da Saúde propôs recentemente um protocolo para um estudo internacional e a expectativa é que o Brasil faça parte desta iniciativa. A nível nacional devem participar alguns centros de referência. A UFRJ deverá participar e, possivelmente, coordenar o estudo.
As gestantes serão público-alvo do estudo?
O estudo atual proposto pela OMS é baseado em um ensaio clínico do tecovirimat que já está em curso na República Democrática do Congo. No referido estudo, estão incluídos adultos e crianças maiores, mas não gestantes. Dado que as gestantes, assim como as crianças e pessoas imunossuprimidas, são vulneráveis a formas mais graves da doença e não existem dados concretos de benefício e segurança da droga em mulheres grávidas. Um estudo que englobe estas populações tem grande relevância e, por esta razão, está sendo defendido pela OMS.
Qual é o papel da UFRJ na testagem da doença?
No Laboratório de Virologia Molecular do CCS, estamos realizando testagem dos casos suspeitos diretamente atendidos no NEEDIER ou em qualquer outra unidade do Complexo Hospitalar da UFRJ. Adicionalmente, como centro nacional de referência em diagnóstico de monkeypox para o Ministério da Saúde, recebemos na UFRJ encaminhamento de materiais biológicos de pacientes atendidos no estado do Rio de Janeiro, no Espírito Santo e nos estados da região Centro-Oeste. Até o dia 10 de agosto, o laboratório investiga 1.052 pessoas com suspeita de monkeypox, com 906 resultados de PCR liberados e 146 em processamento. Entre os liberados, a taxa de positividade é de 45%.
Foto: Alexandre MedeirosO pátio de pilotis do Edifício da Amizade da PUC-Rio, cenário de resistência contra a ditadura militar no período mais repressivo dos anos 1970, ficou lotado na manhã da última quinta-feira. Mobilizada por mais de 40 entidades da sociedade civil, a leitura da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito levou centenas de pessoas ao campus da Gávea, em um dos mais simbólicos atos do país em defesa da democracia nesse já histórico 11 de agosto.
A presidente da Associação de Docentes da PUC-Rio, Alessandra Maia, professora do Departamento de Ciências Sociais, abriu os trabalhos com uma defesa do sistema eleitoral brasileiro. “Esses tempos de ameaças às eleições, às urnas eletrônicas, ao método, à Ciência, ao sistema eleitoral que torna possível o ritual democrático de nosso país há pelo menos 25 anos, explicam um pouco o que nos traz aqui. Há que se respeitar o voto, o resultado das eleições”, disse Alessandra.
Um dos momentos mais emocionantes do ato foi o discurso do diretor do Departamento de História, professor Marcelo Jasmin. Ele lembrou que era um dos estudantes que, em maio de 1977, ocuparam o mesmo pátio da PUC em plena ditadura para pedir democracia. Eram sete mil pessoas desafiando uma ordem do governo militar, que proibira manifestações estudantis. “Embora helicópteros fizessem voos rasantes aqui nos filmando, ameaçando, intimidando e lançando bombas de gás lacrimogêneo, os pilotis da PUC-Rio se tornaram um local de encontro e de articulação de entidades da sociedade civil em defesa das liberdades democráticas”, recordou Jasmin, muito aplaudido.
Também o vice-reitor da PUC, professor Augusto Sampaio, enfatizou a importância de realizar o ato em um local de resistência ao autoritarismo. “A PUC sofreu muito com a ditadura. Nosso Diretório Central dos Estudantes se chama Raul Amaro em memória de um ex-aluno nosso que foi assassinado pela ditadura. Quem viveu aquele período sabe a importância de defender o Estado Democrático de Direito”, disse Sampaio. A carta foi lida por professores de diversos departamentos da PUC, além de representantes da Associação dos Funcionários e do DCE. Ao final da leitura, a plateia gritou “Fora, Bolsonaro” e cantou o Hino Nacional.
Para o jornalista Octávio Costa, presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), uma das entidades organizadoras do ato, o 11 de agosto representou um levante da sociedade civil contra as ameaças golpistas do governo Bolsonaro: “Não há como ficar em cima do muro. Nós temos a barbárie contra o direito, a barbárie contra a democracia, e a ABI está tomando partido. Estamos aqui em defesa da democracia, do processo eleitoral e do resultado das eleições. Porque temos um presidente que ameaça não respeitar o resultado e fazer o que se fez nos Estados Unidos em 6 de janeiro do ano passado, quando invadiram o Capitólio. Isso não vai acontecer aqui”, disse Octávio.