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Carlos Frederico Rocha
DIRETOR DO
INSTITUTO DE ECONOMIA
EX-REITOR
DA UFRJ
O recente bloqueio de um terço dos recursos das universidades federais reacendeu um debate urgente, porém frequentemente malconduzido, sobre o financiamento e o funcionamento dessas instituições. Não é à toa que Conselhos Universitários, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) se manifestaram, alertando para o risco real de paralisação das atividades e para o contínuo processo de sucateamento das universidades — pilares do desenvolvimento científico, tecnológico e social do país.
No entanto, o debate público parece ignorar questões fundamentais. É o que ficou evidente no editorial da Folha de S. Paulo, intitulado “Não Há Dinheiro que Baste para as Universidades Públicas”, que, mais uma vez, recorre a argumentos frágeis, como a alegação de que a maior parte do orçamento universitário está comprometida com despesas de pessoal, sugerindo, portanto, que há má gestão, falta de flexibilidade orçamentária e necessidade de fontes alternativas, como a cobrança de mensalidades.
O Mito dos Gastos com Pessoal
Tomemos como exemplo a UFRJ. Seu orçamento anual gira em torno de R$ 4 bilhões, dos quais apenas R$ 400 milhões são discricionários — ou seja, destinados a despesas operacionais como água, luz, segurança, insumos de laboratório e manutenção. A esmagadora maioria, cerca de R$ 3,5 bilhões, destina-se à folha de pagamento. Mas convém lembrar: desse total, quase R$ 1,5 bilhão refere-se a aposentadorias e pensões, um passivo previdenciário que não tem relação direta com as atividades atuais da universidade.
Mais grave do que a má interpretação dos números é o desconhecimento da dinâmica do setor. Ao contrário do que sugere o editorial, a política de pessoal das universidades sofreu alterações constantes, realizadas pelo poder central, sem consulta e sem discussão com os gestores universitários. Nas últimas décadas, diversas funções antes exercidas por servidores públicos — segurança, manutenção, carpintaria, eletricidade, entre outras — foram terceirizadas. Esse enxugamento, no entanto, não veio acompanhado do necessário reforço nos recursos discricionários, que, ao contrário, vêm sofrendo cortes sucessivos.
Mensalidades: Solução ou Equívoco?
Outro ponto recorrente no debate — e igualmente problemático — é a defesa da cobrança de mensalidades como solução para a crise financeira. Trata-se, mais uma vez, de um argumento que ignora a realidade das universidades federais.
Em primeiro lugar, o perfil socioeconômico dos estudantes não corresponde à elite econômica. Uma cobrança ampla penalizaria justamente a classe média em processo de empobrecimento, ou então teria impacto financeiro irrelevante ao atingir uma minoria.
Em segundo lugar, é um equívoco grave tratar o ensino como o único ou principal custo das universidades. Grande parte dos investimentos e dos custos operacionais está vinculada à pesquisa — atividade que, paradoxalmente, é celebrada pela mesma imprensa que critica os gastos universitários.
E há uma barreira fundamental: mesmo quando as universidades geram recursos próprios — por meio de cessão de imóveis, projetos, convênios ou prestação de serviços —, a legislação impõe severos tetos de gasto. Na UFRJ, por exemplo, a receita própria prevista para 2025 não foi totalmente autorizada pela União para ser utilizada no orçamento. Como consequência, não há estímulo à geração de receitas próprias para o uso na manutenção predial ou nos custos básicos de funcionamento.
Crítica Sim, Desinformação Não
As universidades públicas precisam, sim, ser objeto de crítica, de aperfeiçoamento e de autocrítica. O debate sobre sua sustentabilidade financeira é legítimo, urgente e necessário. No entanto, esse debate deve se basear em informações corretas e em compreensão mínima da complexidade que envolve essas instituições.
Apontar soluções simplistas, ignorando as amarras legais e orçamentárias impostas pelo próprio Estado, não apenas é injusto com as universidades, como também não contribui em nada para resolver os desafios que elas enfrentam. O Brasil precisa decidir se deseja, de fato, manter e fortalecer suas universidades públicas como instrumentos de desenvolvimento, inclusão e soberania científica — ou se continuará refém de discursos rasos que apenas agravam a crise.
João Carlos Salles
Professor de Filosofia
EX-REITOR
DA UFBA
1. É claro o projeto das elites conservadoras para a universidade. Com rara felicidade, a Folha de S. Paulo o sintetizou no Editorial “Não haverá dinheiro que baste para universidade públicas”, de 23 de maio de 2025, reagindo ao manifesto conjunto da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e da Sociedade Brasileira para o Progresso das Ciências (SBPC) — que, com plena razão, mostraram que o contingenciamento ora definido pelo governo federal favorece o desmonte da universidade pública em nosso país.
Os redatores da Folha são competentes. Eles são capazes de enunciar, em poucas linhas, toda a pauta reacionária, que não associa a universidade a um projeto de nação verdadeiramente democrática.Sem dúvida, com seu modo característico de simulara apresentação de argumentos em texto tão somenteeivado de preconceitos, a Folha de S. Paulomostra que tem lado. É verdade que ainda o faz sem assurpreendentes bravatas de um Trump, mas ela não está mais muito distante da retóricados governos anteriores. Assim, ao condenar o “tom catastrofista” do manifesto da ABC e da SBPC, assume ela própria um requentado tom catastrofista, bastante digno de Bolsonaro.
No Editorial, as universidades aparecem como um projeto fracassado e caro, um inútil poço sem fundo, no qual, ademais, servidores docentes e técnicos atrevem-se a fazer greves, tendo o condenável benefício daestabilidade.Para começo de conversa,a Folha considera a universidade uma repartição pública qualquer, quenão teria dignidade própria nem mereceria ser protegida das intempéries da economia. As universidades, afirma o Editorial, são meros “exemplos de distorções e víciosda gestão pública”. Já vai longe aqui o momento em que até a Folha reconhecia o valor das universidades, por exemplo, no combate à pandemia.
As bandeiras reacionáriasparecem brotar como se fossem óbvias, expressando preconceitos ignorantes em letra de forma: fim da estabilidade dos professores, da gratuidade do ensino e, sobretudo, da garantia do financiamento público da educação superior — medidas que sabemos inconsistentes, mas podem ter grande apelo retórico. Em suma, para a Folha et caterva, a universidade parece mais abjeta que o próprio obscurantismo. Com efeito, a próxima campanha eleitoral começa, e o lugar de produção da pesquisa e do conhecimento no Brasil deve tornar-se um alvo a ser desmontado: “Trata-se de um modelo custoso, iníquo e de baixo incentivo à eficiência, defendido à base de discurso ideológico e prática corporativista”.
2. Temos indícios positivos de que a reação do Presidente Lula vai em outra direção. A nota da ABC e da SBPC, em vez de lhe provocar engulhos comoàFolha, parece suscitar o aceno de que Lula receberá os reitores e que, então, poderá até anunciar a suspensão do contingenciamento para as universidades federais.
Não poderíamos esperar outra atitude. Nesse caso, caso se confirme, fica a liçãopara aqueles que pensam ajudar o atual governo evitando qualquer crítica. A mobilização decidida e a crítica necessária ajudam nossos governantes a não serem tragados pelas pautas reacionárias. Com isso, nossos louvores à ABC e à SBPC, bem como a quantos vocalizam a luta, tanto urgente quanto de longa duração, em defesa da universidade pública, gratuita e de qualidade.
Com justa alegria, reitores já comemoram nos bastidores. Não obstante o possível alívio, parece que essa boa e justa acolhida está longe de significar uma autêntica guinada nos rumos das prioridades nacionais. Que o governo Lula não sacrifique as universidades é algo que está à altura de sua história, de seu melhor legado, pois sua política fez expandir a rede de universidades por todo país e permitiu o acesso ao ensino superior de muitos outrora sistematicamente excluídos. Faz, então, muito bem o líder que acolhe, mas não para refrear uma luta ainda mais ampla e franca pelos valores mais elevados que, aliás, no momento, somente ele pode representar.
Que os atores da cena universitária leiam os sinais. As águas se dividem, os campos se desenham. Nesse cenário de grande confronto entre projetos opostos de nação, não há de bastar o mero alíviodas doresagudas das nossas instituições. Reitores não podem contentar-se com sobreviverem a seus próprios mandatos, mesmo com eventuais conquistas e algumas inaugurações. Afinal de contas, está em jogo o destino da universidade. Assim, não basta remediar, é preciso curar um mal e combater uma narrativa, cabendo à ANDIFES uma resposta firme ao Editorial da Folha.
É preciso, pois, deslocar a educação pública para o lugar de prioridade nacional, de sorte que ela contribua, inclusive, por seus essenciais serviços à nossa nação, para afastar de forma duradoura os insistentes fantasmas do obscurantismo.
Lula deve agirnesse momento de urgência, e os reitores devem, sim, celebrar sua atitude. Mas é preciso mais. A mobilização não pode parar nos gabinetes, uma vez que o governo Lula e as universidades não podem fechar os olhos para a dimensão do ataque, nem recusar esta oportunidade para afirmar, perante a sociedade, a bandeira da educação. Se as soluções não forem de grande monta, se não implicarem uma autêntica redefinição das prioridades nacionais, estaremos oferecendo para uma luta ideológica de largo espectro apenas uma saída passageira e insuficiente, porquanto marcada por sua imediatez e tibieza.
Na arte do designer André Hippertt, a homenagem do Jornal da AdUFRJ ao ex-presidente do Uruguai, que faleceu esta semana.

Foto: Marcelo BrasilConvidada pela decania do Centro de Ciências da Saúde, a direção da AdUFRJ apresentou informes da atuação sindical ao Conselho de Coordenação local na manhã desta segunda-feira (12). O destaque foi uma resolução sobre progressão e promoção docente que tramita no Consuni. A formulação do documento contou com intensa articulação do sindicato.
“Essa resolução é um avanço, pois os professores passam a ter direito aos efeitos da progressão a partir do momento em que reúnem os pré-requisitos, e não mais a partir da data de aprovação do relatório na banca”, destacou a professora Mayra Goulart, presidenta da AdUFRJ.
“Relatamos diversas reuniões que tivemos com a reitoria, com a pró-reitoria de Pessoal. E falamos sobre a decisão judicial favorável aos professores nesta situação”, afirmou Renan Teixeira, representando a assessoria jurídica da AdUFRJ.
A proposta de resolução, porém, ainda não cobre todas as solicitações da AdUFRJ. Um dos problemas é o professor precisar de vários processos para corrigir progressões pregressas, em vez de um processo único. “Pedi no conselho do CCS que os representantes no Consuni fossem acionados para conseguir esta alteração”, disse Mayra.
A dirigente contou aos conselheiros do CCS sobre outras iniciativas de congregação e acolhimento dos professores, especialmente neste momento de deterioração das instalações da universidade, como os roteiros histórico-culturais, convênios e a exposição fotográfica sobre o cotidiano da UFRJ.
“Estamos à disposição de outras decanias para fazer essa apresentação. Será um prazer”, disse Mayra.
Fotos: Fernando SouzaRenan FernandesInspirar sonhos para transformar vidas. Esse é o objetivo do “Conhecendo a UFRJ 2025”, que, entre os dias 7 e 9 de maio, recebeu seis mil estudantes de 168 escolas públicas e privadas de todo o estado para apresentar os 175 cursos de graduação da universidade. O evento organizado pela pró-reitoria de Extensão contou com palestras, estandes e visitas guiadas pelas unidades do campus do Fundão.
“É um momento decisivo, que cria um horizonte de entrada na universidade pública para esses estudantes”, afirmou a professora Ivana Bentes, pró-reitora de Extensão. Para a docente, o diálogo com pesquisadores e a possibilidade de visualizar a ciência que é produzida na UFRJ abre a imaginação dos jovens. “Quando eles veem outros jovens iguais a eles trabalhando num laboratório, construindo coisas legais, isso explode a cabeça deles”.
Cauã Telles, de 17 anos, era um dos estudantes mais empolgados do grupo do Colégio Estadual Brigadeiro Schorcht, localizado em Jacarepaguá. “Tinha muita curiosidade de saber como é uma faculdade. Só conhecia de séries e filmes”, disse. Indeciso quanto ao futuro, o jovem saiu encantado com o curso de Nanotecnologia depois do contato com professores e estudantes da área. “Cara! Como os pesquisadores conseguem manipular a matéria em escala nanométrica. São estruturas microscópicas que terão muita importância no futuro. Não sabia se queria fazer uma faculdade, mas agora quero estudar isso”, revelou impressionado.
O professor Marcus Moutinho, coordenador do curso de graduação em Nanotecnologia no Campus Xerém, explicou o impacto do evento para a popularização do campo de pesquisa. “Para um curso novo como Nanotecnologia, que só existe há 15 anos, esse evento é fundamental. É a hora que temos para apresentar o curso para potenciais futuros alunos”.
Juliana Ferreira, professora de Biologia de Cauã, reforçou a importância do evento para mostrar novas perspectivas na cabeça dos estudantes. “Essa visita é essencial para incentivar os alunos a virem para a universidade. Mostrar que eles podem ter acesso a esse mundo que vai oferecer muitas oportunidades durante a vida”, afirmou.
A professora destacou as políticas de permanência estudantil e de incentivo à pesquisa como fatores fundamentais para atrair jovens periféricos. “Eles conheceram as possibilidades de bolsas de permanência, de pesquisa e de iniciação científica. Então, eles saem com essa perspectiva de que não precisam escolher entre estudar ou trabalhar. Dá para estudar, ganhar um dinheirinho e sonhar em mudar de vida”, pontuou.
Convencer os estudantes de famílias de baixa renda de que o ensino superior é um caminho viável também é parte do trabalho diário de Cristiano Azeredo, professor de História do CIEP 201 Aarão Steinbruch, em Duque de Caxias. “Já aconteceu de eu falar que o ensino superior é fundamental e ouvir como resposta que fundamental é comer”, contou. Cristiano organiza, com outros professores, rodas de conversa na escola sobre o acesso e a permanência nas universidades. “Nessas conversas, usamos sempre uma música da Bia Ferreira que fala ‘cota não é esmola’. Hoje, esses jovens conseguem reconhecer esse espaço como deles também. Até pouco tempo atrás, isso não acontecia”.
Uma das estudantes sob a responsabilidade de Azeredo não conseguia esconder a felicidade durante a visita. Vitória Resende, também de 17 anos, é apaixonada por desenho e passou o dia acompanhando as palestras sobre os cursos da Escola de Belas Artes no Auditório G-122, no CT. “Queria fazer Artes Visuais na UERJ, mas agora quero fazer aqui”, avaliou ao final do dia, decidida em se tornar estudante da UFRJ. O motivo dessa mudança foi o deslumbramento com a arquitetura do JMM. Depois das palestras, Vitória foi correndo conhecer o prédio e quase perdeu a hora do reencontro para pegar o ônibus. “Nossa! O prédio é lindo! As esculturas, as pinturas e os desenhos dos alunos nas paredes. Tudo é incrível”, exaltou.
INTERAÇÃO
As palestras ministradas pelos docentes atiçaram a curiosidade dos estudantes, que aproveitaram para tirar dúvidas sobre os cursos. O professor Thiago Gonçalves, diretor do Observatório do Valongo, celebrou o entusiasmo dos alunos após responder a uma série de perguntas dos jovens sobre a Astronomia após sua apresentação no Salão Nobre da Decania do CCMN. “Para a Astronomia, é um momento importante para desmistificar o trabalho que a gente faz, que às vezes parece muito distante. Por isso, é fundamental, seja para eles optarem pela carreira acadêmica na área, seja para entenderem a importância do investimento na Astronomia na universidade”, explicou.
O professor Antonio Santoro, da Faculdade Nacional de Direito, participou pela primeira vez do “Conhecendo a UFRJ”. O docente também reuniu muitos interessados na carreira jurídica no Auditório Horta Barbosa e esclareceu diversas dúvidas. “Fiquei muito impressionado com a quantidade de estudantes e o interesse deles. Foi uma experiência nova para mim. Estamos mais acostumados a falar para o público do Direito, mas é preciso também desenvolver essa capacidade de falar de maneira simples”.
No CCS, a professora Ana Carolina Sodero, da Faculdade de Farmácia, se surpreendeu com a interação com os alunos no Quinhentão. “Eles estavam muito interessados. Achei ótimo, nem estava esperando tantas perguntas”, brincou a docente. Sodero fez uma avaliação positiva do evento. “É difícil para um adolescente conseguir projetar o próprio futuro profissional e a gente consegue dar uma perspectiva do que é o curso, quais as áreas de atuação”.