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A Comissão Eleitoral Local (CEL), com apoio da diretoria da AdUFRJ, realizou um debate entre as quatro chapas que disputam as eleições do Andes. A atividade aconteceu na segunda-feira (5), no Fundão, com presença de 10 docentes na plateia. O debate foi transmitido ao vivo, com participação simultânea de 52 pessoas e mais de 370 visualizações até a manhã do dia 6. A exigência do Andes para que o debate fosse somente presencial não permitiu que fossem aceitas perguntas de quem acompanhava a atividade remotamente. A íntegra segue disponível no canal da AdUFRJ no Youtube. O pleito acontece nos dias 7 e 8 de maio em todo o país. Haverá urnas em 18 pontos da UFRJ, no Fundão, Praia Vermelha, Centro, Caxias e Macaé.
A presidenta da CEL, professora Mayra Goulart, mediou o encontro. Todas as chapas concordaram com questões sobre greve, democracia, autonomia sindical, crise orçamentária das universidades e os riscos da extrema direita. As diferenças se concentraram sobre a forma de organização do Sindicato Nacional diante do contexto político do país.
Maria Carlotto. Foto: Fernando SouzaA Chapa 4 – Oposição para Renovar o Andes foi a primeira a se apresentar. A professora Maria Carlotto, da Universidade Federal do ABC, destacou os principais pontos do programa de sua chapa. Ela é candidata a secretária geral do Andes. Este foi o primeiro debate no Rio com a participação da Chapa 4, por conta de uma disputa judicial que começou ainda em março, no processo de inscrição de chapas. Depois de idas e vindas, a mais recente decisão da Justiça do Trabalho de Brasília permitiu a participação do grupo nas eleições. “A gente tem feito um esforço enorme para ampliar e democratizar essa eleição”, afirmou.
Eudes Baima. Foto: Fernando SouzaA Chapa 2 – Renova Andes foi a segunda a apresentar seu programa. O professor Eudes Baima, da Universidade Estadual do Ceará, é o candidato do grupo ao cargo de 1º vice-presidente da Regional Nordeste I. O grupo herdou o nome do principal coletivo de oposição à diretoria nacional, mas a chapa é fruto de um racha político, que originou também a chapa 4. Baima destacou que o que move o grupo é, essencialmente, o cumprimento do acordo de greve firmado com o governo federal no ano passado. “A tarefa do momento é assegurar o cumprimento integral dos acordos conquistados nas greves estaduais e, sobretudo, na greve do setor federal”.
Gean Santana. Foto: Fernando SouzaA Chapa 3 – Andes-SN Classista e de Luta foi a terceira na ordem de sorteio. O professor Gean Santana, da Universidade Estadual de Feira de Santana, é o candidato do grupo a presidente do Andes. A chapa é fruto da união entre três coletivos minoritários que se opõem à direção atual do Andes. Foi desse grupo a articulação para que a greve docente fosse aprovada no congresso do Andes de 2024. Em sua fala, o docente destacou essa convergência de forças. “A Chapa 3 é a única que se mantém unida na diversidade. Todas as outras chapas são resultados de brigas internas”, afirmou. Apesar de hoje ser oposição à diretoria nacional, parte dos apoiadores e integrantes da chapa, inclusive o próprio Gean, já integrou diretorias do Andes até 2015.
Fernanda Vieira. Foto: Fernando SouzaA Chapa 1 - Andes pela Base: Diversidade e Lutas, última a se apresentar, foi representada pela professora Fernanda Vieira, da UFRJ. Ela é a candidata do grupo a secretária geral do Andes. O coletivo representa a continuidade da atual gestão do Sindicato Nacional, que detém a hegemonia do Andes há mais de duas décadas. O grupo também passou por uma recente divisão política interna evidenciada no início deste ano, quando o PCB rompeu a aliança de anos. Em sua fala inicial, a professora Fernanda destacou a busca por democracia e diversidade. “Não é possível avançarmos nas nossas pautas sem perceber a diversidade de corpos nas nossas universidades”.
Perguntas da plateia
Foram realizados dois blocos de perguntas e cada chapa teve a oportunidade de responder a duas perguntas da plateia. As pessoas e a ordem das perguntas foram sorteadas.
- Marco Antônio Perruso (UFRRJ) perguntou para a Chapa 3 sobre financiamento das IFES
Gean Santana: “O financiamento era o ponto número um da greve das federais. Foi uma greve belíssima, apesar de todas as forças no interior do Andes lutarem para que a greve não saísse. Muito se reivindica sobre os anos de 2013 e 2015, quando os orçamentos das universidades e institutos federais atingiram seu ponto máximo, mas já naquele momento os orçamentos das instituições estava aquém das nossas necessidades. As universidades cresceram sem ter o acompanhamento orçamentário, sem ter concurso suficiente para docentes e para técnicos. A consequência nós já sabemos: colegas sobrecarregados em seu trabalho, adoecimento e alto grau de endividamento. Compreendemos que para reverter esse quadro é importante que fortaleçamos a mobilização docente. O que está acontecendo hoje é também consequência do final da greve, quando setores anteciparam o fim da greve sem garantias concretas nem do ponto de vista salarial e nem orçamentário. O que seria a prioridade zero da nossa pauta sequer foi tocada. Em todos os locais que visito percebo o grau de deterioração das nossas instituições.”
- Elisa Guaraná (UFRRJ) perguntou para a Chapa 1 sobre multicampia e mecanismos para democratizar a participação sindical
Fernanda Vieira: “O Andes do século XXI não é o mesmo da década de 1980, mas há um elemento fundamental de permanência histórica. A docência que constrói a Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior, na década de 80, criou uma organização que enfrenta a lógica ditatorial, autoritária e que rompia a tradição sindical do peleguismo. O Estatuto do Andes não tem proibição de recursos tecnológicos em assembleias de multicampia. O debate não é esse, mas o esvaziamento paulatino das nossas instituições. Isso é grave. Tenho andado nas universidades e percebido esse esvaziamento, o que é um terreno muito propício para os processos de privatização do nosso patrimônio. A gente já viveu isso aqui na UFRJ. Não acho que a democracia seja conversar de forma híbrida. Há desafios da multicampia e fronteiras, na região amazônica, por exemplo, cujas distâncias são muito maiores. Uma das propostas do nosso GT de Multicampia e Fronteiras é a Penosidade, que é um mecanismo de permanência dos docentes. A gente precisa debater essa questão. A riqueza da política é a gente estar aqui debatendo, discutindo.”
- Jacqueline Girão (UFRJ) perguntou para a Chapa 4 sobre atuação do Andes em relação a emergências climáticas
Maria Carlotto: “Se tem um lugar para se discutir todas as questões que envolvem as mudanças climáticas é a universidade. Vários cientistas têm se dedicado a esta questão. O problema é que o Andes está muito distante desse mundo. Por exemplo, na relação com a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, com outras associações científicas. Nós sempre defendemos um Andes mais presente nessas amplas articulações, inclusive no debate sobre o Plano Nacional de Educação e no Fórum Nacional de Educação. Este isolamento do Andes e seu enfraquecimento político, para nós é muito grave nessa e em outras questões. O que nos divide aqui não é a diferença das análises de conjuntura, mas a profundas divergências sobre o que fazer diante dessa conjuntura e como garantir que o Andes seja efetivamente democrático. Queremos debater as questões concretas, que dizem respeito à vida cotidiana dos professores. Entendemos que para garantir a diversidade de corpos e de territórios não dá para demonizar atividades remotas. A burocracia do Andes impede a ampla participação dos professores e contribui para o enfraquecimento político do sindicato. Precisamos trazer ao debate questões concretas e discutir inclusive o negacionismo climático que tem como alvo preferencial as universidades.”
- Daniel Conceição (UFRJ) perguntou para a Chapa 2 sobre veto à inscrição da Chapa 4 nas eleições
Eudes Baima: “A posição da Chapa 2 é muito simples. Durante o Congresso do Andes nós apresentamos diferentes emendas ao Regimento Eleitoral. Algumas foram aprovadas e a maioria foi rejeitada. Foi um congresso extenuante, em que a discussão, apesar de ser longa, é travada, mas o congresso decidiu por um Regimento Eleitoral. Entendemos que o tratamento deve ser isonômico entre todas as chapas. As exigências para cada etapa do processo eleitoral devem ser as mesmas para todas as chapas. Portanto, não é razoável que todas as chapas tenham feito enorme esforço para se constituir, para convencer companheiras e companheiros a participar, construir o programa, recolher enorme e desnecessária lista de documentos para inscrição das chapas. Não é razoável que todos nós tenhamos sido obrigados a isso e essa exigência não ser feita para todas as chapas. Teve chapa que se inscreveu fora da hora, alegando que 18h no Acre é diferente de 18h em Brasília. Não é razoável chapa que se inscreveu com 17 descumprimentos do Regimento Eleitoral, sobre o qual nós temos divergência, mas queremos debater no congresso. A nossa posição é que as chapas que devem ser deferidas são aquelas que cumprem tudo aquilo que o regimento determina. Fora disso é o privilégio, o tratamento desigual, o ataque à igualdade.”
Elisa Guaraná (UFRRJ) perguntou para a Chapa 4 sobre a disputa judicial
Maria Carlotto: “É um absurdo dizer que não cumprimos o regimento e fomos em busca da Justiça por privilégio. Então, vou ler parte da sentença do juiz de primeira instância: ‘Quanto à intempestividade, basta notar que os extratos de inscrição registraram que as chapas registraram candidatos fora do horário das 9h às 18h. A Chapa 1 registrou 20 candidatos fora do horário; a Chapa 2, 74 candidatos; a Chapa 3, 47 candidatos; e a Chapa 4, apenas 2 candidatos. Apesar disso, a CEC homologou as chapas 1, 2 e 3, mas utilizou a intempestividade – o não cumprimento do prazo – como fundamento para indeferir a Capa 4. Tal conduta configura flagrante violação do princípio da isonomia, aplicando pesos e medidas distintos para situações idênticas ou similares’. Ele continua: ‘Quanto às demais irregularidades, a análise das atas da CEC revela uma postura excessivamente formalista e pouco razoável em relação à Chapa 4. A própria CEC reconheceu no rebate do recurso administrativo que houve tratamento isonômico entre as chapas para dirimir dúvidas, mas negou à Chapa 4 a oportunidade de sanear as demais pendências documentais. Ademais, a exclusão de uma chapa inteira, que cumpre todos os requisitos regimentais e estatutários, mostra-se desproporcional e contrária ao objetivo maior de garantir pluralidade e democracia no processo eleitoral sindical.’ O Regimento está sendo utilizado de maneira absolutamente restritiva para excluir uma voz legítima do debate, que está trazendo questões concretas.”
Cristina Miranda (UFRJ) perguntou para a Chapa 1 sobre o balanço da greve
Fernanda Vieira: “A Chapa 1 tem um balanço positivo da greve, de sua massividade, do apoio dado pela maioria das seções sindicais. Não foi uma greve isolada. Teve muito apoio e multiplicidade de categorias do serviço público e multiplicidade de categorias do setor da educação. Eu mesma participei da belíssima marcha dos trabalhadores e trabalhadoras em Brasília, que demonstrou o fôlego da greve. Acho triste que a minha seção sindical tenha se oposto à greve com uma retórica que foi utilizada pelos grandes meios de comunicação contra esse direito da classe trabalhadora duramente conquistado. Essa nossa greve demonstrou a importância da mobilização e da nossa luta para a obtenção dos nossos direitos. Não é o ideal e a gente precisa continuar esse processo de luta. Há uma pauta que ainda não foi implementada pelo governo federal e é importante que a gente se mobilize para garantir essa pauta. O que a gente precisa discutir é que há uma multiplicidade de contrarreformas previdenciárias, que não começou com o governo Bolsonaro. A gente está vivendo ataques diretos aos aposentados desde o primeiro governo Lula. Por isso, a luta pelas revogações das contrarreformas previdenciárias está estabelecida nos nossos congressos.”
Eleonora Ziller (UFRJ) perguntou para a Chapa 3 sobre a estrutura burocratizada do Andes e o esvaziamento do sindicato
Gean Santana: “A Chapa 3 é a única que aponta para o caminho da unidade, apesar das diferenças. As outras chapas trilharam o caminho da ruptura. O que nós compreendemos é que o Andes surge em 1979 como um novo sindicalismo pela base. Onde a democracia deve ser realizada desde os locais de trabalho até a instância máxima, que é o congresso do Andes. Infelizmente, grande parte da categoria talvez não consiga compreender a sua pergunta, porque não participa de perto e não vê o que está acontecendo na diretoria do Andes. As últimas diretorias se afastaram do classismo e isso pode tornar o Sindicato inócuo, sem defender os interesses dos professores, das condições de trabalho, da educação pública. Em vez disso, percebemos que essas últimas diretorias têm se empenhado em resitrigir a democracia interna do sindicato, restringir, por exemplo, que cada sindicalizado encaminhe sua tese para ser discutida no congresso. Temos preocupação com essa e outras restrições que impedem a participação democrática.
Daniel Conceição (UFRJ) perguntou para a Chapa 2 sobre dívida pública e austeridade
Eudes Baima: “O problema da dívida pública é de soberania nacional. É uma questão central para o nosso debate e um problema prático para a vida do sindicato. Na greve do ano passado enfrentamos os limites fiscais que antes eram produzidos pelo teto de gastos e passou a ser produzido, a partir de 2023, pelo novo arcabouço fiscal. A valorização salarial da categoria, o financiamento das instituições federais de ensino, a onda de terceirizações e precarizações do trabalho nas instituições, tudo isso tem a ver com um esforço para produzir superávit, ou o tal do déficit zero. Penso que temos que enfrentar essa questão em cada mobilização, em cada campanha. A solução para o endividamento da categoria é mais salário. Esse é um problema prático do arrocho fiscal. Defendemos a eleição do Lula contra a extrema direita, mas levamos as aspirações da classe trabalhadora e precisamos enfrentar essas questões de soberania nacional. Impedir novas privatizações, reestatizar o que foi privatizado, descentralizar o câmbio, acabar com a independência do Banco Central. É disso que estamos falando sobre a dívida pública. Essa é uma luta atual, não é distante, precisamos aprofundar essa discussão.”
Dez sindicatos representativos de docentes de universidades federais, entre os quais a AdUFRJ, enviaram carta ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), em 22 de abril, em que solicitam a abertura de diálogo sobre duas instruções normativas do ministério que regulamentam o uso do auxílio-transporte para os servidores públicos da União. As entidades sustentam que a nova regulamentação, em vigor desde março deste ano, é prejudicial aos docentes.
“A fiscalização de eventuais abusos no uso do benefício é legítima, mas deve ocorrer de forma responsável”, diz o documento, assinado pelas direções da ADUFABC, Adufal, ADUFMS, APUBH, ADUFPI, AdUFRJ, Adufra, Adur, SINDUFTPR e ADUFDourados. As instruções normativas, publicadas em fevereiro, impõem novas regras para o registro de presença nos locais de trabalho com vistas ao pagamento do auxílio-transporte, mas não levam em consideração as atividades inerentes ao trabalho dos docentes, sobretudo aqueles que atuam no regime de Dedicação Exclusiva (DE).
Para a presidenta da AdUFRJ, professora Mayra Goulart, as especificidades do trabalho docente devem ser observadas: “A legislação parece dirigida aos técnicos em Programa de Gestão de Desempenho (PGD), e não faz sentido ser estendida aos docentes. Em virtude da DE, os professores trabalham em múltiplos lugares e não tem lógica o registro da presença física. Muitas vezes esse professor sequer encontra condições de fazer seu trabalho na universidade, tendo que buscar outros espaços com estrutura para pesquisa de campo, seminários, ensaios em laboratórios. A mobilidade faz parte da atuação docente”.
O Programa de Gestão e Desempenho é um modelo de trabalho instituído na Administração Pública Federal por meio do decreto 11.072/2022, com foco em resultados e metas a serem cumpridas pelos servidores, e não na verificação de presença.
ATUAÇÃO DOCENTE
Uma das articuladoras do documento, a professora Elisa Guaraná, presidenta da Adur, conta que desde março a questão vem sendo debatida internamente entre os segmentos da UFRRJ. “A demanda para que fizéssemos a marcação com os novos códigos, identificando presença na sede, começou em março. Tivemos que debater essa questão na comunidade, em diálogo com a reitoria, e chegamos à conclusão que não concordamos com a medida como ela está proposta por ser uma regra que fere nossa legislação”, afirma a docente.
Segundo Elisa, os novos códigos previstos nas normas do MGI foram criados a partir da preocupação com a modalidade de teletrabalho ou PGD, que não diz respeito aos docentes. “Entendemos a importância óbvia de controle sobre o uso do recurso público para auxílio-transporte, mas há outras maneiras de fazer esse controle sem que ele represente uma ampla desconfiança, e até uma penalização, sobre o trabalho docente. Um parecer de nosso setor jurídico embasou a carta enviada ao MGI. Estamos aguardando o retorno”, diz a dirigente sindical.
Para o presidente da Adufal, professor Jailton Lira, a carta ao MGI traz um alerta importante. “O novo procedimento proposto pelo ministério, que exige o registro de presença diária para fins de concessão do auxílio-transporte, ignora a complexidade do trabalho docente, sobretudo no regime de DE. Essa nova exigência, embora supostamente voltada ao controle do trabalho remoto, desconsidera a realidade multifacetada das atividades que realizamos. A atuação docente vai muito além da presença física em sala de aula, envolve atividades presenciais e assíncronas, dentro e fora da universidade. Muitas dessas ações exigem, inclusive, deslocamentos frequentes, que são parte essencial do exercício profissional”, diz Jailton.
O professor espera que o MGI reveja as novas normas: “No caso específico dos docentes em DE, a mobilidade é ainda mais intensa. São professores que dedicam sua jornada integral à instituição, com sobreposição de funções e jornadas extenuantes, muitas vezes em locais distintos e sem apoio logístico das universidades. A tentativa de condicionar o auxílio-transporte à simples presença física registrada ignora esse contexto e pode, na prática, restringir injustamente um direito básico. A Adufal reafirma a necessidade de diálogo com o MGI e a revisão dessa proposta”.
O Jornal da AdUFRJ entrou em contato com o MGI para obter retorno em relação à carta enviada pelos sindicatos, mas não houve resposta até o fechamento desta edição. Leia abaixo a íntegra da carta.
Em Respeito à Dedicação Exclusiva – auxílio-transporte é um direito
Em 19 de fevereiro, foi publicada a Instrução Normativa nº 70/2025 que trata do auxílio-transporte. Saudamos o reconhecimento de novas modalidades de transporte. Contudo, a categoria docente foi surpreendida por comunicados enviados pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) às universidades, solicitando aos servidores que fazem uso de auxílio-transporte que registrem, como “ocorrência”, os dias que estiveram presentes no seu local de trabalho, de modo a ratificar o uso do referido benefício. Trata-se de uma mudança no padrão de registro: de “negativo” (afastamentos) para “positivo” (presença).
O novo procedimento parece ter como objetivo principal o controle do trabalho remoto e do Programa de Gestão e Desempenho (PGD), conforme se depreende dos quatro códigos criados, todos com referência a essas modalidades de trabalho. No entanto, a Instrução Normativa nº 71/2025 reconhece o direito ao auxílio-transporte nos deslocamentos entre a residência e os locais de trabalho.
No contexto do regime de Dedicação Exclusiva, os (as) docentes desenvolvem atividades de ensino (presenciais e assíncronas), pesquisa, extensão, gestão acadêmica e representação institucional. Essas incluem ações diversas como: pesquisa de campo, reuniões de orientação, reuniões colegiadas de diversos órgãos, atividades universitárias diversas como mesas de debate, palestras, colóquios de pesquisa e seminários, visitas a laboratórios e bibliotecas. Embora o deslocamento tenha como referência o local de trabalho principal, as atividades se estendem a múltiplos espaços e, mesmo no interior das universidades, é comum o deslocamento entre campi ou dentro de um mesmo campus. Essa mobilidade é inerente à atuação docente, especialmente para os (as) que se encontram sob o regime de Dedicação Exclusiva, e garante que as universidades públicas permaneçam como os principais centros de produção científica e tecnológica, formação de profissionais de nível superior e promoção da extensão universitária.
Além disso, a multiplicidade de funções gera sobreposição de tarefas, jornadas extenuantes e deslocamentos que não são custeados pelas instituições federais de ensino, sobretudo em um cenário de restrições orçamentárias. A interiorização dos campi foi uma conquista. É fruto de políticas públicas que ampliaram o acesso e a permanência de estudantes oriundos das camadas populares. Esse processo demanda uma atuação docente ainda mais capilarizada em todo o território nacional.
Nesse sentido, a necessidade de assegurar a correta utilização do auxílio-transporte não pode se sobrepor à legislação vigente, tampouco ignorar a complexidade das atribuições docentes. A fiscalização de eventuais abusos no uso do benefício é legítima, mas deve ocorrer de forma responsável, respeitando e valorizando a ampla maioria dos (as) docentes, para os(as) quais o deslocamento – ainda que parcialmente custeado – constitui uma condição elementar para o exercício profissional. Nesse âmbito, que se busque formas de levantamento de casos abusivos que não penalizem ou ponham em pré-julgamento toda a categoria docente. Dessa forma, solicitamos ao MGI a abertura de diálogo com as representações da categoria docente, bem como a revisão da proposta atual de verificação do uso do auxílio-transporte. Não há democracia nem acesso a políticas públicas e direitos sociais sem a valorização dos (as) servidores(as) públicos(as) federais. Esperamos avançar, coletivamente, com diálogo e compromisso, na defesa de uma educação pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada.
22 de abril de 2025.
Direção da Associação Docente da Universidade Federal do ABC (ADUFABC)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal de Alagoas (ADUFAL)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal Mato Grosso do Sul (ADUFMS)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal de Minas Gerais (APUBH)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal do Piauí (ADUFPI)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ADUFRJ)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal Rural da Amazônia (ADUFRA)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (ADUR)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal Tecnológica do Paraná (SINDUFTPR)
Direção da Associação Docente da Universidade Federal da Grande Dourados (ADUFDourados)
Fundada em 26 de abril de 1979, a AdUFRJ se consolidou como importante instrumento político de luta em defesa da democracia e pelos direitos d@s docentes da UFRJ.
Em tempos difíceis para os cientistas na América, um pesquisador brasileiro ganhou motivos para sorrir. No início de abril, o professor José Garcia Abreu, do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, em missão científica na Harvard Medical School, teve um projeto de pesquisa contemplado com um prêmio oferecido pela Fundação Lemann em parceria com a instituição de Cambridge. O financiamento busca estimular a interação entre pesquisadores e subsidiar trabalhos científicos que tratam de desafios atuais no Brasil.
O projeto “Ciência avançada, divulgação e educação: explorando a biodiversidade brasileira via sequenciamento de células únicas” planeja difundir no Brasil a tecnologia de célula única, bioinformática e aprendizado de máquina desenvolvida sob a coordenação do docente. O trabalho será realizado no laboratório do departamento de Biologia de Sistemas de Harvard para caracterizar espécies de anfíbios nativas.
O investimento na casa dos 200 mil dólares permitirá a compra de insumos, a montagem de equipamento no Brasil e o treinamento de pessoal. “Queremos apresentar a pesquisadores brasileiros essa ferramenta para que eles possam entender o poder que ela tem”, disse o pesquisador.
O Jornal da AdUFRJ conversou com o professor Abreu sobre sua relação com Harvard e a importância do prêmio para o desenvolvimento da pesquisa.
Jornal da Adufrj - Como é sua relação com a Universidade de Harvard?
José Garcia Abreu - Em 2023, pesquisadores do Departamento de Biologia de Sistemas da Harvard Medical School me pediram a indicação de um pós-doutor para trabalhar com o anfíbio Xenopus, uma rã de origem africana, que é um dos principais modelos de estudo no campo da Embriologia.
“Pode ser eu?”, respondi em tom de brincadeira. Estava em um momento indeciso quanto a minha carreira no Brasil, entrando na fase final do meu tempo na UFRJ — são mais de 30 anos de serviço prestados à universidade —, saindo dos anos de pandemia em que fui diretor do ICB, período que trouxe sequelas para quem atuou como gestor, afastando-se do trabalho de pesquisa. Eu estava para baixo, vendo muitos alunos desistindo da pós-graduação e da pesquisa.
Primeiro me responderam que não, porque Harvard tem uma série de regras para trazer professores seniores, é um processo demorado e precisavam de alguém imediatamente. Uma semana depois, me contataram novamente dizendo que, se realmente quisesse ir, poderiam me oferecer uma vaga de professor visitante, porque era a pessoa ideal para o trabalho.
Quando cheguei, fiquei muito entusiasmado em produzir um livro e poder arredondar minha carreira pensando nas contribuições que vou deixar, no meu legado.
Que trabalho é esse?
A ideia é criar uma fonte material de acesso à comunidade científica sobre todo o desenvolvimento embrionário de um anfíbio específico, o Xenopus Iaevis. É um atlas de célula única que descreve todos os estágios de desenvolvimento até etapas da vida adulta. O que a gente quer é mostrar computacionalmente e nos embriões íntegros quantas células são necessárias para formar as estruturas que geram os tecidos e os órgãos do embrião e, depois no adulto, quantas células existem em cada órgão. Quantas células ele tem no fígado, no coração, no osso, na pele, no cérebro.
Queremos ainda mostrar os genes que compõem cada uma das células das estruturas do embrião. Quais genes são expressos numa célula de músculo ou numa célula do sistema nervoso quando elas são vizinhas, em que momento esse gene aparece e como ele pode ser visualizado dentro de uma célula em uma determinada etapa do desenvolvimento. Estamos combinando diferentes ferramentas para individualizar, capturar e sequenciar células utilizando microscopia de alta resolução, aprendizado de máquina e bioinformática.
Esse trabalho dedicado à Embriologia tem desdobramentos, pode ser aplicado à pesquisa sobre o câncer, por exemplo. Aqui no laboratório, temos uma forte pesquisa combinando o desenvolvimento embrionário ao envelhecimento.
Como surgiu a possibilidade de ganhar esse prêmio?
O projeto que recebeu o prêmio é um pequeno apêndice dentro desse enorme projeto que está sendo desenvolvido aqui. Esse financiamento é oferecido aos professores de Harvard para que eles encontrem docentes no Brasil com interesses em comum. Quando cheguei aqui, me apresentaram essa possibilidade de aplicar um projeto para concorrer ao prêmio. Para ganhar, temos que consolidar bem uma ideia original e mostrar que ela é vantajosa para Harvard e para o Brasil.
A ideia é caracterizar algumas espécies brasileiras de anfíbios. Não é apenas para desenvolver uma tecnologia de Biologia Quantitativa e Embriologia, mas também difundir a importância desses animais. Mais de 90% das espécies de anfíbios do planeta estão no Brasil.
Por enquanto, o que temos é um plano. Espero que possamos organizar em breve um workshop no Brasil para apresentar e difundir essa ferramenta aos pesquisadores locais. Trazer pessoas que trabalham na fronteira entre a biologia do desenvolvimento, biólogos, zoologistas e ecologistas.
O que significa conquistar esse financiamento em um momento de cortes?
Todos no corredor me param para dar os parabéns. Os colegas ficaram felizes que alguém conseguiu algum sucesso nesse momento tão duro que estamos vivendo. O fomento à pesquisa nos Estados Unidos atravessa um momento de dificuldades, como o Brasil atravessou durante o governo passado e na pandemia. Então, ao mesmo tempo em que estamos felizes no laboratório por ganhar esse projeto, tentamos entender o que vai acontecer à medida que os recursos se tornam escassos numa das maiores referências de ensino e pesquisa do mundo.
Fotos: Fernando SouzaValorização dos servidores públicos, reforma da administração federal, inteligência artificial, mercado de trabalho e os impactos na economia global com a guerra tarifária iniciada pelo governo Donald Trump foram alguns dos temas em debate na roda de conversa da ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, com professores e estudantes no Teatro de Arena do campus Praia Vermelha da UFRJ, na tarde de segunda-feira (14). O encontro foi organizado pelo Instituto de Economia (IE) e pelo Centro Acadêmico Stuart Angel.
Com o Teatro de Arena lotado, a ministra se emocionou ao receber flores dos alunos do Instituto de Economia e, sempre sorridente, disse se sentir em casa no Palácio Universitário: “Para mim é muito importante estar aqui fazendo essa troca. Já participei da gestão federal de 2011 a 2016, voltei a atuar aqui no Instituto de Economia, e agora estou no governo de novo. A bagagem que você leva e traz de volta muda seu olhar em termos de experiência e de pesquisa, é enriquecedor. Tenho muito orgulho de ser professora da UFRJ”, disse ela, ao abrir a roda de conversa, ao lado do diretor do IE, professor Carlos Frederico Leão Rocha.
Em sua fala inicial, a ministra contou que a própria criação do MGI, neste terceiro governo Lula, sinalizou o compromisso do Executivo com a reconstrução do Serviço Público Federal, duramente atacado na gestão de Jair Bolsonaro. “Ainda na transição, o presidente Lula decidiu criar um ministério voltado para a gestão pública para remontar muitos instrumentos necessários ao desenvolvimento do país, depois do período de ataques que o Serviço Público sofreu na gestão anterior”, lembrou ela.
Esther destacou que o MGI tem entre as suas prioridades a valorização dos servidores públicos, a digitalização de processos e a reorganização da máquina estatal: “A realização de um concurso público unificado se incluiu nesse processo de retomada do papel do Estado e da valorização do servidor. O trabalho do governo é de reconstrução dos instrumentos de desenvolvimento”. A ministra respondeu a perguntas dos alunos em parceria com Norberto Montani Martins, assessor especial do MGI e, como ela, ex-aluno e professor cedido do IE.
Ela falou sobre o trabalho que vem sendo feito para resgatar o papel primordial do Serviço Público para o país, no momento em que o governo de Donald Trump vai na direção oposta, perseguindo e demitindo servidores federais. “Vemos com preocupação o que está sendo feito nos Estados Unidos. Tudo o que estamos fazendo aqui em termos de reforma do Estado nada tem a ver com a reforma administrativa prevista na PEC 32. Defendemos incondicionalmente a estabilidade do servidor porque ela é uma proteção do Estado. A volta dos concursos também tem a ver com o fortalecimento do Serviço Público. A área de Meio Ambiente, por exemplo, estava destruída, estamos recompondo os quadros”.
Os estudantes se revezaram ao microfone para fazer perguntas que foram desde o tarifaço do governo Trump à “pejotização” crescente nas empresas. David Ousmane, aluno do sétimo período de Economia da UFRJ, perguntou sobre os impactos da inteligência artificial (IA) no mercado de trabalho e como o governo federal atua na regulação das relações trabalhistas. “Acho que a IA vai diminuir trabalhos que são mais repetitivos e, por outro lado, vai abrir mercado de trabalho para a formação em novas competências. É um novo ciclo de tecnologia”, disse ela. “Sobre a guerra tarifária, como eu queria estar agora de volta na universidade para discutir isso! É um debate muito legal para as aulas”, comentou, arrancando risos da plateia.
Antes de deixar o Palácio Universitário, já atrasada para pegar o voo para Brasília, Esther ainda fez questão de conversar mais um pouco e posar para fotos com alunos do IE. Nada como se sentir em casa.