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Beatriz Coutinho e Lucas Abreu

 

Depois de escapar com vida de uma infecção pela covid-19, o que pode acontecer com o paciente? Que sequelas ele poderá ter? Para aprofundar essa questão, o Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade (Nupem/UFRJ), do campus Macaé, e o Centro de Acolhimento e Reabilitação Pós-Covid (Carp), da prefeitura da cidade do norte fluminense, iniciaram em janeiro a pesquisa “Epidemiologia das afecções pulmonares e neurocognitivas pós-covid nos munícipes de Macaé”. Com uma equipe composta por 23 pessoas e financiada pela Faperj, a pesquisa tem duração prevista de três anos e estimativa de monitorar entre 200 e 500 pessoas. O foco principal são as sequelas renais, respiratórias e neurológicas deixadas pela doença que já matou mais de 635 mil brasileiros.

“Nos chamavam a atenção diversos distúrbios que os pacientes relatavam pós-covid. Alguns apareciam logo após a infecção e outros só seis, doze meses depois”, explicaWhatsApp Image 2022 02 08 at 15.58.331 a neurocientista Cintia Monteiro, professora da UFRJ e coordenadora do projeto. A pesquisa é uma consequência do trabalho de testagem, rastreamento do genoma do vírus, monitoramento da imunidade após infecção e acompanhamento da eficácia da vacinação que vem sendo realizado desde o começo da pandemia pelo Nupem. Alguns dados desse trabalho, ainda em curso, servem de base para a pesquisa atual.

“Passamos questionários perguntando aos voluntários das últimas pesquisas para saber se eles tiveram algum tipo de afecção, convidando para o novo projeto”, detalha a coordenadora. “Quando a resposta era ‘sim’, eles retornavam ao Nupem ou ao Carp para realizar a coleta de sangue”. Para ser voluntário não é necessário ter participado das pesquisas anteriores, nem residir em Macaé. “Aceitamos todos que queiram participar”, diz Cintia. Com duas semanas apenas, o projeto já soma 15 pessoas no time de voluntários.

A pesquisa pode ter um grande impacto social. Com o diagnóstico precoce e eficaz e o mapeamento dessas afecções, a gravidade e o número de mortes pode diminuir. “É bom para a população e poupa dinheiro público com medicação e internação”, pontua Cintia. A princípio, a ideia é fazer três coletas de sangue e testes complementares nos próximos três meses, e depois observar. “Caso os sintomas persistam, pretendemos ter uma avaliação mais adiante, talvez seis meses depois ou até um ano”, estipula. Apesar das conquistas, a coordenadora acredita que o trabalho poderia ter começado mais cedo. “Perdemos muitas informações de afecções que não foram mapeadas em 2020 e 2021. Muitas não eram nem relacionadas ao coronavírus”, lamenta.

Minuciosa, a pesquisa parte de diversos métodos de análises. “Temos uma ideia de estudar o sistema imunológico através da análise de produção de citocinas e anticorpos relacionados ao coronavírus, ambos marcadores inflamatórios”, explica a neurocientista, que questiona por que algumas pessoas desenvolvem afecções e outras, não. O grupo também faz investigações cruzadas, herança da última pesquisa de mapeamento de genomas, procurando relações entre as afecções e as variantes. “Como as variantes têm sintomas diferentes, pode ser que cada uma possa levar a afecções diferentes, ou não. Vamos investigar”.  

A investigação vai ser feita a partir de biomarcadores. Caso o paciente ateste algum sintoma neurológico, por exemplo, serão buscados biomarcadores neurais no sangue. “Existem proteínas que só são encontradas no nosso cérebro. Quando há algum dano no sistema nervoso, essas proteínas podem vir a cair na circulação sanguínea. Isso pode ser um indicador”, explica Cintia. Antes, é realizado um teste para medir a memória e a concentração do paciente e, para complementar, pode ser feito um encefalograma. Se os sintomas forem pulmonares, é realizada uma espirometria, exame que indica o quanto está comprometida a respiração. Se for renal, a busca é por biomarcadores renais na urina.

Todos os voluntários realizarão coleta de sangue, mas somente os que apresentarem os três distúrbios mencionados terão seus exames aprofundados. “Não temos profissionais qualificados em quantidade o suficiente para avaliar todos os problemas. Fazer de todo mundo demandaria uma equipe maior”, desabafa Cintia. Para ela, a centralização das atividades no Carp, onde a equipe do Nupem envolvida no estudo está trabalhando, aumenta a adesão da população e garante o seu retorno.

 “A parceria com o Nupem é um investimento na saúde”, explica Nichollas Augusto, idealizador e coordenador do Carp. Ele também entende que há necessidade de tratar a questão da covid-19 como um todo, inclusive o momento depois da infecção, e destaca que todos os profissionais atuam com base na literatura científica. “A universidade deve participar do tratamento. Foi um casamento, unindo o útil ao agradável, saúde e ciência”, destaca. O Carp tem uma taxa de resolução de até 84% dos casos, e foi fundado, em novembro do ano passado, para otimizar recursos físicos, financeiros e humanos.

Graziele Sousa é pesquisadora voluntária no Nupem desde abril de 2020, e agora atua na pesquisa dos efeitos do pós-covid. “No início, nosso intuito era a parte mais clínica do diagnóstico, do isolamento e da testagem”, conta. Com a chegada de outros testes, o grupo se voltou para a pesquisa. “A pessoa contraiu covid, mas e agora?”, perguntava o grupo, que via cerca de 50% a 80% dos pacientes apresentando sequelas. “A importância está nesse trabalho multidisciplinar de procurar saber como ajudar essa pessoa”, conclui Graziele, que não recebe bolsa. “Faço pelo bem do próximo. O governo investiu em mim da graduação ao doutorado, então quero retribuir para a sociedade o que eu aprendi”, conta, orgulhosa.  

Para o professor Rodrigo Nunes da Fonseca, a pesquisa é mais um resultado positivo da parceria estabelecida entre o instituto e a prefeitura de Macaé. “O Nupem tem mais de 30 anos de parceria com a prefeitura, contribuindo com os variados temas de interesse da sociedade macaense”, exalta Rodrigo. O professor também celebra os ganhos que a parceria oferece para a sociedade, para a população da cidade e para a UFRJ Macaé. “Dentre os principais resultados da parceria está a geração do conhecimento e, claro, o treinamento dos alunos que futuramente serão profissionais de saúde”, diz.

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