facebook 19
twitter 19
andes3
 

filiados

Por Beatriz Coutinho

 

Em abril, a UFRJ finalmente começará seu ano novo. O período letivo de 2022.1 se inicia somente no dia 11 e, com ele, há a expectativa da volta integral ao ensino presencial. Até lá, parcela significativa da universidade continua em ensino remoto ou híbrido, mas a frustração de permanecer dois anos sem pisar nos campi ecoa com cada vez mais força na comunidade acadêmica. Estudantes e professores querem voltar ao ensino presencial.

Apesar de aguardado, há a justificada preocupação com as condições em que esse retorno se dará. Na última terça-feira (8), convocados pelo Diretório Central dos Estudantes da UFRJ (DEC Mário Prata), cerca de 65 alunos dos cursos da Praia Vermelha se reuniram para debater a infraestrutura do campus. Eles frisaram que os problemas antigos de infraestrutura podem dificultar o retorno seguro, mas que para reclamar melhorias é preciso ocupar presencialmente o espaço universitário. “Reformas não caem do céu. As nossas reivindicações precisam de estudantes tendo a vivência presencial”, pontua Rodrigo Ferreira, estudante de Jornalismo. “Manter as faculdades fechadas torna mais fácil para o atual governo promover cortes.”

O Jornal da AdUFRJ ouviu professores e estudantes que relataram suas expectativas, frustrações e medos ao longo dos últimos dois anos.  “Cansaço”, “desgaste” e “saudade” são as palavras que mais aparecem nos depoimentos a seguir, embora muitos reconheçam pontos positivos do ensino remoto. Em comum, o desejo de reocupar a UFRJ com força total.

 

WhatsApp Image 2022 02 11 at 23.24.40Tatiana Sampaio
Professora do Instituto de Ciências Biomédicas
Eu acho que o retorno às aulas presenciais nas universidades deveria ser completo. Nenhum país do planeta deixou o ensino público continuamente fechado por tanto tempo. Educação pública é um serviço essencial prestado à sociedade. As pessoas podem não querer ser servidoras públicas, podem preferir priorizar seus direitos individuais à segurança total. Mas quando assumem sê-lo, a decisão implica em servir ao público e não a si mesmas. As escolas e universidades públicas não existem para gerar empregos estáveis. Elas existem para dar educação às crianças e jovens do Brasil. Assim como os profissionais de saúde existem para cuidar da saúde da população, inclusive durante uma pandemia.

O retorno devia ser completo, porque os estudantes que moram fora do estado precisam da segurança de que as aulas retornarão ao normal para poderem organizar sua moradia no Rio. Para resolver o problema das notas serem mais altas no remoto, basta decidir que as provas serão necessariamente presenciais. Quem for grupo de risco, fará prova oral só com o professor. Também acredito que não dá pra continuar com a postura de ‘proteção total’, ‘ninguém fica para trás’. Passamos por uma pandemia, haverá prejuízo para muitas pessoas. Mas o compromisso do gestor e do servidor público deve ser com o bem da maioria. As crianças e os jovens precisam de educação e isso é um direito deles.

Professor Antonio IFAntônio Santos
Professor do Instituto de Física
Como toda a comunidade acadêmica, estou ansioso para o retorno, mas um retorno seguro. Minha única preocupação é com o transporte público, que é cheio e muitas pessoas andam sem máscara. Porém, sou favorável ao retorno, porque para o público em geral há uma universidade que está vazia. Algumas pessoas pensam que estamos em casa fazendo nada e ganhando salário. Isso é um engano. Estamos trabalhando muito mais. Eu, inclusive, trabalho mais em casa. Tem sido super exaustivo e desgastante. Temos muitas reuniões e algumas duram muitas horas, por exemplo. Mas somos servidores públicos, devemos uma prestação de contas à sociedade, trabalhamos com vidas. E a universidade pública muda a vida das pessoas.

Sobre o ensino remoto, eu sou das antigas, então foi um desafio. Todas essas ferramentas que usamos hoje, eu não conhecia na época. Hoje consigo dominar bem, mas acho que perdemos muito em qualidade e isso é irrecuperável. Nas minhas aulas, por exemplo, eu via várias pessoas com câmeras desligadas, caladas. No presencial você pode tirar a dúvida com o professor, que tem dedicação exclusiva, o aluno está na sala, vem e conversa. Perdemos isso.

Inclusive, notei que tivemos a convivência diferente do que foi no presencial, com pessoas de lugares diferentes. Sinto falta do contato com os alunos, dos colegas professores, dos bate-papos, dos cafezinhos. Até do trajeto sinto falta: no ônibus eu aproveitava pra meditar, chegava na faculdade mais tranquilo. Então, embora seja cansativo, são essas pequenas coisas que somadas fazem grande diferença.

 

WhatsApp Image 2022 02 11 at 23.22.08Raabe Vitória
Estudante de Filosofia, ingressou em 2018.1
É uma situação muito diferente, que ninguém esperava. Foi um choque, uma coisa assustadora ter aula online. Primeiro, porque não ia ser disponibilizado para todo mundo, somente para os formandos, e na época eu ainda estava na metade do curso. Pensava ‘ai meu Deus, quando que eu vou voltar a estudar? Não vou me formar nunca!’ Depois, foi liberado o período remoto para todo mundo, e eu consegui fazer algumas matérias. Mas então eu fui fazendo e todo mundo falava ‘período que vem volta’ e nunca mais voltou. Vou me formar de casa.

Ingressei na universidade no presencial, ia todos os dias para a faculdade. Meu curso é integral, então eu passava muito tempo na rua, além do deslocamento. Mas era aquela adrenalina diária. Daria tudo para estar no IFCS de novo. Sinto falta também do contato com as pessoas, de estar com os amigos para momentos de estudos e de distração. Com o ensino remoto, fazemos trabalho com pessoas que nunca vimos, com uma letra, não sabemos nem o rosto. É um estar presente completamente diferente.  

Em relação à qualidade de ensino, pode ter afetado um pouco negativamente. Claro, foi melhor do que nos cursos que têm matérias totalmente práticas, porque filosofia vai ser eternamente teórica, seja no campus, seja em casa. Na questão dos estágios, por exemplo, me ajudou muito. Eu fazia estágio em três lugares diferentes, então fazer isso presencialmente me atrapalharia. O online também me ajudou a conseguir as horas mais rápido para me formar.

 

Professora Carolina FNDCarolina Pizoeiro
Professora da Faculdade Nacional de Direito
Eu fiquei super disposta a retornar, pois apesar de estar no grupo de risco e com as doses da vacina em dia, acredito que fosse o ideal retornar ao presencial. O melhor dos mundos, na verdade, seria ter investimento para que não precisássemos estar online mas, sem verbas, fazemos o que é possível. O conhecimento vamos conseguir resgatar, mas a nossa vida, não. Todo mundo hoje conhece alguém próximo que faleceu na pandemia. Antes da vacina, era muito temerário, por mais que quiséssemos fazer tudo com segurança. A partir do momento que estamos vacinados, a probabilidade de acontecer algo grave e fatal é pequena. Então, agora podemos começar a pensar em retorno total para 2022.1. Acho que foi acertado dessa forma, com distanciamento social, com turmas reduzidas, até pra poder ir sentindo como vai ser.

Do presencial, sinto muita falta dos alunos e dos meus colegas de trabalho. Para quem está fazendo a primeira graduação, é muito importante esse contato e o desenvolvimento de habilidades sociais, além dos conteúdos que acabam ficando perdidos no remoto. Se você não faz essa rede de contato no início da faculdade, que é muito importante para a carreira, depois você perdeu. Outra coisa do presencial é que você consegue sentir quando as pessoas não estão entendendo, você vê a cara de interrogação nos alunos. No online não tem isso. É uma dinâmica muito diferente do presencial, que eu podia fazer um método mais socrático, de fazer perguntas. Eu tento fazer isso no online, mas não rola, fica um silencio absurdo. Então tive que mudar até as didáticas. Foi um mal necessário.

 

Júlia Estudante HistóriaJúlia Duarte
Estudante de História, ingressou em 2020.2
Para mim, é muito complicado estar indo para o meu quarto período e nunca ter pisado na faculdade. Isso me desmotivou bastante, porque quando eu estudava para passar para a UFRJ, uma das grandes motivações que eu tinha era justamente estar no ambiente da universidade, ter essa mudança entre o cenário da escola para a faculdade. Tenho uma sensação de desconforto de que quando voltar para o presencial, vou me se sentir muito deslocada. Uma coisa é chegar na faculdade no primeiro período e ir aprendendo as coisas. Outra é sentir que já está na metade da graduação. É como se você tivesse voltado no tempo.

Espero conseguir voltar em breve. Não quero criar muitas expectativas com o retorno presencial, porque sempre tem a possibilidade de voltarmos e termos que parar, caso tenha uma piora. Mas eu espero que quando a gente consiga voltar de maneira segura, que eu goste do prédio. Todo mundo fala muito bem do IFCS, que é onde fica o prédio de História. Em relação ao contato, tive muita sorte de ter criado grupo de amigas. Como somos do mesmo curso e período, estamos passando pela mesma situação. Quando voltar, quero muito ter esse hábito de encontrá-las. Quero conhecer os professores que adorei ter matérias, vê-los nos corredores.

Acho que ter feito tudo online foi negativo para mim. História não é um curso que você precisa estar no presencial, mas eu tenho dificuldades de ter essa responsabilidade de estar no meu quarto e não poder me distrair. Estudar em casa te dá um certo conforto que eu não posso ter. Preciso ir para a faculdade, estar na sala de aula.

 

Professora Cristina ClaCristina Tranjan
Professora da Escola de Belas Artes
Sei que a universidade vai ter que se preparar muito para esse retorno, caso volte em abril mesmo. Poderia ser parcial, gradual, mas não vejo logisticamente como. Ter uma aula remota num dia e no mesmo dia ter aula presencial, a grade horária não fecha, fica complicado montar esse quebra-cabeça. Então eu sou favorável ao retorno completo. Acho que estamos nos saindo bem na universidade, mas não dá para ter cinco anos de aula remota. Nosso curso não é EAD. Vai haver uma perda muito grande. Vivemos um ‘dá-se um jeito’, mas não é a mesma coisa.

Acho que tem que voltar. Já deu. Eu não gosto de aula remota. Estou dando aula com o quadro branco magnético e é muito ruim: bate luz, reflete, a caneta escorrega. É melhor o contato físico com os alunos, olhar os desenhos deles. Vou de mesa em mesa tirar dúvidas, recolher os desenhos na hora. Aqui eles têm que abrir a câmera para mostrar o desenho ou mandar por e-mail, mas a imagem não fica legal, e para explicar é ruim também. Quando estamos presencialmente, ensino a manejar os esquadros. Aqui, não vejo se estão trabalhando certo, se estão usando certo o esquadro, se estão usando a escala certa.

A minha saudade é o convívio com os estudantes, o convívio com os meus colegas, o cafezinho no hall da reitoria. Isso me faz muita falta. Minha expectativa é que consigamos sair dessa e que consigamos voltar à normalidade dentro do possível, com todos os cuidados, para que eu consiga estar de volta à sala de aula com os meus estudantes, mesmo que de máscara e álcool em gel.

 

Samantha MartinsSamantha Martins
Professora do Instituto de Ciências Farmacêuticas, do Centro Multidisciplinar UFRJ-Macaé
Pessoalmente, vislumbro 2022.1 totalmente presencial, porque vejo que alguns países já estão flexibilizando bastante, já estão considerando a covid-19 como uma doença endêmica. Não vejo justificativa para a universidade não voltar ao presencial tomando cuidado em relação aos protocolos de segurança, apesar de todos os problemas que presenciamos no dia a dia, apesar da infraestrutura. Nesses últimos dois anos, nosso orçamento diminuiu de forma bastante drástica. Isso com certeza impacta, é algo que temos que trabalhar em paralelo ao nosso retorno ao presencial. Óbvio que não podemos entrar num ambiente que ofereça riscos, mas não vejo como podemos postergar. Eu estou muito ansiosa por essa volta e sinto muito que os alunos estão querendo saber. Não dá mais, temos que voltar, observando o cenário.

No remoto, num primeiro momento, você se sente angustiado porque você sai da sua zona de conforto. Para quem está acostumado com ensino presencial, não é legal. Gosto do olho no olho. Os alunos não abrem a câmera, não se sentem à vontade, fico sozinha com a câmera aberta. É ruim também não olhar a face da pessoa, interpretar como a pessoa está recebendo a mensagem que você está passando, o diálogo. Isso fica muito comprometido. Mas, tirando o fato da pandemia, acho que o ensino remoto serviu para dar uma chacoalhada em toda a comunidade, para pensar em novas formas de ensino, e isso é importante.

A saudade que eu tenho é de ver os alunos, os corredores cheios. Sinto falta também da convivência com os colegas docentes, os servidores, os técnicos-administrativos. Ou seja, sinto falta da comunidade acadêmica inteira. Teremos a SIAC (Semana de Integração Acadêmica) na semana que vem e é muito gostoso no formato presencial, com os corredores cheios e os alunos apresentando. A minha expectativa é que a próxima SIAC seja presencial.

 

Professor Marcel CaxiasMarcel Cunha
Professor do Campus de Duque de Caxias
Acho que o anseio de qualquer professor que trabalha no formato presencial é que esse formato retorne, já que é o nosso modelo hoje empregado e há mais de 100 anos funcional para o ensino. Os professores que lecionam em aulas presenciais sentem saudades. O ensino remoto também é bastante funcional, é muito mais fácil para conseguir transmitir informações, mas para um modelo com a parte prática muito forte, essa carga horária prática adaptada para o remoto faz falta. Ficamos no aguardo para definição precisa desse retorno, que torço para que ocorra no período que vem, junto com a torcida para o fim da pandemia, a vacinação de todos e pelo controle do espalhamento do vírus. Isso significa uma vitória nossa depois de dois anos de muito controle e de muito cuidado para que a pandemia não ficasse pior do que foi.

A saudade da sala de aula é gigantesca. É uma recompensa muito grande dar aula. O que a sala de aula dá para a gente é um retorno muito imediato do que a gente está falando, que vai desde a risada até a cara de insatisfação ou dúvida do aluno. Nossas aulas em geral têm de duas a quatro horas, e depois o pessoal pode querer mais, fazer perguntas. Esse pós-aula é de extrema satisfação, mas foi praticamente perdido. No ensino remoto, o pós-aula nunca existiu, porque era cansativo e com um retorno que era fraco. O que foi mais duro para os professores parecia ser uma falta de engajamento, que era só um resultado do modelo. No fundo, sabemos que o aluno está ali. No final da aula online costuma ser muito triste: acabar a aula era quase um apagar de luzes.

 

Professora Carine ECOCarine Prevedello
Professora da Escola de Comunicação
Nós tivemos vários momentos nesse período de ensino remoto. Numa disciplina que tem uma aplicabilidade prática tão significativa, como as que eu ministro (Telejornalismo, Tecnologia da Produção e Expressão e Linguagens Digitais), faz muita falta a atividade prática. A gente brinca que chegou um momento que esgota completamente a criatividade da professora em oferecer recursos diferentes para motivar os alunos na aula remota. Estamos num momento de esgotamento geral, de limite tanto para alunos quanto para docentes. Mas é uma contingência do momento, infelizmente temos que nos adaptar. Precisamos desenvolver novas abordagens e mudar completamente a característica da disciplina, então tem um prejuízo no aprendizado.

Perdemos muito também na relação humana, no diálogo, na troca. Minha rotina é muito mais desgastante no remoto, muito mais do que no presencial, porque emendamos todos os turnos na frente do computador, sem intervalo. Então, a gente perde muito dos espaços de convivência, nos fundimos com a máquina. Espero que possamos retornar, talvez não exatamente como era antes, mas com atividades práticas, em um ambiente de integração entre alunos e servidores.

O que eu tenho mais saudades é do caminho para a ECO, a natureza exuberante na Praia Vermelha, o nosso prédio lindíssimo, histórico, que nos acolhe e é tão significativo, que nos dá relevância tanto em espaço público quanto em legitimidade de formação. Saudades de toda essa convivência, da diversidade, da abordagem comum dos alunos para a gente conversar no meio do caminho, nos corredores, sentar no Sujinho para fazer um lanche e jogar conversa fora.

 

WhatsApp Image 2022 02 10 at 18.16.29Carolina Carvalho
Estudante de Ciências da Computação, ingressou em 2021.1
n Acho que está sendo uma experiência bem diferente do que a gente está acostumado, não necessariamente ruim ou boa. Eu já estive em outra faculdade presencial, e tive pouquíssimas aulas online, então é diferente de você ter suas aulas 100% remotas. Quando você está numa aula presencial, você tem um ambiente adequado para aquilo. No virtual foi um pouco mais difícil. Por exemplo, agora estou tendo algumas matérias mais voltadas para Matemática, e alguns professores usam câmera voltada para o quadro, fica muito difícil de enxergar. Em outras matérias, o remoto trouxe mais praticidade para o meu curso. Então, para algumas aulas foi ótimo, mas para outras foi terrível.

Minha maior expectativa é poder ter um contato maior com meus amigos, professores, estar na sala de aula. Poder almoçar juntos, poder conhecê-los pessoalmente. Mas meu caso também é especial, porque por fazer Ciências da Computação, onde todo mundo é bem ‘nerdzinho’, conseguimos nos conectar bastante através dos jogos virtuais em equipe. Então minha turma conseguiu se unir bastante, mas ainda acho que falta um pouco de proximidade humana.

Não tive trote, estava ansiosa para ser pintada novamente. É uma experiência! Então é claro que eu fico triste, mas acho que fico um pouco mais triste pelos meus colegas, que não passaram pelo primeiro ambiente universitário, e nem vão passar, não tiveram o choque de realidade.

Topo