facebook 19
twitter 19
andes3
 

filiados

Kim Queiroz
Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

Ser brasileiro na pandemia é experimentar um pesadelo diário que começa com o anúncio do número de mortos e se arrasta entre o medo de adoecer e a revolta pelo descaso das autoridades sanitárias. Em pesquisa feita pelo Lowy Institute, da Austrália, que analisou e classificou o desempenho de 98 países na gestão da pandemia, o Brasil ficou em último lugar. No dia 9 de março, com a morte de 1.954 brasileiros em apenas 24 horas, o país ultrapassou os Estados Unidos em número de óbitos diários pela covid-19.

“ É uma situação que, sem o apoio e orientação do Estado, não tinha como ser diferente”, explica o cientista político Josué Medeiros, diretor da AdUFRJ. Ele acredita que o comportamento de parte do povo brasileiro, aparentemente anestesiado pela explosão de adoecimentos, não representa um desrespeito generalizado às normas de distanciamento, mas sim uma necessidade de subsistência. “O brasileiro precisa sobreviver. Os dados das pesquisas mostram índices ótimos de resposta sobre vacinação. O problema não está na nossa população, e sim no modo como o governo inviabilizou as condições para que essa população conseguisse se proteger da pandemia”, critica.

A adoção do auxílio emergencial evitou uma contração ainda maior da economia do país, mas a iniciativa foi muito aquém do necessário. “Os auxílios reduzidos propostos pelo governo para 2021 são cruelmente insuficientes”, alega o economista Daniel Conceição, professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ. “Se o governo realmente retomar sua agenda radical de austeridade, teremos um agravamento da crise econômica e uma elevação do desemprego e da miséria a níveis socialmente insuportáveis”, aponta o docente.

Para se esquivar dos números da covid-19, o governo adotou uma postura negacionista, que alimenta o senso de inferioridade do povo brasileiro. “As declarações do Bolsonaro de que ‘brasileiro anda na vala e não acontece nada’, reforçam esse vira-latismo”, destaca Mayra Goulart, professora de Ciência Política no IFCS/UFRJ. Ela teme o impacto desses discursos na sociedade. “São opiniões pejorativas que têm consequências dramáticas, uma vez que desvalorizam a vida das pessoas. São vidas que supostamente valem menos e merecem menos cuidados”, ressalta.

Professora de Antropologia Social da UFRJ, Adriana Facina descreve que as camadas mais populares ficaram “à deriva”, pois havia uma força política agindo a favor da pandemia. “Não é à toa que a gente vê a pandemia vitimando muito mais a classe trabalhadora do que as elites, que se encontram em condições muito mais seguras de saúde, moradia, higiene, distanciamento e até mesmo lazer”, comenta.

“A pandemia vem escancarar o caráter necrófilo dos grupos bolsonaristas e de extrema-direita, que já estava se manifestando mesmo antes da covid-19”, reforça o antropólogo José Sérgio Leite Lopes. Professor titular do Departamento de Antropologia do Museu Nacional, Leite Lopes avalia que a população brasileira na pandemia pode ser caracterizada pela desigualdade social extrema. “Enquanto uma parte da população pode trabalhar e estudar de casa através do acesso à informática, a outra parte majoritária é obrigada a se deslocar para locais habituais de trabalho passando por situações de aglomeração”, completa.

Topo