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WhatsApp Image 2024 05 24 at 19.09.09 1Orçamento reduzido, despesas milionárias e regras fiscais draconianas. As causas da dramática situação da UFRJ foram apresentadas com riqueza de dados em um debate organizado pela AdUFRJ na quarta-feira (22). A atividade — que está gravada no canal do sindicato no Youtube — integrou a agenda do segundo dia da paralisação dos professores.
“A UFRJ está passando, talvez, o momento mais crítico da sua história”, afirmou o superintendente geral de Orçamento, George Pereira da Gama, que substituiu o pró-reitor Helios Malebranche no evento. “Mas tenho certeza de que a universidade é maior que isso. Os professores Roberto Medronho (reitor) e Cássia Turci (vice) estão assiduamente em contato com o MEC e isso vai se reverter”, completou.
Antes de demonstrar esperança, George expôs os frios números do problema — que podem ser conferidos nestas páginas. Hoje, a instituição trabalha com menos da metade das receitas que já teve entre 2011 e 2013, em valores corrigidos pela inflação. No auge, em 2012, a UFRJ contou com R$ 795 milhões. Neste ano, são apenas R$ 391 milhões. Se considerar valores nominais, ou seja, sem correção, o orçamento atual da universidade é pouco maior que o de 13 anos atrás, de R$ 367 milhões.
“Já as despesas têm um crescimento vegetativo, por exemplo, nos contratos de prestação de mão de obra. Anualmente, eles são reajustados em função dos dissídios dos colaboradores de limpeza e vigilância. E o orçamento não acompanha”, explicou.
Depois da conta de luz (R$ 67,2 milhões), estes contratos representam os maiores gastos da universidade: vigilância (R$ 61,9 milhões) e limpeza (R$ 61,8 milhões). Em seguida, vêm as despesas com alimentação (R$ 42,7 milhões) e a conta de água (R$ 38,9 milhões).
É fato que 2024 trouxe um orçamento melhor para a instituição. Mas os valores pouco representaram após tantos anos de subfinanciamento. “Este orçamento se compara ao de 2012 (em valores nominais). É complicado frente ao tamanho da UFRJ”, continuou George.WhatsApp Image 2024 05 24 at 19.07.06
Está tão complicado que o desafio tem sido terminar o ano de portas abertas, com as despesas sendo empurradas para o próximo exercício. Em 2017, por exemplo, foram pagos R$ 60,1 milhões de déficit do período anterior. “A gente já abre o exercício pagando primeiramente as despesas do exercício anterior. É como se fosse um cheque especial. Quando seu salário entra, você tem que pagar primeiro sua dívida”, afirmou o superintendente.
Só houve uma diminuição destes valores em 2021 e 2022, por conta da pandemia, respectivamente, em 2020 e 2021. A universidade ficou praticamente dois anos fechada. Com a retomada das atividades presenciais para a maior parte da UFRJ em 2022 — é bom lembrar que a área de Saúde nunca parou —, o passivo voltou a aumentar: R$ 79,8 milhões, em 2023.
Se nada melhorar, a situação deve se repetir agora. Embora a universidade conte com uma dotação de R$ 391 milhões, boa parte das receitas é “carimbada”. Ou seja, tem destinação específica, que a reitoria não pode alterar. É o caso das verbas do Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), de R$ 61,2 milhões. E já insuficientes para as necessidades da UFRJ.
O orçamento que a universidade realmente trata como discricionário está limitado a apenas R$ 294 milhões. Já as despesas estimadas até o fim do ano somam R$ 540 milhões. Para tentar fechar esta conta, a reitoria faz constantes pedidos de suplementação de recursos ao Ministério da Educação. Por enquanto, sem sucesso.

RECURSOS PRÓPRIOS?
WhatsApp Image 2024 05 24 at 19.07.06 2Um alívio para os cofres poderia vir das chamadas receitas próprias – decorrentes de aluguéis de terrenos, por exemplo. Até 2022, tudo que superava a previsão autorizada pelo próprio governo ficava no Tesouro. Lula, logo no primeiro ano do novo mandato, liberou as universidades de fazer esta devolução, por meio de uma emenda constitucional. Mas a regra ainda não funciona como os gestores esperavam.
Os excedentes arrecadados dentro de um mesmo ano demoram meses para serem liberados. Assim como a parte que acaba transferida para o exercício seguinte.
A UFRJ tinha R$ 21,9 milhões acumulados para receber de anos anteriores a 2023. O MEC disponibilizou a oportunidade para solicitação em 28 de abril do ano passado, mas a UFRJ só recebeu os recursos em 23 de outubro. “Foi um ganho. Antes, a gente via (o excedente), mas não recebia”, disse George.WhatsApp Image 2024 05 24 at 19.07.06 1
O atraso se repetiu dentro do próprio ano de 2023. Ano passado, a UFRJ tinha uma dotação prevista de R$ 59,39 milhões, mas arrecadou R$ 69,03 milhões. Mesmo com os pedidos para ganhar a diferença, só uma pequena parte chegou, no fim do ano passado. Ficaram faltando R$ 5,8 milhões. “A emenda não tem sido aplicada na íntegra. A gente arrecadou mais, fizemos todas as solicitações em todos os momentos e a Secretaria de Orçamento Federal não nos disponibilizou os recursos”. Os valores devidos do ano passado foram novamente solicitados em abril último. “Mas até agora a gente não recebeu”.

CONTRAMÃO
Com a experiência de ter conduzido a pró-reitoria de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças entre 2015 e 2019, Roberto Gambine relatou o início da espiral descendente do orçamento da UFRJ. “O primeiro impacto ocorreu na virada de 2014 para 2015. Sofremos um contingenciamento na casa dos R$ 70 milhões, que, à época, equivalia a dois meses de funcionamento da universidade”, disse. “Eu imagino que, para todas as gestões da PR-3 de lá para cá, o desafio foi chegar em dezembro pagando as contas de outubro para não piorar a situação que a gente herdou”.
Gambine, hoje na diretoria de Administração do Instituto de Doenças do Tórax (IDT), critica o esvaziamento de uma política pública criada entre universidades e o governo. “Eu considero a democratização e a ampliação do acesso às universidades como a principal política pública construída no país nos últimos anos. Nós mudamos o perfil das universidades federais. Todas abraçaram esse desafio. E, contraditoriamente, o orçamento vai na contramão”, afirmou. “É devastador. Quando a gente olha os números, chega a doer”.
Ex-representante dos técnicos-administrativos no Conselho Universitário, Gambine também recordou a política de extinção de centenas de cargos da categoria e sua substituição por terceirizados, desde os anos 90. “Hoje, não temos recursos suficientes para dar conta da terceirização”.
A redução das receitas por tanto tempo, acompanhada do crescimento da instituição e das despesas milionárias com serviços terceirizados — que, antes, com os servidores, estavam garantidos na folha de pessoal — gera consequências visíveis. “Literalmente, os tetos estão caindo sobre nossas cabeças. O chão está abrindo sob nossos pés”, disse, em referência a recentes incidentes de infraestrutura da UFRJ.

EDUCAÇÃO EM QUEDA
Regras fiscais ruins também contribuem para o esvaziamento das políticas sociais, com impacto nas universidades federais. E, para o professor Carlos Pinkusfeld, do Instituto de Economia, o teto de gastos públicos criado no governo Temer ainda não foi substituído de forma adequada pelo novo governo.
“A gente não se livrou do teto. Transformamos o teto em nível (aquele valor que não podia gastar a mais) no teto em taxa do crescimento do gasto público. Este ano, o gasto do governo não pode crescer além de 1,7%”, afirmou. A restrição prevalece mesmo com o atual aumento da arrecadação tributária.
Carlos Pinkusfeld, responsável pela mediação do debate, apresentou alguns números assustadores da aplicação de regras fiscais draconianas na Educação em geral, desde 2017. “Tivemos o pico em 2014. A valores de hoje, a gente recebia R$ 111 bilhões. Em 2022, tivemos R$ 82 bilhões. Temos uma queda de 27% . Quando a gente vai para investimento, o quadro é bizarro. Tivemos um pico de R$ 19 bilhões. O vale em 2022 foi de R$ 5,5 bilhões. Uma queda de 72%”.
O docente do Instituto de Economia reivindica muito mais recursos para as universidades. “Como você pode pensar em modernização, sem investir em universidade?”, questiona. “Se a gente quer modernizar com inclusão, a conta não fecha. Estamos com um déficit de recursos gigantesco. A gente deveria recuperar mais rápido”.

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