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WhatsApp Image 2022 11 04 at 18.43.26ENTREVISTA I MAYRA GOULART, CIENTISTA POLÍTICA E VICE-PRESIDENTE DA ADUFRJ

Com governos estaduais de esquerda basicamente restritos ao Nordeste, como será a relação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com os novos governadores? Sobretudo com apoiadores de Jair Bolsonaro em estados estratégicos, como São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro? Essa é uma das questões abordadas nesta entrevista pela cientista política Mayra Goulart, professora do IFCS/UFRJ, vice-presidente da AdUFRJ e coordenadora do Observatório do Conhecimento e do Laboratório de Eleições, Partidos e Política Comparada. Segundo ela, Lula não deverá ter dificuldade de diálogo com os governadores eleitos de direita e centro-direita. “Boa parte dos governadores de direita deve adotar uma postura ou menos beligerante ou mais adesista para atuar em conformidade com o governo federal”, acredita a professora. Ela também fala sobre a nova composição da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, a relação da Casa com o governador reeleito Cláudio Castro e a necessária reorganização da esquerda no território fluminense.

Jornal da AdUFRJ — O PT do presidente Lula elegeu quatro governadores, todos no Nordeste, e conta com mais três governadores aliados do PSB, sendo dois deles também no Nordeste. Como você avalia essa correlação de forças nos governos estaduais, nos quais partidos de direita e centro-direita avançaram e a esquerda ficou restrita, basicamente, ao Nordeste?
É preciso dizer que a força centrípeta da Presidência da República é muito grande. É difícil ser um governador de oposição, uma vez que os estados dependem muito de repasses da União. Boa parte dos governadores de direita deve adotar uma postura ou menos beligerante ou mais adesista para atuar em conformidade com o governo federal. Acho que teremos essa atração do governo federal sobre os governadores.

Você prevê dificuldades de diálogo de Lula com governadores eleitos que são aliados de Bolsonaro, sobretudo em estados de peso, como São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro?
O próprio Tarcísio de Freitas (governador eleito de São Paulo) já vem num processo de descolamento do radicalismo de Bolsonaro. A mesma coisa pode ser falada do Romeu Zema, reeleito em Minas Gerais. O Zema, embora possa ser tido como uma liderança bolsonarista, se descolou de Bolsonaro na pandemia e, mesmo no primeiro turno, fez uma campanha em que a relação com Bolsonaro ficou muito diminuída.

E em relação ao Cláudio Castro, governador reeleito do Rio de Janeiro?
Ele teve uma postura muito parecida com a do Zema. Só no segundo turno ele se assumiu propriamente bolsonarista, e mesmo assim de uma maneira muito secundária. Ele é muito mais um político da máquina, alguém que tem articulações com o Legislativo, com prefeitos e vereadores do interior do estado. O mesmo perfil do Zema. São figuras da dimensão local, que construíram a sua trajetória na localidade. O Zema é um símbolo da mineirice, ele joga com essa ideia. Então essas dinâmicas muito nacionais não serão um polo de atração sobre esses governadores.

Em relação ao Rio de Janeiro, a Assembleia Legislativa teve renovação de menos de 50%, e com perfil mais conservador. Juntos, o PL e o União Brasil elegeram 25 deputados estaduais. O PL, com seus 17 deputados, a maior bancada, mostra força para eleger o presidente da Casa. Como você avalia esse quadro, e que perfil deve ter esse futuro presidente da Alerj?
Sobre a renovação da Alerj, é preciso observar que, em alguns casos, o grau de renovação se deu dentro de um mesmo grupo político, de herdeiros políticos. Então não se pode falar em renovação nesses casos (veja box abaixo sobre a Alerj). Acredito que o Cláudio Castro vá apostar em um bom negociador para presidir a Alerj, talvez orientando o PL a escolher alguém com esse perfil. Um perfil conciliador, que seja capaz de fazer a política da governabilidade.

No caso do Rio de Janeiro, a esquerda foi derrotada em primeiro turno para o governo do estado por larga margem, e Lula teve menos votos que Bolsonaro no estado. O candidato do PL venceu na capital e em toda a Região Metropolitana, salvo Niterói. Como a esquerda pode se reorganizar no estado para as próximas eleições?
Acho que um ponto de reorganização da esquerda no estado do Rio é ocupar os postos mais locais, como prefeito, vereador. A esquerda tem que se enraizar, atuar mais na política local. Observando os dados da votação no estado, é interessante notar que locais em que você tem uma prefeitura mais de esquerda você tem, em comparação com municípios vizinhos, uma votação mais expressiva no Lula. Como, por exemplo, em Maricá, cuja prefeitura é comandada pelo PT, onde o Lula perdeu, mas mesmo assim teve muito mais votos proporcionalmente do que em Cachoeiras de Macacu, Itaboraí ou Rio Bonito (as três cidades são administradas por governos de direita).

Na Alerj, às vezes renovação é sinônimo de continuidade

Dos 70 deputados eleitos em 2 de outubro, 32 são novatos, o que representa uma renovação de 45,7%. Ao menos em tese. Como observado pela professora Mayra Goulart, muitos novatos representam grupos — ou famílias — tradicionais na política fluminense. O que se configura, na verdade, em continuidade, e não em renovação.
O deputado estadual eleito Douglas Ruas (PL), com seus 175.977 votos, é um bom exemplo. Policial civil, ele é filho do prefeito de São Gonçalo, Capitão Nelson (PL), que é policial militar reformado. A influência política do pai foi determinante para que Douglas fosse o mais votado de São Gonçalo para a Alerj.
Outro bom exemplo no campo da direita é Guilherme Delalori (PL), que teve 114.155 votos. Policial militar, ele é irmão do prefeito de Itaboraí, Marcelo Delalori. Vinicius Cozollino (União Brasil), também se encaixa nesse perfil: ele é primo do prefeito de Magé, Renato Cozollino, e foi secretário de Fazenda e de Governo da cidade. Mesmo caso de Renato Miranda (PL), irmão do prefeito de Mesquita, Jorge Miranda. Ele foi secretário municipal de Governança de Mesquita.
Ainda no campo da direita, o sobrenome foi fundamental para a eleição de Giselle Monteiro (PL). Irmã do ex-vereador Gabriel Monteiro, que foi cassado por uma série de acusações e impedido de concorrer a deputado federal, ela teve 95.028 votos. Também do PL, o novato Cláudio Caiado é irmão do presidente da Câmara do Rio, Carlo Caiado. Aos 69 anos, o também novato Otoni de Paula Pai (MDB) se elegeu fazendo campanha junto com o filho, Otoni de Paula, um dos mais fiéis escudeiros de Jair Bolsonaro.
A esquerda também tem um representante da continuidade entre os novatos. Andrezinho Ceciliano (PT), filho do atual presidente da Alerj, André Ceciliano (PT), é o mais jovem eleito, aos 24 anos.

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