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WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.17.33 2Estela Magalhães e Silvana Sá

A Lei de Cotas completa sua primeira década de existência na próxima segunda, dia 29. Ao longo de dez anos, foi responsável por ampliar o acesso de estudantes pobres, pretos, pardos e indígenas à graduação. A UFRJ aderiu ao sistema em 2013, depois de longo debate, e desde então viu o perfil de seus estudantes mudar. O número de alunos pretos e pardos cresceu 71% em seis anos. “A universidade hoje respira novos ares. A lei de cotas vem trazendo uma UFRJ mais diversa, plural e com mais representatividade”, analisa Denise Góes, coordenadora das Comissões de Heteroidentificação da Pró-reitoria de Graduação (PR-1).
A lei prevê que 50% das vagas sejam reservadas para estudantes que completaram o ensino médio em escolas públicas. Dentro deste grupo, 50% se aplicam a candidatos cuja renda familiar per capita seja de até 1,5 salário mínimo. A outra metade fica destinada a alunos de escolas públicas com renda superior a 1,5 salário mínimo. Nas duas faixas de renda são destinados percentuais para pretos, pardos e indígenas, de acordo com a proporção desses grupos étnicos no estado em que se localiza a instituição de ensino. Também há cotas para pessoas com deficiência. De acordo com o Censo 2010, o Rio de Janeiro tem 51,7% de sua população formada por pessoas negras e 0,1% por indígenas.
A própria lei prevê sua revisão após dez anos, ou seja, ainda em 2022. Uma das sugestões de Denise Góes é que haja mudanças no acesso de indígenas às vagas. “O indígena urbano vem sofrendo perdas em relação à reserva de vagas porque não está aldeado conforme preconiza a documentação que ele tem que apresentar no momento da matrícula”, conta. O candidato indígena precisa apresentar um certificado de aldeamento.
O momento eleitoral, para Denise, não é o mais propício à revisão de uma lei tão importante para o país. De acordo com a servidora, é necessário que as universidades se articulem para interferir na revisão da lei em outro momento. “Penso que as comissões de heteroidentificação têm que estar dentro dessa revisão com caráter obrigatório a todas as universidades”, opina.
Apesar da preocupação com um Parlamento conservador, com grande número de parlamentares contrários às cotas, o professor Vantuil Pereira, decano do Centro de Filosofia e Ciências Humanas, lembra que o momento eleitoral e o apoio da sociedade podem proteger a lei. “Há um sentimento na sociedade civil muito diferente de 2003. A opinião pública hoje é favorável às cotas e a repercussão de um eventual fim dessa lei pode ser muito ruim para os parlamentares num ano eleitoral”, analisa.

HETEROIDENTIFICAÇÃO
WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.17.34 2Jonathan Silvino e seu avô Vilmar Alves“Fico muito orgulhoso por ele, ter alguém na família cursando uma universidade traz muita alegria”, diz Vilmar Alves, que acompanhou o neto Jonathan Silvino no processo de heteroidentificação, no qual foi aprovado. O objetivo desta etapa é garantir o acesso de pessoas pretas e pardas às vagas reservadas e coibir fraudes.
Ingrid Nogueira também foi aprovada no processo e garantiu sua vaga em Arquitetura. “Não consigo nem descrever o que estou sentindo. Meus pais não completaram o ensino médio e sou a primeira da família a cursar uma universidade pública”, conta, emocionada.
“Nós analisamos o fenótipo dos candidatos, porque é ele que marca o racismo no Brasil”, explica Denise Góes.WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.17.34 3Ingrid Nogueira “Não se trata de simplesmente julgar quem é preto, quem é pardo e quem não é”, ela explica. “Para realizar a heteroidentificação é preciso entender o quanto o racismo massacrou um segmento da população e a trajetória da luta do movimento negro brasileiro na conquista dessas políticas públicas por igualdade de oportunidades”, analisa. Ela ainda destaca a importância da diversidade de raça, gênero e segmento social nas comissões, o que foi muito bem recebido pelos candidatos. “É bom ser avaliado por uma banca diversa e com pessoas que me representam”, diz Elias dos Santos, aprovado em Relações Internacionais.
WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.17.35Elias dos Santos“Não falamos mais em fraude desde 2020”, diz o professor Marcelo de Pádula, superintendente-geral de Graduação. “O processo de heteroidentificação admite os candidatos aptos e elimina os que não têm direito às cotas”, completa. Desde a implementação dessa política pela UFRJ, as fraudes foram anuladas e o número total de não aptos vem caindo a cada semestre. Em 2020.1, período de implementação do processo, 14% dos candidatos foram considerados não aptos para o uso das cotas e 21% não compareceram. Em 2022.1, foram identificados menos de 6% de candidatos não aptos, e o número de faltosos permaneceu por volta de 21%. Caso o candidato seja considerado não apto pela comissão, ele tem direito a solicitar outra banca, no mesmo dia, e recorrer da decisão. O candidato só é eliminado caso a comissão determine a não aptidão de forma unânime.

MUDANÇAS NA DOCÊNCIA
Embora o impacto das cotas seja mais sentido na graduação, a participação de pessoas pretas na pós-graduação e admitidas nos concursos docentes também aumentou ao longo dos anos. “Tanto a lei de 2012, quanto a lei de 2014 (que prevê cotas raciais para o Serviço Público), criaram condições para a renovação do corpo docente nas universidades e na própria UFRJ”, acredita Vantuil Pereira. “Isso, combinado ao Reuni (Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais), que abriu a perspectiva do aumento de vagas docentes”, afirma. “Essas políticas associadas mudaram a composição do corpo docente, ainda que não da maneira desejada”, considera. “Saímos de um patamar de 8% de professores negros para 14%, que é mais ou menos o número que temos na UFRJ”.

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