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WhatsApp Image 2022 05 27 at 18.06.32MOBILIZAÇÃO estudantes, professores e grupos em defesa da educação protestaram na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara - Foto: DivulgaçãoSilvana Sá e Estela Magalhães

A rápida reação de professores, estudantes e parlamentares contra a PEC 206/2019, que abre caminho para a cobrança de mensalidades em universidades públicas, teve sua primeira vitória. A discussão, que chegou a entrar na pauta da reunião da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara, na quarta-feira (25), foi adiada com compromisso de realização de audiências públicas prévias sobre o tema. O projeto é assinado pelo deputado federal General Peternelli (PSL-SP). A relatoria é do deputado federal Kim Kataguiri (União-SP), atual presidente da Comissão de Educação. Kataguiri deu parecer favorável ao pagamento das mensalidades, mas uma licença médica o afastou de Brasília nos últimos dias, o que contribuiu para o adiamento da matéria.
No texto, autor e relator defendem que a cobrança de mensalidades seja aplicada a todos os estudantes, exceto aos “comprovadamente carentes”. A justificativa ataca o Artigo 206 da Constituição Federal.
Para o professor Luigi Bonizzato, da Faculdade Nacional de Direito, a PEC é inconstitucional porque altera um direito fundamental protegido pela Constituição: a educação. “Ele é entendido pelo legislador constituinte como um direito de todos e um dever do Estado”, diz. O docente explica que as chamadas cláusulas pétreas, que não podem ser modificadas pelo legislador, só podem ser alteradas no sentido da ampliação de direitos. “Se hoje temos a garantia de um ensino público gratuito de qualidade disponibilizado à população pelas universidades públicas, e se é pra fazer pagar o que é gratuito, isso não é acrescentar um direito. E, sim, diminuir. Isso é afrontar um direito fundamental do Brasil que é petrificado pela própria Constituição”, completa.
A reitora da UFRJ, professora Denise Pires de Carvalho, também é contrária à medida. “É uma proposta absurda”, critica. “As universidades públicas são instituições do Estado brasileiro, responsáveis pela formação dos melhores profissionais do país e geração de conhecimento”, afirma.
Um dos argumentos da PEC, o financiamento, é outro equívoco, para a reitora. Para ela, o pagamento de mensalidades não garantiria o funcionamento das instituições. “Não seria suficiente para garantir e manter o modelo de universidade que defendemos, com carreira dos servidores em dedicação exclusiva e laboratórios de pesquisa em pleno funcionamento”, avalia.

MAIORIA NÃO PODERIA PAGAR
“A primeira coisa que precisa ser desconstruída é esta tese de que as universidades ainda são espaços elitistas”, afirma o presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), professor Marcus David. “Em função das várias políticas públicas, como cotas e interiorização, nós mudamos o perfil dos estudantes”, explica.
O último levantamento da Andifes, de 2018, revelou que 53,5% dos graduandos das instituições federais brasileiras estavam na faixa de renda mensal familiar per capita de até 1 salário mínimo. E mais de 70% estavam na faixa de renda mensal familiar per capita de até 1,5 salário mínimo. Na UFRJ, mais de 30% dos estudantes têm renda familiar menor ou igual a 1,5 salário mínimo. Os números mostram que o pagamento de mensalidades não seria uma realidade para a maioria dos estudantes.
O professor critica a falta de lógica econômica da proposta. “A educação superior de qualidade é muito cara. Por isso, os cursos particulares de qualidade apresentam mensalidades tão elevadas. Isso é fora da realidade, inclusive, da classe média no Brasil”.
Marcus David também avalia que existe uma concepção equivocada por trás da atual proposta. “O sistema universitário público não tem o aluno como cliente. O sistema é criado pensando a sociedade como beneficiária. Nós formamos alunos para melhorar a qualidade de vida da sociedade como um todo”, completa.
Integrante da Comissão de Educação da Câmara, o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) acredita que a PEC deve voltar à discussão na CCJ nas próximas duas semanas. “É preciso ampla mobilização e pressão sobre o presidente da comissão (deputado Arthur Oliveira Maia - União-BA), que tem a prerrogativa de pautar ou não as matérias”, defende. Ele considera “precário” o adiamento desta semana. “Precisamos destacar que ela não foi definitivamente retirada da pauta”.
O DCE Mário Prata também é contra a PEC e convocou uma assembleia estudantil no dia 31 para debater o assunto. “Não à toa, essa proposta vem após um longo processo de desmonte das universidades, após cortes bilionários, após uma série de políticas para fragilizar e precarizar a estrutura”, diz a estudante Júlia Vilhena. “A gente luta pela ampliação do acesso à universidade pública, inclusive para que essas desigualdades sociais que hoje ainda existem no acesso ao ensino superior sejam supridas por outras medidas”, completa.
Presidente da AdUFRJ, o professor João Torres destaca que a PEC acaba com a isonomia entre os estudantes. “Teríamos duas classes de alunos na universidade: os clientes, que iam pagar, e os assistidos. Aconteceria uma diferenciação que não seria saudável entre os alunos”, alega o professor.
Apesar do adiamento da votação, Torres acredita ser necessária uma maior articulação da sociedade contra a cobrança. “Se essa PEC for para frente vamos ter que nos articular de um jeito mais incisivo, porque uma das questões importantes da universidade pública é esse caráter onde ninguém é cliente”, diz. “Aqui, todo mundo tem o mesmo status, sem relação privilegiada”. (Colaborou Kelvin Melo)

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