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Por Beatriz Coutinho

A UFRJ conquistou seu lugar entre gigantes à mesa de debates sobre o clima da Terra. Pesquisadores da Coppe levaram o Brasil ao patamar de primeiro país em desenvolvimento a elaborar um modelo, o Coffee, capaz de propor soluções para mitigar os efeitos das mudanças climáticas em um cenário global. O modelo foi publicado no dia 4 de abril no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês). Os IMPs (Illustrative Mitigation Pathways), ou cenários de mitigação ilustrativos, são essenciais para gerar modelos de soluções possíveis, que podem dar suporte a reuniões climáticas e decisões políticas. Para o relatório deste ano do IPCC, dos 1.600 modelos coletados, foram escolhidos cinco, um deles o da Coppe.

O Coffee foi escolhido para gerar soluções para um cenário conhecido como IMP-Neg (Negative Emissions). “É a história de um mundo onde você não faz tanto esforço para reduzir violentamente a demanda por combustíveis fósseis, porque você conta que para sempre vai fazer uso crescente de tecnologias de emissão negativa, que a grosso modo é tirar CO² da atmosfera”, explica o professor Roberto Schaeffer, do Laboratório Cenergia, do Programa de Planejamento Energético (PPE) da Coppe, e coordinating lead authors do capítulo três do relatório do IPCC 2022.

A escolha dos modelos é feita a partir dos futuros possíveis que o IPCC quer analisar. “Chegou-se à conclusão que um dos cenários do Coffee era o mais interessante, porque ele tinha um equilíbrio razoável entre reflorestamento e produção de biomaterial, que é uma maneira de sequestrar carbono”, diz o professor.

Da sigla em inglês para Computable Framework For Energy and the Environment, o Coffee é um Modelo de Avaliação Integrada (IAM, em inglês) global. Esses modelos avaliam as melhores opções para encontrar soluções de menor custo, levando em consideração todas as restrições possíveis. “Por exemplo, em um cenário a longo prazo, no qual o biocombustível se mostre importante, o modelo integrado vai enxergar que isso significa mais áreas para cultivo de fontes para esse combustível. Com isso, vão sobrar menos áreas para a produção de alimentos, o que pode gerar impacto na indústria de refino, que por sua vez vai precisar de mais fertilizantes para que áreas menores consigam produzir mais alimentos”, ilustra Schaeffer.

A ideia surgiu ainda durante as discussões do Acordo de Paris (2015), quando o professor Schaeffer e seu grupo de pesquisa questionavam se as propostas apresentadas pelo Brasil eram compatíveis com o objetivo maior do tratado, que era estacionar a temperatura mundial entre 1,5ºC e 2ºC acima da temperatura pré-industrial (1850-1900).
Schaeffer sabe que as vitórias na Ciência não são imediatas. “Isso é produto, no meu caso pelo menos, de um investimento de mais de 20 anos”, se emociona Scheaffer. O professor faz questão de pontuar que ter um trabalho reconhecido mundialmente é muito importante para o Brasil, para a UFRJ, para a Coppe e para o seu grupo de pesquisa. A conquista chama atenção para a competência dos cientistas brasileiros. Ao final, o professor brinca: “Os IMPs são como menus de opções. E dentro desse menu, um dos pratos principais foi preparado aqui pela cozinha da Coppe”.

Criado em 1988, o IPCC concentra-se em estudos integrados sobre o clima, para entendê-lo e saber quais caminhos tomar. Seu produto é um relatório estruturado por capítulos. “O consumidor final desse relatório são governos. Teoricamente, essa informação é o que vai pautar as negociações climáticas do mundo nos próximos seis ou sete anos”, explica Schaeffer. “O Acordo de Paris, em 2015, foi 100% baseado no relatório de 2014”.

Para a professora Joana Portugal, o IPCC constrói uma ponte entre governos e Ciência. Enquanto políticos pensam a curto prazo, geralmente visando à reeleição, cientistas trabalham a longo prazo. É nessa lacuna que entram os trabalhos do Painel. “Esses relatórios integram e sintetizam as mensagens-chave que nós temos para oferecer sobre a Ciência do clima para um decisor político de forma útil”, pontua a professora. Em 2017, Joana trabalhou no IPCC, em seu ciclo de relatórios científicos especiais, concentrando-se na captação de gases para redução do efeito estufa a médio prazo, em 2050.

Joana, que é pesquisadora do Laboratório Cenergia, vê como um sinônimo de independência o fato de o Brasil ser o primeiro país em desenvolvimento a integrar os relatórios do IPCC. “Não ficamos dependentes de terceiros, conseguimos internamente trabalhar com modelos globais, que atendem às necessidades do país”, ressalta. “É entender o papel do Brasil no mundo e qual é o papel do mundo no Brasil”.

Suzana Kahn, vice-diretora da Coppe, credita o papel de destaque do Brasil na elaboração de cenários globais de mitigação a muitos anos de pesquisa na área. Ex-secretária de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente (2008-2010), a professora lembra que a Coppe vem há muito tempo atuando ativamente nos debates políticos e científicos sobre o tema, incluindo a participação na elaboração dos relatórios do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, o PBMC, do qual ela é presidente do Comitê Científico. “Nos dá a legitimidade junto a todos os países para debater o tema de igual para igual”, argumenta.

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