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WhatsApp Image 2021 10 22 at 15.10.271Marcos (FND), Camila (CAp), Bruno (Biologia) e Rodrigo (Letras)Kelvin Melo e Kim Queiroz

Marcos de Souza Paula é professor da Faculdade Nacional de Direito, mas nunca deu aulas no histórico prédio do Centro do Rio. A inusitada situação, porém, não é um caso isolado entre os docentes da UFRJ. Marcos faz parte de um grupo de 500 substitutos da universidade contratados após 16 de março de 2020, data de suspensão das atividades acadêmicas não emergenciais, segundo levantamento da Pró-reitoria de Pessoal.
“A minha contratação foi precedida de uma prova, realizada antes do período pandêmico, por volta de fevereiro de 2020. Chegamos a ser convocados em março, mas, com a pandemia, tudo foi suspenso”, lembra Marcos.
O grande volume de contratações de substitutos, que só deveriam “atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”, conforme a legislação federal, revela a urgência de novos concursos públicos. Enquanto isso não ocorre, a professora Gisele Pires, pró-reitora de Graduação, não tem dúvidas sobre a importância dos substitutos.
“Os profissionais que optam por ingressar na carreira docente na UFRJ, quer seja para um contrato transitório ou não, passam por um criterioso processo seletivo gerenciado pelas unidades ou campi, permitindo, assim, que os mais qualificados sejam selecionados”, diz. “Mesmo durante todo o período de completa atipicidade — a pandemia de covid-19 —, as unidades e campi primaram pela manutenção da excelência do ensino de graduação”, completa.
Só que preservar a excelência no ensino tem sido uma experiência mais desafiadora para os substitutos, que tiveram pouco ou nenhum tempo para construir laços presenciais com seus alunos e colegas docentes. Marcos assinou o contrato de dois anos em dezembro de 2020. Hoje, dá aula para três turmas de Direito Civil, cada uma com cerca de 60 alunos. Durante este período, viu muitas câmeras fechadas nas atividades síncronas. Mas também colecionou pequenas vitórias em sua primeira experiência formal como professor. “Vários alunos têm feito elogios e comentários positivos, dizendo terem se interessado pela matéria, e que se sentiram estimulados pelas aulas”, orgulha-se.WhatsApp Image 2021 10 22 at 15.22.401
Já a professora Camila Costa de Oliveira, do Colégio de Aplicação, precisou se reinventar como professora para ensinar artes cênicas. “Como trabalhar com o corpo e jogar através das telas, diante de um grande número de câmeras fechadas? Seguimos experimentando, descobrindo e aprendendo junto com os estudantes”, diz.
A docente acredita que o maior desafio está na construção e manutenção do vínculo afetivo com esses alunos. “Isso foi se dando pouco a pouco, por meio de propostas pedagógicas baseadas no afeto e na troca. Acredito que sem essa troca afetuosa não existe processo de ensino-aprendizagem”.
Um momento marcante foi o espetáculo “Estação Terror e Miséria”, com estudantes do 1º e 2º anos do ensino médio, desenvolvido e apresentado inteiramente online. “Foi muito bonito ver o fazer teatral na escola se apropriando dos meios de criação disponíveis no momento atual. A força e a importância do teatro como disciplina curricular na escola é imensa, e não seria diferente agora”, afirma.
Camila só conheceu os alunos em carne e osso, nesta semana. “Foi muito emocionante estar com os estudantes. Dava para ver a alegria nos olhos deles, e nos nossos também”, disse. O colégio retomou o ensino em formato híbrido desde o dia 13.
 O CAp é a unidade da universidade com mais substitutos (79), mas a professora quer ajudar a diminuir o número, participando de um concurso para ser efetivada no Setor de Artes Cênicas. “Aprendi muito desde a minha chegada ao CAp e, ao longo desse ano, tive a oportunidade de delinear mais fortemente minha identidade docente e o sentido da profissão”.

UMA ÚNICA AULA PRESENCIAL
O contrato de professor temporário tem duração máxima de 24 meses. “Portanto, alguns foram contratados sim, antes do início da pandemia, em março de 2020, e ainda estão em atividade”, informou a pró-reitoria de Graduação. Ao todo, a UFRJ possui 628 substitutos: os 500 contratados durante a pandemia e mais 128, com vínculos anteriores a 16 de março do ano passado.
É o caso do professor Bruno Clarkson Mattos, do Instituto de Biologia, que chegou a participar de apenas uma reunião presencial, antes da suspensão das atividades não emergenciais.
Enquanto aguardava o início do ensino remoto, o docente se voluntariou para trabalhar no combate à pandemia. “Como eu tenho experiência com biologia molecular, trabalhei no Centro de Triagem Diagnóstica (CTD), fazendo a triagem dos profissionais de hospitais públicos que iam à UFRJ para fazer o teste de PCR”, lembra. Em julho, ele se desligou do CTD para se dedicar integralmente à preparação das aulas para o Período Letivo Excepcional (PLE), que começaram no final de agosto.
Bruno já teve 23 turmas, distribuídas entre as disciplinas de Zoologia I e II, e duas eletivas. “Houve turmas com 60 alunos e outras, com menos de 20. Essa variação ocorre muito também em razão de a Zoologia ter uma carga horária considerável de aulas práticas”, explica.
O professor destaca que a experiência tem sido enriquecedora, mas ainda não chega nem perto daquilo que os docentes podem oferecer presencialmente. “Dentro da sala de aula, existe uma percepção muito maior de como os alunos estão recebendo o conteúdo. A realidade no ensino remoto é que quase nenhum aluno liga a câmera, então não sabemos nem se eles realmente estão ali”, completa.
Rodrigo Octávio Cardoso, da Faculdade de Letras, também deu uma única aula presencial na UFRJ, em março do ano passado. Depois disso, só voltou a encontrar os alunos no PLE, em agosto de 2020. Atualmente, ele dá aula para três turmas de Teoria Literária I, matéria obrigatória para todas as habilitações de Letras, e passará a lecionar também Teoria Literária II no próximo período.
“As aulas sem o contato presencial tornam-se muito mais cansativas. É difícil acompanhar o progresso dos alunos e é preciso fazer mais atividades, o que torna o curso mais cansativo para eles e pra mim”, ressalta Rodrigo. “A principal dificuldade talvez seja a de estabelecer debates mais fluidos, o que é uma característica importante dessa disciplina”, diz.
O contrato de Rodrigo será finalizado em março de 2022. Pela lei, não poderá mais trabalhar como substituto pelo período de dois anos. Até lá, o docente alimenta o esperança de muitos desses 628 temporários: o de seguir carreira na maior universidade federal do país. “Seria um sonho conseguir passar um dia num concurso de efetivo na UFRJ, que tem um excelente departamento de Ciência da Literatura”, completa.

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