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WhatsApp Image 2020 12 12 at 14.55.18E mais uma vez, a Justiça culpou a vítima. No dia 14 de junho de 2019, o fisioterapeuta André Luiz da Cunha Serejo atropelou um grupo de professores e estudantes que protestavam contra a Reforma da Previdência. Quatro sofreram lesões corporais. Marinalva Oliveira, 56 anos, docente da Faculdade de Educação da UFRJ, caiu no asfalto, bateu a cabeça e conheceu uma dor que a acompanha até hoje.
Marinalva teve um inchaço na parte posterior da cabeça, foi hospitalizada, fez uma série de exames e ficou sob observação por 24 horas. “Não é só a dor física. É a dor de ser vítima do ódio ”, resume Marinalva, ex-presidente do Andes que acumula três décadas de militância nos movimentos sociais.
Sindicalista e militante dos direitos das pessoas com deficiência, está convencida de que o motorista estava impregnado de raiva quando aproximou o Fox vermelho, placa LSB 1696 contra os manifestantes “As imagens mostram isso. Provam isso”, completa. As imagens, no entanto, não convenceram as autoridades. Nem o laudo pericial, demonstrando as lesões das vítimas, com fotos, vídeos e o depoimento das testemunhas. A promotora e a juíza resumiram o caso – e a pena – a um crime de trânsito. “Nunca vi nada igual”.
Já recorri e espero que o resultado saia nos próximos dias”, lamentou Vitor Terra de Carvalho, advogado de Marinalva e de mais três vítimas do atropelamento.
Se o recurso do advogado for recusado, prevalecerá a sentença da juíza Fernanda Magalhães Freitas Patuzzo. Em 16 linhas, ela resumiu a pena do atropelador a R$ 1.045 em cestas básicas.
WhatsApp Image 2020 12 12 at 14.55.19Assim que ele pagar, o processo será extinto. “A transação penal consistente no pagamento de 1 (um) salário mínimo federal a ser convertido em cestas básicas. Esclareceu-se, ainda, ao autor do fato que a extinção do presente processo fica condicionada ao cumprimento desta. O autor do fato aceitou a proposta.”
Naquela manhã, em Niterói, na esquina da rua Marquês do Paraná com Princesa Isabel, André Luiz da Cunha Serejo aproximou o carro dos manifestantes, e ao contrário dos outros veículos que estavam na área, não desviou de rota.
Acelerou o carro, em direção aos professores e alunos que carregavam faixas e bandeiras. Houve confusão. Andre Serejo não parou. Em seu depoimento na delegacia, André alegou legítima defesa e relatou que “o carro deu um solavanco”, e que ele “não sabia dizer se tirou o pé da embreagem com o carro engrenado ou se tirou o pé do freio”.
Na transcrição de seu depoimento, página 17 do inquérito policial, o fisioterapeuta de 47 anos reconhece que pisou no acelerador. Disse que entrou em pânico e que “precisava sair do local para não ser linchado e acelerou o veículo sem perceber que as pessoas estavam na frente”.
As imagens, os depoimentos do atropelador, das vítimas e das testemunhas formam um conjunto tão farto de provas que a autoridade policial, inspetor de polícia Leandro Caputo Lancelotti, encerra o relatório do inquérito com a seguinte conclusão: “Diante do exposto, e dos elementos coligidos nos autos entendo que o Andre Luiz Cunha Serejo assumiu o risco (Dolo Eventual) de vir a morte das vítimas, as quais foram severamente lesionadas, incidindo, assim nas condutas do Artigo 121 do Código Penal Brasileiro”.
“A questão é que o olhar técnico não prevaleceu”, lamenta o advogado da AdUFRJ. “O Ministério Público contrariou a primeira conclusão policial e, ao invés de denunciar tentativa de homicídio doloso, caracterizou o caso como crime de trânsito, acompanhando o que depois entendeu o delegado, e a juíza concordou e propôs um acordo. Nós não aceitamos o acordo”.
Serejo, claro, aceitou e assinou o documento no dia 6 de novembro. “Pra mim, foi como ser atropelada de novo. Foi a sensação da impunidade e de vivermos num regime de ódio e de mentira”, lamentou a professora da Faculdade de Educação, dona de preciosa qualidade. É respeitada por quem concorda e por quem discorda dela. “Não sei fazer política com ódio”.

DEPOIMENTO

WhatsApp Image 2020 12 12 at 14.55.18 1"Após um ano e meio, o MP configura o ato como crime de trânsito. Estou indignada, estávamos na rua em defesa do direito à vida com dignidade, com Previdência e Educação públicas asseguradas e quase pagamos com nossas vidas. O MP, que deveria defender a população, qualifica o CRIME como acidente de trânsito. Não podemos aceitar que um crime que foi cometido contra quem luta por direitos, quem luta em defesa da vida digna, seja qualificado como acidente leve de trânsito. Isso é legitimar com o aval do Judiciário o crime de ódio  e violência que tem tomado nossa sociedade nos últimos anos. Relembrar aquele dia, 14 de junho, é trazer à tona um enorme mal-estar (morte), porém o mal-estar maior é entender que esse ódio fascista é impulsionado por governos genocidas, como o de Bolsonaro, que incita o ódio e a violência contra qualquer pessoa que manifeste divergência com suas políticas."

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