Lucas Abreu, Kim Queiroz e Liz Mota Almeida
Direito, Medicina e Politécnica já existiam antes da criação da Universidade do Brasil em 1920. Conheça um pouco da história das três unidades que fundaram a UFRJ
»FACULDADE NACIONAL DE MEDICINA«
Quando a UFRJ foi fundada, a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro já passava dos cem anos. Criada, em 1808, por Dom João VI, a instituição já tinha, em 1920, uma história respeitável, com médicos de renome entre os seus ex-alunos e no quadro de professores, uma sede suntuosa e uma marca impressa na Medicina brasileira.
“A Faculdade de Medicina era maior do que a Universidade do Brasil”, diz o professor da UFRJ Antônio Braga, ex-presidente da Sociedade Brasileira de História da Medicina. “A UFRJ ainda não tinha se estruturado enquanto universidade, e já tinha uma Faculdade de Medicina mais que centenária. Isso também refletia o jogo de poder que se construía na universidade”, analisa. Braga ilustra a situação a partir de uma anedota: Pedro Calmon, reitor da UFRJ que por mais tempo ocupou o cargo, não se conformava com a ideia de a reitoria ter uma pequena sede no Centro do Rio, enquanto a faculdade ocupava um palácio.
O palácio em questão é a antiga sede da Faculdade de Medicina, na Praia Vermelha, inaugurado em 1918. O prédio foi utilizado até 1973, quando a Medicina se mudou para o recém-inaugurado campus da Ilha do Fundão. No mesmo ano o edifício foi demolido pela ditadura militar. “A ditadura queria tirar a intelectualidade universitária do Centro do Rio”, revela o professor Antônio Braga. “A demolição do prédio da Praia Vermelha foi um ataque simbólico à UFRJ”, episódio que o professor acredita ter sido talvez a maior agressão que a universidade sofreu em sua história.
Mas se tinha uma sede suntuosa, faltava à Faculdade de Medicina um hospital para as atividades do internato, parte do curso no qual os alunos fazem um estágio prático. “A grande questão da década de 1920 era ter um hospital de clínicas próprio para a prática dos alunos”, contou a professora Gisele Sanglard, coordenadora da Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da COC/Fiocruz. As atividades do internato aconteciam nas Santas Casas, na Maternidade-Escola e onde hoje é Instituto de Atenção à Saúde São Francisco de Assis. Só em 1978 a UFRJ inaugurou o seu hospital universitário, no Fundão.
Nas duas pontas do centenário da UFRJ estão dois reitores oriundos da Faculdade de Medicina: Benjamim Franklin de Ramiz Galvão, o primeiro, e Denise Pires de Carvalho, a atual. Entre eles ainda passaram pela reitoria Fernando Magalhães, Raul Leitão da Cunha e o próprio Clementino Fraga. É emblemático que a Medicina tenha cedido tantos reitores para a universidade. O equilíbrio de forças pode ter mudado nos últimos cem anos, mas não tirou nenhum brilho da Faculdade de Medicina, e sua importância para o Brasil e para a UFRJ.
“A Faculdade de Medicina era maior do que a Universidade do Brasil”, diz o professor da UFRJ Antônio Braga, ex-presidente da Sociedade Brasileira de História da Medicina. “A UFRJ ainda não tinha se estruturado enquanto universidade, e já tinha uma Faculdade de Medicina mais que centenária. Isso também refletia o jogo de poder que se construía na universidade”, analisa. Braga ilustra a situação a partir de uma anedota: Pedro Calmon, reitor da UFRJ que por mais tempo ocupou o cargo, não se conformava com a ideia de a reitoria ter uma pequena sede no Centro do Rio, enquanto a faculdade ocupava um palácio.
O palácio em questão é a antiga sede da Faculdade de Medicina, na Praia Vermelha, inaugurado em 1918. O prédio foi utilizado até 1973, quando a Medicina se mudou para o recém-inaugurado campus da Ilha do Fundão. No mesmo ano o edifício foi demolido pela ditadura militar. “A ditadura queria tirar a intelectualidade universitária do Centro do Rio”, revela o professor Antônio Braga. “A demolição do prédio da Praia Vermelha foi um ataque simbólico à UFRJ”, episódio que o professor acredita ter sido talvez a maior agressão que a universidade sofreu em sua história.
Mas se tinha uma sede suntuosa, faltava à Faculdade de Medicina um hospital para as atividades do internato, parte do curso no qual os alunos fazem um estágio prático. “A grande questão da década de 1920 era ter um hospital de clínicas próprio para a prática dos alunos”, contou a professora Gisele Sanglard, coordenadora da Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da COC/Fiocruz. As atividades do internato aconteciam nas Santas Casas, na Maternidade-Escola e onde hoje é Instituto de Atenção à Saúde São Francisco de Assis. Só em 1978 a UFRJ inaugurou o seu hospital universitário, no Fundão.
Nas duas pontas do centenário da UFRJ estão dois reitores oriundos da Faculdade de Medicina: Benjamim Franklin de Ramiz Galvão, o primeiro, e Denise Pires de Carvalho, a atual. Entre eles ainda passaram pela reitoria Fernando Magalhães, Raul Leitão da Cunha e o próprio Clementino Fraga. É emblemático que a Medicina tenha cedido tantos reitores para a universidade. O equilíbrio de forças pode ter mudado nos últimos cem anos, mas não tirou nenhum brilho da Faculdade de Medicina, e sua importância para o Brasil e para a UFRJ.
»ESCOLA POLYTECHNICA«
A história da Escola Politécnica da UFRJ revela os bastidores da edificação de um país. Com um passado que remete ao período colonial, a unidade que hoje abrange todas as graduações de engenharia da universidade deu origem ao desenvolvimento tecnológico brasileiro.
“A Escola foi responsável pela formação de gerações e mais gerações de engenheiros de renome”, afirmou o professor Helói Moreira, superintendente do Museu da Poli. “O concreto armado surgiu no Brasil por um ex-aluno da Escola, Emílio Baumgart. As estradas de ferro, com Paulo de Frontin. Antônio Alves de Noronha, nas rodovias. Era a construção de um país”, pontuou.
Uma construção que começou em 1792, com a criação da Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho. Sucedida, em 1810, pela Academia Real Militar. A instituição que um dia viria se tornar a Poli iniciou o ensino de engenharia no Brasil, e é considerada a sétima escola de Engenharia mais antiga do mundo, e a primeira das Américas.
Situada inicialmente na Casa do Trem, que hoje integra o Museu Histórico Nacional, a Academia Real Militar teve sua sede transferida em 1812 para o Largo de São Francisco de Paula, onde se manteve até 1966.
Atualmente ocupado pelos Institutos de Filosofia e Ciências Sociais e de História da UFRJ, o prédio no Largo de São Francisco de Paula foi o primeiro construído no Brasil para abrigar uma escola superior. Considerado o “berço da Engenharia Brasileira”, lá estava localizada a Escola Politécnica no ano de 1920, quando nasceu a UFRJ.
Inicialmente subordinada ao Ministério do Exército, a instituição chegou a ser denominada “Escola Militar” e, posteriormente, “Escola Central”. “Somente em 1874 a Escola passa a pertencer ao Ministério do Império e recebe essa denominação de Politécnica”, contou Helói. Desse momento em diante, a Escola passou a atender apenas alunos civis. “Em 1920, já não havia nenhuma conotação militar”, apontou.
A Poli carrega em seu histórico o pioneirismo. “Já na década de 20, havia a pós-graduação, criada ainda antes, na época militar”, destacou Helói. “Evidentemente que as pesquisas não eram corriqueiras, pois não havia agências de fomento, como existem hoje”, completou.
Hoje, a Escola Politécnica da UFRJ forma engenheiros em 12 habilitações diferentes, mas em 1920 já havia um grande leque de opções. “Havia um curso de Artes e Manufatura, que era voltado principalmente para a indústria têxtil. Havia também as Engenharias Naval, Ferroviária, Civil, Mecânica e Metalúrgica”, disse Helói. “Mas os alunos faziam mesmo era o curso de Engenharia Civil. Naquela época, podia se fazer dois cursos simultaneamente.”
“A Escola foi responsável pela formação de gerações e mais gerações de engenheiros de renome”, afirmou o professor Helói Moreira, superintendente do Museu da Poli. “O concreto armado surgiu no Brasil por um ex-aluno da Escola, Emílio Baumgart. As estradas de ferro, com Paulo de Frontin. Antônio Alves de Noronha, nas rodovias. Era a construção de um país”, pontuou.
Uma construção que começou em 1792, com a criação da Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho. Sucedida, em 1810, pela Academia Real Militar. A instituição que um dia viria se tornar a Poli iniciou o ensino de engenharia no Brasil, e é considerada a sétima escola de Engenharia mais antiga do mundo, e a primeira das Américas.
Situada inicialmente na Casa do Trem, que hoje integra o Museu Histórico Nacional, a Academia Real Militar teve sua sede transferida em 1812 para o Largo de São Francisco de Paula, onde se manteve até 1966.
Atualmente ocupado pelos Institutos de Filosofia e Ciências Sociais e de História da UFRJ, o prédio no Largo de São Francisco de Paula foi o primeiro construído no Brasil para abrigar uma escola superior. Considerado o “berço da Engenharia Brasileira”, lá estava localizada a Escola Politécnica no ano de 1920, quando nasceu a UFRJ.
Inicialmente subordinada ao Ministério do Exército, a instituição chegou a ser denominada “Escola Militar” e, posteriormente, “Escola Central”. “Somente em 1874 a Escola passa a pertencer ao Ministério do Império e recebe essa denominação de Politécnica”, contou Helói. Desse momento em diante, a Escola passou a atender apenas alunos civis. “Em 1920, já não havia nenhuma conotação militar”, apontou.
A Poli carrega em seu histórico o pioneirismo. “Já na década de 20, havia a pós-graduação, criada ainda antes, na época militar”, destacou Helói. “Evidentemente que as pesquisas não eram corriqueiras, pois não havia agências de fomento, como existem hoje”, completou.
Hoje, a Escola Politécnica da UFRJ forma engenheiros em 12 habilitações diferentes, mas em 1920 já havia um grande leque de opções. “Havia um curso de Artes e Manufatura, que era voltado principalmente para a indústria têxtil. Havia também as Engenharias Naval, Ferroviária, Civil, Mecânica e Metalúrgica”, disse Helói. “Mas os alunos faziam mesmo era o curso de Engenharia Civil. Naquela época, podia se fazer dois cursos simultaneamente.”
»FACULDADE NACIONAL DE DIREITO«
A fundação da Faculdade Nacional de Direito resulta de uma fusão de escolas e de uma reação libertária para o ensino superior no Rio de Janeiro, explica o ex-aluno Marcos Tavolari, diretor de assuntos históricos da Associação dos Antigos Alunos de Direito da UFRJ (ALUMNI FND).
Antes do período republicano, “as classes conservadoras preferiam que os filhos continuassem estudando em Coimbra”, explica Tavolari, em referência à universidade portuguesa. O objetivo era evitar a disseminação de idéias liberais, especialmente na capital. Em São Paulo e Pernambuco, faculdades haviam sido criadas com apoio das oligarquias locais. Iniciativas semelhantes foram sufocadas no Rio.
Em 1882, Fernando Mendes de Almeida, um jovem advogado de perfil mais liberal, reúne alguns intelectuais da cidade para criar uma faculdade, no dia 18 de abril. “Rua do Carmo 74 é o endereço da primeira ata de Congregação da FND. Mas o governo imperial não autorizou o funcionamento da escola”, conta o diretor da associação de ex-alunos. Só em 1891, dois anos após a proclamação da República, a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro ganhou permissão para abrir o curso.
“Ao mesmo tempo, é criada outra faculdade livre na capital, a Faculdade Livre de Direito, da família França Carvalho”, relembra. Essa outra escola mudou de lugar algumas vezes: funcionou no Mosteiro de São Bento, no Liceu de Artes e Ofícios, na Escola Normal do Rio de Janeiro até chegar ao prédio perto do Campo de Santana, na área do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro.
As duas faculdades coexistiram, com alguma rivalidade, de 1891 a 1920, explica Tavolari. Entretanto, a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais se desenvolveu mais. Em 1912, esta Faculdade comprou um prédio na Rua do Catete, 243, onde a FND funcionou até 1937. O mesmo imóvel se tornaria berço de outra importante instituição do Rio, na década de 40. “Alguns ex-alunos, também professores, resolveram criar uma faculdade ali, que seria a Faculdade de Direito do Catete, e deu origem à UERJ”, afirma. “Aquele prédio, matriz de fundação de duas universidades, hoje está abandonado em ruínas”, lamenta.
Muitos professores davam aulas nas duas instituições. E, quando o governo republicano decidiu criar a universidade, em 1920, ambas foram estatizadas e fundidas um pouco antes, em maio. “Entre criar uma do zero ou federalizar escolas particulares, que já recebiam tremendos incentivos estatais, era natural que se buscasse uma fusão dessas escolas”, explica. A integração, para o ex-aluno, não foi bem feita. “Era a costura de escolas isoladas, que continuaram com a mentalidade de serem assim. Continuaram funcionando de maneira isolada, e ganharam o selo de universidade”.
Antes do período republicano, “as classes conservadoras preferiam que os filhos continuassem estudando em Coimbra”, explica Tavolari, em referência à universidade portuguesa. O objetivo era evitar a disseminação de idéias liberais, especialmente na capital. Em São Paulo e Pernambuco, faculdades haviam sido criadas com apoio das oligarquias locais. Iniciativas semelhantes foram sufocadas no Rio.
Em 1882, Fernando Mendes de Almeida, um jovem advogado de perfil mais liberal, reúne alguns intelectuais da cidade para criar uma faculdade, no dia 18 de abril. “Rua do Carmo 74 é o endereço da primeira ata de Congregação da FND. Mas o governo imperial não autorizou o funcionamento da escola”, conta o diretor da associação de ex-alunos. Só em 1891, dois anos após a proclamação da República, a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro ganhou permissão para abrir o curso.
“Ao mesmo tempo, é criada outra faculdade livre na capital, a Faculdade Livre de Direito, da família França Carvalho”, relembra. Essa outra escola mudou de lugar algumas vezes: funcionou no Mosteiro de São Bento, no Liceu de Artes e Ofícios, na Escola Normal do Rio de Janeiro até chegar ao prédio perto do Campo de Santana, na área do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro.
As duas faculdades coexistiram, com alguma rivalidade, de 1891 a 1920, explica Tavolari. Entretanto, a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais se desenvolveu mais. Em 1912, esta Faculdade comprou um prédio na Rua do Catete, 243, onde a FND funcionou até 1937. O mesmo imóvel se tornaria berço de outra importante instituição do Rio, na década de 40. “Alguns ex-alunos, também professores, resolveram criar uma faculdade ali, que seria a Faculdade de Direito do Catete, e deu origem à UERJ”, afirma. “Aquele prédio, matriz de fundação de duas universidades, hoje está abandonado em ruínas”, lamenta.
Muitos professores davam aulas nas duas instituições. E, quando o governo republicano decidiu criar a universidade, em 1920, ambas foram estatizadas e fundidas um pouco antes, em maio. “Entre criar uma do zero ou federalizar escolas particulares, que já recebiam tremendos incentivos estatais, era natural que se buscasse uma fusão dessas escolas”, explica. A integração, para o ex-aluno, não foi bem feita. “Era a costura de escolas isoladas, que continuaram com a mentalidade de serem assim. Continuaram funcionando de maneira isolada, e ganharam o selo de universidade”.