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Uma chamada do CNPq para concessão de bolsas, divulgada na semana passada, preocupa a comunidade científica. O documento muda regras anteriores e pode representar uma brutal diminuição do número de benefícios aplicados em pesquisa. “Da maneira como o edital está, vai ser uma briga de todo mundo por muito pouco”, disse a pró-reitora de Pós-graduação da UFRJ, professora Denise Freire
Serão disponibilizados R$ 70 milhões para o financiamento das bolsas com vigência até o segundo semestre deste ano. O problema é que o CNPq não discriminou quantas seriam. O edital, com inscrições abertas até 27 de agosto, apresenta salvaguardas para garantir que os programas mantenham um quantitativo mínimo. Já a comunidade científica desconfia que a suposta proteção pode esconder uma armadilha para redução das bolsas.
Pelo texto, programas com até 10 bolsas mantêm 80% delas; para aqueles com 11 a 20 bolsas, 70% e para aqueles com mais de 20, 60%. Caso a aplicação do percentual de manutenção chegue a um número fracionário, o resultado será arredondado para o número inteiro imediatamente inferior. “Se o programa de pós-graduação tem apenas uma bolsa, isso significa que ele pode ficar sem nenhuma”, explica Rogério Rosenfeld, coordenador de um grupo de trabalho da SBPC que trata do CNPq.
A agência também determina, na chamada, que as propostas de projetos devem ser apresentadas pelo programa de pós-graduação — e não mais pelo pesquisador, como era antes. A mudança torna o coordenador do curso responsável pelos projetos. O documento ainda inclui como item de avaliação o alinhamento às prioridades do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, o que deixa para trás as ciências humanas.
O edital fez a sociedade científica reagir. A SBPC escreveu uma carta em que aponta os pontos problemáticos da chamada e faz sugestões para não haver prejuízos aos pesquisadores e programas de pós-graduação. Entre elas, devolver ao pesquisador a possibilidade de fazer a inscrição e tirar do coordenador do programa a responsabilidade pelo projeto. Também recomenda que a chamada seja reformulada para o primeiro semestre de 2021 e que seja mantido o mecanismo de distribuição de bolsas atual para o segundo semestre de 2020. A entidade defende no mínimo três bolsas por programa e pede regras mais claras para os programas novos, que ainda não receberam bolsas. “Propusemos a suspensão desta chamada e uma discussão mais ampla com a sociedade científica da mudança de paradigma que o CNPq quer fazer”, afirmou Rogério.
A Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa da UFRJ prepara um documento para enviar ao CNPq os questionamentos sobre o edital. Um levantamento feito pela PR-2 concluiu que projetos de pesquisa em curso na UFRJ recebem um total de aproximadamente R$ 35 milhões em bolsas de mestrado e doutorado do CNPq. Se o edital prevê uma alocação de R$ 70 milhões, haverá um enorme impacto para a pesquisa não só da UFRJ, mas de todo o país. Assim como a SBPC, a PR-2 critica a sobrecarga de trabalho sobre os coordenadores e a falta de clareza quanto ao fomento de novos programas de pesquisa.
“Estamos em contato com vários coordenadores e pró-reitores pelo Brasil”, contou a pró-reitora Denise Freire. “Vamos abrir um diálogo com o CNPq com essas demandas. Precisamos que o CNPq se comprometa com algumas coisas, como garantir que as bolsas que estão sendo recolhidas sejam repostas pelo edital”, disse.
Para a dirigente, a responsabilidade do coordenador sobre a bolsa gera uma insegurança para o docente. “Se o aluno não defender seu projeto, o professor terá que devolver a bolsa para o CNPq?”, questionou. Denise também criticou a priorização de áreas de pesquisa. “Não pode existir área prioritária em ciência e tecnologia. Mesmo assim, o governo insiste nessa política.Nós discordamos dela”, afirmou.
A Associação de Pós-Graduandos da UFRJ endossa as críticas da pró-reitoria. “Ao escolher áreas prioritárias, o edital do CNPq reforça assimetrias na pesquisa. Não existe escala de importância de conhecimento”, disse Kemily Toledo, coordenadora da APG, que classificou o edital como “confuso” e “tecnicamente muito ruim”.
Ela apontou ainda mais um problema. “O proponente do projeto é o coordenador do programa. Caso ele esteja inadimplente com a Receita, CNPq ou tenha qualquer outra restrição do tipo, a proposta será indeferida. Todos os pedidos podem ser indeferidos por causa da restrição de um coordenador, o que prejudicaria demais um programa de pós-graduação”, observou.

CAPES
 A relação da comunidade acadêmica também segue tensa com outra agência de fomento, a Capes. No começo deste mês, mais de cem coordenadores das Áreas de Avaliação enviaram uma carta à direção do órgão criticando a “excessiva centralização de decisões” e pedindo mais democracia na gestão. Um dos pontos criticados foi a portaria 34, que mudou o critério de distribuição de bolsas, e pode ampliar a desigualdade entre programas de pesquisa.
A comunidade científica também está lutando para que a agência reveja os critérios para extensão das bolsas de pesquisa durante o período da pandemia. A Capes concordou com a prorrogação por três meses, mas sem sobreposição de cotas. Ou seja, pesquisadores que entrarem nos programas de pesquisa só vão receber bolsas quando acabar a atual extensão. A APG-UFRJ, em articulação com outras associações, está promovendo uma campanha em defesa dos pesquisadores, solicitando que as agências de fomento revisem suas políticas de prorrogação de bolsas durante o período da pandemia.

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