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Elisa Monteiro
Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.WEB menoDAMARESFoto: José Cruz - Agência Brasil

 

“Não tem a menor chance de dar certo. Fui pai novo e não foi planejado. Nessa idade, a gente mal escuta pai e mãe. Quem dirá escutar um governo que manda a gente contrariar nossos hormônios”, avalia Marvyn Castro, 23 anos, pai desde os 17.

Desde o fim do ano passado, o governo Bolsonaro tenta combater a gravidez na adolescência com uma guerra contra o sexo. A principal arma usada pela ministra da pasta dos Direitos Humanos, pastora Damares, é uma campanha de marketing pela abstinência sexual. O projeto é severamente criticado pelos estudiosos do tema.

Para a professora Elaine Brandão, especialista em juventude e saúde reprodutiva do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC- UFRJ), “responsabilizar adolescentes pela gravidez, incitando-os a se abster de sexo”, sem discutir seriamente as relações e violências de gênero no país, “chega a ser leviano”.

“Levamos anos acumulando experiências na formulação de programas, estratégias, material didático, treinamento de pessoal para abordagem aos adolescentes e jovens sobre saúde sexual e reprodutiva”, critica. “E, de repente, ignoramos toda essa expertise científica e técnica em prol de iniciativas amadoras, oportunistas e sabidamente não recomendadas pelas sociedades científicas”, completa.

De acordo com a pesquisadora do IESC, a fecundidade entre jovens de 15 a 19 anos vem decrescendo ao longo das últimas décadas no Brasil. Mas não tanto quanto entre os grupos etários subsequentes. A taxa ainda é alta. E, depende de fatores como o nível de renda e escolaridade das famílias e regiões do país.

“No último Censo de 2010, a taxa média de fecundidade ficou em 1,9 filho por mulher, desigualmente distribuída por grupos etários e regiões do país. No grupo de 15 a 19 anos, estamos com uma taxa de 69,9 nascimentos por mil mulheres, o que nos preocupa”, diz Eliane Brandão. Segundo o documento UNFPA – o organismo da ONU responsável por questões populacionais – a taxa mundial é de 48,9 por mil. Nos países em desenvolvimento, é de 52,7 por mil.

Diálogo mais eficaz
“Acho estranho a escolha pela abstinência. No mundo de hoje, não faz sentido”, opina Julia Almeida, 17 anos. “A minha geração sabe muito mais sobre como se preservar, doenças e essas coisas. Há informações em todos os lugares. Mas acho que a escola ainda é a fonte mais confiável”, afirma a jovem. “A gente conversa muito com amigos e nos grupos. Também tem a ginecologista”.

Para Simone Peres, pesquisadora do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC), a proposta de Damares está desconectada da geração digital. “Demonstra um claro distanciamento dos estudos empíricos realizados com adolescentes”, afirma a docente. “Os jovens contemporâneos são o tempo todo interpelados pelo mundo virtual. Eles têm à sua disposição inúmeras fontes de informação e orientação que não passam necessariamente pela mediação das instituições”.

Outra fragilidade da abordagem está na responsabilização individual. “São práticas ineficientes exatamente porque demonstram ser artificiais, ingênuas e inócuas”, aponta.

O avesso do direito
Na visão da docente do Instituto de Psicologia da UFRJ, o que está em jogo é a oferta ou negação da cidadania aos jovens. “Na prática, a proposta da abstinência como estratégia de prevenção da gravidez na adolescência não reconhece os direitos sexuais e reprodutivos, que dizem respeito à possibilidade de homens e mulheres de diferentes inserções sociais tomarem decisões sobre sua fertilidade e saúde reprodutiva”, resume. Ela lembra que a melhor prevenção é aquela que ocorre “através do acesso às informações e aos recursos necessários para implementar suas decisões e cuidados com o corpo”.

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