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WhatsApp Image 2024 06 21 at 20.45.10 7Arte sobre foto de Kelvin MeloKelvin Melo e Renan Fernandes

Não precisa nem entrar no prédio do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais e do Instituto de História para começar a entender as péssimas condições de trabalho e estudo enfrentadas por professores, técnicos e estudantes. Plantas crescem nas paredes e tubulações de escoamento da água. As paredes, desbotadas, estão pichadas. Muitas vidraças, quebradas. No esvaziado Centro do Rio, o entorno é inseguro. Principalmente, na saída dos cursos noturnos.
Por dentro do imóvel de quatro pavimentos e 14 mil m² de área construída, a sensação de insegurança é alimentada pelo risco de incêndio. A rede elétrica, do século passado, demanda uma ampla reforma. Em caso de sinistro, quem frequenta os três pavimentos superiores só tem dois caminhos para alcançar o térreo: uma elegante escadaria toda feita em madeira (!) e um apertado acesso de cimento, nos fundos do prédio.
O sistema elétrico antigo, unido à falta de recursos, repercute na falta de climatização da maioria das salas. A reportagem constatou muitos aparelhos de ar quebrados ou pendentes de manutenção e instalação adequada. E uma profusão de ventiladores velhos, insuficientes para refrescar as amplas salas dos institutos, com um pé direito altíssimo.
Nas salas, além do calor em dias muito quentes, docentes e alunos sofrem com o mobiliário antigo. A reportagem viu muitos quadros a giz e poucos quadros brancos de qualidade. Os docentes também encontram dificuldade para conseguir equipamentos de projeção.
Já a falta de água para beber nos dias de calor se tornou um problema recente do prédio. Um acidente com a caixa de gordura do restaurante universitário contaminou os bebedouros do prédio, em maio, e forçou a suspensão das aulas por vários dias. Nesta semana, desta vez por um problema de fornecimento da companhia no centro da cidade, a comunidade do IFCS-IH ficou novamente sem água na quinta-feira (20).
Estes e outros problemas que compõem o drama da comunidade do prédio são abordados nesta edição especial do Jornal da AdUFRJ.

POSSIBILIDADE DE INCÊNDIO COMO O DO MUSEU NACIONAL

WhatsApp Image 2024 06 21 at 20.45.10 2Fotos: Fernando SouzaO receio que o IFCS-IH sofra um incêndio das mesmas proporções do Museu Nacional é constante. A rede elétrica defasada é o principal foco de preocupação de professores, técnicos e alunos que frequentam o prédio histórico do Largo de São Francisco.
“Já tivemos três princípios de incêndio em dois anos”, afirmou o estudante Washington Yuri, do Centro Acadêmico de Ciências Sociais. Em um deles, no ano passado, começou a sair faísca de um disjuntor antigo do quarto andar. “Alguém, por pura sorte, viu e desligou o disjuntor”, disse.
No início deste semestre letivo, uma professora substituta do Instituto de História tomou um tremendo susto ao tentar ligar um dos ventiladores. O aparelho deu curto-circuito e a docente levou um choque muito forte. “Ela ficou muito assustada, mas continuou a aula mesmo assim, com o braço dormente ali na hora”, afirmou o professor João Paulo Rodrigues, do IH.
Se algum destes “sustos” fugir ao controle e o prédio pegar fogo nos pavimentos superiores, as pessoas terão apenas duas opções para alcançar a saída: uma elegante escadaria toda feita em madeira e um apertado acesso nos fundos.
O professor Antonio Saturnino Braga, do departamento de Filosofia, revelou preocupação com as rotas de fuga do edifício. “É um medo com que convivemos aqui. Um tópico que deveria ser atacado prioritariamente. São feitos treinamentos e manutenção dos extintores, mas isso é paliativo. A questão das rotas de escape é muito grave”, teme.

“SAUNAS” DE AULA

WhatsApp Image 2024 06 21 at 20.45.10 3Não é fácil dar aulas em dias de calor. No verão, nem se fala. A rede elétrica antiga, somada à falta de recursos da universidade, impacta também a climatização do IFCS-IH. Não há aparelhos de ar-condicionado na maioria das salas. Parte dos que existem é apenas decorativa: os aparelhos estão completamente quebrados ou precisam de manutenção para voltar a operar.
A solução encontrada é a instalação de ventiladores. Muitos, mas insuficientes para refrescar as amplas salas do prédio histórico, com um pé direito altíssimo. Além de barulhentos, concorrendo com a voz dos professores.
“Os aparelhos de ar-condicionado que existem não funcionam e os ventiladores são velhos e ineficazes. Quando ligados, a gente se pergunta se é pior o barulho ou o calor”, lamentou o professor Saturnino Braga.
A professora Adriany Ferreira de Mendonça, da Filosofia, conconcorda. “Nos dias de calor, a gente passa mal. É desumano. Ainda temos medo de ligar os ventiladores, porque podem cair do teto”, disse.

INFILTRAÇÕES SÃO CONSTANTES

WhatsApp Image 2024 06 21 at 20.45.10 5As infiltrações estão por toda parte. Ao lado do Salão Nobre, no segundo pavimento, existe uma cratera no teto do banheiro feminino. Na biblioteca, perto de uma estante do setor de periódicos, uma das paredes está bastante descascada pela ação da umidade. As obras são protegidas por um plástico improvisado.
Diretor adjunto de graduação do Instituto de História, o professor João Paulo Rodrigues já teve a sala afetada por vazamentos duas vezes, em menos de seis meses: em novembro e abril. No episódio mais recente, detritos do teto ficaram espalhados pela mesa e pelo chão.
“O de novembro inundou a sala toda e vazou água para o corredor”, disse. “Os armários, com documentos, ficaram molhados. Tivemos que abrir para secar. Mas os armários estão deteriorados. E perdemos o filtro de água, que pifou”. O piso perdeu o sinteco e o cheiro de mofo só desapareceu por volta de maio, segundo o docente.
O mofo inviabiliza o uso de algumas salas do edifício. É o caso da sala 107, no térreo, que não tem janelas de ventilação para a rua. O professor Pedro Vitor, da Faculdade de Educação, que trabalha no prédio ministrando o curso de Didática especial em História, foi alocado na 107 no último período e precisou buscar outro local para dar aula. “É impraticável. A sala parece um calabouço. Tem um cheiro de mofo muito forte, ninguém consegue ficar mais de 15 minutos ali. Eu e os alunos começamos a espirrar e tive que interromper a aula para procurar outra sala”, contou.
A professora Isabele Mello, do IH, relacionou a falta de infraestrutura no prédio com um ambiente de desestímulo à continuidade nos cursos. “Por vezes, me sinto constrangida em sala de aula. Como promover a continuidade na carreira acadêmica, na pós-graduação, quando o estudante observa as condições em que ele está assistindo aula e que seu professor está trabalhando?”, questionou.

RISCO À SAÚDE NA BIBLIOTECA

WhatsApp Image 2024 06 21 at 20.45.12Com quatro pavimentos e um acervo de 135 mil documentos, a biblioteca Marina São Paulo de Vasconcellos é um dos destaques do prédio. Mas a beleza das paredes de pedra, originais da construção do século XIX, esconde um risco à saúde de quem estuda e trabalha no local.
“As paredes estão se desfazendo, soltando um pó que é respirado pelos frequentadores”, informa Sulamita Nicolau de Miranda, subchefe da biblioteca. “As pedras guardam o aspecto histórico dos anos 1800, mas estamos em 2024. É preciso um trabalho de recuperação, uma análise técnica de como estão essas paredes”, afirma.
A demanda por mais tomadas é outro problema do espaço. “Hoje, os alunos estudam com tablets e notebooks. Precisamos de uma rede elétrica estável, mas não temos nem tomadas suficientes para oferecer. E as que temos são do padrão antigo, de dois pinos”, conta Sulamita.
A falta de climatização também desafia quem trabalha e estuda no local. O aparelho de ar está quebrado. A reportagem do Jornal da AdUFRJ constatou o clima desconfortável na biblioteca na terça-feira, 18, dia em que a cidade registrou máxima de 34°C.
Mas as temperaturas altas também são prejudiciais ao acervo. “É uma questão de preservação do patrimônio da universidade. Os livros expostos ao calor e às janelas abertas se deterioram com o tempo”, aponta a bibliotecária.
O padrão determinado pelo manual de conservação de acervos bibliográficos da universidade estipula a temperatura ideal nas bibliotecas entre 19°C e 23°C e a umidade relativa do ar entre 50% e 60%.

ÁGUA CONTAMINADA

WhatsApp Image 2024 06 21 at 20.45.12 1O episódio recente da crise de infraestrutura foi a contaminação da água dos bebedouros. O problema foi causado por um vazamento da caixa de gordura do restaurante universitário, em maio. Nas redes sociais, estudantes relataram mal estar, vômito, dor de cabeça e de barriga. As aulas foram suspensas até a normalização do serviço.
O bicentenário prédio do Largo de São Francisco conta com quatro bebedouros (um por andar) para atender a uma “população” de 157 professores, 93 técnicos e mais de dois mil alunos com matrícula ativa. E isso contando apenas as graduações do IFCS e do IH.
Estudantes de Psicologia, Enfermagem e Odontologia também recebem aulas de Ciências Sociais ou Filosofia no local. Além disso, o bandejão localizado no térreo — que serve 800 refeições no almoço e 400 no jantar — serve o público das demais unidades da UFRJ no Centro.
Bem antes deste incidente, Adriany Ferreira, docente da Filosofia, já havia passado por uma experiência desagradável com os bebedouros. “Não tenho mais coragem de beber a água do IFCS. Tive problemas de saúde ano passado e nunca mais bebi”, revelou.
A professora destacou a qualidade da água como uma condição básica para a permanência de estudantes nos cursos. “A universidade tem que ser cada vez mais aberta e mais inclusiva. Agora, sem água potável, não tem restaurante universitário. O estudante, que por vezes vem de longe, fica sem água e sem comida”, concluiu.
O IFCS-IH comporta oito banheiros — um deles interditado —, que não estão em boas condições. Um aviso no sanitário feminino do segundo andar dá a dimensão de como o problema é antigo. “Em 2016, o IH gastou mais de R$ 6 mil com a manutenção dos banheiros. Em menos de seis meses, seis tampas de privada, um espelho e dois ganchos de bolsa foram quebrados”, diz um trecho.

MOBILIÁRIO ANTIGO E PRECÁRIO

WhatsApp Image 2024 06 21 at 20.45.12 2Kelvin MeloNo Salão Nobre, no segundo pavimento, um bonito relógio de parede marca sempre a mesma hora: cinco para as duas. O tempo parece ter parado também quando se trata de mobiliário e equipamentos básicos para as aulas no prédio. Em várias salas, os professores precisam trabalhar com o tradicional quadro negro a giz.
Há quadros brancos que só podem ser apagados, entre uma disciplina e outra, pelos funcionários terceirizados, usando produtos de limpeza mais fortes. “Comecei a trabalhar no ensino básico em 2016 e nunca dei aula em uma escola com quadro negro. Como o IFCS ainda tem salas sem quadro branco?”, questiona o professor Pedro Vitor dos Santos, da Faculdade de Educação.
Pedro foi aluno do IFCS, mas ainda é surpreendido com a falta de estrutura do edifício. “O IFCS funciona por meio de improviso e gambiarras. Os projetores instalados nas salas não funcionam. O departamento de Ensino de História tem um cedido pela Faculdade de Educação. Somos sete professores e a gente tem que fazer rodízio. Tenho uma aula sobre o uso da imagem na sala de aula e tenho que combinar com meus colegas para poder usar o projetor”, lamentou.

INSEGURANÇA NA SAÍDA DO NOTURNO

Três cursos noturnos — bacharelado e licenciatura em História e a licenciatura em Ciências Sociais — funcionam no Largo de São Francisco, com disciplinas até 21h40 ou 22h. Mas não é incomum que os professores liberem as turmas antes por conta da insegurança no centro do Rio.
A professora Isabele Mello, do Instituto de História, expôs o medo de alunos com a violência no entorno do prédio. “A questão da insegurança afeta principalmente os alunos do noturno. Vários estudantes já relataram assaltos no trajeto até os pontos de ônibus ou o metrô”, revelou.
Uma alternativa para reduzir os riscos seria a abertura do portão dos fundos do prédio, que dá acesso ao Largo Alexandre Herculano, próximo à Praça Tiradentes. “A liberação do portão facilitaria a vida dos estudantes. Mas por limitação de segurança e por necessidade de reformas não podemos usar a saída”, acrescentou.

 

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