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WhatsApp Image 2023 06 15 at 18.50.06 2CNEN Odair durante reunião da Comissão de Minas e Energia, em março de 2011 - Foto: Leonardo Prado/Câmara dos DeputadosProfessor devotado à universidade pública, profissional rigoroso, homem culto e elegante. Essas são as características que colegas, ex-alunos e familiares vão guardar do professor titular Odair Dias Gonçalves, falecido no último dia 11. Ex-presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e fundador do curso de Física Médica, o mestre deixa uma legião de admiradores.
“Sinto que perdi um membro da minha família”, lamenta a vice-diretora do Instituto de Física, professora Simone Cardoso. “O Odair era como um pai. Eu o considerava como meu pai acadêmico, o pai da profissão. Eu o tinha como referência”.
Simone fala com propriedade por tê-lo conhecido logo no primeiro dia da graduação, há 30 anos. E de ter contado com sua orientação até o doutorado. “Os alunos que não trabalhavam com ele tinham um medo inicial, porque era uma pessoa muito séria e exigente. Mas, depois de transposta essa barreira, você pode ver como era a relação pelas postagens de homenagem nas redes sociais”.
A vice-diretora cita uma publicação do Centro Acadêmico de Física. “Odair, coordenador da Física Médica, era aquele professor que a maioria tinha um certo medo de entrar em contato. Mas depois de conhecê-lo de perto, mudávamos totalmente de opinião”, escreveram os estudantes, no dia seguinte ao falecimento. “Por diversas vezes, ele demonstrou admiração e respeito pelo CAFís e por tudo que um centro acadêmico representa. Sempre nos foi muito solícito, conselheiro e amigo”.WhatsApp Image 2023 06 15 at 18.42.39CONGRESSO de Física Médica em Porto Alegre, em 2018, rodeado de alunos - acervo pessoal/Felipe Marques

PIONEIRISMO
O curso de Física Médica, criado em 2000 — um dos primeiros do país — era um dos “xodós” do docente. “Ele se dedicou muito à criação do curso de Física Médica. Preparou tudo para a abertura e até os últimos dias, mesmo doente, quis se manter como coordenador do curso”, conta Simone. O bacharelado forma físicos capazes de atuar com especialistas da área médica, fornecendo os requisitos mínimos para o exercício da profissão na radiologia, radioterapia e medicina nuclear.
A professora titular Ginette Jalbert também elogia o pioneirismo de Odair. “Pude observar o prestígio que ele tinha entre seus colegas de departamento e os alunos, suas atividades acadêmicas e políticas. Principalmente a “coragem” e a persistência de criar a especialidade em física aplicada (Física Médica) num instituto com forte tendência à Física Teórica”, diz. “Essa criação foi um salto enorme do instituto, abrindo novas possibilidades não só em Física Médica como em outras áreas aplicadas”.
Ex-alunos, como Felipe Marques, são só agradecimentos. “Ele foi muito importante nas minhas decisões acadêmicas e profissionais”, diz o jovem, que começou a graduação na Engenharia, mas, cativado, decidiu migrar para a Física Médica. “Ele desafiava a gente. Conseguia fazer a gente se interessar de uma forma que não encontrei em nenhum outro professor da UFRJ”.
Da convivência, Felipe destaca ainda o lado culto do antigo mestre. “Era um leitor ávido. Tinha um biblioteca em casa da qual tinha muito orgulho”. E revela. “Uma vez, me disse que tinha vontade de escrever um livro. Perguntei sobre o quê, já imaginando que seria um livro didático e ele me surpreendeu dizendo que seria um romance policial”.
WhatsApp Image 2023 06 15 at 18.42.16FAMÍLIA UFRJ Karín; Thiago; Hebe e Odair, em 2006, na Califórnia - acervo pessoal/Thiago SignoriniA generosidade com os alunos ainda é registrada pela professora Regina Cely, da Uerj. “Odair foi uma pessoa importante porque me aceitou orientar no doutorado nos anos 90. Ele me deu oportunidade de fazer a ligação entre a engenharia nuclear e a física, o que era uma coisa muito nova”.
Foi com Odair e outros colegas que Regina publicou seu primeiro artigo científico em 1998. “Escrevi e levei para ele ler (a primeira versão). Achei que estava arrasando”, brinca. Depois ele retornou. “Olha, você escreve bem, mas cientificamente, você vai aprender. Foi me dando as dicas. Escrever em inglês “cientifico” é mais técnico, mais direto. E, a partir desse artigo, muitos outros vieram”, relembra.

O DANÇARINO
Já a professora Ana Maria Senra conheceu Odair no final de 1978, no mestrado. “O IF estava crescendo. Havia muitos professores auxiliares de ensino e colaboradores entre os alunos da pós-graduação”. Era um tempo de ebulição política. No ano seguinte, surgiu a AdUFRJ. “Na época, o movimento dos docentes universitários estava nascendo e participamos juntos das assembleias de professores, das passeatas, das greves e das suas atividades”.
Da amizade de mais de 40 anos, a docente conta uma curiosidade que talvez poucos imaginassem do professor sempre muito sério. “O Odair gostava muito de dançar. Costumávamos fazer festas para dançar e não perdíamos um Docente Dançante, os famosos bailes da AdUFRJ”, revela. “Ele tinha uma expressão corporal muito forte, impossível não percebê-lo em um ambiente. Inclusive, foi professor de Expressão Corporal na Escola de Dança da Angel Vianna”.
O filho, Thiago Signorini Gonçalves, confirma. “Ele tinha muitas facetas que as pessoas não conheciam. Meus pais nasceram no mesmo ano (1952) e quando fizeram 50, eles decidiram fazer a ‘festa dos 100 anos’. Acho que muita gente na festa se surpreendeu porque meu pai tinha essa experiência toda de dança. E era bonito de ver os dois dançando”.WhatsApp Image 2023 06 15 at 18.42.16 1EM VIENA: professor visitou muito a cidade, sede da Agência Atômica Internacional - acervo pessoal/Thiago Signorini

FAMÍLIA UFRJ
Thiago, que é professor do Observatório do Valongo, atribui muito da escolha profissional aos pais. A mãe, Hebe Signorini, que faleceu ano passado, também era docente do Instituto de Psicologia. “Eu consegui viver muito o ambiente acadêmico. Tive muito apoio. Da Física em particular, tenho uma influência muito grande. Falava muito de física com meu pai”.
A situação das universidades era tema recorrente dos almoços de família, ainda mais quando Thiago e a esposa Karín Menéndez-Delmestre se tornaram docentes da Astronomia da UFRJ. “A gente falava muito da UFRJ o tempo todo. Meu pai era um defensor da universidade pública. Sempre valorizou isso”.
O tempo em que o pai ficou à frente da Comissão Nacional de Energia Nuclear era outro tópico das conversas. “Foi muito interessante ele ter sido chamado, porque ele não tinha nenhum envolvimento com qualquer partido político, nenhum apadrinhamento. Ele simplesmente participou do grupo de transição. Foi claramente uma indicação técnica. Tinha muito orgulho disso”.
E não só disso. No memorial para o concurso de Titular, em 2019, o professor Odair escreveu que os resultados do trabalho de toda uma vida, não só na pesquisa básica, mas na aplicada, na educação, e não menos importante, no IF e na CNEN, “fizeram e ainda fazem diferença, principalmente para os alunos que ajudei a formar e ainda estou formando”. O texto é encerrado com convicção: “Tenho orgulho de minha carreira e não me arrependo de minhas opções”.

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