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O clima amistoso e de diálogo entre o governo federal e as entidades representativas dos servidores públicos na atual campanha salarial nem de longe de assemelha ao das duas últimas mesas de negociação, em 2012 e em 2015, na gestão da ex-presidenta Dilma Rousseff. Eram mesas setoriais — envolviam apenas os docentes das instituições federais de ensino, representados pelo Andes e pelo Proifes (Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e Ensino Básico, Técnico e Tecnológico) —, tiveram negociações tensas e interrompidas e suscitaram as duas mais longas greves da categoria: a de 2012 durou 124 dias e a de 2015, 139.

“Em 2012, os representantes do Andes diziam que a entidade estava ali para negociar desde que o governo adotasse a lógica e a pauta do Andes. Quem negocia assim? E a pauta do Andes previa uma carreira única com 13 níveis, com passagem automática de um nível para o outro. O governo não aceitou e eles saíram da mesa. O Proifes acabou assinando o acordo sozinho”, lembra o professor João Torres, presidente da AdUFRJ. João vê a atual postura do Andes como bem diversa daquela adotada no governo Dilma. “O Andes vem mudando a sua postura, muito por pressão do movimento Renova Andes, que é um grupo de oposição expressivo à atual direção do sindicato e tem sempre questionado essas atitudes. Estou muito feliz que o Andes está negociando, e quero que ele continue assim, disposto a dialogar”, observa.

João recorda que, em 2012 e em 2015, o Andes saudou as duas longas greves como vitórias do movimento. “No fundo, era uma posição de oposição mais geral ao governo, contra alguns projetos como o Reuni, por exemplo”, acredita João. Ele até hoje guarda uma nota do Andes em que o sindicato aponta uma clara oposição ao Reuni: “Estamos à frente da maior greve da história e, depois de resolvidas as questões relativas à carreira e aos salários dos professores, será preciso iniciar a discussão do segundo ponto de pauta da entidade, para debater a falta de qualidade do atual processo de expansão de universidades e institutos federais”.

IMPASSES
Outro docente muito envolvido no movimento sindical nas negociações de 2012 e 2015, Hélio de Mattos Alves, professor da Faculdade de Farmácia da UFRJ, lembra que o acordo assinado pelo Proifes em 2015 trouxe alguns ganhos significativos para a categoria. “A parte financeira, em uma conjuntura de grave recessão, teve um resultado discreto. Entretanto, foram alcançadas importantes vitórias em relação à estruturação das carreiras e outras demandas, que abriram espaço para discussões futuras. Para o professor, não há espaço político atualmente para a postura adotada pelo Andes em 2012 e em 2015. “Estamos em uma mesa nacional de negociação, construindo pontes de apoio para essas pautas, e não se pode colocar uma greve nacional nesse momento”.

João Torres diz que a postura do Andes levou a impasses nas negociações da década passada. “Na época, nosso grupo insistia muito para que o Andes negociasse, sentasse à mesa com o Ministério do Planejamento, que separasse as questões de carreira com as demais. O Proifes, ao contrário, negociou. Em 2012, a greve durou mais de 100 dias, não tiveram vitória alguma, nem um acordo, nem um centavo, mas na avaliação deles havia sido uma grande vitória de mobilização, fechando as universidades. Teriam de fazer uma avaliação com um mínimo de credibilidade. Uma coisa que sempre me incomodou muito é que com as greves as bibliotecas e os laboratórios eram fechados. Que luta política é essa, em que você fecha bibliotecas para alunos e professores? Qual o simbolismo disso?”, questiona o professor.

INTRANSIGÊNCIA
Nilton Ferreira Brandão, presidente do Proifes, vê com bons olhos a disposição atual de negociação do Andes. “É um avanço. Em 2012, assim como em 2015, o Proifes assinou o acordo sozinho porque o Andes saiu da mesa, não aceitou a proposta do governo. O posicionamento do Andes foi o mesmo: manteve a sua proposta e não negociou. Quando falo em 2012 e em 2015 eu falo de mesas setoriais, envolvendo as entidades da Educação. Não é como agora em que há uma negociação com o conjunto de servidores públicos em geral, há outros atores envolvidos. No último encontro tivemos 49 entidades que não se diziam representadas por nenhum dos dois fóruns nacionais de servidores (Fonasefe e Fonacate)”, diz Brandão.

Segundo o presidente do Proifes, há que se ter coerência para negociar: “Nossa perda salarial hoje é da ordem de 42%, o IPCA acumulado de 2015 até janeiro deste ano. É isso que eu quero. Mas isso é possível hoje? Não é, temos que ser coerentes. Qual o orçamento que o governo precisa para dar esse reajuste? A proposta do Andes em 2015 era autoritária, não dava margem à negociação, entrou na mesa no primeiro dia e saiu no último exatamente a mesma. Era tanta intransigência que as propostas do Andes nem entravam em debate. Eram fora da realidade. Como está sendo agora, o Fonasefe, onde está o Andes, mantém a proposta original. Falta análise da realidade”, avalia.

Para o professor Brandão, a postura do Andes foi ainda mais radical em 2012 do que em 2015. “Em 2012 foi ainda pior, o Andes dizia que não queria negociar com o governo, queria derrotar o governo. Se eu vou para uma mesa com esse espírito, vou negociar o quê? Nós negociamos e fechamos o acordo com uma proposta que tinha 15 itens, desde a reposição das perdas inflacionárias até a valorização do piso da carreira. Tivemos um retorno de 78% de nossa base aprovando o acordo. E assinamos o acordo com esse apoio expressivo. O Andes optou pelo caminho da greve”, relembra.

DIVERGÊNCIAS
Presidenta (2012-2014) e vice (2014-2016) do sindicato nacional, a professora Marinalva Oliveira, da Faculdade de Educação da UFRJ, defende a postura do Andes nas mesas de negociação com o governo Dilma e diz que as greves foram instrumentos legítimos de mobilização da categoria. “A greve de 2015 não foi deflagrada porque o Andes não aceitou as propostas de reajuste do governo Dilma. A greve foi o último recurso encontrado pelos docentes para pressionar o governo federal a ampliar os investimentos públicos para a educação pública, e dar respostas ao descaso do Executivo frente à precarização das condições de trabalho e ensino nas Instituições Públicas Federais, muitas das quais estavam impossibilitadas de funcionar por falta de técnicos, docentes e estrutura adequada”, diz Marinalva.

Segundo Marinalva, a greve de 2015 começou em maio e a última reunião de negociação com o governo foi em abril de 2014, na qual foi assinado um acordo entre o MEC e o Andes em que o governo reconheceu a desestruturação da carreira e apontou para a continuidade da discussão. Mas depois disso, segundo ela, o governo negou o acordo assinado com o Andes. “Somente após um mês de deflagração da greve é que o governo propôs reajuste salarial de 21,3% parcelados em quatro anos para todos os servidores públicos federais, que reivindicavam reajuste de 27,3% e data-base. A proposta foi considerada insuficiente pela maioria das entidades de servidores federais e acabou rejeitada”, recorda a professora.

Marinalva diz que o diálogo em 2015 não foi adiante “porque o governo isoladamente encerrou as negociações com as entidades que representavam a ampla maioria da categoria, Andes e Sinasefe”. “Essas duas entidades representavam mais de 90% da categoria nas universidades e institutos federais, cujas assembleias rejeitaram a proposta do governo, indicando a necessidade de avançar na negociação. Entretanto, o Proifes ignorou esse processo e assinou o acordo. Importante destacar que o Proifes tinha representação em apenas seis das 57 universidades federais que estavam paralisadas”, lembra ela. Para a professora, a postura do Proifes à época não serve como exemplo. “O Proifes cumpriu o papel que o governo queria: uma entidade para chancelar o que a ampla maioria da categoria docente havia rejeitado. Isso precisa ser denunciado sempre. Em minha avaliação, não podemos usar a prática do Proifes como exemplo ou parâmetro de negociação. Precisamos, ao contrário, resgatar a história do Andes de mobilização e deliberação pela base, com autonomia e independência”.

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