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O funcionamento da UFRJ só está garantido até agosto. Este é um dos resultados do mais recente corte imposto pelo governo Bolsonaro às áreas de Educação e Ciência e Tecnologia. A maior federal do país, que já trabalhava com um orçamento deficitário, sofreu uma “tesourada” de 7,2% dos recursos. O governo havia anunciado uma restrição ainda maior. Porém, no final da tarde de sexta-feira 3), após intensa pressão da comunidade acadêmica de todo o país, o Executivo recuou e, em vez de bloquear 14,5% do orçamento do MEC, comunicou às universidades que bloqueará 7,2%. No caso da UFRJ, significa que há recursos para o funcionamento apenas até agosto. “A situação do bloqueio é dramática para a UFRJ. Pela primeira vez, podemos ter o shutdown das universidades. Significa a necessidade de fechar por falta de orçamento e quebra de contratos”, explica o pró-reitor de Planejamento e Finanças, professor Eduardo Raupp.

A UFRJ já tinha empenhado — ou seja, indicado o dinheiro para a despesa — 90% dos recursos liberados pelo MEC. A partir do bloqueio, a administração central precisou correr para cancelar parte dos empenhos e recolher outros recursos para se adequar ao novo limite orçamentário. Os empenhos relacionados ao mês de agosto foram cancelados.

Todas as universidades receberam um corte linear de 7,2% em seus orçamentos. Internamente, a reitoria decidiu preservar a verba de assistência estudantil, mas teve que aplicar duros ajustes em outras rubricas. Foram recolhidos recursos distribuídos aos centros e às unidades acadêmicas pelo orçamento participativo. O Complexo Hospitalar também teve dinheiro bloqueado. Além disso, todos os recursos emergenciais destinados ao apoio das aulas presenciais — e não utilizados até o dia 31 — retornariam aos cofres da administração central.

O bloqueio do governo tem uma crueldade extra, no caso da UFRJ. Boa parte dele ocorreu nas chamadas receitas próprias da instituição — basicamente, o dinheiro arrecadado com aluguéis de terrenos da universidade.

O pró-reitor está bastante preocupado com as possibilidades de reversão do bloqueio. “Se não for revertido no contexto pré-eleitoral, dificilmente será revertido depois”. E qualquer que seja o resultado. “Seja porque teremos o mesmo governo, que já fez a opção por bloquear da educação e da C&T; seja porque teremos um novo governo, que ainda não terá assumido e não terá ingerência sobre o orçamento”, esclarece. “Embora tecnicamente ainda seja um bloqueio, está mais com cara de um cancelamento”, critica.

ANDIFES REAGE: “A SITUAÇÃO É GRAVÍSSIMA”
A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) já organiza reuniões com representantes do governo para tentar reverter os cortes. “Também mobilizamos todos os reitores para acionar os parlamentares de seus estados. E estamos estudando até mesmo a via judicial”, diz o professor Marcus David, presidente da entidade.

“A situação é gravíssima. Temos que considerar que este corte vem depois de uma série sucessiva de cortes. Tudo que era possível e impossível já foi feito pelas universidades”, diz. “Já estávamos com uma dificuldade imensa de administrar este orçamento. Estamos com um cenário que projeta um segundo semestre caótico para as universidades”.

Para o docente, que é economista, o grande problema é a emenda constitucional que limita os gastos públicos. A Lei de Responsabilidade Fiscal permite ao governo fazer ajustes orçamentários durante o ano, quando há indicativos de que não vai cumprir metas fiscais e, nos últimos anos, o teto de gastos. “O relatório publicado pelo Ministério da Economia referente a março e abril, divulgado no fim de maio, indica que a arrecadação subiu muito. O governo não tem problema para cumprir a meta fiscal prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Mas o relatório fala que não está conseguindo cumprir o teto de gastos. Isso justificaria a necessidade de cortes”, explica Marcus David. “Havia espaço para avaliações políticas, mas a priorização se deu sobre estas áreas (Educação e C&T). O MEC sofreu um corte de R$ 1,6 bilhão”, criticou.

Uma das autoras de estudo inédito do Observatório do Conhecimento sobre o orçamento das áreas de Educação e C&T, a também economista Julia Bustamante concorda. “O teto de gastos estrangula não só o orçamento. Ele estrangula as possibilidades de construção de um desenvolvimento econômico nacional autônomo”, afirma. “O Brasil investe pouco e cada vez menos em Ciência e Educação. E, ainda assim, temos a previsão orçamentária sendo contingenciada”, completa. Se confirmados os cortes, as perdas do chamado “orçamento do conhecimento” vão superar R$ 100 bilhões em apenas oito anos.

ROMBO DE R$ 1,8 BILHÃO
O quadro é crítico também no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, que ficou com um “rombo” de R$ 1,8 bilhão, segundo a mais recente avaliação elaborada pela assessoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

A entidade ainda busca o detalhamento, mas, pelo tamanho do corte, existe o receio de que parte do Fundo Nacional para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) esteja na conta. Neste caso, o governo cometeria uma ilegalidade. “É evidente o ataque do governo federal à Ciência brasileira. Um ataque ilegal já que a Lei Complementar nº 177, de 2021, proíbe expressamente que o FNDCT sofra qualquer limitação de despesa”, diz trecho de nota da SBPC.

“O governo está falando que o corte é para pagar reajuste de servidores, mas a justificativa real é caber no teto de gastos. Este dinheiro não vai dar para pagar os servidores”, afirma a vice-presidente da SBPC, professora Fernanda Sobral.

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