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Silvana Sá e Liz Mota Almeida

WhatsApp Image 2021 08 14 at 08.57.56O teatro de horrores em que se transformou o Planalto teve uma semana particularmente grotesca. O desfile de absurdos – literal e figurado – atingiu o ápice na terça-feira (10), com a exibição de tanques e blindados sucateados das Forças Armadas na Praça dos Três Poderes, no mesmo dia em foi votada e rejeitada pela Câmara a proposta do voto impresso para as eleições do ano que vem. A tentativa de intimidar os parlamentares virou motivo de chacota na internet.  
Para o professor Josué Medeiros, do Departamento de Ciência Política do IFCS, a pretensa demonstração de força se transformou em constrangimento. “O desfile foi um tiro que saiu pela culatra para Bolsonaro e reforçou sua situação de isolamento. A derrota do voto impresso, no mesmo dia, confirma o diagnóstico”, avalia. Josué, contudo, lembra que não dá para concluir que Bolsonaro “está prestes a ser derrotado”. “Sua proposta golpista contra as urnas eletrônicas recebeu 229 votos, número bem representativo”, sublinha. “As Forças Armadas, mesmo incomodadas, toparam aquele desfile patético. A base bolsonarista mais radical segue defendendo o presidente. Por fim, ele ainda mantém o patamar de 25% de ótimo/bom nas pesquisas de avaliação do governo”, elenca o especialista.
O Congresso teve outra pauta polêmica na semana: a volta das coligações para eleições proporcionais e o chamado “distritão”. Os temas faziam parte da PEC 125/11, votada na Câmara na quarta-feira (11), em primeiro turno. “A derrota do distritão foi uma grande vitória da democracia”, considera o professor Josué. “Esse sistema favorece a ação de celebridades e figuras públicas na política e aumenta o peso do poder econômico nas eleições. Além disso, enfraquece os partidos, os projetos coletivos e dificulta a representatividade”, resume o cientista político.
Para Josué, o preço desse resultado foi a volta das coligações, prática que tinha sido proibida em 2017. “Apesar do custo político, derrotar o distritão era fundamental para pensarmos em democracia no Brasil”, conclui. Para as mudanças valerem para o ano que vem, precisam ser aprovadas em dois turnos na Câmara e no Senado e incorporadas à Constituição até o início de outubro.

Corrida de obstáculos
Na UFRJ, a semana também foi de fortes emoções. Findo o prazo de inscrições, duas chapas se apresentaram para disputar a diretoria da AdUFRJ (leia nas páginas 6 e 7). E a universidade ficou sabendo que seu orçamento para 2022 será de R$ 320,8 milhões, o que sinaliza mais uma corrida de obstáculos para se manter aberta no ano que vem (leia na página 4). O MEC só liberou os limites do orçamento de 2022 no dia 6, à noite, com prazo para resposta até o fim do dia 9. As instituições correram contra o relógio para montarem suas propostas.
“As universidades estão ameaçadas de parar. Os institutos também estão sofrendo muito com a falta de investimento e não está havendo subvenção para as indústrias”, avalia o professor Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências.
As declarações do ministro Milton Ribeiro, no útimo dia 9, dão pistas de que esses cortes de recursos fazem parte de um projeto. Ele afirmou que “a universidade deveria ser para poucos”. Também disse que a Eucação foi “tomada por um viés político-ideológico”, que atribuiu aos “maus professores” que resistem em voltar às salas de aula durante a pandemia. Disse, ainda, que reitores não podem ser “esquerdistas ou lulistas” e criticou o sistema de cotas.
“A universidade deve ser para todos, sim”, rebate o professor Marcus Vinicius David, presidente da Andifes (associação nacional de reitores). Ele defende que todos os segmentos sociais tenham acesso ao ensino superior. “O modelo de desenvolvimento social e econômico pressupõe a garantia de acesso à Educação e à universidade. Por isso, a Andifes defende a política de cotas, que é transformadora para a sociedade”.
A professora Eleonora Ziller, presidente da AdUFRJ, reforça que as declarações do ministro estão “em completa sintonia” com o governo Bolsonaro. Ela lembra que até o início do século 21, menos de 5% da população jovem brasileira estava na universidade. “Sempre reservamos a universidade para muito poucos, e engatinhamos nos últimos dez anos com um processo de transformação, ampliação e renovação da universidade. O Brasil devia isso à sua juventude”, avalia a professora.

Interferência é marca
Milton Ribeiro também defendeu uma maior interferência na autonomia administrativa das universidades, o que já é uma das grandes marcas do governo. Cerca de 40% dos atuais reitores são biônicos, ou seja, não foram escolhidos por suas comunidades. O último ataque à autonomia foi publicado no dia 4 de agosto. O MEC destituiu o procurador-chefe da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Murillo Giordan Santos, e nomeou Alessander Jannucci como substituto, à revelia do reitor e sem justificativas. A reitoria reagiu. Em nota, declarou que solicitou audiência cm o ministro, em caráter de urgência, “visando obter informações e esclarecimentos sobre o processo”. E que o assunto será tratado “nas devidas instâncias universitárias”.
Ribeiro agiu fora de suas prerrogativas. Instrução Normativa nº 5, de 1998, determina que cabe aos reitores a tarefa de indicar os procuradores das universidades. Em carta encaminhada aos pares e obtida pelo Jornal da AdUFRJ, o procurador destituído alerta que o que está em jogo “é o atropelo de ministérios sobre as autarquias; é a falta de autonomia do advogado público para exercer sua missão com imparcialidade técnica sob o receio de desagradar interesses políticos e ser exonerado por autoridade que sequer possui competência para tal ato”. Ele completa: “É a nítida intervenção e uso político da nossa carreira”.
O professor Marcus Vinicius David afirma que a Andifes está, desde o ocorrido, trabalhando próximo à reitoria da Unifesp, “dando todo o apoio e buscando solução para o impasse”, além de diálogo com o MEC. “Entendemos que faz parte do princípio da autonomia que universidades escolham seus dirigentes também das funções administrativas”. O Conselho Universitário da Unifesp, no dia 11, aprovou moção manifestando “surpresa e indignação” com o caso. O documento exige que o MEC anule os atos de exoneração e nomeação do procurador-chefe, “a fim de preservar a legalidade, legitimidade e segurança jurídica do processo”.
Para a professora Eleonora Ziller, as intervenções do governo são “uma tentativa desesperada” de interferir na vida universitária. “A AdUFRJ é solidária à Unifesp. A questão da autonomia é central para nossa sobrevivência. Ninguém está a salvo neste governo. Qualquer um pode ser vítima de intervenção uma vez que as falas das autoridades não demonstram nenhum compromisso republicano e democrático”.
A Adunifesp, seção sindical docente local, tem se articulado local e nacionalmente. “O rito foi indevido, incorreto e uma intromissão inadmissível do MEC, em algo que o ministro não tem competência para atuar”, defende o presidente da entidade, professor Fábio Venturini. “Estamos buscando o apoio para ações políticas, administrativas e jurídicas”, afirma. “É um governo golpista, que está destruindo tudo o que pode, mas a gente vai reconstruir”.
Depois de uma semana como essa, só resta uma certeza: vamos sim, professor, vamos sim.

 

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Os defensores da democracia, da universidade pública e gratuita e do Serviço Público têm agenda cheia na próxima quarta-feira (18). O dia começa com uma assembleia da AdUFRJ, às 10h, para debater a greve nacional em defesa do Serviço Público e contra a reforma administrativa, marcada para o mesmo dia. Às 16h, na Candelária, começa a concentração para o ato contra a PEC 32 convocado pelo Fórum  Unificado em Defesa do Serviço Público e Estatais.

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