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WhatsApp Image 2024 07 01 at 17.28.25 3Fotos: Alessandro CostaAo morrer, em 1880, Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, patrono do Exército Brasileiro, tinha entre seus “bens” 12 homens e mulheres escravizados, que cuidavam de tarefas domésticas e de lavoura em sua chácara, na Rua Conde de Bonfim, na Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro. Algumas das escravas tinham filhos “ingênuos”, que é como se chamavam os nascidos após a Lei do Ventre Livre, de 1871. O inventário de Duque de Caxias integra há tempos o acervo do Museu Histórico Nacional (MNH), mas suas informações só se tornaram públicas recentemente, em uma das intervenções decoloniais promovidas pela instituição — e que jogam luz sobre fatos invisibilizados de nossa história.
As intervenções decoloniais foram um dos destaques da visita guiada ao MHN, a última do ciclo de passeios histórico-culturais da AdUFRJ no primeiro semestre. Há a expectativa de um novo ciclo no segundo semestre, com novas temáticas e locais de visitação. Realizada na manhã de sábado (22), a visita reuniu 15 professores e foi guiada por Douglas Libório, graduado em História pela UFRJ e doutorando pela UFF, um apaixonado pela história (revista) do Brasil: “As intervenções decoloniais podem tornar os museus mais plurais. Neste museu, criado de um modo militarizado, elas podem ressoar uma ideia mais democrática de Brasil”.

ORIGENS
A visita começou pelo Pátio Epitácio Pessoa, também conhecido como Pátio dos Canhões. Douglas Libório falou das origens do MHN e do papel de seu idealizador, o integralista Gustavo Barroso. “Foi um intelectual que dialogou com o autoritarismo no entreguerras, no início dos anos 1900. Ele foi um dos mais ferrenhos defensores do antissemitismo no Brasil, e isso contribuiu para seu posterior ‘apagamento’. No integralismo, ele era da ala mais antissemita. Foi o criador do museu e seu diretor até a morte, nos anos 1950”, lembrou.WhatsApp Image 2024 07 01 at 17.28.25 4
Entre as contribuições de Gustavo Barroso se destaca a criação do primeiro curso de museus do Brasil, em 1932, embrião do atual curso de Museologia da Unirio, o maior da América Latina. “Barroso vai se inspirar nos museus militares criados na Europa entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. Ele vai buscar as relíquias e os ícones das chamadas grandes batalhas do Brasil, como Tamandaré, Riachuelo, Osório, Caxias. O início da coleção do Museu Histórico Nacional é pautado por essa grandiosidade imperial e militar do Brasil”, explicou o guia. Aberto em 1922, nas comemorações pelo centenário da Independência do Brasil, o MHN ocupa três prédios que abrigaram instalações militares do Império.
Com ouvidos atentos às explicações do guia, o professor José Paulo Azevedo, da Escola Politécnica e da Coppe, tinha o olhar dedicado a detalhes da imponente construção da Praça Marechal Âncora, no Centro do Rio. “Essas visitas nos dão um panorama de nossa história que dificilmente teríamos sem as orientações do guia. Nós passamos na frente de instituições como esta e não imaginamos quanta história há lá dentro. Estou bem satisfeito com essa iniciativa da AdUFRJ, espero que ela prossiga. Como sou da área de Engenharia, fico obervando os materiais empregados nas construções, as diferenças entre as arcadas, é tudo muito rico”, observou o professor.

RELEITURAS
Entre as novas inserções do MHN uma das mais belas e emblemáticas é a instalação do Altar de Oxalá, toda em tons de branco e prata, dedicado ao orixá. A obra do escultor baiano Emanoel Araujo, morto em 2022, abre espaço à reflexão sobre a perseguição sofrida pelas religiões de origem africana no Brasil — e à violência do período escravagista, de forma geral. “São reflexões importantes. É impossível falar da história dos povos pretos no Brasil sem falar da violência, de nossas orações censuradas, das mulheres estupradas, dos açoites”, apontou Douglas Libório.
Os povos indígenas também receberam novas leituras no museu. A equipe do MHN propôs intervenções que firmaram o compromisso “com a escuta, a diversidade e o protagonismo de novas histórias que foram invisibilizadas ao longo da construção de uma ‘história oficial’”. A mostra “îandé: aqui estávamos, aqui estamos” celebra ritos, lugares e saberes dos povos originários desde antes da chegada dos colonizadores portugueses.
Douglas Libório também encantou a todos com ‘bastidores’ pouco conhecidos da Independência do Brasil. Um deles é retratado na tela “Sessão do Conselho de Estado”, da pintora paulista Georgina de Albuquerque. Ex-aluna da Escola Nacional de Belas Artes (atual EBA/UFRJ), Georgina dá tons impressionistas à pintura encomendada pelo governo em 1922 e que retrata o momento em que Dona Leopoldina é aconselhada por José Bonifácio a escrever uma carta a Dom Pedro I recomendando-lhe a proclamar a Independência do Brasil. A cena se passa em 2 de setembro de 1822, cinco dias antes do “Grito do Ipiranga”, cena imortalizada em famosa tela de Pedro Américo.

NOVO CICLO
Fiel frequentador do ciclo de visitas da AdUFRJ — participou de todos —, o professor Ricardo Medronho, emérito da Escola de Química, elogiou o projeto do sindicato e defendeu sua ampliação. “Acho uma iniciativa fantástica, uma forma de levar aos nossos filiados um pouco da cultura do país. Essa visita ao Museu Histórico Nacional nos proporcionou, em três horas de passeio, conhecer uma parte do acervo. E isso nos traz o desejo de voltar aqui. Quero conhecer o resto”, disse Medronho.
WhatsApp Image 2024 07 01 at 17.28.25 5O gosto de “quero mais” também alcançou a professora Cibeli Reynaud, aposentada da Escola de Música e presidente da AdUFRJ de 1989 a 1991. “O guia é maravilhoso. A gente vive cada segundo da visita com o ânimo dele. Achei extraordinário, espero que venha mais por aí”, pediu ela. O mesmo desejo foi expresso pelo professor Oswaldo de Campos Melo, aposentado da Faculdade Nacional de Direito e um dos mais ativos participantes da visita ao MHN: “O guia é muito bom e conhece bem a história do Brasil. Foi empolgante a visita. Que venham outras!”, comentou o professor.
Se depender da disposição do guia e da vontade da diretoria da AdUFRJ, não resta dúvida: vem mais um ciclo de visitas por aí. De tão entusiasmado, Douglas Libório deu um “spoiler”: “Foi um ciclo importante, começamos com a história da cidade, no Museu Histórico da Cidade, e encerramos aqui com a história do Brasil. Foi um roteiro diversificado e deve ter impactado os professores. Parabenizo a AdUFRJ pela iniciativa, e espero que no segundo semestre possamos aprofundar o projeto com roteiros na área de arte moderna”.
Para a presidenta da AdUFRJ, professora Mayra Goulart, os passeios proporcionam uma troca de experiências. “O que temos aqui é um experimento de entrelaçamento de saberes. Não é só um guia que explica e um grupo que escuta. São professores que interagem e acrescentam informações de suas áreas”, observou Mayra, também apontando para um novo ciclo. “Estamos aceitando sugestões de roteiros e lugares de nossos sindicalizados. Nossa intenção é ampliar esse projeto”, adiantou. Sugestões? Mande um e-mail para Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

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