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WhatsApp Image 2024 06 21 at 20.45.12 4Fernando SouzaNa manhã de terça-feira (18), a estudante Giovana Pereira, do 5º período de Ciências Sociais, foi ao gabinete do diretor do IFCS, professor Fernando Santoro, para reclamar da barricada que bloqueava a entrada da sala 402-A, onde sua turma teria uma aula de Antropologia II. O bloqueio era recente, a aluna levou fotos de antes e depois da instalação da pilha de cadeiras que fechou o acesso à sala. “Os bloqueios impedem as pessoas de entrarem nas salas. O professor queria dar aula, mas o bloqueio impediu”, protestou ela.
Na terça e na quarta-feira (19), equipes do Jornal da AdUFRJ constataram que as barricadas feitas com cadeiras bloqueiam o acesso a diversas salas de aula no 3º e no 4º andar do prédio do IFCS/IH. O método tem gerado questionamentos por parte de alunos que não aderiram à greve estudantil e de professores.
As direções do IFCS e do IH têm tentado dar suporte aos professores e aos alunos que desejam ter aulas. Na segunda-feira (17), a direção do IFCS divulgou um protocolo de convivência durante a greve. “A direção entrou como garantidora de que impedimentos físicos, como cadeiras, seriam retirados pelos seguranças sempre que estudantes e professores precisassem transitar nas salas e exercer o direito de frequentar aulas. Os representantes estudantis asseguraram que, respeitando suas formas horizontais de deliberação e organização, seus piquetes seriam de persuasão e não de coerção ou qualquer forma de violência”, diz o comunicado.
Entre as diretrizes do protocolo constam que as “as aulas continuarão a ser ofertadas presencialmente aos alunos que comparecerem”; que “ações de assédio, coerção ou violência devem ser reportadas à Comissão de Prevenção e Combate ao Assédio e, conforme o caso, serão tratadas em Processos Administrativos Disciplinares”; e que “será assegurado aos docentes o livre exercício de seu trabalho e, em caso de ausência de alunos na turma, a aula será contabilizada sem compromisso de reposição”.
Muitos professores temiam ter que repor aulas. “Sinto que há um sentimento generalizado entre os professores de que a greve estudantil é legítima, que as pautas são justas. Estamos todos, alunos, professores e técnicos, imersos em situações emergenciais, em várias dimensões. E todos buscam formas de enfrentar isso. Mas há um desconforto em relação aos bloqueios, inclusive entre alunos, que não se sentem à vontade em ir às aulas. Isso tem gerado certa contrariedade em alguns professores, temerosos de terem que repor aulas que não se recusaram a dar”, reflete a professora Thais Aguiar, do Departamento de Ciência Política.
Segundo Thais, outros aspectos em relação à greve devem ser considerados. “Há uma preocupação institucional com a universidade, que vem tendo seu papel questionado pela direita e enfrenta problemas como a evasão estudantil. A gente vê nossas salas de aula se esvaziando. Se antes da pandemia tínhamos disciplinas optativas com 20 ou 30 alunos, hoje são cinco, dez. Isso para um professor é muito duro. Espero que busquemos entendimentos para construir outro ambiente”.

BLOQUEIOS
Para o diretor do IFCS, o uso de barricadas é um símbolo da crise política por que passa a unidade. “Quando a política começa a ser feita com forças de constrangimento, como cancelamentos e pressões, aí saímos do campo da política democrática para entrar no plano da disputa, da guerra. E nesse plano as coisas não se resolvem mais com a palavra, com o entendimento. Se perdemos a palavra como instrumento político, nós perdemos a coesão comunitária. Estamos num período assim”, observa Santoro.
O diretor lamenta que a palavra esteja sendo substituída pelas barricadas. “Se não é a palavra que traz a adesão dos colegas, mas o assédio, o bloqueio, o impedimento físico, isso é sinal de crise. Há inclusive uma confusão semântica. Muitos estudantes estão chamando as barricadas de piquetes. O piquete é um ato de persuasão, como os trabalhadores nas portas das fábricas convencendo seus companheiros a aderir à greve. Mas estão chamando de piquete o que são barricadas, montes de cadeiras impedindo as pessoas de passar, de entrar em sala de aula. Isso não é uma ação política pela palavra. Uma barricada é um artefato de tática de guerra, um ato violento”.
Os dirigentes estudantis defendem a estratégia. “A greve estudantil foi deflagrada em assembleia, onde também foi votado o uso de piquetes nas salas de aula, impedindo a passagem. A gente utiliza esse meio para conversar com os estudantes que aparecem, o que raramente vem acontecendo porque poucos estudantes estão indo às aulas. Quem aparece para a aula a gente conversa e a maioria entende a questão da greve, respeitando a decisão coletiva”, diz o estudante Washington Yuri, dirigente do Centro Acadêmico de Ciências Sociais (CACS).
Arthura Rocha, que atua na gestão do CACS, também defende os bloqueios. “Com os piquetes a gente tem a chance de conversar com os estudantes dispostos a ter aulas. Hoje (quinta-feira, 20) aconteceu com dois alunos que vieram para ter aulas e decidiram voltar. A gente até sugere aos professores fazer fotos dos piquetes e enviar aos seus departamentos, reforçando que estamos aqui como testemunhas, já que havia o temor de sanções aos que não ministrassem as aulas. A greve estudantil é legítima e reconhecida pelo CEG”.

INCIDENTE
O clima é de tensão mesmo onde não há barricadas. Na quinta-feira da semana passada (13), uma aula de História Medieval teria sido invadida e interrompida na sala 106. Segundo relato divulgado pela direção do IH, o professor Markos Klemz, do Departamento de Filosofia, teria destratado a professora Josena Ribeiro, substituta de História Medieval. O professor nega as acusações e se diz vítima de difamação.
O diretor do IH, professor Antônio Carlos Jucá, classificou o episódio como “gravíssimo”. “Sou professor universitário há 28 anos, tenho 20 anos de UFRJ e nunca vi nada assim. Já vi aluno invadindo aula para protestar. Mas um professor universitário invadir uma aula de uma professora que estava numa sala e num horário designados para ela? Ela estava absolutamente regular e ele invadiu a sala, criou um clima em que ela se viu na obrigação de sair, porque ele foi ofensivo, ele a destratou”.
O professor garante que pedirá a abertura de um PAD contra Markos Klemz. “Isso não pode ficar impune. Quando afeta a professora Josena, afeta a todos nós. É uma invasão, um desrespeito à atividade docente. Há duas coisas que faço questão de marcar. A primeira é que isso é um assédio moral, ela é uma jovem professora substituta, está numa posição mais fragilizada. A segunda é que é uma atitude sexista, é uma violência de gênero. Ele não faria isso comigo ou com outro professor homem”.
Procurada pelo Jornal da AdUFRJ, a professora Josena Ribeiro preferiu não comentar o incidente. “Sou nova na UFRJ, passei por essa situação de acossamento e acho melhor não me expor”. O caso ficou público por meio de uma postagem da direção do IH no Instagram no dia 17. “Trata-se de um caso gravíssimo de ataque à atividade acadêmica por parte de um docente, caracterizando assédio moral e violência de gênero, tanto pela invasão quanto pela forma como ele se dirigiu à professora. (...) Encaminharemos ainda hoje solicitação de abertura de PAD (Processo Administrativo Disciplinar) contra o professor Markos Klemz”.
No dia 18, o Comitê de Greve do IFCS, os CAs de Filosofia e Ciências Sociais e o DCE manifestaram em postagem no Instagram “indignação conjunta diante da atitude vexatória e difamadora assumida deliberadamente pela direção do IH contra o professor Markos Klemz”.
O professor nega as acusações. “Estou bem abalado desde que essa nota difamatória foi divulgada. Ela teve um poder de manchar a minha reputação como eu nunca vivi. Sou professor no Serviço Público desde 2011. Faço política desde o grêmio da escola. Nunca sofri esse tipo de perseguição. Jamais eu invadiria a aula de um colega profissional”, argumenta Klemz.
Ele diz que foi convidado pelos estudantes a participar de uma atividade de greve na sala 106. “Jamais chamaria essa colega de qualquer coisa, muito menos de fura-greve. Não faz sentido, os professores não estão em greve na UFRJ. Fui convidado para uma roda de conversa. Cheguei às 15h05, e já havia pessoas sentadas na plateia, como ela, que se apresentou como professora de História Medieval. Eu segui conversando com alguns estudantes, surgiu um papo sobre a greve no IFCS, e comentaram que uma professora tirou as cadeiras da porta para dar aula. Comentei que achava melhor tentar dialogar do que burlar a mobilização dos estudantes. Ela ouviu isso e se exaltou, disse que não estava burlando nada. Eu nem estava me referindo a ela, mas a uma situação geral. Aí ela se retirou da sala”, relata.
“Ela ter se sentido ofendida com a situação e procurar a direção do IH para fazer queixa é legítimo. O que me provoca indignação é a direção de um instituto fazer um post de rede social sem me contactar. O post é uma peça de difamação, o dano que já foi feito eu não vou conseguir desfazer”, completa.

DIÁLOGO
Decano do CFCH, o professor Vantuil Pereira é taxativo sobre o incidente da sala 106. “Se há uma denúncia, tem que ser apurada. Antes do PAD há um inquérito preliminar para que as partes sejam ouvidas. Minha posição é de condenar qualquer ato de violência, de sempre buscar uma solução civilizatória”.
Vantuil está articulando uma reunião com todos os segmentos do IFCS. “Tenho buscado conversar com as direções do IH e do IFCS e com os estudantes para estabelecer uma posição intermediária, reconhecendo o direito dos estudantes, por um lado, e o direito de quem quer dar aulas. Tenho pedido aos estudantes para não fazerem barricadas”.
O decano acredita que um diálogo franco pode ajudar a amenizar o clima no IFCS. “A greve estudantil é um processo que mostra a sociedade viva, isso é positivo. O que merece reflexão é a colocação das barricadas. Para chegar a esse limite, houve antes uma tentativa de entendimento? A barricada dificulta o acesso e o direito de ir e vir. Vamos apostar no diálogo”.

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