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A Lei de Cotas para o Ensino Superior completa dez anos em 2022, prazo previsto pela própria legislação para ser revista. E uma ação apoiada pela
AdUFRJ vai trazer a discussão em torno da defesa da manutenção do sistema de cotas para dentro da UFRJ. “Um passo pra dentro e muitos pro mundo” é uma campanha da Perifa Connection, da Coalizão Negra por Direitos e do Observatório do Conhecimento que vai promover o debate sobre as cotas na universidade, apresentando argumentos favoráveis à política para os integrantes da comunidade acadêmica.
A ação começa na segunda-feira (16). A primeira semana será dedicada à panfletagem e a conversas nos bandejões da universidade. Mas a campanha também prevê a montagem de bancas em pontos centrais dos campi, rodas de conversa e diálogos nas salas de aula. Para isso, a AdUFRJ convida os professores a participar da campanha, cedendo dez minutos das suas aulas para que os mobilizadores possam conversar com a turma. Os professores que tenham interesse em receber a campanha podem entrar em contato com os organizadores através do formulário disponível em bit.ly/dialogocotas.
Mayra Goulart, vice-presidente da AdUFRJ e coordenadora do Observatório do Conhecimento, falou da importância da campanha. “Fica o convite aos professores, para podermos ampliar o espaço de reverberação e reflexão sobre a importância dessa política pública para os cotistas, para a universidade e para o país”, observou Mayra. A professora explicou que o Observatório e a AdUFRJ entraram na campanha pela importância da defesa da política de cotas. “Achamos importante oferecer para a sociedade civil e para a universidade insumos para atuar em defesa dessa que acreditamos ser uma das principais políticas públicas do século 21”, defendeu.
“As cotas devem ser mantidas porque vamos conseguir, para as próximas gerações, transformar o imaginário social das pessoas negras. Para que elas entendam que a universidade é um lugar para elas”, defendeu Vitor Matos, ativista, doutorando da UFRJ que pesquisa os efeitos da política de ação afirmativa. “O percentual pequeno de negros que consegue acessar as cotas raciais não é proporcional aos 56%, segundo a última pesquisa do IBGE, de negros na sociedade brasileira”, explicou ele, que é técnico da UFRJ e faz parte da Câmara de Políticas Raciais e da Comissão de Heteroidentificação da universidade.
Vitor, que participou da formação dos mobilizadores que vão atuar na campanha, acredita que a política de cotas deve ser mantida ou ampliada, não diminuída. Para o pesquisador, a política teve êxito, mas é importante que a comunidade universitária seja sensibilizada sobre o tema. “A AdUFRJ, como entidade de classe, acerta ao encampar essa discussão e trazer a conscientização para dentro dos campi”, disse.
Aluna da FND, Thuane Nascimento é coordenadora da Perifa Connection e será uma das mobilizadoras na ação na UFRJ. Para ela, a participação dos professores é essencial, pela importância da docência na vida universitária. “Eles que estão ali fomentando, introduzindo os diversos saberes, técnicos e da vida, a forma de pensar, de construir a epistemologia. Sem os professores, a mobilização perderia muito”, apontou Thuane.
A comunidade da UFRJ assistiu, no dia 27 de abril, ao filme “Ciência: Luta de Mulher”. “Nosso objetivo é mostrar diferentes origens, trajetórias e fazeres científicos, para ampliar o espectro de identificação de jovens mulheres, que poderão ver na Ciência um lugar também pra elas”, disse a professora Mayra Goulart, diretora da AdUFRJ, no evento realizado no Fórum de Ciência e Cultura.
Antes da exibição, uma mesa inteiramente feminina saudou a produção do Observatório do Conhecimento — rede de associações e sindicatos docentes da qual a AdUFRJ faz parte. Coordenadora do Fórum, a professora Tatiana Roque relatou como ocorreu a separação de gêneros no fazer científico, a partir do século XIX. A situação deu origem ao que a docente classificou como “machismo epistemológico”. “Aí eu entendi muita coisa sobre mulheres na Ciência, sobre como nos sentimos sempre deslocadas”.
A professora Tatiana Sampaio, do Instituto de Ciências Biomédicas, apresentou uma perspectiva em sua área de atuação. “Na minha trajetória pessoal e profissional, eu nunca me senti oprimida, mas nós sabemos que existe uma cobrança maior sobre as mulheres”, contou.
Completaram a mesa as estudantes Julia Vilhena, represntante do DCE, e Natália Trindade, da Associação de Pós-graduandos, além da diretora do filme, Rithyele Dantas.
SURPRESA
O evento contou com uma aparição inesperada da pesquisadora e hacktivista Nina da Hora, uma das personagens retratadas no filme. Ela saudou a diversidade contida na produção. “Temos que acabar com essa ideia de que apenas as histórias extraordinárias, dentro de um padrão que a sociedade estabeleceu, são importantes. Todas as histórias são extraordinárias”, defendeu.
Após ser exibido pelas entidades que compõem o Observatório do Conhecimento, o documentário será disponibilizado ao público pelo Youtube.
Cidadania. O substantivo comum vira palavra com significado incomum para boa parte dos brasileiros sem acesso a direitos básicos como habitação adequada, saneamento, educação, documentos. Para ajudar a mudar essa realidade, estudantes e professores ligados à Escola Politécnica criaram o coletivo de extensão universitária Força Motriz. “Nosso debate é de que a extensão é o papel fundamental da universidade. É para o que ela serve, é a forma mais direta de intervenção da universidade na sociedade”, defende Pedro Enrique Monforte Brandão Marques, mestrando do Programa de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Coppe. “Não adianta fazer pesquisa, produzir conhecimento, se não houver relação com as necessidades sociais”, acredita.
Pedro é um dos organizadores do coletivo, junto com sua orientadora, a professora Adriana da Cunha Rocha. A ideia nasceu nas Engenharias, em 2018. O principal projeto do Força Motriz é o Núcleo de Assessoria Técnica Popular (NATEP). “Nosso trabalho se dá principalmente em favelas, com parcerias com ONGs, associações de moradores e projetos sociais”, explica o estudante. “Nós desenhamos, propomos e realizamos ações de educação popular (com o pré-vestibular Só Cria) e em assistência social”, conta. Nessa área, o projeto criou o Favela Viva, uma central de atendimento telefônico para moradores de favelas com foco em Psicologia, Serviço Social e Direito.
A primeira comunidade a ser atendida pelo Força Motriz foi a Ocupação Gringolândia, na Pavuna, Zona Norte do Rio. “É emblemático porque se conquistou o fim do processo de despejo dessa ocupação. Logo no nosso primeiro ano de apoio, conseguimos que a prefeitura do Rio transformasse a área em local de especial interesse social”, orgulha-se Pedro. “Eles já não correm risco de serem expulsos. O desafio agora é a urbanização da região”, observa o mestrando, que também é diretor do Sindicato dos Engenheiros do Rio de Janeiro. “Nossa luta é pela reforma urbana”, diz. O projeto faz o acompanhamento da infraestrutura das ocupações São Januário, na Barreira do Vasco, em São Cristóvão; Moisés, na Rua do Riachuelo, no Centro; e Gringolândia, na Pavuna, esta a maior delas, com 500 famílias.
A coordenadora Adriana, diretora adjunta de graduação e extensão da Escola Politécnica, é só elogios ao orientando. “Pedro é uma espécie de gerente. O projeto começou por causa dele, que já trabalhava com iniciativas populares. Ele trouxe a proposta de criar na universidade um projeto de extensão que atendesse a famílias de baixa renda”, conta.
Estudantes de diferentes áreas participam do projeto. “Os alunos começaram a se envolver com iniciativas para que os moradores tirassem documentos, houve a criação de biblioteca comunitária. Na medida em que os alunos foram entrando, eles começaram a fazer outras ações”, relembra Adriana. “Surgiu o trabalho na Rocinha, com curso pré-vestibular que, na verdade, funciona como um reforço dos conteúdos que são exigidos no Enem. Fizemos também horta social. Vamos fazendo as coisas na medida em que as demandas aparecem”.
Cristiane Valente, do 5º período de Serviço Social, faz parte do Força Motriz desde julho de 2021. “Desde que entrei na universidade, comecei a buscar alguma coisa em que eu pudesse atuar diretamente nas comunidades do Rio de Janeiro. Além de aplicar conhecimentos acadêmicos, eu também estou aprendendo muito com as comunidades, absorvendo saberes que vão também ajudar na minha atuação profissional”, destaca.
Para Cristiane, dar suporte a famílias para que garantam seu direito básico à moradia é a ação de que ela mais se orgulha. “É, sem dúvidas, um dos pontos que mais me impactam. É uma vivência que vou levar para minha vida”, se emociona ela. “Pelo Favela Viva fizemos recentemente uma ação para que as pessoas tirassem o título de eleitor. Hoje, como tudo é pela internet, muitas pessoas sequer têm direito ao voto. São direitos básicos à cidadania que o Força Motriz e o NATEP ajudam a garantir”.
O Força Motriz agora tem um novo desafio: tornar-se programa de extensão. “A gente percebeu que precisa fazer todas essas ações de maneira mais integrada com o que o aluno de Engenharia espera e afinado com as novas diretrizes curriculares”, avalia a professora Adriana. “Nosso objetivo final é proporcionar o resgate da cidadania das pessoas. Para isso, precisamos de uma atuação institucional mais fortalecida. Daí a intenção de transformar nosso projeto em programa para formalizá-lo na estrutura da universidade”.
Os organizadores procuram professores para coordenação de projetos que se relacionem ao Força Motriz. Uma das formas de entrar em contato com o coletivo é por meio do Instagram: @coletivoforcamotriz.
Afeto, esperança e união contra os desmandos do governo. O 1º de Maio deste ano teve clima de reencontro após dois anos sofridos de pandemia. No Rio, a manifestação
foi convocada em conjunto pelas centrais sindicais nacionais e aconteceu no Aterro do Flamengo, com pouca participação de trabalhadores, mas com longos abraços e sorrisos dos manifestantes. A AdUFRJ montou uma barraquinha com bolo, sucos, lanches e ambiente acolhedor. Os professores da UFRJ atenderam ao chamado do sindicato e marcaram presença na atividade.
“Esse 1º de Maio tem um clima afetivo, festivo. Fomos presenteados com um belo dia de sol, num ato com várias centrais sindicais. É um momento muito importante de valorizarmos a democracia”, opinou a professora Maria Paula Araújo, do Instituto de História. A docente, que já foi diretora da AdUFRJ, acredita que o clima diferente não tem relação só com a pandemia. “Foram 3 anos de massacre absoluto de um governo que o tempo todo produz violência. Esse é um pequeno momento em que a gente tem oportunidade de se reencontrar para aglutinar forças”.
Presidente da AdUFRJ, o professor João Torres destacou a pluralidade do ato e a necessária unidade do campo progressista em torno das grandes questões nacionais. “Aqui havia representações de várias categorias: domésticas, ferroviários, petroleiros, metroviários, educação básica e superior, partidos políticos”, disse. “É importante que toda essa representatividade se converta em ações que coloquem no debate público os graves problemas pelos quais passa o país”, apontou o dirigente. “As famílias estão endividadas, a Educação vive seu pior momento, não há recursos para o desenvolvimento nacional e tudo por escolhas políticas do atual governo. É preciso que toda essa pauta impulsione o debate político de 2022 para que a gente derrote Bolsonaro”.
Cleusa Santos, professora aposentada da Escola de Serviço Social, também estava no ato e passou pela banquinha da AdUFRJ. “Esta data é um marco histórico. No pós-pandemia, estamos resgatando a disposição e possibilidade de estarmos nas ruas”, afirmou. A docente, que já foi diretora e presidente da AdUFRJ, comentou sobre a pouca adesão dos trabalhadores. “Retomar o processo democrático já tão destruído tem mostrado algumas dificuldades. Nem todos que são contra o atual governo voltaram para as ruas. Precisamos que este seja um momento de retomada dessa mobilização”.
A coordenadora-geral do Sintufrj, Neuza Luzia Pinto, destacou o caráter simbólico da data. “O ato de hoje nos indica que é na rua que os trabalhadores vão conseguir derrotar Bolsonaro”, disse. “Desejo que hoje seja um marco para que a gente atinja a consciência crítica dos trabalhadores. São necessários mais atos, muitas manifestações para organizar a classe”.
Outras associações docentes do Rio de Janeiro participaram da manifestação. Uma delas foi a Adur-RJ, da Universidade Federal Rural. A presidente, professora Elisa Guaraná, chamou atenção para o processo eleitoral que se avizinha. “Bolsonaro não está derrotado. Essa unidade não pode ser só ‘fora, Bolsonaro’. É preciso indicar caminhos”, alertou a docente. “Precisamos mostrar que a gente defende um Brasil que combate as desigualdades. A gente precisa colocar os pobres na pauta. Uma massa da população brasileira enfrenta a fome! Isso é muito grave”, afirmou a professora. “Nossa luta é pela democracia e em defesa da sociedade brasileira”, concluiu.
Por Beatriz Coutinho
A UFRJ conquistou seu lugar entre gigantes à mesa de debates sobre o clima da Terra. Pesquisadores da Coppe levaram o Brasil ao patamar de primeiro país em desenvolvimento a elaborar um modelo, o Coffee, capaz de propor soluções para mitigar os efeitos das mudanças climáticas em um cenário global. O modelo foi publicado no dia 4 de abril no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês). Os IMPs (Illustrative Mitigation Pathways), ou cenários de mitigação ilustrativos, são essenciais para gerar modelos de soluções possíveis, que podem dar suporte a reuniões climáticas e decisões políticas. Para o relatório deste ano do IPCC, dos 1.600 modelos coletados, foram escolhidos cinco, um deles o da Coppe.
O Coffee foi escolhido para gerar soluções para um cenário conhecido como IMP-Neg (Negative Emissions). “É a história de um mundo onde você não faz tanto esforço para reduzir violentamente a demanda por combustíveis fósseis, porque você conta que para sempre vai fazer uso crescente de tecnologias de emissão negativa, que a grosso modo é tirar CO² da atmosfera”, explica o professor Roberto Schaeffer, do Laboratório Cenergia, do Programa de Planejamento Energético (PPE) da Coppe, e coordinating lead authors do capítulo três do relatório do IPCC 2022.
A escolha dos modelos é feita a partir dos futuros possíveis que o IPCC quer analisar. “Chegou-se à conclusão que um dos cenários do Coffee era o mais interessante, porque ele tinha um equilíbrio razoável entre reflorestamento e produção de biomaterial, que é uma maneira de sequestrar carbono”, diz o professor.
Da sigla em inglês para Computable Framework For Energy and the Environment, o Coffee é um Modelo de Avaliação Integrada (IAM, em inglês) global. Esses modelos avaliam as melhores opções para encontrar soluções de menor custo, levando em consideração todas as restrições possíveis. “Por exemplo, em um cenário a longo prazo, no qual o biocombustível se mostre importante, o modelo integrado vai enxergar que isso significa mais áreas para cultivo de fontes para esse combustível. Com isso, vão sobrar menos áreas para a produção de alimentos, o que pode gerar impacto na indústria de refino, que por sua vez vai precisar de mais fertilizantes para que áreas menores consigam produzir mais alimentos”, ilustra Schaeffer.
A ideia surgiu ainda durante as discussões do Acordo de Paris (2015), quando o professor Schaeffer e seu grupo de pesquisa questionavam se as propostas apresentadas pelo Brasil eram compatíveis com o objetivo maior do tratado, que era estacionar a temperatura mundial entre 1,5ºC e 2ºC acima da temperatura pré-industrial (1850-1900).
Schaeffer sabe que as vitórias na Ciência não são imediatas. “Isso é produto, no meu caso pelo menos, de um investimento de mais de 20 anos”, se emociona Scheaffer. O professor faz questão de pontuar que ter um trabalho reconhecido mundialmente é muito importante para o Brasil, para a UFRJ, para a Coppe e para o seu grupo de pesquisa. A conquista chama atenção para a competência dos cientistas brasileiros. Ao final, o professor brinca: “Os IMPs são como menus de opções. E dentro desse menu, um dos pratos principais foi preparado aqui pela cozinha da Coppe”.
Criado em 1988, o IPCC concentra-se em estudos integrados sobre o clima, para entendê-lo e saber quais caminhos tomar. Seu produto é um relatório estruturado por capítulos. “O consumidor final desse relatório são governos. Teoricamente, essa informação é o que vai pautar as negociações climáticas do mundo nos próximos seis ou sete anos”, explica Schaeffer. “O Acordo de Paris, em 2015, foi 100% baseado no relatório de 2014”.
Para a professora Joana Portugal, o IPCC constrói uma ponte entre governos e Ciência. Enquanto políticos pensam a curto prazo, geralmente visando à reeleição, cientistas trabalham a longo prazo. É nessa lacuna que entram os trabalhos do Painel. “Esses relatórios integram e sintetizam as mensagens-chave que nós temos para oferecer sobre a Ciência do clima para um decisor político de forma útil”, pontua a professora. Em 2017, Joana trabalhou no IPCC, em seu ciclo de relatórios científicos especiais, concentrando-se na captação de gases para redução do efeito estufa a médio prazo, em 2050.
Joana, que é pesquisadora do Laboratório Cenergia, vê como um sinônimo de independência o fato de o Brasil ser o primeiro país em desenvolvimento a integrar os relatórios do IPCC. “Não ficamos dependentes de terceiros, conseguimos internamente trabalhar com modelos globais, que atendem às necessidades do país”, ressalta. “É entender o papel do Brasil no mundo e qual é o papel do mundo no Brasil”.
Suzana Kahn, vice-diretora da Coppe, credita o papel de destaque do Brasil na elaboração de cenários globais de mitigação a muitos anos de pesquisa na área. Ex-secretária de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente (2008-2010), a professora lembra que a Coppe vem há muito tempo atuando ativamente nos debates políticos e científicos sobre o tema, incluindo a participação na elaboração dos relatórios do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, o PBMC, do qual ela é presidente do Comitê Científico. “Nos dá a legitimidade junto a todos os países para debater o tema de igual para igual”, argumenta.