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WhatsApp Image 2022 09 05 at 15.54.43A pandemia e as mudanças climáticas acenderam um alerta sobre a relação da humanidade com o planeta, que parece chegar perto do seu limite. Parte considerável da sociedade olha para o futuro para buscar soluções, o que inclui planos megalômanos de bilionários do Vale do Silício de colonizar o espaço. Ailton Krenak propõe algo diferente, a busca por uma resposta na história. Não na história da colonização, aquela ensinada nas escolas, mas com os povos originários das Américas e suas lições sobre a relação com a natureza.
Filósofo, ambientalista, poeta e escritor, Krenak reúne habilidades que eram comuns em filósofos da antiguidade europeia ou renascentistas, mas uma perspectiva completamente diferente. Líder indígena da etnia Krenak, ele conjuga sua inteligência com a maneira indígena de ver o mundo e as coisas e de pertencer à terra. Krenak participou do Festival do Conhecimento, em conversa mediada pela professora Ivana Bentes, e falou sobre como essa perspectiva pode salvar a humanidade.
“Já há algumas décadas estamos tentando estabelecer essa espécie de comunicação entre mundos, essa tradução do pensamento de povos originários aqui no continente”, disse Krenak logo em sua abertura, citando ainda Eduardo Galeano, que sempre defendeu que o pensamento dos povos originários do continente ressoasse além das fronteiras da América Latina.
“A ocupação colonial foi tão vasta que substituiu muitos modos de viver por outras organizações, outros modos de assentamento”. Krenak conta que, apesar da colonização brutal, as cosmovisões de muitos povos originários andinos persistem e continuam sendo passadas adiante dentro das suas comunidades, mesmo estando fora de bibliotecas. “Isso é resultado de uma corajosa persistência e de uma persistente maneira de transmitir de geração em geração saberes que não estão nos livros ou nas bibliotecas”, ressaltou.
Krenak conta que esses povos hoje falam sobre um tempo anterior à chegada dos europeus, quando o mundo era outro. “Houve, do Panamá à Terra do Fogo, uma experiência vigorosa de povos vivendo e compartilhando vários ecossistemas. Toda essa região compartilhada por ideia de estar no mundo que era expresso como o amplo território do Tahuantinsuyo, um período de uma experiência social, política e cultural de uma importância rara”, explicou. “Havia uma ecologia e um cuidado com tudo que constituía o entorno dos assentamentos humanos. Toda aldeia estava ecologicamente encaixada onde a cultura e o modo de produzir guardavam uma coerência reverente e sagrada com cada território”, acrescentou.
Na cosmovisão desses povos, com a qual Krenak concorda, tudo é natureza, inclusive os seres humanos. A ideia remete à Pachamama, a maneira como os povos andinos viam o mundo. A Pachamama é a natureza em sua capacidade de criar e destruir, e os seres humanos fazem parte dela. “Se não somos natureza, não temos como experimentar a nossa relação com os outros seres, estaríamos deixando de ser essa experiência sensível da vida e estancando essa experiência de milhares de anos. Vamos nos tornando uma espécie de ciborgue”, explicou. “Estamos falando da nossa vinculação profunda com a vida no planeta Terra, no organismo de Gaia, na Pachamama”, acrescentou.
E é exatamente esse equilíbrio entre os povos originários e a natureza que apresenta uma saída para a humanidade. O que Krenak defende é um resgate desse modo de ver o mundo, entendendo o ser humano como parte da natureza, e não como o seu senhor. “Acredito que precisamos despertar uma consciência entre o divórcio que estamos produzindo e entre a experiência dos humanos e todos os outros seres que constituem o organismo da Terra. Se formos nos transformando em ciborgues, poderemos habitar qualquer outro lugar. Não vamos precisar desse maravilhoso organismo da Terra”, defendeu. “O pensamento antropocêntrico surgido na Modernidade nos faz acreditar que podemos dominar a vida no planeta, quando na verdade estamos perdendo a qualidade da experiência de estar vivo e a nossa comunhão com bilhões de outros seres que dançam a experiência da vida aqui na Terra e no cosmos”, disse.

Como desmonetizar discursos de ódio

WhatsApp Image 2022 09 05 at 15.54.43 1O combate à desinformação e ao discurso de ódio nos meios digitais ganhou destaque na mesa sobre o Sleeping Giants Brasil, movimento que desmonetiza as fontes desses conteúdos. “Com a distribuição automática de anúncios por grandes plataformas como Facebook e Google, empresas e marcas podem acabar patrocinando conteúdo nocivo”, explicou Mayara Stelle. “Nosso trabalho é alertar essas empresas e cortar o financiamento da desinformação”.

Professores dão aula sobre varíola dos macacos

Contexto da epidemia, sintomas da doença e como é feito o diagnóstico. Pesquisadores da UFRJ deram um panorama completo sobre a varíola dos macacos. A resposta rápida da UFRJ à epidemia foi destacada. “Estruturamos nosso núcleo da covid para a monkeypox, para triagem, diagnóstico e orientação aos pacientes”, disse a professora Terezinha Castiñeiras. Participaram ainda os professores Amilcar Tanuri, Clarissa Damaso e Rafael Galliez.

Conhecimento, diversão e muita música

Apresentações musicais presenciais fizeram parte da programação de cada dia do festival. A Escola de Música da UFRJ, que comemora 174 anos estaWhatsApp Image 2022 09 05 at 15.54.43 2 semana, realizou a maioria delas. Logo no primeiro dia, o Salão Leopoldo Miguez recebeu a Orquestra Sinfônica da UFRJ. Na quinta (dia 1º), foi a vez do pianista Rafael Ruiz. Já no Teatro de Arena, na Praia Vermelha, houve show do DJ Goranmo, da banda Biltre e de Marina Iris.

Eméritos debatem a democracia e o comum

“Muito mais que nas altas esferas, a democracia está no cotidiano”, declarou o professor Muniz Sodré, emérito da ECO, durante debate com os professores Cristiano dos Santos e Raquel Paiva, também emérita. O tema da mesa foi “Crises da democracia e o comum”. “Mesmo bombardeada por um governo despótico, a academia mostra toda a potencialidade de seus 102 anos de resistência”, disse a professora, em referência ao Festival do Conhecimento.

WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.31.57 1Estela Magalhães

"Só a UFRJ consegue articular e reunir da ministra Cármen Lúcia ao nosso querido Milton Cunha. Os saberes jurídicos e os saberes da festa e do Carnaval, tudo cabe nesse espectro tão amplo”, disse a pró-reitora de extensão, professora Ivana Bentes, na abertura do Festival do Conhecimento, na segunda-feira (29). Em sua terceira edição, o maior evento virtual da universidade reuniu especialistas de diversas áreas e convidados especiais em mais de 800 atividades virtuais por cinco dias.
“A extensão existe nesse lugar da diversidade, do encontro de saberes e da busca pelo que ainda não está institucionalizado”, completou Ivana. “Estamos juntos nestes cinco dias de Carnaval, conhecimento e folia!”, reforçou o carnavalesco Milton Cunha, embaixador do festival.
O tema da edição, “Do Ancestral ao Digital”, propôs uma reflexão sobre as diferentes visões de mundo contemporâneas e a percepção do passado como guia para o futuro. “Nossas pegadas precisam ser reinterpretadas nesse momento de encruzilhada da história, onde vamos constituir como chegamos até aqui e escolher o melhor caminho do ponto de vista político e simbólico”, afirmou a vereadora Tainá de Paula (PT). “Buscar a nossa ancestralidade é muito importante”.
Mas não foi só festa do conhecimento. A mesa de abertura também representou um ato em defesa das universidades públicas. “É nas universidades que aprendemos a lidar com o contraditório e a dialogar. Nós formamos profissionais qualificados, mas antes disso, formamos cidadãos e cidadãs críticos e competentes, fundamentais para a sociedade”, disse a reitora Denise Pires de Carvalho.
O professor João Torres, presidente da AdUFRJ, lembrou dos ataques do governo à Ciência e à democracia. “O momento exige que os professores, cientistas e intelectuais explicitem em alto e bom tom o valor do pensamento crítico, o peso das evidências e a importância dos dados”, disse.
Já a ministra do STF Cármen Lúcia celebrou o papel das universidades na criação de diálogos e como anfitriãs da diversidade. “A universidade é algo que se abre para o mundo e permite que a gente aprenda e ensine a convivência com o diferente”, disse.
A reitora da Federal de Rondônia, Marcele Pereira, outra convidada da mesa de abertura, comemorou a integração entre as universidades. “Desde o primeiro Festival do Conhecimento já ficamos todos muito maravilhados com a capacidade de articulação e de reunir pessoas diferentes, com a riqueza das reflexões”, lembrou.
A primeira edição do festival aconteceu em 2020, no início da pandemia de covid-19, e foi pioneira na produção de eventos virtuais. Ela teve como tema “Universidade Viva”, em celebração ao centenário da UFRJ. No ano seguinte, o título foi “Futuros Possíveis”, com destaque para o enfrentamento da pandemia.

SINDICATO DEVE SER ESPAÇO DE ESCUTA E ACOLHIMENTO

WhatsApp Image 2022 09 02 at 16.41.48A discussão dos rumos do sindicalismo docente mobilizou uma das mesas do festival nesta sexta-feira (2), dois dias após a Assembleia da AdUFRJ aprovar o apoio à candidatura Lula. Para Mayra Goulart, vice-presidente da associação e coordenadora do Laboratório de Eleições, Partidos e Política Comparada, uma decisão mais que acertada.
“Quando nós atuamos como representantes de um sindicato, podemos falar a partir deste corpo (de pessoas) particular. Então por que estamos nos manifestando em uma eleição geral? Porque esta eleição geral tem impacto imediato e direto em nossas vidas”, afirmou a docente. Mayra defendeu que a AdUFRJ se posicione em qualquer eleição indicando o candidato que melhor atenda aos interesses dos professores, mas destacou a gravidade do pleito atual. “Nesta eleição, o que está em jogo é a manutenção do devido processo legal. É a possibilidade de haver novas eleições. É a manutenção da possibilidade de existir sindicato. Nós, professores, temos um modo de vida que está ameaçado”, alertou.
Ex-diretor da AdUFRJ, o professor e cientista político Josué Medeiros concordou. “É a manutenção da democracia e da universidade pública. Ou seja, daquilo que caracteriza a nossa missão. Também está em jogo a liberdade de cátedra”, observou o coordenador do Observatório Político e Eleitoral e do Núcleo de Estudos sobre a Democracia Brasileira.
Mediador do debate e presidente da AdUFRJ, o professor João Torres ponderou que, caso a chapa Lula-Alckmin vença as eleições, a perspectiva é fazer uma luta pela esquerda para ampliar direitos dos docentes. “É a questão da aposentadoria, principalmente para os jovens, que têm uma carreira diferente da minha, por exemplo”.

COMO ATRAIR FILIADOS
A dificuldade de atrair novos filiados para o sindicato tmbém repercutiu na mesa. “Os professores estão doentes, cansados, desvalorizados, com problemas psicológicos. Isso tudo cria obstáculos para que façam parte do movimento sindical”, observou Mayra. “Ontem fui fazer um evento no IFCS e não havia um cabo para conectar o data-show. A sala tem cheiro de mofo. Só tem banheiro no terceiro andar. O sindicato tem que ser um lugar de escuta e acolhimento”, completou.
Mayra destacou o papel do Observatório do Conhecimento, rede de associações da qual faz parte a AdUFRJ em defesa da Educação e da Ciência públicas, para ajudar a criar melhores condições de trabalho aos docentes. “Um desafio da AdUFRJ hoje, que se diferencia de outros sindicatos, é ter particular atenção às verbas da Ciência e Tecnologia e atuar em defesa disso”.
Também é importante que o sindicato se conecte com dinâmicas vividas no interior da categoria, argumentou Josué. Neste sentido, o docente elogiou outra iniciativa do Observatório do Conhecimento: a produção de um documentário (Ciência: Luta de Mulher) que mostra diferentes trajetórias e dificuldades de mulheres pesquisadoras. “Uma mulher, quando fica grávida ou tem um filho, acaba sendo punida nos editais, porque não consegue acompanhar a produtividade dos homens”, disse Josué. (Kelvin Melo)

WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.31.57Maior evento virtual da UFRJ, o Festival do Conhecimento começa na segunda (29). A abertura, às 14h30, contará com a participação da ministra do STF Cármen Lúcia e outros convidados para um Ato em Defesa das Universidades Públicas — o professor João Torres será o representante da AdUFRJ. Até o dia 2, estão agendadas cerca de 800 atividades. Realizado pela pró-reitoria de Extensão (PR-5), o Festival celebra este ano a abertura da produção de conhecimento científico aos saberes ancestrais de matrizes africanas e indígenas e às tecnologias sociais e digitais em nome de um bem comum.

I Jornada Mulheres Eleitas

O Laboratório de Eleições, Partidos e Política Comparada (Lappcom) realiza a I Jornada Mulheres Eleitas, no dia 1º. O evento, a partir das 10h, está marcado para a sala 107 do IFCS. No encerramento, às 16h, será exibido o documentário “Ciência: Luta de Mulher” produzido pelo Observatório do Conhecimento — rede de associações docentes da qual faz parte a AdUFRJ. “O objetivo do evento é discutir, neste contexto eleitoral, a sub-representação das mulheres na esfera política e também na esfera social. A sub-representação política é consequência de uma estrutura social que coloca a mulher em espaço subalterno”, afirma a coordenadora do Lappcom e vice-presidente da AdUFRJ, professora Mayra Goulart. As inscrições gratuitas podem ser feitas pelo link forms.gle/EVQ7LS1Nggt2hmZ28 ou no local.

WhatsApp Image 2022 09 05 at 15.53.07 1Foto: Fernando SouzaNicolas Vilete, 18 anos, morador de Nilópolis, gosta de jogar Minecraft e League of Legends, adora animes e mangás, e não dispensa a pizza com os amigos. Seria um perfil bastante comum para a idade, mas com uma diferença importante: o jovem coleciona medalhas em competições nacionais e internacionais de matemática. Na mais recente delas, no fim do ano passado, faturou um ouro na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP).

“Sempre gostei de matemática. Sempre fui bem nas provas. Quando terminei o ensino médio, decidi continuar”, diz Nicolas, hoje no segundo período do bacharelado do Instituto de Matemática da UFRJ. “Em competição, não basta saber o conteúdo. Tem que desenvolver a ideia. Pensar nisso é a parte mais legal da matemática”.

O feito de Nicolas não é pequeno no país que apresenta um dos piores desempenhos do mundo no aprendizado da matéria. O mais recente estudo do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) mostra que apenas 2% dos estudantes brasileiros do ensino fundamental alcançaram os níveis 5 ou 6 de proficiência, que são os mais altos da instituição.

Além do gosto pessoal pela matéria, um projeto do Colégio Estadual Marechal Zenóbio da Costa, em Nilópolis, foi decisivo para a performance de Nicolas. “Era a ‘sala de aula invertida’. A ideia é que o professor passa uma prova, normalmente de um nível mais difícil que o nosso. Quem resolve uma questão ensina os colegas. É invertido porque a gente faz o papel de professor. E dizem que ensinando você aprende bastante”, afirma Nicolas.
Aprendeu bastante e colheu frutos. A medalha da OBMEP lhe garantiu o direito de se inscrever em um Programa de Iniciação Científica e Mestrado (Picme), que vai render R$ 400 mensais.

DEZENOVE BOLSISTAS
O professor Sérgio Ibarra é o responsável pelo programa Picme na UFRJ. “O primeiro critério de participação é ser medalhista, mas não necessariamente como aluno da Matemática”, informa. Hoje, a UFRJ possui 19 bolsistas da modalidade, sendo 11 de cursos do instituto. Mas há alunos das engenharias, da Física Médica e até de Comunicação Visual Design. Nicolas entrou na última leva, junto de outros três colegas.

Os medalhistas já ingressam na universidade com uma base boa da matéria. O papel da instituição é apresentar possibilidades interdisciplinares. “Ele não fica só pensando na matemática pura. Pensa também no que pode levar para a sociedade. O ganho maior está por aí. Abre o mundo para eles”, afirma Ibarra. “Meu trabalho principal é apontar uma direção. O aluno é encaminhado para um colega orientador que vai combinar o processo de iniciação científica com cada um”.

Desde o início do programa em 2009, a UFRJ já teve 158 bolsistas. As olimpíadas de matemática premiam centenas de jovens em cada edição. Para se inscrever no Picme, basta estar regulamente matriculado em alguma instituição de ensino superior e ter recebido uma medalha (de ouro, prata ou bronze) em qualquer edição da olimpíada. “Em geral, as notas são muito próximas. Até como uma forma de incentivo, a OBMEP faz uma ampla distribuição de medalhas”, avalia Ibarra.

O Picme também serve como uma preparação para o mestrado na Matemática. “Os alunos que ganham bolsa têm rendimento bem alto e, para entrar no mestrado, fica mais fácil. Mas não é algo automático. É necessário fazer as provas da seleção”.

Assim como centenas de outras iniciativas de Educação e Ciência, o programa sofre com o subfinanciamento no governo Bolsonaro. “Antigamente, a média era de 25 bolsas por ano. Este semestre, tive que recusar quatro medalhistas, de áreas paralelas à Matemática. Por exemplo, da Medicina. Não há bolsas suficientes”. O Picme também previa pagamento de bolsas de mestrado, via Capes. Mas elas estão suspensas desde 2020.

AÇÃO MOTIVADORA
Diretora da AdUFRJ e professora do Instituto de Matemática, Nedir do Espirito Santo é uma entusiasta da OBMEP. “Certamente tem sido a maior ação motivadora para o estudo da Matemática entre alunos da educação básica, envolvendo professores das escolas que se empenham em atividades diversificadas e diferenciadas no ensino, conduzindo seus alunos ao sucesso”, afirmou.

Nedir observa que a iniciativa ajuda a formar novos quadros para a comunidade científica. “Em geral, os medalhistas fazem parte de grupos de alunos que se destacam na universidade com excelente desempenho e adentram a vida acadêmica participando em atividades de iniciação científica e projetos, que são os primeiros passos para se tornarem pesquisadores”. Ela completa: “Parabenizo Nicolas pela medalha. Quem sabe, tenhamos, no futuro, um grande Matemático? Parabenizo também o Colégio Estadual Marechal Zenóbio da Costa, onde estudou, e os professores que o ajudaram na preparação”.

WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.17.33 4O Jornal da AdUFRJ desta semana apresenta o debate sobre a construção de um novo espaço multicultural na Praia Vermelha. A ideia da reitoria é demolir o antigo Canecão e dar lugar a um equipamento sofisticado, que atenda aos interesses da universidade e do mercado cultural carioca. Detalhes do projeto foram apresentados nesta quinta-feira (25), no Conselho Universitário. O local terá espaço para 1.786 lugares na modalidade “teatro”, e até 4 mil no formato “show”. A proposta abrange apresentação de concertos e óperas e uma sala destinada à guarda de cenários. A universidade teria direito ao uso do palco principal por 50 dias no ano. Também foi pensado um espaço de exposição da UFRJ com 600 m2.
A nova casa de espetáculos deve ser construída no Campinho, apelido do campo de futebol administrado pela Escola de Educação Física. Já a área onde hoje fica o que sobrou do Canecão deve ser aberta ao público, com a criação de uma praça e a demolição dos muros que cercam aquele trecho do campus. “Queremos abrir o campus da Praia Vermelha para a cidade, para a sociedade”, conta o vice-reitor da UFRJ, professor Carlos Frederico Leão Rocha. “É uma mudança completa de concepção daquele espaço”.
A gestão da nova casa de shows será privada, a princípio com concessão de 25 anos. Em contrapartida, quem adquirir o direito de gerir o espaço multiuso deverá investir na construção de um bandejão, com capacidade para 2.500 refeições por dia, e um prédio de 8 mil m2, com até 80 salas de aula.
O restaurante deverá ficar nas imediações da nova casa de shows. Já para o aulário há duas possibilidades: a primeira seria construí-lo no centro do campus. O problema é que no local hoje existem o atual aulário de contêineres, o anexo do Centro de Filosofia e Ciências Humanas, a garagem e o antigo prédio da Associação Latino-Americana de Física. Todos precisariam ser demolidos, o que desalojaria unidades como a Biblioteca do CFCH e o NEPP-DH. “Outra alternativa discutida é utilizar a área do antigo bingo para a construção desse prédio”, conta o vice-reitor. “Nesse cenário, sai o aulário ‘de lata’, mas os outros edifícios permanecem”, explica Leão Rocha.
O dirigente conta que a classe artística da universidade discutiu o projeto e propôs mudanças para que o espaço cultural fosse adaptável a todas as formas de arte presentes na universidade. “Por exemplo, o prédio tem 20 metros de altura desde a base do solo porque para uma ópera ou um concerto é preciso uma área maior para a projeção dos instrumentos. Fizemos a conta e seriam necessários pouco mais de 19 metros desde o solo”, conta o vice-reitor. “Isso repercutiu na mudança também do gabarito da região, que antes limitava as edificações a 20 metros de altura a partir da lâmina d’água, que está a cerca de dois metros abaixo do nível do terreno”, justifica.WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.19.06
O projeto atual nasceu em 2018, ainda na gestão do professor Roberto Leher, mas foi “profundamente modificado” pela atual administração da universidade. “A Praia Vermelha não entra mais como um ativo. Também retiramos todos os onze terrenos do Fundão que seriam destinados à iniciativa privada e não há hipótese de demolição do Instituto de Psiquiatria”, afirma o vice-reitor.
Apesar das mudanças, o caminho será longo até que o projeto saia efetivamente do papel. Isto porque muitos grupos estão descontentes com a condução da discussão e com a concessão da futura casa de espetáculos à iniciativa privada. O professor Romildo Bomfim, ex-diretor da AdUFRJ e integrante dos coletivos “Salva UFRJ Praia Vermelha” e “Movimento em Defesa do ‘Campinho’” questiona a transparência das discussões. “A partir do momento em que a reitoria não disponibiliza os contratos, os aditivos, os estudos de impacto ambiental, de vizinhança, empresas interessadas no empreendimento, isto, por si só, já denota falta de transparência. E vale ressaltar que não foi por falta de solicitação, de pedido”, alega o docente. “Por que a reitoria não torna públicas as negociações, tratativas e os seus resultados, na página da UFRJ?”, questiona.
Um documento subscrito por um dos movimentos que o professor participa, além do Sintufrj e diversos centros acadêmicos da universidade foi protocolado no dia 24, na reitoria. “Nosso requerimento solicita a interrupção imediata desse projeto para que a comunidade acadêmica tenha tempo de se debruçar sobre ele”, defendeu o servidor Fábio Marinho, diretor do Sintufrj, durante o Consuni.
A reitora rebate veementemente os argumentos da oposição. Durante o Consuni, Denise Pires de Carvalho informou que até o final da próxima semana todos os documentos sobre o atual projeto serão divulgados no site da UFRJ e que a discussão continuará. “O projeto está em construção. Não haverá obstrução do debate. Precisamos devolver o Canecão para o Rio de Janeiro”, afirmou. “Não há prazo definido para o fim da discussão”, completou o vice-reitor.
Os estudantes criticaram o que chamaram de privatização da universidade. “Em que momento o fortalecimento do ensino público passa por fornecer espaços públicos à gestão privada?”, questionou Lucas Peruzzi.
Eduardo Raupp, pró-reitor de Planejamento e Finanças, rebateu essa e outras falas nessa direção. “Se a gente levar para o debate da privatização, a gente não vai ter transporte na universidade, a gente não vai ter restaurante. Porque são concessões a empresas privadas”.
Nas próximas edições, o Jornal da AdUFRJ apresentará outras faces dessa discussão.

ANTES
WhatsApp Image 2022 08 29 at 10.17.33 5Foto: Diego MendesEspaço está abandonado há mais de uma década

Desde 2010, quando a UFRJ conseguiu reaver a posse da então casa de espetáculos Canecão, o imóvel está abandonado e em deterioração. Antes disso, foi parcialmente destruído por dentro pelos antigos proprietários da marca. Além dos recursos escassos para reabilitar o espaço, havia também um impedimento legal para reformas e mudanças na edificação. Existia uma lei estadual, de 1999, que tombava o Canecão. A universidade só conseguiu o destombamento do espaço em junho de 2019, depois da apresentação dos primeiros estudos e projetos de revitalização da área e construção de um novo espaço de cultura no local.

 

DEPOIS
UFRJ quer construir novo centro multicultural e praça

O terreno onde hoje está o decadente prédio do Canecão dará lugar a uma praça arborizada e aberta ao público. Os muros que cercam o campus da Praia Vermelha serão postos abaixo para abrir a universidade à cidade. Esses são os planos contidos no projeto apresentado pela reitoria nesta semana. A edificação, com 20 metros de altura, e a praça serão construídas numa área de 15 mil m2 e utilizará uma parte do terreno onde existe o campo de futebol da Escola de Educação Física e Desportos. Conhecido como “campinho”, o local abriga dois projetos de extensão e é recorrentemente alugado pelo Botafogo.


O novo equipamento cultural prevê dois formatos: “modo teatro”, com capacidade para 1.786 lugares, e “modo show”, onde caberão até quatro mil pessoas. A arquitetura do ambiente principal de eventos também se adaptaria a apresentações de óperas e concertos realizados pela Escola de Música

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