As receitas previstas para universidades e institutos federais, Capes e CNPq, além de institutos de educação inclusiva, seguem insuficientes para o próximo ano. O chamado “Orçamento do Conhecimento”, calculado em R$ 17,29 bilhões, é 0,12% superior à proposta orçamentária (PLOA) deste ano, mas corresponde quase à metade do que era em 2014: R$ 32,51 bilhões, em valores corrigidos pela inflação.
As informações são do relatório produzido pelo Observatório do Conhecimento — rede de associações docentes coordenada pela AdUFRJ. O documento, cuja íntegra pode ser lida AQUI, foi divulgado dia 24, em audiência na Câmara dos Deputados (veja matéria ao lado).
“O governo Lula tem feito uma recomposição, mas em valores muito aquém dos necessários para recuperar o sistema federal de educação superior e de Ciência, Tecnologia e Inovação”, afirma a presidenta da AdUFRJ e coordenadora do Observatório, professora Mayra Goulart.
Contribui para este preocupante cenário o crescente peso atribuído às emendas parlamentares. Somente este ano, considerando apenas as universidades, elas totalizaram aproximadamente R$ 571 milhões. Em 2014, não passavam de
R$ 148 milhões, também em valores corrigidos pela inflação.
“Políticas públicas deveriam contar com custeio sólido entre os exercícios fiscais. No entanto, conforme já estamos destacando há algum tempo no Observatório, elas estão cada vez mais dependentes de recursos incertos”, diz Mayra.
UNIVERSIDADES
Para 2026, o governo planejou R$ 7,85 bilhões para o orçamento discricionário das universidades federais. Este valor equivale a 45,3% do que foi destinado há uma década.
Deste total, R$ 7,51 bilhões são para as despesas correntes. Ou seja, para o funcionamento do ensino, pesquisa e extensão, assistência estudantil e fomento das ações de graduação e pós-graduação. O número representa 65,87% das despesas correntes em 2014.
Já a parcela destinada a investimentos nas universidades praticamente desapareceu do orçamento do conhecimento, na última década. Em 2026, o valor previsto é de R$ 335,9 milhões, equivalente a apenas 5,67% dos investimentos em 2014 (ou R$ 5,92 bilhões). Números que se refletem na infraestrutura precária nas instituições, realidade bem conhecida da comunidade da UFRJ.
A única rubrica que parece ter se salvado dos cortes, ao longo dos últimos anos, é a de assistência ao estudante do ensino superior. Houve uma redução média de apenas R$ 15,5 milhões entre 2014 e 2026. Se comparada à proposta orçamentária deste ano, a ação receberá até 2,94% a mais e ficará em
R$ 1,38 bilhão. Mas são números que enganam.
“No período, a universidade se expandiu e inseriu parcelas da sociedade que não tinham acesso à educação superior. O orçamento da assistência estudantil deveria aumentar, em vez de permanecer estagnado”, explica Letícia Inácio, economista responsável pelos estudos do Observatório do Conhecimento.
Em 2026, Capes e CNPq receberão, respectivamente, R$ 4,93 bilhões e R$ 1,57 bilhão, se não houver mudança na proposta do governo. A Capes até ganha um pouco a mais que o valor reservado na PLOA deste ano, de R$ 4,9 bilhões. Mas o CNPq sofre ligeira perda, pois a PLOA deste ano era de R$ 1,63 bilhão. Mas ambas agências ganharão bem menos que os R$ 10,83 bilhões e R$ 3,43 bilhões previstos em 2014.
Já os Institutos Federais têm vivido o mesmo processo de redução orçamentária das universidades, com uma recomposição lenta ao longo dos anos mais recentes. A PLOA do próximo ano reserva R$ 2,85 bilhões para o funcionamento destas instituições contra R$ 5,92 bilhões de 2014.
REGRAS RESTRITIVAS
As regras fiscais de execução orçamentária, restritivas desde o governo Temer, são outro obstáculo. Há pisos constitucionais de repasses para Educação e Saúde, mas não existem mecanismos legais para proteger os recursos específicos da educação superior, por exemplo. “Temos feito algumas pesquisas que vão na direção de estabelecer um mínimo de repasse com base em um percentual da arrecadação, como acontece nas estaduais paulistas. É um debate muito difícil porque a posição dos parlamentares e até do governo, no geral, é contrária à indexação das despesas da educação à arrecadação”, lamenta Letícia.
Enquanto não há uma mudança estrutural do orçamento do conhecimento, a comunidade volta suas preocupações para a votação do orçamento 2026, o que deve ocorrer até 22 de dezembro. “Até lá, o Observatório continuará pressionando o parlamento em defesa das universidades e da pesquisa nacionais”, afirma Mayra.
CAPES RESPONDE
Presidenta da Capes, a professora Denise Pires de Carvalho atribui a queda do orçamento da agência à extinção do “Ciência sem Fronteiras”, considerando o início da série estudada pelo Observatório. De acordo com os dados enviados à reportagem, o programa de incentivo à internacionalização chegou a representar R$ 1,8 bilhão da dotação da Capes em 2014 e
R$ 3,2 bilhões em 2015.
A professora destaca o trabalho de recomposição orçamentária da agência pelo atual governo, iniciada com a negociação da Emenda Constitucional da Transição. A legislação viabilizou recursos novos para a agência logo no primeiro ano da gestão Lula. “Em 2023, o orçamento teria sido muito menor”, disse.
Desde então, a dotação da Capes tem superado os
R$ 5 bilhões, contra R$ 3,5 bilhões do último ano do governo Bolsonaro.
Já em relação às universidades, Denise esclarece que a redução se dá após a conclusão do programa de reestruturação e expansão das universidades (Reuni). “No caso das universidades, até 2017 havia verba que terminou, obviamente, após as inaugurações”, completa.
O Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação não respondeu ao questionamento da reportagem até o fechamento desta matéria.