A UFRJ e toda a comunidade científica brasileira estão de luto. Um dos mais respeitados virologistas do país, o professor Amilcar Tanuri nos deixou no dia 26 de setembro, aos 67 anos. Titular do Departamento de Genética do Instituto de Biologia, Tanuri era reconhecido mundialmente por suas pesquisas sobre HIV e arboviroses. O docente teve importante contribuição para a associação entre o zika vírus e a microcefalia em bebês, além de ser uma das principais vozes pró-vacinação do país, durante a pandemia de covid-19. Era chefe do Laboratório de Virologia Molecular da UFRJ, que se tornou referência na testagem de covid padrão ouro no Brasil. O Jornal da AdUFRJ e colegas relembram a trajetória do pesquisador e destacam seu legado para a ciência.
‘Amilcar tem tantas e lindas facetas. Foi um pai incrível, que sempre apoiou os filhos em todas as escolhas. Era um filho amoroso, que nunca deixou de cuidar de sua mãe. Foi um pai zeloso também para os meus filhos. Era apaixonado pelo nosso neto”. Foi assim, com ternura e tristeza, que Andréa Tavares, viúva do professor Amilcar Tanuri, o descreveu poucos dias após perder o companheiro. “Ele sempre estava disposto a ajudar, independentemente de quem fosse. Ajudava inclusive a quem não conhecia. Na pandemia, nossa casa parecia um ambulatório. Ele não deixava ninguém sem resposta, ninguém sem atendimento, ninguém sem ajuda”, recorda. “Era muito ativo. Uma mente brilhante e generosa”.
O relato é corroborado por colegas e amigos que conviveram com o pesquisador. “Amilcar era um exemplo de dedicação e inteligência, inspirou várias gerações de pesquisadores. Era também pessoa com ótimo senso de humor, coisa tão importante em nossos ambientes muitas vezes tão estressantes”, resumiu o 2º vice-presidente da AdUFRJ, professor Antonio Solé, colega de Tanuri no Instituto de Biologia.
Os legados para a ciência e para a UFRJ são diversos. Na segunda metade da década de 1980, o professor ganhou notoriedade pelos estudos e empenho no entendimento do vírus HIV. “Amilcar se envolveu muito com a questão do HIV a partir de 1985. O Hospital Universitário Clementino Fraga Filho era referência para pacientes de HIV”, contou a professora Denise Pires de Carvalho, presidente da Capes e ex-reitora da UFRJ. “Nessa época, ele migrou sua atuação para a área de virologia e se tornou referência no mundo. Foi quando começaram suas cooperações com a África”, lembrou.
“Ele esteve à frente de um grande projeto de massificação dos testes de HIV em Moçambique”, contou o professor Hélio de Mattos, da Faculdade de Farmácia. “Quando chegou ao país, em 2001, apenas 300 testes eram feitos anualmente. No primeiro ano de atuação, foram atendidas 110 mil pessoas. Em 2013, já eram feitos dois milhões de testes no país”, revelou o docente.
Na epidemia de zika, o pesquisador ajudou a construir a correlação entre o vírus e o nascimento de crianças com microcefalia. “Conheci Amilcar em 2015, no auge da epidemia de zika”, conta a pesquisadora Adriana Melo, médica paraibana que descreveu a zika congênita. “Ele me ligou certa noite para perguntar se eu queria ajuda nas pesquisas. É claro que eu precisava – tínhamos coletado sangue e urina de cerca de mil mulheres, mas não tínhamos como analisar. Faltavam equipamentos, kits e recursos. A partir daquele contato, nunca mais nos faltou apoio”, lembrou. “Mais do que conhecimento, ele tinha ética e humanidade. Amilcar não precisava de mais artigos nem de notoriedade, mas estava sempre presente quando uma nova epidemia surgia, estendendo as mãos, compartilhando saberes e transformando ciência em prática”.