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Foi publicada na edição do Diário Oficial desta quinta-feira (7) a troca no comando da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). O pesquisador e professor da UFRJ, Jerson Lima, foi exonerado da presidência da instituição. Em seu lugar, o governador Cláudio Castro nomeou Caroline Alves da Costa, pedagoga e até então presidente da Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec).
Assume o comando da Faetec o bolsonarista Alexandre Valle, candidato derrotado do PL nas eleições municipais de Itaguaí.
Os atos foram confirmados pelo governador em reunião com representantes da comunidade científica na última quarta-feira (6). Na ocasião, Cláudio Castro chegou a afirmar que manteria todos os editais de fomento da Faperj, mas reafirmou que as trocas de comando seriam realizadas.
A dança das cadeiras já havia sido antecipada pelo Jornal da AdUFRJ, que acompanhou toda a mobilização da comunidade científica em defesa da Fundação.
Foto: Fernando Souza/Arquivo AdUFRJEm uma tentativa de cerceamento a manifestações contrárias à atuação da autarquia, a direção do Conselho Federal de Medicina (CFM) entrou com uma ação por danos morais contra a professora Ligia Bahia, do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC) da UFRJ e conselheira da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Os autores pedem que a professora seja condenada ao pagamento de indenização no valor de R$ 100 mil.
A ação toma por base uma entrevista de Ligia Bahia ao canal do Instituto Conhecimento Liberta (ICL) no Youtube, em 15 de agosto passado, na qual ela faz críticas ao comando da entidade. Além dos R$ 100 mil e da retratação por supostas agressões feitas por Ligia na entrevista, o CFM exige que ela se “abstenha de fazer qualquer tipo de publicação nas redes sociais” em relação à autarquia.
TUTELA NEGADA
A ação foi impetrada em 26 de agosto na 19ª Vara Federal Civil de São Paulo. Ao lado da professora, figuram como réus o ICL e o Google (proprietário do Youtube). As duas empresas foram citadas para que retirassem do ar o link da entrevista, o que foi feito antes mesmo da conclusão do processo. Os autores pediram tutela de urgência, ou seja, que a Justiça concedesse imediatamente os efeitos contra Ligia Bahia solicitados na ação. Mas esse pedido foi negado.
Em sua análise inicial, expedida no último dia 15 de outubro, o juiz José Carlos Motta, da 19ª Vara Federal Cível de SP, indeferiu o pedido sob a argumentação de que “as manifestações da ré Ligia Bahia em sua entrevista devem ser compreendidas como abarcadas pela liberdade de expressão e de crítica política, ainda que contundentes”.
Em outro trecho de sua decisão, o magistrado sustenta que a argumentação usada por Ligia Bahia na entrevista “também foi alvo de críticas à atuação do CFM em outros veículos de imprensa, seja no que tange à sua tolerância na utilização de tratamentos sem eficácia comprovada durante a pandemia de covid-19, seja no que concerne à recente Resolução CFM nº 2.378/2024, que proibiu aos médicos a interrupção de gravidez nos casos de aborto previstos em lei”.
A professora Ligia Bahia acredita que a Justiça vai prevalecer. “Não proferi ofensas à honra, nem agressões. Fiz críticas, o que me é garantido pelo direito constitucional de liberdade de expressão. Tenho confiança na Justiça”, disse a professora.
Em nota divulgada esta semana, o escritório Vilhena Silva Advogados, que representa Ligia Bahia, destaca que “a liberdade de expressão é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal” e que “a possibilidade de manifestar opiniões e experiências pessoais contribui para a construção de senso crítico e de uma sociedade democrática e plural”.
Os advogados sustentam que a ação “tem como objetivo responsabilizar a doutora Ligia Bahia, reconhecida nacionalmente pelas suas contribuições à pesquisa e à academia, por um suposto dano que suas manifestações teriam causado à credibilidade do CFM” e que “a crítica e o debate são pilares de uma sociedade saudável, e que qualquer tentativa de silenciar vozes não deve ser permitida”.
SOLIDARIEDADE
A AdUFRJ vem prestando apoio à docente. O professor Rodrigo Fonseca, diretor do sindicato, enxerga no processo movido pelo CFM uma tentativa de silenciar vozes contrárias à postura do comando da autarquia. “A professora Ligia é uma referência nacional na área, uma batalhadora pelo Sistema Único de Saúde e pelas causas coletivas. A AdUFRJ, toda a sua diretoria e nosso setor Jurídico vêm acompanhando o caso diariamente e dando todo suporte para que a professora Ligia não tenha sua liberdade de expressão cerceada, princípio fundamental de um estado democrático de Direito”, afirma Rodrigo.
Para o professor Renato Janine Ribeiro, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), as críticas feitas pela conselheira da entidade são pertinentes. “A SBPC manifesta sua perplexidade e indignação ante ao processo iniciado por membros do CFM, usando o nome dessa autarquia federal, contra a professora Ligia Bahia. Porque ela exerceu o direito constitucional de crítica a medidas que foram tomadas pelos membros do Conselho, nos anos mais recentes, e que, segundo a argumentação dela, contrariam as evidências científicas”, diz o professor.
“Não podemos esquecer também que o CFM foi muito leniente com tratamentos sem base científica oferecidos por ocasião da pandemia da covid-19, o que realmente não corresponde ao que esperamos de uma prática de saúde que somente tem qualidade se for baseada em descobertas científicas testadas e comprovadas. Manifestamos nossa solidariedade à professora Ligia Bahia”, completa o presidente da SBPC.
PERFIL CONSERVADOR
A entrevista ao ICL foi concedida por Ligia Bahia uma semana depois das eleições do CFM, nas quais mais de 60% dos conselheiros se reelegeram, e novos representantes, ainda mais alinhados à direita, também conseguiram vitórias. Foram eleitos 54 conselheiros, dois para cada estado e o Distrito Federal. A eleição mobilizou políticos bolsonaristas em todo o país. Nunca é demais lembrar que o CFM foi um dos principais aliados do governo Bolsonaro na postura negacionista durante a pandemia de covid-19.
Em São Paulo, saiu consagrado das urnas o candidato Francisco Cardoso Alves, da chapa Força Médica. Ele foi apoiado pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) e foi estrela de lives bolsonaristas por defender tratamentos sem comprovação científica na pandemia.
No Distrito Federal, a médica Rosylane Rocha, uma das vices do atual presidente do CFM, José Hiran da Silva Gallo, foi reconduzida ao cargo. Ela se notabilizou por comemorar nas redes sociais a tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023.
Já no Rio de Janeiro foi reeleito o médico Raphael Câmara, com o slogan “Não deixar a esquerda tomar o CFM”. Ele foi o relator da Resolução nº 2.378/2024 do CFM, que proibiu a assistolia fetal a partir da 22ª semana de gravidez. O procedimento é recomendado pela Organização Mundial da Saúde em casos de aborto realizado em vítimas de estupro que estejam com mais de 22 semanas de gestação.
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou a resolução do CFM por entender que ela era incompatível com a Constituição, em caso que deverá ser levado ao plenário até o fim do ano. A resolução do CFM foi basilar para o chamado PL do Estupro, que pretendia equiparar o aborto acima de 22 semanas ao homicídio. O projeto foi retirado de pauta na Câmara depois de pressão da sociedade civil, mas ainda tramita na Casa.
O Jornal da AdUFRJ encaminhou questionamentos ao CFM sobre o processo contra a professora Ligia Bahia, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.
ANA BEATRIZ MAGNO
ANDRÉ HIPPERTT
KELVIN MELO
NEDIR DO ESPIRITO SANTO
Serve para servir.
Servir ao cidadão,
ao Brasil e a um
mundo melhor
Não há mundos melhores sem servidores públicos, sem servidores do povo, como traduz a etimologia desta tão surrada e necessária palavra – público.
Temos muito orgulho do que somos e também de onde estamos. Estamos na Universidade Federal do Rio de Janeiro, a maior universidade federal do país, castigada pelos problemas que todos conhecemos, mas enraizada no compromisso com a ciência e a cultura.
Se servir ao povo é o nosso dever de ofício, servir ao conhecimento é nossa alegria diária na universidade. Aqui, professores e técnicos estão amalgamados na produção de saberes e na gestão do fascinante espaço dos campi. Estamos nas salas de aulas, nos escritórios, nos laboratórios, nas ruas e nas praças.
Na UFRJ, somos 13 mil servidores públicos na ativa, sendo 9.033 técnicos e 4.765 docentes. Ao lado dos estudantes, dedicamos nossas vidas a construir uma universidade pública, gratuita e de qualidade. E é por ela, para ela e nela que apresentamos a exposição Servidores da Sociedade.
Aqui, mostramos nosso cotidiano e nosso compromisso com o futuro. Preparar esta exposição foi uma aventura compartilhada entre a AdUFRJ e a comunidade acadêmica. As fotografias são da mais variada autoria; muitas da equipe de comunicação da AdUFRJ, mas boa parte foi feita por professores e técnicos engajados em registrar momentos representativos de suas jornadas de trabalho.
É uma honra para a AdUFRJ organizar esta exposição. Foram dois meses de intensa produção coletiva. Desejamos percorrer várias unidades e esperamos contribuições para futuras edições. Nosso propósito é mostrar que a UFRJ é construída por dedicados professores e técnicos, servidores de uma utopia de país, de um país que respeita o público e que está comprometida com a universidade pública, gratuita e de qualidade.
A curadoria da exposição é da professora Nedir do Espirito Santo, vice-presidenta da AdUFRJ.
A direção artística é do designer André Hippertt.
As fotografias são dos acervos da AdUFRJ e dos Centros e unidades acadêmicas que, gentilmente, atenderam ao chamado do sindicato e cederam imagens.
Os textos são dos jornalistas Ana Beatriz Magno, Alexandre Medeiros, Kelvin Melo, Silvana Sá e Renan Fernandes, todos integrantes da equipe
de comunicação da AdUFRJ.
A produção do evento é de Meriane Paula e a administração de Deborah Trigueiro. Alex Silva, Beline Viana e Marcelo Brasil fazem o apoio técnico e administrativo.
A arquiteta Gabriela Olivia Moncada é a responsável pela montagem.
As fotografias expostas estão divididas da seguinte forma:
• Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas
• Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza
• Centro de Ciências da Saúde
• Centro de Filosofia e Ciências Humanas
• Centro de Tecnologia, incluindo o Parque Tecnológico
• Centro de Letras e Artes
• Nupem e Centro Multidisciplinar de Macaé
• Campus de Caxias
• Fórum de Ciência e Cultura
• AdUFRJ
A AdUFRJ tem
orgulho
de servir aos
servidores.
Somos a maior associação de professores das universidades federais. Temos quase 4 mil sindicalizados e um compromisso profundo com a valorização do trabalho docente e o respeito à universidade pública. Nascemos em 1979 na luta contra ditadura no Brasil e jamais nos desvinculamos dos compromissos democráticos, tema essencial para a livre produção do conhecimento científico e cultural. Firme com estas bandeiras que ligam instituição e educadores, o sindicato atravessou 45 anos de história. Foram centenas de atos, palestras, reuniões, assembleias e confraternizações. Nesta exposição, apresentamos um pouco dos 45 anos de nossa história e mostramos em imagens porque nos orgulhamos de servir aos servidores da sociedade.
Foto: João LaetA comunidade científica está mobilizada contra o aparelhamento político da gestão da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Há uma semana, vazou a notícia que o governador Cláudio Castro exoneraria o atual presidente da instituição, o professor Jerson Lima Silva. O cargo, que já foi ocupado por nomes como Darcy Ribeiro, Edmundo Moniz de Aragão, entre outros renomados pesquisadores, agora está prestes a ser leiloado a alas negacionistas do PL.
A reação foi imediata. Na própria quinta-feira (25), dia do vazamento da informação, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) convocou uma reunião emergencial para discutir o assunto. O chamado foi atendido por 300 cientistas. “Queremos é proteger a Faperj e evitar a crise que está se avizinhando”, explicou a professora Lígia Bahia, representante da SBPC no Rio. “A Faperj deve ser ocupada pela comunidade científica. Não podemos estragar um trabalho tão bem-sucedido”.
No dia seguinte (26), centenas de representantes da comunidade científica realizaram um abraço simbólico à Fundação. Eles fecharam o quarteirão entre as ruas Erasmo Braga, São José e Av. Antônio Carlos. “Jerson Lima Silva é absolutamente competente, tem vasta experiência na Faperj, passou por diferentes governos”, argumentou o professor Antonio Solé, vice-presidente da AdUFRJ. “Ele está testado e é aprovado pela comunidade científica do estado”, defendeu.
“Jerson é competente e tem compromisso com a comunidade científica”, explicou o professor João Torres, pró-reitor de pesquisa da UFRJ. “Ele é um pesquisador de renome, amplamento reconhecido e respeitado.Foto: Silvana Sá
À frente da Fundação desde 2019, Lima Silva é professor do Instituto de Bioquímica médica da UFRJ, pesquisador 1A do CNPq com mais de 240 artigos publicados em periódicos internacionais, 12.450 citações e 38 orientações de teses de doutorado. Ele passou por diferentes funções na Faperj, desde 2003.
COTADOS
O primeiro nome ventilado para assumir a vaga do professor Jerson foi o do bolsonarista Alexandre Valle, candidato derrotado do PL nas eleições de Itaguaí. Sem ensino superior, sua indicação foi rejeitada até pelo setor de compliance do Governo do Estado. Valle é do mesmo partido do atual secretário de Ciência e Tecnologia, Anderson Moraes, nome de confiança da família Bolsonaro. Era dele o projeto de lei estadual para extinção da Uerj. O projeto foi engavetado.
A segunda indicação, também rejeitada pelo compliance do gabinete do governador, foi a da atual presidente da Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec), Caroline Alves da Costa. Formada em Pedagogia e em Odontologia, Caroline já foi vice-presidente de Educação a Distância da Fundação Cecierj, onde também foi chefe de gabinete. Segundo o subsecretário Victor Travancas, a ausência de título de doutorado desqualificaria a indicação.
A comunidade científica, no entanto, defende que o doutorado não é requisito suficiente, dada a importância da função. “É claro que há cargos que devem ser preenchidos por critérios políticos, mas há outros que devem seguir critérios técnicos, republicanos. É o caso da presidência da Faperj”, defendeu a vereadora eleita Tatiana Roque (PSB). A fala ocorreu em novo ato convocado pela AdUFRJ, SBPC, Academia Brasileira de Ciências e Associação Nacional de Pós-Graduandos, no dia 29 de outubro.“É preciso que a Faperj seja ocupada por um nome consensuado com a comunidade científica. Esse nome é o do Jerson”, afirmou.
Na reunião, a vice-presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da Alerj, a deputada Dani Balbi (PCdoB), contou que conversou com o governador sobre a possível troca na Faperj. “Tivemos uma conversa longa. Ele me garantiu que não iria nomear os atuais cotados, mas disse que entende que essa é uma prerrogativa do secretário de Ciência e Tecnologia”.
Para Mayra Goulart, presidente da AdUFRJ, defender a Faperj é defender a produção científica. “Nós ensinamos aquilo que produzimos. Não ter financiamento é fazer cessar a pesquisa”.
O reitor da UFF, Antônio Nóbrega, também defendeu a permanência de Jerson. Em nome do fórum de reitores, Nóbrega atribuiu ao professor Jerson a solidez da pesquisa realizada nas instituições públicas do estado nos últimos anos. “Nossas instituições continuam vibrantes e colaborando para mitigar a tragédia do estado do Rio de Janeiro muito em função do perfil do professor Jerson”, disse. “Precisamos defender a Faperj e a população do nosso estado”.
Na próxima sexta-feira, 1º de novembro, haverá uma audiência pública na Alerj, convocada pela Comissão de Ciência e Tecnologia da Casa. A reunião acontece às 10h e será feita em parceria com a AdUFRJ, a ANPG e as entidades científicas SBPC e ABC. “A comunidade científica tem nomes qualificados para assumir cargos e pastas. Estamos buscando uma audiência com o governador para tratar do assunto”, contou a presidente da comissão, deputada ElikaTakimoto (PT). Na audiência de sexta são esperados o governador Cláudio Castro e o secretário de Ciência e Tecnologia, Anderson Moraes.
A troca do comando da Faperj não foi publicada no Diário Oficial do Estado até o fechamento desta edição. A reportagem procurou a Secretaria de Ciência e Tecnologia e o gabinete do governador para comentar a crise, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto.