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Homens brancos e de elite correspondiam ao perfil majoritário de professores da universidade, no seu inícioPor ocasião das comemorações dos 100 anos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, me indagaram sobre o que significava ser docente do ensino superior, nos anos 1920? O que podemos assinalar sobre a questão é que, naquele contexto, atuar como docente significava – em linhas gerais – fazer parte de um reduzido grupo de homens brancos, letrados, pertencentes, portanto, a uma elite cultural e econômica. Era fazer parte de um grupo que se distinguia pelo conhecimento acumulado, num país onde a maioria da população era analfabeta, haja vista que o regime escravista havia sido extinto há, apenas, pouco mais de três décadas.
Uma das características fortes desse grupo foi sua associação ao regime de cátedras.
No contexto brasileiro, ser professor catedrático implicava ter assegurada a vitaliciedade no cargo, o que lhes garantia uma ampla margem de poder na hierarquia que, pouco a pouco, foi se constituindo no interior das Universidades. O poder dos professores catedráticos contrastava com as condições de trabalho dos seus auxiliares, que contavam com reduzidas chances de ingressarem e galgarem estabilidade nos quadros da instituição. Essa situação perdurou até a Reforma Universitária de 1968, que extinguiu o regime de cátedras, dentre outras medidas.
Nesses cem anos, as identidades dos professores das Universidades públicas brasileiras mudaram muito. Hoje, muitas mulheres integram o quadro docente, o que não era de se esperar no início do século XX. Gradativamente, o grupo de professores e professoras, de distintas origens sociais, foi se tornando, cada vez mais, plural e profissional. Se, em 1920, eles pareciam estar mais distantes da população, em 2020, o compromisso assumido pela grande maioria de docentes que atuam nas Universidades públicas, pelo Brasil a fora, se volta para a produção e disseminação dos conhecimentos científicos, visando a melhoria da qualidade de vida da população e a solução dos problemas de nosso tempo.
Libânia Xavier
Professora Titular da Faculdade de Educação da UFRJ
CARLOS CHAGAS FILHO em ação num dos laboratórios da Faculdade de Medicina, que funcionava ainda na Praia VermelhaNa década de 80, a UFRJ ainda era chamada de “a Nacional”. Ser aluno da Nacional era um sonho para muitos dos que tentavam ingressar no ensino superior. Comigo não foi diferente e mesmo sem saber qual carreira seguir, a meta para esta carioca do subúrbio era ser aluna da “Nacional”. Ingressei na Universidade Federal do Rio de Janeiro ao completar 17 anos, o que acontece com muitos estudantes até os dias de hoje. Ainda em formação, ingressamos em instituições capazes de modificar as nossas vidas para sempre. Nossos anseios mudam e ao longo dos anos, nos bancos da universidade, amadurecemos e a nossa personalidade vai sendo moldada, adquirindo os contornos que levaremos para o resto da nossa existência. A universidade passou a ocupar a maior parte do meu tempo durante os últimos 38 anos. Afinal, sempre fiquei mais tempo nas instalações da UFRJ do que na minha própria casa, o que é uma prática comum entre muitos servidores e estudantes.
A UFRJ nos envolve e fascina porque nela encontramos liberdade de pensamento e possibilidade de discussões acaloradas e de altíssimo nível nas diferentes áreas do conhecimento sobre temas do passado e do presente, sem perder de vista a perspectiva do futuro. Basta estarmos abertos ao diálogo, à troca de ideias e à possibilidade de nos reinventarmos. Esse é um ambiente salutar que nos acolhe e propicia a renovação, base para a modernidade e o progresso. Como estudante, pude assistir shows e palestras de professores e cientistas renomados, inclusive conviver com prêmios Nobel que visitam a UFRJ. O que mais os seres humanos gostam de fazer do que ter a possibilidade de interagir com esta riqueza de ideias e possibilidades?
Desde os primeiros anos da faculdade, ingressei em diferentes atividades de monitoria e de iniciação científica, que pavimentaram a minha trajetória até os dias de hoje. As oportunidades que encontrei permitiram que eu pudesse escolher os caminhos a seguir. Me sinto muito grata por ter encontrado na UFRJ o alimento completo para o meu desenvolvimento como profissional médica qualificada e o solo fértil para me tornar cientista e professora engajada nas atividades de graduação, pós-graduação e extensão. Durante a trajetória acadêmica, desde muito cedo escolhi ser professora em tempo integral da UFRJ e assim continuo até hoje, exercendo esta profissão por opção. Muitos questionam a nossa dedicação ao trabalho, porque talvez não tenham a perspectiva de que a atividade laboral pode ser muito prazerosa. As atividades de produção do conhecimento e de ensino se aproximam bastante de manifestações artísticas, porque dependem de muita inspiração e são capazes de gerar emoção. Poder ensinar, pesquisar e interagir com a sociedade são tarefas extremamente recompensadoras.
Nesta centenária instituição, me tornei médica, mãe biológica de duas profissionais formadas pela UFRJ e mãe científica de vários doutores que hoje são profissionais reconhecidos. Tendo sido a primeira pessoa da minha família a obter diploma na educação superior, sou mais um dos exemplos da capacidade transformadora da nossa universidade e das oportunidades que esta instituição nos propicia.
Desde aluna de graduação pude atuar em eventos científicos dentro e fora do país, com o principal intuito de divulgar o nosso trabalho, o nome da UFRJ e do nosso Brasil. Agora, me sinto muito honrada em dirigi-la no ano do seu centenário, quando, por obra do destino, a gigante UFRJ pôde se aproximar ainda mais da sociedade neste difícil momento de enfrentamento à pandemia pelo coronavírus. Devemos seguir adiante, atendendo sempre às demandas da sociedade do conhecimento. Que esta fábrica de realizar sonhos, a UFRJ, possa continuar de forma perene a transformar as nossas vidas para melhor.
Denise Pires de Carvalho
A professora é a primeira mulher a ocupar o cargo máximo da universidade em 100 anos
“Hoje, eu faço os meus filmes independentes. Faço edição, fotografia e produção sozinho. Eu não dependo mais dos brancos”, disse o cineasta indígena Takumã Kuikuro, na última sessão do CineAdUFRJ. O cineclube virtual, parceria do sindicato com o Grupo de Educação Multimídia da Faculdade de Letras, debateu no dia 26 a execução cinematográfica do ponto de vista indígena. “O tempo todo, acordado ou dormindo, eu fico pensando e construindo ideias. Sonhando com câmera, editando no sonho. Acordo e penso: o que eu posso fazer hoje?”, contou Takumã, diretor de “Pele de Branco” e “O dia em que a lua menstruou”. Bernardo Oliveira, professor da Faculdade de Educação da UFRJ, destacou a autonomia e originalidade das produções indígenas. “Temos aí algo realmente novo. Algo que não temos a mínima ideia de onde vai dar, e que bom. Isso é a coisa mais importante no cinema brasileiro atual”, afirmou.
As polêmicas opções de calendário acadêmico foram o tema da roda de conversa do Tamo Junto, encontro organizado pelo sindicato docente todas as sextas-feiras. No dia 21, os professores discutiram as propostas apresentadas pela reitoria, Centros e faculdades e divulgadas na edição anterior do Jornal da AdUFRJ.
"O problema é que estamos nadando em opções, cada um a partir do seu próprio universo”, disse a presidente da associação, Eleonora Ziller. Para a docente, a situação é difícil, porque a pró-reitoria de Graduação não apresenteu propostas satisfatórias. "A primeira foi recusada por todas as unidades, e hoje (no dia 21) apareceu outra proposta sem objetividade e dados necessários para se fazer essa escolha”, explicou. "Foi apresentado para a sociedade que o PLE seria um período excepcional e sem obrigatoriedade. Mexer nesse pacto é uma desarrumação interna muito complicada”, avaliou.
"Meu grande dilema é por que se deve continuar 2020.1”, questionou a professora Christine Ruta, diretora da AdUFRJ. "Se já iniciarmos do 2020.2, seria excelente. Não posso acreditar que um sistema (o SIGA) possa nos obrigar a seguir com 2020.1”, disse. No Instituto de Biologia, onde Christine leciona, mais de 90% dos docentes aderiram ao período, e cerca de 80% das disciplinas obrigatórias e eletivas do quadro normal foram oferecidas. "Independentemente do que for escolhido, deve haver uma forma de compensar os professores que aderiram ao PLE”, afirmou. Para o professor Nelson Braga, do Instituto de Física, a primeira proposta da reitoria, com três semestres praticamente emendados, era muito ruim. "Por um motivo simples: os alunos estão parados até agora. Depois de cinco meses sem aula, teriam de fazer três períodos de 12 semanas exaustivos”, sustentou. “É preciso assumir que houve uma tragédia, mas não prejudicar os alunos”, defendeu o professor.
O Conselho Universitário do dia 27 aprovou, por unanimidade, uma carta para celebrar os 100 anos da instituição, fundada em 7 de setembro de 1920. O documento reafirma os compromissos da UFRJ com a defesa do conhecimento, da vida e com os princípios republicanos e democráticos. Mas também cobra investimento e valorização dos governos para a universidade desempenhar seu papel social.
O colegiado também concedeu o título de Professora Honoris Causa a Nísia Trindade, presidente da Fiocruz, primeira mulher a presidir a instituição fundada há 120 anos. O colegiado também concedeu o título de Doutor Honoris Causa a Noca da Portela, baluarte do samba e compositor de mais de 400 músicas. As homenagens foram aprovadas por unanimidade e aclamação.