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WhatsApp Image 2020 09 07 at 13.37.03O belga Alberto I foi o primeiro monarca europeu a visitar a República do Brasil. A viagem, em 1920, mobilizou a sociedade carioca, que assistiu ao desfile na Avenida Rio Branco. O banquete de gala foi oferecido no Palácio do CateteA Universidade do Rio de Janeiro foi criada pelo governo do Presidente Epitácio Pessoa em 1920, durante a Primeira República. Este período da história brasileira durou de 1889 a 1930 e recebeu diversos nomes na nossa historiografia: República Velha, República do Café com Leite, República dos Coronéis, República Oligárquica. Todas estas denominações remetem para o fato de que a Primeira República foi dominada econômica e politicamente pelas oligarquias paulistas e mineiras, principalmente pela riqueza produzida pelo café de São Paulo. No entanto essa caracterização geral não dá conta da riqueza e complexidade da vida social e cultural do Brasil, especialmente no Rio de Janeiro, a capital do país.
Entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX a cidade do Rio de Janeiro vive um grande processo de transformação. Como apontou Flora Sussekind, a cidade, que já aparece como epicentro da vida política e cultural do país, desejava se modernizar.
“A Capital: a encenação de um Brasil que se deseja moderno, de uma população que troca seu velho figurino por sapatos e paletós obrigatórios, de uma ansiosa substituição do naif pelo puro chic”. 1
Este empenho se traduziu no projeto de urbanização e modernização levado a cabo pelo prefeito do Distrito Federal Francisco Pereira Passos, entre 1902 e 1906. Destas obras emergiu a “Cidade Maravilhosa”, que começou a definir uma identidade cultural própria. Além disso, na visão de WhatsApp Image 2020 09 07 at 13.37.02EPITÁCIO PESSOA Assinou o decreto de criação da então Universidade do Rio de Janeiro, a primeira do paísAmérico Freire, constituiu postura e relações políticas próprias, valendo-se do fato de que, como Distrito Federal, gozava de uma certa autonomia.2
Em contrapartida, como apontou José Murilo de Carvalho, a grande propriedade rural e o legado da escravidão freavam a modernização e eram obstáculos à cidadania civil e política. A urbanização evoluiu lentamente, concentrando-se em algumas capitais, especialmente Rio e São Paulo; da mesma forma, a industrialização também se concentrava nestas capitais; na época o Rio de Janeiro era a cidade mais industrializada. São Paulo e Rio tinham perfis diferentes nesse campo: no Rio havia forte presença de população negra oriunda da escravidão, em São Paulo a maioria do operariado era composta de imigrantes europeus. Mas ambos tinham, nesta época, grande influência do movimento anarquista que só será superado após a criação do Partido Comunista Brasileiro em 1922.3  
Mas, em 1920, o Rio de Janeiro era também uma capital social. Uma vida circulava pelas ruas do centro da cidade, pelas ruas do Ouvidor e Gonçalves Dias, onde se respirava um ar mundano e moderno. As famosas melindrosas do caricaturista J. Carlos são representações dessa atmosfera da cidade.  Esta mundanidade também se estendia à vida social do Palácio do Catete que, no tempo do Presidente Epitácio Pessoa, foi das mais intensas.4 O presidente ofereceu algumas grandes recepções e a mais marcante foi o banquete de gala para os reis da Bélgica.
WhatsApp Image 2020 09 07 at 13.37.031LIMA BARRETO Denunciou, em crônicas, contos e romances, as desigualdades da época. Foi o primeiro a exaltar o subúrbioMas, sobretudo o Rio foi uma capital cultural. Não apenas em 1920, mas ao longo de toda a década 20, intelectuais e artistas pensavam e interpretavam a República; expressavam e criticavam as contradições da capital. Num estudo clássico sobre história e literatura, Nicolau Sevcenko aborda a vida e a obra de dois escritores cariocas que ele considera representativos das contradições, dilemas e agruras da  Primeira Republica e, ao mesmo tempo, das maiores expressões literárias do período: Euclides da Cunha e Lima Barreto.5 Para Sevcenko estes dois escritores transformaram sua escrita em “missão”. Euclides da Cunha (1866-1909), em sua obra monumental “Os Sertões” retratou e recriou a guerra de Canudos, do sertão da Bahia, tendo acompanhado a atuação do exército republicano que destruiu o arraial de Canudos, liderado por Antonio Conselheiro. Lima Barreto (1881-1922) mulato, pobre, alcoólatra, fez de seus romances e contos uma contundente crítica à sociedade carioca da época, denunciando a desigualdade social e o racismo.
Mas, para além da literatura, a cultura popular marca os anos 20 e deixará um legado indelével na cidade e no país: o samba. Nas primeiras WhatsApp Image 2020 09 07 at 13.37.032TIA CIATA Matriarca do samba. Veio para o Rio na chamada “diáspora baiana”, aos 22 anos e influenciou decisivamente na criação do ritmo. O samba nasceu em sua casadécadas do século XX, músicos, artistas, compositores, capoeiristas reuniam-se na Pequena África, nas regiões da Gamboa, Saúde, Pedra do Sal nas casas das tias baianas, em especial na casa de Tia Ciata, onde compunham, cantavam, dançavam e tocavam samba, sempre perseguidos pela polícia.6  

1 Sussekind, Flora. As Revistas de Ano e a Invenção do Rio de Janeiro.  RJ. Nova Fronteira/FCRB, 1986, pp15

2 Freire, Américo. República, cidade e capital: o poder federal e as forças políticas do Rio de Janeiro no contexto da implantação republicana. IN Ferreira, Marieta (Org.) Rio de Janeiro: uma cidade na história. RJ, Editora FGV. 2000, PP 29

3 Carvalho, José Murilo de. Cidadania no Brasil. O longo caminho. RJ, Civilização Brasileira, 2010, pp58, 59
 
4 Lustosa, Isabel. Histórias de Presidentes. A República no Catete. RJ, Vozes, 1989, pp87
 
5 Sevcenko, Nicolau, “Literatura como missão: tensões sociais e criação cultural na Primeira República”, Brasiliense, SP.

6 Moura, Roberto Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro, RJ, FUNARTE, 1983

 

WhatsApp Image 2020 09 07 at 13.26.37Maria Paula Nascimento Araujo
Historiadora, professora titular do Instituto de História da UFRJ, ex-diretora da AdUFRJ

 

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