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WhatsApp Image 2023 08 18 at 12.33.23Fotos: Alessandro CostaSe pudessem ser analisadas com rigor científico, não seriam exatamente ternas as lembranças do físico alemão Albert Einstein de sua visita ao Brasil, entre 4 e 12 de maio de 1925. Aos 46 anos, já agraciado com o Nobel de Física de 1921 — por suas pesquisas sobre o efeito fotoelétrico — e consagrado pela Teoria da Relatividade, comprovada em 1919, o cientista achou que o Brasil era “quente e úmido demais para se efetuar qualquer trabalho intelectual” e foi apresentado, sem teste prévio, a um vatapá com pimenta, qual fosse um nativo do Recôncavo. Mas, entre uma visita protocolar ao presidente Arthur Bernardes e uma palestra sufocante em auditório superlotado no Clube de Engenharia, Einstein conheceu a sede da Rádio Sociedade, fundada apenas dois anos antes. E, aí sim, ficou encantado com o que viu — e ouviu.
“Após minha visita a esta Rádio Sociedade, não posso deixar de mais uma vez admirar os esplêndidos resultados a que chegou a ciência aliada à técnica, permitindo aos que vivem isolados os melhores frutos da civilização”, discursou Einstein, em alemão, no estúdio da rádio, depois de ouvir uma apresentação da orquestra da emissora. “Na cultura levada pela radiotelefonia, desde que sejam pessoas qualificadas que se encarreguem das divulgações, quem ouve recebe além de uma escolha judiciosa, opiniões pessoais e comentários que aplainam os caminhos e facilitam a compreensão: esta é grande obra da Rádio Sociedade”, completou.
A visita de Einstein ao Brasil tem lugar de destaque na exposição “Rádio Sociedade: 100 anos de rádio no Brasil”, aberta esta semana na Casa da Ciência da UFRJ. Emissora pioneira do país e uma das primeiras do mundo, a rádio teve sua irradiação experimental em 1º de maio de 1923, e passou a transmitir regularmente a partir de 19 de maio daquele ano. Não foi criada por obra e graça do governo nem da iniciativa privada. Foi concebida para ser um veículo de divulgação científica e cultural por um movimento de cientistas e intelectuais do Rio de Janeiro, reunidos na Academia Brasileira de Ciências (ABC) e capitaneados por Edgard Roquette-Pinto, considerado o “pai da radiodifusão no Brasil”.WhatsApp Image 2023 08 18 at 12.33.57CHRISTINE RUTA “enquadra” o diretor da Casa da Ciência, Ismar Carvalho - Foto: Divulgação
“Ao mesmo tempo em que relembra o processo de criação, amadurecimento e transformação da rádio no Brasil, essa exposição retrata um momento muito interessante da história, no qual a Ciência estava se consolidando no país. E sendo reconhecida, como vemos na exposição com os registros das visitas de Albert Einstein e Marie Curie, em 1925 e 1926, dois expoentes mundiais da Ciência até hoje”, destaca a professora Christine Ruta, coordenadora do Fórum de Ciência e Cultura, ao qual a Casa da Ciência está vinculada.
Para a pesquisadora Luisa Massarani, da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), a criação da Rádio Sociedade se deu em um contexto de ebulição da Ciência. “Ela foi criada apenas um par de anos depois da primeira rádio no mundo. Além disso, foi concebida no escopo da Academia Brasileira de Ciências por cientistas e intelectuais, tendo entre seus objetivos divulgar a ciência. Sua criação teve grande relevância tanto na história da rádio como da divulgação científica, em um momento de efervescência como a década de 1920”, lembrou Luisa, que é curadora da exposição, ao lado do professor Ildeu Moreira, do Instituto de Física da UFRJ.
A pesquisadora também coordena o Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT/Fiocruz), que digitalizou todo o acervo da Rádio Sociedade, base da exposição. É possível ao visitante ouvir áudios originais da emissora, como o “Quarto de Hora Infantil”, voltado às crianças. A emissora também transmitia palestras de diversos cientistas, como as conferências feitas pela física e química polonesa, naturalizada francesa, Marie Curie, em sua visita ao Brasil, em 1926. Ela também visitou a Rádio Sociedade e, assim como Einstein, ficou encantada.
WhatsApp Image 2023 08 18 at 12.33.59 1 equipamentos e objetos usados em estúdios de rádios nas décadas de 1920, 1930 e 1940, assim como dezenas de fotos de época. Uma parada obrigatória é a seção dedicada a cartas dos ouvintes.
Depois do auge dos anos 1920, a Rádio Sociedade começou a enfrentar a concorrência das rádios comerciais a partir dos anos 1930. Em 1936, com o compromisso do presidente Getúlio Vargas de manter suas características originais, a rádio foi doada à União e passou a se chamar Rádio MEC — que se mantém até hoje.
De acordo com Luciane Correia, diretora da Divisão de Programas da Casa da Ciência, a exposição conduz o leitor à reflexão. “Pretendemos mostrar a evolução tecnológica que o conhecimento científico traz no seu embrião. Por isso a exposição termina com os podcasts, que nada mais são do que programas de rádio”, diz Luciane.
O estúdio é o ponto final da mostra, onde mediadores ajudam os visitantes a criarem podcasts. “Você sabia que essa casa em que estamos foi um alojamento de pacientes tuberculosas do antigo Hospital Nacional dos Alienados e foi inaugurado em 1926?”, diz logo na entrada o mediador João Pedro Fernandes de Melo, de 20 anos, aluno de Psicologia da UFRJ, com o mesmo brilho nos olhos que Roquette-Pinto deve ter ostentado ao conceber a Rádio Sociedade.

ROQUETTE-PINTO JOGAVA NAS 11

WhatsApp Image 2023 08 18 at 12.33.57 1Com seu vozeirão de locutor, seria mesmo uma injustiça se o antropólogo, escritor, etnólogo, professor e médico Edgard Roquette-Pinto não incorporasse ao seu currículo a atividade de radialista. A voz de locutor poderá ser conferida pelo visitante na entrada da exposição, onde áudios reproduzem narrações de Roquette-Pinto na Rádio Sociedade. Já o currículo mereceria uma exposição própria.
“Pai da radiodifusão” no Brasil, título ao qual fez jus com a criação da Rádio Sociedade, o carioca Roquette-Pinto (que dá nome à rádio oficial do governo do Rio de Janeiro) se graduou em Medicina na Universidade do Brasil em 1905 e conseguiu conciliar suas atividades na área médica com as de antropólogo. Foi diretor do Museu Nacional e coube a ele receber Albert Einstein em sua visita à instituição em 1925.
Em 1927, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras e, em 1932, criou o Instituto Nacional de Cinema Educativo. Foi também membro da Academia Brasileira de Ciências e um dos fundadores do Partido Socialista Brasileiro.
Mas sua paixão mesmo era o rádio. “Ele literalmente colocava a mão na massa, trazendo as notícias do dia para os ouvintes, com seu vozeirão potente”, diz Luisa Massarani, lembrando que Roquette-Pinto criou o setor educativo no Museu Nacional.
Um dos painéis da exposição traz o seguinte texto: “Rádio é o jornal de quem não sabe ler. É o mestre de quem não pode ir à escola. É o divertimento gratuito do pobre. É o animador de novas esperanças; o consolador dos enfermos; o guia dos sãos, desde que realizado com espírito altruísta e elevado”. Assinado: Edgard Roquette-Pinto.

SERVIÇO
- “Rádio Sociedade: 100 anos de rádio no Brasil”
- De 15 de agosto a 8 de outubro de 2023
- Terça a sexta, de 9h às 20h; sábados, domingos e feriados, de 10h às 17h
- Casa da Ciência da UFRJ: Rua Lauro Muller, 3 — Botafogo — Rio de Janeiro
- Agendamento de grupos e escolas pelo site www.casadaciencia.ufrj.br

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