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WhatsApp Image 2022 09 19 at 10.11.08 1Estela Magalhães

Pressão por produtividade acadêmica, sobrecarga de funções administrativas, de ensino e pesquisa, dificuldade de separação entre o tempo de trabalho e a vida pessoal e precarização das estruturas da universidade. Junte tudo isso para entender o esgotamento mental dos professores da UFRJ. “O docente usa as férias para trabalhar há muito tempo e isso é naturalizado. No que era para ser um período de descanso, a gente atualiza o Lattes, prepara o projeto, escreve o artigo, lê o trabalho dos alunos, então não paramos de trabalhar nunca”, diz a professora Suzy dos Santos, diretora da Escola de Comunicação. No Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio, debater problemas como esses é fundamental para cuidar da saúde mental da comunidade acadêmica.
“Nós queremos fazer pesquisa, mas o ranqueamento por notas implica no dinheiro e nas condições do nosso programa de pós-graduação. Você precisa ter um grau de produtividade sempre alto para não virar um programa que não recebe recursos”, explica ela. Essa questão ainda está associada à sobrecarga de trabalho causada pela redução do número de servidores. “O primeiro preconceito com a doença mental é interno, vem de uma autoavaliação: se você não é produtivo, você não é um bom professor”, diz.
Para a professora, o estigma interno contribui para uma maior dificuldade em buscar ajuda quando ela é necessária. “A gente vive nadando no mar agitado e só com a cabeça de fora. A gente nada, nada, nada e continua com água por todos os lados. Não conseguimos nem ver quando vai chegar à terra firme e estamos sempre com uma onda para bater na nossa cara”, desabafa.
O cansaço também está associado a um entristecimento da categoria. Na ECO, o luto foi quase constante nos últimos meses, com a perda de estudantes, técnicos e professores. “Estamos vivendo um tempo de negação da Ciência e o nosso fazer é violentamente atacado. Eu não posso dizer que o câncer de uma docente querida venha necessariamente desses tempos”, diz Suzy sobre o falecimento da professora Marta Araújo este mês. “Mas eu posso dizer que estou na Eco há 17 anos e nunca morremos tanto. Esses tempos que estamos vivendo nos fragilizam tanto física quanto mentalmente”, completa.
Para o professor Ari Loureiro, do Serviço Social da UFPA, a tristeza que adoece os professores é também uma herança da pandemia. “Vivemos um temor por medidas cautelares, por ter sofrido pessoalmente o impacto da covid-19 e pela família ter vivido experiências de morte, de perda e luto”, explica. Com os escritórios em casa nos dois últimos anos, a névoa na separação entre a vida pessoal e o fazer acadêmico se intensificou. Os meios de comunicação pessoais se tornaram públicos e os professores passaram a responder mensagens de madrugada sobre ‘a aula de amanhã’. “O espaço familiar tornou-se o lugar do trabalho, da cultura, da política e do ensino. O ambiente privado foi aberto e nós passamos a viver o mundo do trabalho 24 horas por dia”, diz Ari.
O professor ainda defende a importância do atendimento psicológico institucional pelas universidades. “As dificuldades e limites do docente não pertencem só a ele, mas ao mundo do trabalho e à universidade. O atendimento às nossas dimensões subjetivas precisa ser compreendido como de interesse de uma política social da universidade”, pondera.
Por meio da Superintendência Geral de Atenção à Saúde do Trabalhador (Superast), da Pró-Reitoria de Pessoal (PR-4), a UFRJ oferece atendimento psicossocial aos servidores técnicos e docentes com apoio de psicólogos, enfermeiros e assistentes sociais. “Intensidade de trabalho na área acadêmica, cobranças estratosféricas por produtividade, cobrança das agências de fomento, não pagamento, não cumprimento de editais de pesquisa e até os cortes na Educação e na Ciência têm um impacto gigantesco na saúde mental e na saúde em geral dos professores da UFRJ”, diz Silvia Jardim, psiquiatra e superintendente-geral.
Em 2021, a Seção de Atenção Psicossocial dos Trabalhadores (SAPS), divisão responsável pelo atendimento psicológico, atendeu 3.345 pessoas. “Tratamos cada caso de forma particular, mas sempre de forma interdisciplinar. Isso nos permite identificar uma situação que é institucional a partir das relações entre trabalhadores”, diz a superintendente.
Silvia destacou que os transtornos mentais e comportamentais são a terceira principal causa de afastamento do trabalho no Brasil. Os dados são da consultoria B2P, especializada no acompanhamento e gestão de funcionários afastados, de 2021.
A psicóloga Catiuscia Munsberg, da SAPS, explica que os professores tradicionalmente buscam menos o atendimento do que outros servidores. “Já nos deparamos com situações em que um docente tem enfrentado uma situação de saúde na qual ele teria acesso a uma licença para tratamento, que é um direito dele, mas não aciona o afastamento para a preservação da própria saúde”, diz. Ela ainda explica que isso se intensificou com a pandemia, com a possibilidade de dar aulas online e não tirar licença. “Muitas vezes a pessoa negocia, faz acordos com os colegas, ou até trabalha, talvez por uma aparente flexibilidade do trabalho docente”, completa.
Ela ainda destaca a importância de estar atento à própria saúde mental e a dos colegas ao longo de todo o ano e não apenas durante as campanhas do Setembro Amarelo, uma vez que os sinais de que alguém precisa de ajuda nem sempre são claros ou até perceptíveis. “Pode não ter um sinal, ou que esse sinal não seja algo diretamente interpretado como tristeza, mas algo da ordem do conflito também pode estar apontando para coisas importantes de se cuidar”, diz. “Mais do que tentar identificar um sinal aqui e ali, é importante criar espaços no ambiente de trabalho onde se possa falar e ter alguma possibilidade para saber como as pessoas estão”, encerra.

COMO RECORRER À SAPS
Caso o servidor ou terceirizado da UFRJ busque atendimento psicossocial ou orientação sobre afastamento do trabalho por problemas de saúde mental, basta entrar em contato com a SAPS pelo e-mail Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..
“Um dos nossos técnicos faz uma entrevista com o servidor e identifica o problema. A partir daí, ele é acompanhado parcial ou totalmente pela SAPS, dependendo da situação, e também pode ser encaminhado para o SUS ou para a rede privada. Se ele já faz tratamento, se precisa de apoio institucional, se precisa de uma orientação, acompanhamos cada caso”, explica Silvia Jardim.
Após o acolhimento por e-mail, o atendimento presencial pode ser feito nas sedes da superintendência no Fundão ou na Praia Vermelha. O canal Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. também está disponível para aqueles servidores em posições de gestão que identifiquem possíveis problemas com seus colegas de trabalho.

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