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WhatsApp Image 2020 12 12 at 14.59.19A pandemia do novo coronavírus já registra quase 1,6 milhão de mortos em todo o mundo, 180 mil deles no Brasil, e dá sinais de recrudescimento em vários países. Nesse cenário sombrio, um fio de esperança veio esta semana: o Reino Unido começou a imunizar sua população com a vacina da farmacêutica norte-americana Pfizer, desenvolvida em parceria com a empresa alemã BioNTech.
Por aqui, o início da vacinação é uma incógnita e ganhou contornos políticos. O governo de São Paulo anunciou um calendário de imunização a partir de 25 de janeiro, com a vacina CoronaVac, que já está sendo produzida no Instituto Butantan. Por sua vez, o Ministério da Saúde, que não apresentou calendário, abriu negociação para a compra de 70 milhões de doses da vacina da Pfizer/BioNTech. Nenhum imunizante recebeu o aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), cujos técnicos divulgaram na sexta-feira (11) uma carta aberta em que rechaçam interferências políticas no órgão: “O trabalho técnico está acima de qualquer pressão”, diz o documento.
Mais de 150 vacinas estão em testes em todo o mundo. Duas já estão aprovadas para uso. Além da Pfizer/BioNTech, em uso no Reino Unido, a russa Sputnik V começou a ser aplicada em trabalhadores de Moscou no dia 5 de dezembro, mesmo sem ter concluído a fase 3 de testes. No Brasil, quatro estão sendo testadas: a de Oxford, a CoronaVac, a Pfizer/BioNTech e a Janssen-Cilag, produzida pela Johnson&Johnson.
“Em geral, o desenvolvimento de uma vacina envolve várias etapas e tradicionalmente leva cerca de 15 anos até a produção em larga escala”, destaca o professor Marcelo Bozza, do Instituto de Microbiologia da UFRJ. “Em função das características emergenciais impostas pela pandemia, o desenvolvimento de vacinas para o SARS-Cov-2 está ocorrendo em tempo recorde”, analisa.
Ligia Bahia, professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ, entende que a melhor vacina para o país seria a de dose única. “Entretanto, as mais avançadas precisam de duas doses. Isto exige um sistema logístico, de convocação das pessoas, uma ampla campanha”, comenta. “Precisa marcar data, monitorar quem já se vacinou e montar planos para pessoas que trabalham à noite, quando os postos de saúde estão fechados”, exemplifica a pesquisadora.
WhatsApp Image 2020 12 12 at 15.02.49Outro desafio apontado pela docente é a conservação da vacina. O governo brasileiro financia a vacina de Oxford, que será produzida na Fiocruz, e anunciou esta semana o interesse na vacina da Pfizer/BioNTech, que deve ser armazenada a -70ºC. “É preciso um acordo com o fabricante para que sejam propiciadas as condições de armazenamento e transporte para todas as regiões do país”, avalia Ligia. “Essa característica da Pfizer é um dificultador, mas não impossibilita a aquisição. O Brasil tem larga experiência em cadeia de frios (como é chamada a rede de equipamentos para armazenamento e transporte de vacinas)”, destaca.
No plano nacional, se tudo correr bem, duas vacinas deverão estar à disposição até março: a de Oxford e a da Pfizer/BioNTech. Além delas, a chinesa CoronaVac poderá ser aplicada em São Paulo e em Niterói (RJ) a partir de janeiro. Já o Paraná demonstrou interesse na russa Sputnik V, que fechou esta semana a venda de mais de 20 milhões de doses para a Argentina.
Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, a médica Isabella Ballalai reconhece que ter tantas vacinas diferentes poderá representar um desafio para a imunização. “O cenário de múltiplas vacinas pode dificultar. Por outro lado, era algo desejado no cenário mundial, pois é a única forma de conseguirmos vacinar a população do planeta”, diz.
Para a médica, a vacinação em duas doses, que precisam ser repetidas num curto espaço de tempo, pode sobrecarregar a rede. Mas ela não vê motivos para pessimismo. “Temos uma enorme população, um território de proporções continentais, locais de difícil acesso. Mas temos know-how. Temos 36 mil salas de vacinação e outras poderão ser criadas”, argumenta. “Somos os melhores do mundo em distribuição de vacinas e imunização das populações, muitas só acessadas por barquinhos, com dias de deslocamento por rios. Nós fazemos isso com excelência”.

Como se desenvolve
uma vacina
O estudo de uma vacina é dividido em diversas etapas, que vão desde a fase exploratória ou laboratorial, quando ainda são avaliados os componentes e estudadas as características de entrada do vírus nas células humanas; passam pela fase pré-clínica, em que os testes são realizados em animais; e pela fase clínica. Esta, por sua vez, se divide nas fases 1, 2 e 3. A partir da fase 3, os resultados são enviados para a agência reguladora responsável pela liberação. Finalizada a última fase com sucesso, há o licenciamento do imunizante para uso.
“A escolha do principal alvo da grande maioria das vacinas, a proteína Spike, bem como a redução ou a eliminação de estudos pré-clínicos, se basearam nos conhecimentos obtidos com SARS-Cov e MERS”, explica o professor Marcelo Bozza. Os vírus foram responsáveis por epidemias respiratórias nos anos de 2003 e 2012, na Ásia e no Oriente Médio, respectivamente. “As fases clínicas no desenvolvimento de vacinas são fundamentais para o estabelecimento da segurança e da eficácia. Muitas das instituições com vacinas em teste para SARS-Cov-2 têm realizado as diferentes fases clínicas de maneira sobreposta, o que também tem permitido a redução no tempo de desenvolvimento e licenciamento”, pontua o docente.

Conhecimento
e financiamento
Segundo o professor Herbert Guedes, do Instituto de Microbiologia, o sucesso das vacinas contra a covid-19 se deve a distintos fatores. Especialista em imunologia e vacinologia, ele afirma que o conhecimento acumulado e o financiamento são fundamentais. “Tínhamos plataformas já estabelecidas para produção de vacinas, estudadas e sedimentadas durante décadas, e plataformas em desenvolvimento já há algum tempo, por ocasião do surto de SARS, sobretudo”, diz. “O segundo ponto é o investimento mundial, de bilhões, focalizado no problema. Sem investimento, não se faz pesquisa”, analisa.
O fenômeno é bastante diferente do que ocorre com o financiamento de estudos das chamadas “doenças negligenciadas”, como a de Chagas, a hanseníase, a leishmaniose e a malária, entre outras. “Como muitas dessas doenças acontecem em regiões ou países específicos, uma grande empresa privada acaba não tendo interesse em financiar o estudo. É preciso que os governos locais tenham vontade política para fazer parcerias e invistam alto, o que dificilmente acontece”, afirma.
A própria estrutura dos organismos pode dificultar o desenvolvimento de imunizantes. “Temos larga experiência em desenvolver vacinas para vírus, temos boas vacinas para bactérias, mas não temos para protozoários, por exemplo. E mesmo em relação a vírus, ainda não conseguimos uma vacina para o HIV. Há organismos mais complexos e outros mais fáceis de predizer. E aqui, novamente, entram o conhecimento acumulado e o investimento na área, que são fundamentais”.

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