A atriz Márcia Fiani explica que a peça conta a história de seus integrantes. “Nós começamos a fazer teatro amador em 1967”, lembra. Era o Teatro Universitário Carioca (Tuca). “Depois, veio o endurecimento da ditadura e nos afastamos”, completa.
A partir do AI-5, baixado em dezembro de 1968, o grupo foi desfeito. Vários estudantes que participavam do movimento artístico foram presos, torturados, exilados ou demitidos de seus empregos. “Nós nos reencontramos 50 anos depois e decidimos fazer algo que contasse as nossas trajetórias”, conta Márcia.
A peça mistura música, poesia, relatos, projeções de fotos e trechos da peça “Coronel de Macabira”, que o coletivo encenava na década de 1960. As diferentes formas de arte se juntam no palco e conduzem os espectadores a uma verdadeira viagem no tempo.
O assassinato do estudante Edson Luís, em março de 1968, é retratado na obra, assim como a Passeata dos Cem Mil, a aprovação da Lei da Anistia e o Movimento Diretas Já! Os momentos históricos do país se misturam aos dramas vividos pelas personagens sem nome.
Em um dos muitos trechos tocantes do espetáculo, alguém declara: “Não dá para esquecer o barulho do molho de chaves que anunciava qual seria a próxima cela”. Ela se referia às chaves carregadas por carceireiros. O barulho ecoava pelos corredores para levar um preso político para interrogatório, tortura e, muitas vezes, para a morte.
No entanto, se engana quem pensa que o espetáculo é sinônimo de sofrimento. Há muita vida vivida, encenada e apontada para o futuro por seus personagens e atores octogenários. “Esqueceram de nos avisar que não poderíamos ser felizes. E nós fomos!”, festeja uma das personagens em cena. “Viver vale a pena”.
FICHA TÉCNICA:
Direção e dramaturgia:
Amir Haddad
Elenco:
Alberto Strozenberg, Amir Haddad, Dora Zaverucha, Márcia Fiani, Marta Klagsbrunn
(In Memoriam), Mônica Arruda, Regina Célia Dantas, Ricardo Valle (in memoriam), Sérgio Alevato e Victor Hugo Klagsbrunn.
Sonoplastia:
Evandro Castro
Edição das músicas:
Márcia Fiani
Edição de fotos:
Marta Klagsbrunn
Direção de imagem:
Máximo Cutrim
Produção:
Associação
TUCA de Arte e Cultura
Entrevista com o elenco:
Como foi falar de tantas dores no espetáculo? A arte ajuda a expurgar esses fantasmas?
Márcia Fiani - É difícil dizer isso, que expurgamos. A vida que a gente viveu está dentro da gente, faz parte da gente. Mas é verdade que nas nossas primeiras apresentações era muito difícil falar. Eu, por exemplo, fui exilada. Eu não conseguia parar de chorar. O que não é bom, porque, senão, a gente não conta a história. Não somos nós que temos que ficar chorando.
Como foi o reencontro?
Victor Hugo Klagsbruun - Quando nós nos reunimos, sem saber muito bem o que queríamos fazer, constatamos que nós não nos conhecíamos. Tinham se passado 50 anos sem ter contato e aí cada um começou a contar a sua história. Foi muito emocionante. De repente a Marta, minha companheira, disse que tinha alguns poemas que nunca havia apresentado para ninguém. Ela nunca tinha mostrado nem pra mim. E são eles que nos ajudam a passar por todas as etapas da peça. Eram muitos depoimentos e a gente queria incluir tudo. No início, esse espetáculo tinha duas horas e ninguém queria se desfazer de sua parte.
Foi uma construção coletiva, então?
Márcia - Totalmente. A partir desses depoimentos. E a gente inclui não só os nossos, mas de outras pessoas que eram do Tuca e não estão na peça porque moram longe, têm outra vida, mas que fazem parte da história do grupo. Como a gente tinha muita coisa, a construção da peça passou pelo nosso mestre Amir Haddadd. Ele é muito bom dramaturgo e nos ajudou a gerar essa dramaturgia.
A arte é resistência?
Sérgio Alevato - O Tuca foi fundado naquela época já como parte da resistência estudantil à ditadura. Era um ponto de confluência de estudantes, até para discutir, conversar. Os diretórios estavam fechados, os DCEs fechados, a UNE fechada. Sem dúvidas, a arte é resistência e transformação.
Agenda
27/11, às 19h
Biblioteca Parque,
na Rocinha
07/12, às 15h
Av. Getúlio de Moura, 1302
centro de Nova Iguaçu