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WhatsApp Image 2023 10 05 at 21.09.51Por Igor Vieira

ENTREVISTA I PROFESSORA ANA PAULA ABREU MOURA, DIRETORA ELEITA DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO

Um novo rosto e uma nova cor para a diretoria da Faculdade de Educação (FE). A professora Ana Paula Abreu Moura não apenas se orgulha em ser a primeira diretora negra da unidade e a primeira da sua família a entrar na universidade, mas também de “trazer a questão racial para dentro do currículo” na proposta de campanha da chapa eleita no pleito dos dias 26 e 27 de setembro. A docente toma posse em 1º de janeiro.
A vice-diretora eleita é a professora Silvina Fernandez, cuja carreira focada em planejamento educacional a trouxe da Argentina para o Brasil e até a UFRJ. Ela defende que “o lema da reconstrução” de que o presidente Lula tanto fala é importante: “Temos que reconstruir prédios e laços, o material, o relacional e o simbólico”.
A nova diretoria embarcou em um desafio inédito na Faculdade de Educação: elaborar um Plano de Desenvolvimento da Unidade (PDU), que funciona como o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), mas localizado. Para isso, a aposta é no diálogo com todos os setores da universidade e sociedade.
A diretoria defende o “modelo participativo”, como explicado pela professora Silvina. “O PDU é novo na UFRJ e é facultativo. Escolhemos fazer porque é uma oportunidade ímpar de conversarmos com todos os segmentos, estudantes, professores, servidores, técnicos, e diferentes setores da sociedade com quem nos vinculamos”. O diálogo vai pautar a gestão.
A elaboração do PDU é uma experiência. “Não estamos só no nosso curso, mas também em todas as licenciaturas. Será uma experiência de desenvolvimento e experimentação de tudo que estamos analisando e pesquisando, mas também de forma pedagógica”, completou Silvina Fernandez.
Confira a seguir a entrevista com a nova diretora.

Jornal da AdUFRJ: Como foi sua trajetória para chegar à diretoria da faculdade?
Ana Paula Abreu Moura:
Costumo dizer que nem nos meus sonhos mais ousados imaginei que seria diretora da Faculdade de Educação. Cresci na Ilha do Boqueirão (perto da Ilha do Governador), muito isolada. Com oito anos, pegava uma embarcação em um trajeto de 40 minutos, e depois andava dois quilômetros até o Bananal, para então chegar ao ponto de ônibus. Eu luto pelo direito à Educação, pela Educação de Jovens e Adultos, porque na minha vida esse direito também foi conquistado com muito suor. Minha trajetória foi toda no ensino público, da escola até a graduação na Uerj, o mestrado na UFF — onde conheci Silvina Fernandez — até o doutorado na UFRJ. No último ano do Ensino Médio, recebemos duas ex-alunas que estavam na Uerj e voltaram à escola por iniciativa própria. Elas disseram: “É possível. Fomos atrás de isenção na matrícula e entramos em Letras e Pedagogia. Viemos aqui para dizer que é difícil para caramba, mas é possível”. Mesmo assim, eu não achava que era possível, e fui atrás por incentivo de uma amiga mais velha que eu. Antes de ser professora, fui técnica da UFRJ, e fiz a prova numa situação complicada: minha filha tinha nascido 20 dias antes, e tive que sair da sala 13 vezes porque ela estava chorando e incomodando os outros candidatos. Quando passei em primeiro lugar, fiquei surpresa. Nós, que somos negros, carregamos no corpo e na alma as cicatrizes do que é ser negro em uma sociedade racista. Minha candidatura vem do reconhecimento do poder das instituições públicas em formar minha identidade e do papel que posso cumprir para fortalecer essas instituições.

Como vai funcionar a elaboração do PDU?
Vamos discutir as diretrizes com nossa comunidade acadêmica, estabelecendo algumas questões: Quais são as ações? Quais são as metas? Como alcançamos o que é solicitado e gestado pelo corpo social que envolve os três segmentos, professores, técnicos-administrativos e alunos? Também vamos incluir o quarto segmento, que são os terceirizados. É difícil por conta da alta rotatividade dos funcionários, mas alguns deles estão na universidade há muito tempo. Vamos tentar.

A UFRJ e o país estão em uma situação difícil. Quais serão as principais pautas da nova gestão?
A elaboração do PDU, o fomento à internacionalização e à extensão, e a reestruturação da Faculdade de Educação. Desde o incêndio de 2011 no Palácio, atuamos em condições muito precárias. Temos aula no Aulário da Praia Vermelha, ocupamos algumas salas do Fórum e as poucas salas da FE que estão liberadas para uso com trabalho administrativo e os grupos de pesquisa. Não temos uma sede, e precisamos de um espaço físico que nos comporte. Hoje, não temos nem sala dos professores. Se um aluno quiser falar com a gente e deixar um material, não tem como. Não temos um lugar para estudar e descansar. Temos quatro laboratórios que funcionam em um corredor. Logo, não temos espaço para trabalhar, o que é um limitador não só para nossas questões operacionais, mas também para a nossa identidade como faculdade.

E quanto à extensão e à internacionalização?
A internacionalização, principalmente com os países do Mercosul, é importante para os alunos entenderem que nós, como América Latina, temos desafios parecidos na educação e no país. O avanço nas atividades de extensão é para ampliar a interlocução da faculdade com a Educação Básica, que é grande, mas pode ser maior. Precisamos discutir como os movimentos sociais estão fazendo educação, e trazer o conhecimento deles para pensar a educação na perspectiva da educação popular, sistematizada por Paulo Freire, um marco no Brasil. Muitos pensam que a extensão é só levar o conhecimento da universidade para a sociedade, mas também temos que fazer o caminho inverso, porque conhecimento se constrói junto, a partir da interação dialógica. A extensão, então, ressignifica a universidade e pode ajudar a reposicionar a identidade da Faculdade de Educação.

Como assim?
Ela está pulverizada, sem um centro. Sou de um tempo da faculdade em que todos se encontravam e se conheciam. Você podia não ter aula com aquele professor, mas sabia quem era. Agora, você não pode estar com as pessoas, e isso é fundamental para a constituição de nossa identidade enquanto unidade acadêmica.

E quanto à alta evasão da UFRJ?
Primeiro, temos que identificar as razões da evasão. Para isso, é preciso um espaço de escuta e análise. Sem essas informações, não há como tomar medidas. Os auxílios também são importantes. Hoje, vemos jovens reclamando que as condições de permanência ainda são poucas. O que temos atualmente são conquistas de pessoas que lutaram com muito suor. Na minha época, não havia bilhete único universitário, por exemplo, e era muito difícil pagar a passagem do ônibus. Por isso, para quem olha do passado, é muito. Agora, temos que lutar por mais.

Como será a relação com a reitoria?
Temos um novo reitor e uma nova direção. Vamos aproveitar esse momento para sentar e dialogar, não só em um movimento de colocar nossas necessidades, mas de diálogo em diversas instâncias, para entender como a reitoria vai trabalhar junto com a gente. Será então de defesa da universidade enquanto um patrimônio público e de nossas pautas da Faculdade de Educação. Mesmo que surjam divergências, vamos buscar entendimento e diálogo.

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