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WhatsApp Image 2021 12 17 at 14.10.31Foto: Fernando Souza/Arquivo AdUFRJOs atendimentos de emergência no Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG) estão parcialmente suspensos desde o dia 27 de novembro. A medida é resultado da falta de pessoal e do subfinanciamento da unidade. Um comunicado na página do instituto na internet diz que “só é possível oferecer assistência aos pacientes sob risco imediato de morte, pacientes em tratamento de leucemias, linfomas e doenças em uso de medicamentos causadores de imunossupressão”.
“O déficit de recursos humanos para compor a equipe é muito grande. Sem quantitativo, tenho que reduzir de alguma forma o atendimento”, explicou o diretor do IPPMG, Bruno Leite Moreira. O instituto tem 540 servidores e 117 extraquadros, mas 48 servidores não estão trabalhando, em função da pandemia. “São muitos funcionários afastados por conta de comorbidades, o que está previsto nas resoluções da UFRJ, mas a situação causa muitos impactos aqui”, completou. Dos 54 leitos de enfermaria, apenas 30 estão funcionando. Na UTI, dos dez leitos, oito estão abertos.
“Não pude, por exemplo, manter a classificação de risco da emergência funcionando por 24 horas por falta de enfermeiros”, relatou Bruno. Se houver alguma mudança nas resoluções que regulam o trabalho durante a pandemia, pode haver alguma melhora neste cenário, mas não seria uma solução definitiva. “O ideal seria ter concurso público”, defendeu o diretor. Bruno calcula que seria necessário aumentar em 35% a equipe da emergência pediátrica — hoje composta por 90 profissionais.
O orçamento também é motivo de preocupação e só ganhou algum fôlego neste fim de ano. “Em 2021, o Rehuf (Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais) teve uma redução drástica. Só o IPPMG recebia R$ 7 milhões, que, este ano, foi o valor que toda a UFRJ recebeu”, informou. O instituto, desde abril, sofreu para comprar insumos. “Mas isso, agora no final do ano, foi solucionado porque veio um orçamento do governo federal para suporte dos hospitais. Então, vamos conseguir equilibrar as contas”, relatou o diretor. Desde 11 de novembro, chegaram ao instituto repasses totalizando R$ 5,2 milhões.

“TENDÊNCIA É PIORAR”
A sobrecarga no sistema de saúde pública do estado também influenciou a decisão da equipe do IPPMG. “Está havendo uma crise geral nos atendimentos dos hospitais. Há duas semanas, o sistema de regulação estava com cerca de 30 crianças na fila para UTI pediátrica”, contou Bruno. Com esta sobrecarga, não há como transferir pacientes para outras unidades.
Para o coordenador do Complexo Hospitalar da UFRJ, Leôncio Feitosa, o que acontece no IPPMG é um retrato da crise pela qual passam as unidades hospitalares da UFRJ. “Essa crise vem de algum tempo, e a tendência é piorar. O HU, por exemplo, já teve 550 leitos, e em janeiro terá 200, talvez 180”, ilustrou.
Leôncio ainda joga uma nova luz sobre o problema da falta de pessoal nas unidades do complexo. Com a falta de concursos, o quadro de profissionais vai envelhecendo, o que torna certas tarefas mais difíceis de serem executadas. “Nossas enfermeiras estão ficando velhas, algumas com dores nas costas e doenças como reumatismo. Você não pode querer que uma enfermeira com quase 60 anos, dor nas costas e hipertensa levante um paciente da cama, leve ao banheiro. Ela não aguenta. Então às vezes parece que há um bom número de profissionais para atender, mas só alguns conseguem fazer trabalhos mais pesados”, explicou.
O cenário atual de cortes no orçamento e falta de concursos tornou o trabalho de administrar os hospitais, na opinião de Leôncio, uma “luta pela sobrevivência”. “Nós estamos o tempo inteiro administrando a penúria”, disse Leôncio. Para ele, é importante que a UFRJ possa negociar com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), mas a empresa não é a solução dos problemas, e sim uma “boia de salvação”. “Ganhamos a decisão no Consuni e vamos poder negociar com a Ebserh. Vamos montar um grupo para discutir as necessidades da UFRJ para esta negociação. Nossa perspectiva é não morrer”, esclareceu.
O vice-reitor da UFRJ, professor Carlos Frederico Leão Rocha, comentou que a administração central está ciente das dificuldades do instituto, e lamentou o fechamento parcial da emergência. “O IPPMG tem uma importância no atendimento pediátrico no Rio de Janeiro, é um prejuízo grande para a população”, disse.
O docente reconheceu que não só o IPPMG, mas o HU e outras unidades de saúde estão passando por um momento extremamente delicado. Mas o problema não começou agora. “Esse problema vem desde antes de 2013, quando se discutiu pela primeira vez a possibilidade de contratar a Ebserh. O que se espera agora é que as conversas com a empresa prosperem e consigamos suprir essa deficiência”, comentou.

DEPOIMENTO I Tomaz Pinheiro da Costa, vice-diretor do IPPMG (1985-1989), diretor do instituto (1989-1993) e diretor da AdUFRJ (1983-1985)

WhatsApp Image 2021 12 17 at 14.11.08A emergência do IPPMG foi criada quando eu era vice-diretor do instituto, ainda no começo da gestão do professor Luiz Carlos Siqueira como diretor. Tínhamos cerca de 25 leitos ativos na época. Ainda não havia o Sistema Único de Saúde, mas sim o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (Suds), e iniciava-se uma política mais integrada de assistência, que envolvia todos os equipamentos públicos, inclusive as unidades universitárias. Os recursos do Ministério da Saúde e Previdência Social para a manutenção do hospital eram destinados de acordo com o porte do equipamento — um hospital de pequeno porte não recebia praticamente nada. Tínhamos que crescer para virar um hospital de médio porte, o que significava ter pelo menos 90 leitos. Para crescer esse tanto não podíamos ficar dependendo da procura espontânea ou de eventuais encaminhamentos.
A emergência foi criada para ser uma potente porta de entrada para a área de internação (enfermarias) do hospital. Além de cumprir um papel no ensino e na capacitação de pessoal para a rede pública, que é papel da universidade no nosso setor, a emergência também cumpriu o papel de expandir a unidade. Foi assim que conseguimos aumentar a capacidade do hospital para 90 leitos em quatro anos.
Com a emergência aberta, o IPPMG tinha clientela para assegurar o aumento da capacidade. A emergência abriu uma pressão de demanda interna para internação. Isso fez com que os recursos vindos do setor público, na época o Suds, aumentassem. Tivemos também o apoio de uma reitoria muito ousada. Para ter a emergência aberta era preciso, por exemplo, ter uma ambulância bem equipada, o que, na época, era um investimento muito dispendioso para a unidade. Isso nós conseguimos não só com o recurso da produção, mas com o apoio da reitoria. A captação de recursos, como de resto para todas as unidades, foi uma das nossas grandes dificuldades na empreitada. Uma questão muito difícil que enfrentamos foi um pouco de resistência da academia. Na época, havia uma grande corrente na universidade que achava que emergência, digamos assim, não era uma atividade nobre para a academia.
A abertura da emergência trouxe muitos ganhos para o IPPMG, tanto na área de internação, com a abertura de novos leitos, quanto na sustentação do projeto, mas também no atendimento ambulatorial, expandindo para mais de 20 as especialidades ambulatoriais na Pediatria. Essas duas expansões, de leitos e de especialidades, trouxeram enormes ganhos acadêmicos para o IPPMG.
E a iniciativa também permitiu que construíssemos uma integração maior com o que viria a ser o SUS. Porque com uma emergência aberta e atendendo a demanda de uma população, o IPPMG pôde fazer articulações e negociações com o Suds, que trouxe mais recursos para o instituto. Quando o Sistema Único de Saúde foi criado, o IPPMG já estava pronto para lidar com ele.
E ainda houve ganhos para a população da região onde fica o IPPMG. Essa área se beneficiou muito com uma nova emergência pediátrica aberta, o que era até então uma carência local. E acho que a população sempre teve um carinho muito grande pelo IPPMG, nós tínhamos um nome, uma adesão afetiva à unidade que passou a estar aberta 24 horas por dia para atender suas demandas.

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