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Se acaso um eleitor indeciso estivesse na noite de terça-feira (5) no auditório Manoel Maurício de Albuquerque, no campus da Praia Vermelha, talvez até saísse de lá ainda em dúvida sobre em qual das duas chapas votar nas eleições para a diretoria da AdUFRJ, na semana que vem. Mas jamais poderia dizer que não saiu esclarecido.
Tão nítida quanto a ausência de algum eleitor indeciso na plateia — formada por apoiadores declarados de um lado e outro — foi a diferença de concepções das duas vertentes sobre sindicalismo, em visões sustentadas com vigor e duras críticas de parte a parte, mas com uma cordialidade digna de nota.

 

Logo na apresentação, as duas candidatas à presidenta da AdUFRJ deixaram translúcidas essas divergências. A professora Mayra Goulart, da situação, encorpou sua defesa de um “sindicalismo para professores, e não para sindicalistas” e enalteceu as novas formas de mobilização postas em prática pela AdUFRJ, e que, no seu entendimento, “vão além do sindicalismo tradicional”. Já a professora Aline Caldeira, da oposição, destacou que o cenário de desfinanciamento das universidades públicas “tem tornado o cotidiano docente adoecedor” e que a AdUFRJ, na sua visão, está ausente desse dia a dia: “Não chama sequer uma assembleia para discutir com a categoria a atual campanha salarial, na qual o governo apresentou um índice de 1% para os servidores”, pontuou.

Os dois blocos de perguntas da plateia, oito no total, acentuaram as distintas concepções. Escolhidas por sorteio, cinco perguntas foram feitas por apoiadores da situação, e três pelos da chapa 2. Entre os pouco mais de 20 presentes — outros 26 participaram de forma remota — estava o ex-reitor Carlos Frederico Leão Rocha. E coube a ele uma das perguntas mais instigantes do debate: a relação entre a AdUFRJ e o Observatório do Conhecimento. “Vocês vão acabar com o Observatório ?”, questionou o professor.

Aline Caldeira e seu candidato a vice, Caio Martins, disseram que precisarão consultar as bases, e questionaram o papel de protagonismo do Observatório em negociações em Brasília. “Tem que haver clareza em relação às políticas que são definidas e aos recursos que são alocados no Observatório”, reivindicou Aline. E Caio complementou: “Não chegam até a base as informações que embasam esse protagonismo que o Observatório tem na formulação da política da AdUFRJ”.

Já Mayra Goulart sustentou que as ações de advocacy são uma nova frente de luta que a AdUFRJ e o Observatório vão manter, caso seja eleita. “O Observatório estava em nosso programa de chapa quando fomos eleitos para esta gestão, então nós fomos sufragados para exercer esse papel. E conseguimos posicionar o Observatório como uma referência no campo educacional”, defendeu. “O Observatório gastou apenas 7% do que gastamos com o Andes”.

A prática sindical, seja no âmbito da AdUFRJ ou do Andes, foi outro ponto de clara divergência entre as duas chapas. As visões distintas ficaram expostas nas respostas à pergunta feita pela professora Cristina Miranda, recentemente aposentada, sobre como aproximar os docentes do sindicato. “Tem que haver diálogo presencial, é o que defendemos. O que a gente tem assistido são métodos que criam um distanciamento do cotidiano, não só do corpo docente, mas da comunidade universitária. Queremos um sindicato que seja um instrumento de mobilização, que crie espaços de debate”, ponderou Caio Martins. “Nós ampliamos a participação. O professor ocupado, que está em seu laboratório, que não é sindicalista profissional, ele se sente amparado por ter mais essa ferramenta de participação online. A gente acredita que isso amplia a participação”, rebateu Mayra Goulart.

As diferentes visões de prática sindical das atuais direções do Andes e da AdUFRJ — três perguntas da plateia, todos de apoiadores da situação, trataram dessa questão —suscitaram alguns dos momentos mais duros do encontro. “O Andes faz um tipo de sindicalismo que a gente não quer fazer, que é completamente alienado das questões políticas e das questões profissionais que afetam nossa categoria. A gente não discutiu a eleição de 2022 nas reuniões do Andes. São discussões alienadas da conjuntura e da vida diária do professor”, demarcou Mayra. Aline retrucou: “Na verdade, essas novas formas de luta não têm nada de novo. É o velho e carcomido sindicalismo pelego. Construir organização coletiva dá trabalho”.

Bem conduzido pelos professores Felipe Rosa e Marta Castilho, da Comissão Eleitoral, com serenidade e respeito aos tempos de fala, o debate careceu de um modelo menos engessado. O formato que permite apenas perguntas da plateia às chapas tem dois problemas: barra o confronto direto entre os candidatos e dá margem a perguntas repetitivas, como se viu terça-feira. Se ao menos um bloco fosse dedicado a perguntas diretas de uma chapa a outra, com direito a réplicas e tréplicas, as questões poderiam ser praticamente exauridas, tornando mais claras ainda as diferenças e abrindo espaço a outros temas — alguns não foram sequer tocados no debate da Praia Vermelha, como o novo Canecão, a contratação ou não da Ebserh e as más condições de manutenção de algumas unidades da UFRJ.

Fica a sugestão. Com tanta cordialidade, um confronto direto entre as chapas não traria mal algum: poderiam ser embates duros, mas sem perder a ternura. Jamais.

*Alexandre Medeiros
Jornalista, atua na área política desde os anos 1980. Trabalhou no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia e revista Época. É autor do livro “Crônica de um sonho”, sobre a campanha de Lula ao Planalto em 1994. 

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