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WhatsApp Image 2022 08 22 at 12.35.32O debate eleitoral é central este ano e os professores estão preocupados com o tema. Apesar da gravidade política do momento, a diretoria do Andes não tem dado o devido espaço para a discussão. Essas impressões fizeram parte do programa Contramola, que convidou as professoras Mayra Goulart, cientista políica e vice-presidente da AdUFRJ, e Elisa Guaraná, antropóloga e presidente da Adur-RJ (Associação de Docentes da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro).

Convocado para discutir a crise nas universidades e o papel do Andes nas eleições 2022, o bate-papo aconteceu num canal do Partido dos Trabalhadores, no Youtube. A apresentação foi de Luiz Sérgio Canário.

A professora Elisa comentou o quanto o golpe de 2016, que tirou do poder a presidente Dilma Rousseff, impactou as instituições federais. Ataques que se acentuaram no governo de Jair Bolsonaro. “Já no governo Temer há mudanças significativas nas políticas públicas que vinham garantindo uma universidade para a juventude de periferia”, disse a professora. “O Reuni (Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) sem dúvidas foi um marco importante para a educação pública brasileira”, acredita a professora. “A gente teve uma mudança significativa no perfil do nosso alunado e na perspectiva de futuro para o país. Conquista que vem sendo desmontada”, analisou.

A asfixia financeira das universidades é uma das razões para que haja um engajamento forte nas eleições deste ano contra Bolsonaro. “Há universidades que não têm orçamento para daqui a dois meses. Por tudo isso, a Adur, a AdUFRJ e outras entidades entendem que essas eleições são uma espécie de tudo ou nada”, disse. “Precisamos apoiar a candidatura do presidente Lula. Não dá para ficarmos numa postura de neutralidade. Mas esse debate não é fácil para o Andes”, afirmou.

A docente defendeu que a defesa da candidatura de Lula é uma defesa da democracia. “Não queremos um sindicato partidarizado, mas entendemos que o sindicalismo brasileiro precisa tomar posição contra o fascismo”, pontuou. “É preciso se manifestar em defesa da sociedade brasileira e essa defesa, nesse momento, é a eleição do presidente Lula”.

Ela argumentou que o papel do sindicato não é se posicionar em eleições, a menos que o momento seja de crise. “É o que estamos enfrentando hoje. Por isso, nós que nos organizamos no Renova Andes (grupo de oposição à atual diretoria nacional) defendemos a importância de debater eleições. Esse tema não foi pautado pela diretoria nem no Congresso do Andes nem no Conad”, criticou.

Elisa também desaprovou a ausência do Andes na Conferência Nacional Popular de Educação (Conape), organizada pelo Fórum Nacional Popular de Educação, que aconteceu entre 15 e 17 de julho, em Natal (RN). “A diretoria do Andes marcou o seu Conselho, que aprova suas contas, para as exatas mesmas datas da Conape. Mais de três mil professores de todo o país se reuniram para discutir educação pública, mas a diretoria não entende a importância dessa instância”, lamentou.

Mayra Goulart, que estuda Bolsonaro e o bolsonarismo desde 2018, fez uma categorização sobre o atual presidente da República. “Bolsonaro é um inimigo inequívoco. Ele não se contradiz, é coerente no seu ataque às minorias, às classes populares e à pluralidade”, disse. “Ele se constrói como um sujeito que é homem, branco, hétero, cis e de classe média. Esse é o perfil identitário desse sujeito político. Ele representa todo aquele que se percebe como vencedor, que não precisa de ajuda, o ‘cidadão de bem’, da família tradicional”.

Esse sujeito político, segundo Mayra, é incompatível com a ideia de conhecimento. “A Ciência se alimenta da pluralidade. Quanto mais diverso for o horizonte dos cientistas, mais soluções diversas poderão ser aportadas. O bolsonarismo ataca esse lugar de conhecimento, que é a universidade pública, porque ele não tolera a pluralidade”, analisou.

A vice-presidente da AdUFRJ citou os recentes estudos realizados pelo Observatório do Conhecimento — rede que reúne dez associações docentes — sobre cortes no orçamento e os ataques à liberdade de cátedra. “A gente calculou, até 2021, uma redução de R$ 83,8 bilhões no Orçamento do Conhecimento (que engloba universidades federais e Ministério da Ciência e Tecnologia). Há uma estimativa de chegar a R$ 100 bilhões de cortes em 2022”, revelou.

Sobre os ataques à liberdade de cátedra, Mayra lamentou a tendência a um “conhecimento natimorto”. “Mais de 35% dos pesquisadores entrevistados revelaram que mudaram seu foco de pesquisa por medo de represália e 42% cercearam suas próprias aulas”, disse. “Ou seja, são conhecimentos cortados antes de nascer. Isso vai gerar um apagão do pensamento por conteúdos que não foram sequer trabalhados em sala de aula”. Para esta pesquisa foram ouvidos 1.116 cientistas.

Em relação ao Andes, Mayra declarou que esperava estar num sindicato que acolhesse suas preocupações. “Gostaria de ouvir que há uma discussão para reverter todos esses ataques sofridos pelas universidades e professores, que me protegesse, que me dissesse que há estratégias para informar a sociedade civil sobre esses cortes, que atuasse junto a parlamentares para defender a liberdade acadêmica”, elencou. “Mas eu chego no sindicato e escuto zero sobre isso. Eu escuto muito sobre Ucrânia, sobre refugiados, sobre o socialismo. Temas todos importantes se a gente não estivesse com o bode na sala. Nós temos um inimigo urgente. A gente não está num contexto normal”, desabafou. “Quando não vejo esse debate eleitoral pautado, fico me perguntando se a diretoria do Andes entende a singularidade dessa eleição”, questiona.

NOVA FORMA DE DESMOBILIZAR

Aparentemente, a diretoria nacional encontrou mais uma forma de desmobilizar professores na reta final da campanha eleitoral. A tarefa urgente, entendida por boa parte dos docentes das universidades país afora, é derrotar Bolsonaro elegendo Lula no primeiro turno, em 2 de outubro. Mas o Andes acredita que é inadiável realizar uma reunião plena do Grupo de Trabalho Política Agrária, Urbana e Ambiental (GTPAUA), no dia 28 de setembro. O evento acontece em Brasília e tem na programação discussão sobre catástrofes ambientais, injustiças sociais, planos nacionais de Mineração e Energia, além de teorizações sobre termos surgidos nos cadernos de textos dos últimos Conads e Congressos, como “bem viver, ecossocialismo, povos do campo, águas e florestas”.

“Essa convocação às vésperas das eleições é uma ilustração bem didática do que é a diretoria do Andes, que entende o sindicato como uma entidade de sindicalistas sempre ensimesmados pelas suas próprias questões”, critica a professora Mayra Goulart.

Para ela, tirar lideranças políticas de seus estados às vésperas das eleições demonstra como o grupo que comanda o Andes ignora a conjuntura nacional. “No pleito mais importante da nossa história, o Andes está mais preocupado em rever seus cadernos de texto”.

Eudes Baima, professor da Universidade Estadual do Ceará e liderança do Renova Andes,também critica a iniciativa. “O sindicato não pode paralisaras atividades por conta das eleições, mas há que ter bom senso”, ressalva. “A diretoria demonstra completo descolamento da conjuntura, até certa alienação em relação à realidade brasileira”, conclui.


DE COSTAS PARA A DEMOCRACIA

Apesar de ter assinado a Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito, produzida pela USP e apoiada por mais de um milhão de pessoas, a diretoria do Andes não convocou os professores para participarem dos atos em que a carta foi lida país afora. A mobilização da direção nacional para o 11 de agosto focou nos atos de rua contra Bolsonaro que aconteceram nos estados. Para o professor João Torres, presidente da AdUFRJ, um gesto preocupante, considerando que a mobilização em torno da leitura da carta aconteceu, sobretudo, nas universidades.

“Acho um equívoco e uma insensibilidade ao nosso momento político. É muito importante que a Fiesp, os banqueiros e e elite paulistana se posicionem a favor da democracia ao lado da UNE, das universidades e de toda a sociedade civil”, argumenta. “Sabemos que essa carta foi uma manifestação gestada no ‘andar de cima’ da sociedade brasileira e isso faz com que setores mais sectários do nosso sindicato a encarem com desconfiança e mesmo com desdém”, avalia Torres. “Sabemos que houve manifesto contra a presidenta Dilma Rousseff pelos mesmos professores do Direito da USP, por exemplo, mas temos que lidar com essas contradições”, acredita o professor.

Para João Torres, a prioridade de todos os que têm compromisso com a democracia é o engajamento na campanha política para a Presidência da República. “A missão do momento é eleger Lula-Alckmin, não porque é a chapa dos nossos sonhos, mas porque é a unica saída para tirar o Bolsonaro. E a carta faz parte dessa estratégia”.

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